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Trab - dissidio coletivo de comum acordo, Trabalhos de Direito do Trabalho

DIREITO DO TRABALHO - DISSIDIO COLETIVO DE COMUM ACORDO

Tipologia: Trabalhos

Antes de 2010

Compartilhado em 20/04/2007

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Baixe Trab - dissidio coletivo de comum acordo e outras Trabalhos em PDF para Direito do Trabalho, somente na Docsity! ASPECTOS POLÊMICOS DO PODER NORMATIVO DA JUSTIÇA DO TRABALHO E DO DISSÍDIO COLETIVO “DE COMUM ACORDO” Mauro Schiavi1 Os conflitos de massa da classe trabalhadora são próprios das relações de trabalho e, segundo a doutrina, começaram a surgir a partir da Revolução Industrial. Passados alguns séculos, os conflitos coletivos continuam a eclodir, tendo a sociedade criado meios para solucioná-los da forma mais efetiva possível. O Direito do Trabalho, desde o seu surgimento, é marcado por forte intervenção do Estado nas relações capital x trabalho e tal intervenção continua de forma preponderante em países de terceiro mundo, como forma de se tentar assegurar a igualdade real entre empregados e empregadores. Esse intervencionismo estatal nas relações de trabalho tem reflexos nos meios de solução dos conflitos trabalhistas. Para a solução e prevenção dos conflitos individuais, há toda uma estrutura estatal no Direito Brasileiro. Basta lembrarmos os Fiscais e Auditores Fiscais do Trabalho, as Delegacias Regionais do Trabalho, o Ministério Público do Trabalho e a Justiça do Trabalho. Quanto aos conflitos Coletivos de Trabalho, há formas de solucioná-los fora do Estado, como a autotutela (greves e locautes), a negociação coletiva (acordos e convenções coletivas) e a abitragem. Entretanto, mesmo na esfera coletiva, prevalece a solução estatal do conflito coletivo por meio do chamado Poder Normativo da Justiça do Trabalho. O Poder Normativo da Justiça do Trabalho tem sido objeto de inúmeras críticas pelos estudiosos do Direito do Trabalho, por ter suas origens no corporativismo estatal e ser uma ingerência indevida da Justiça do Trabalho nas relações de trabalho, uma vez que há a criação pelo Judiciário de normas jurídicas que regerão as relações de trabalho no âmbito das categorias profissionais e econômicas. Também sua existência, conforme apontam alguns, provoca uma natural acomodação da negociação coletiva e até um acentuado abuso na pauta de reivindicações da categoria profissional quando do ingresso do dissídio coletivo. Argumentam, ainda, que, constantemente, a Justiça do Trabalho prolata uma decisão completamente divorciada da realidade das categorias, não sendo efetiva. Por outro lado, há os que continuam defendendo o Poder Normativo como meio pacificação social, de garantia de equilíbrio na solução do conflito coletivo e de ser ainda um meio confiável, justo e eficaz na solução do conflito, garantindo o equilíbrio na negociação coletiva e justiça social. Sem a pretensão de esgotar o tema, que é dos mais polêmicos no Direito do Trabalho atual, mencionaremos as formas de solução dos conflitos coletivos, dando ênfase ao chamado Poder Normativo da Justiça do Trabalho, e sua nova roupagem a partir da Emenda Constitucional 45/04. 1 Juiz do Trabalho na 2ª Região. Mestrando em Direito do Trabalho pela PUC/SP. Professor Universitário. Professor do Curso Robortella. . 1 DOS CONFLITOS COLETIVOS TRABALHISTAS Não há consenso na doutrina sobre o que seja conflito, mas este é inerente à condição humana, principalmente em razão da escassez de bens existentes na sociedade e das inúmeras necessidades do ser humano. Márcio Pugliese2 apresenta os seguintes fatores para um modelo conflitivo da sociedade: “a)A vida social, num determinado modo produtivo, é resultado da interação permanente de utilidades (interesses) diversas que constituem o elemento motivador fundamental para a conduta social do homem; b)O conflito de interesses é a busca de utilidade, domina a vida social e, em conseqüência, propicia a produção de normas regulamentos, sistemas de repressão e lide de todo tipo; c)O consenso, também chamado equilíbrio social, é um estado precário sendo mais um construto teórico-prático que efetivo consenso normativo generalizado; d)o consenso, no sentido de c), existe como expressão ideológica das resultantes das forças de dominação e coerção ou de exploração de uma sociedade e é, por conseqüência precário e mutável; e)O conflito social favorece a divisão da sociedade em grupos de pressão, instituições (particularmente partidárias) que disputam o poder que, de fato, permanece com as elites dominantes; f)A ordem social (estado de equilíbrio do sistema) depende da natureza desse conflito, ou melhor, de sua estrutura; g)O conflito entre os contendores produz a mudança social, elemento permanente em qualquer sociedade a fim de manter o estado geral de coisas orbitando em torno de um ponto de equilíbrio (um ponto de acumulação, em sentido topológico); h)Quando o desequilíbrio excede a capacidade de o sistema obter retorno a esse ponto de acumulação, transformações serão necessárias; i)Inicialmente, o sistema tenderá a diversificar seu funcionamento a fim de superar o desequilíbrio e, se isso não for suficiente, então, e só então, mudanças estruturais serão implementadas”. Na esfera processual, o conflito surge quando ocorre uma pretensão resistida, o que Carnelutti denominou de lide. Por seu turno, segundo este consagrado processualista, pretensão é a exigência de subordinação do interesse alheio ao interesse próprio. Conflito de interesse, conforme ensina Moacyr Amaral Santos 3, “pressupõe, ao menos, duas pessoas com interesse pelo mesmo bem. Existe quando, à intensidade do interesse de uma pessoa por um determinado bem se opõe a intensidade do interesse de uma pessoa pelo mesmo bem, donde a atitude de um tendente à exclusão da outra quanto a este”. O Direito do Trabalho como é marcado por grande eletricidade social, uma vez que está por demais arraigado na vida das pessoas e sofre de forma direta os impactos das mudanças sociais e da economia, é um local fértil para eclosão dos mais variados conflitos de interesse. 2 PUGLIESE, Márcio. Por uma Teoria Geral do Direito. Aspectos Micro-sistêmicos, São Paulo, RCS Editora, 2005, p. 203. 3 SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras Linhas de Direito Processual Civil, São Paulo, Saraiva, 1985, p. 4. 2 grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base; III-interesses individuais homogêneos, assim entendidos os decorrentes de origem comum”11. Os interesses difusos são transindividuais de natureza indivisível, cujos titulares são indeterminados e ligados entre si por uma situação fática. Como exemplos, podemos citar a proteção do meio ambiente do trabalho. Ensina Nélson Nery Júnior se referindo aos direitos difusos12, “são direitos cujos titulares não se pode determinar. A ligação entre os titulares se dá por circunstâncias de fato. O objeto desses direitos é indivisível, não pode ser cindido. É difuso, por exemplo: o direito de respirar ar puro; o direito do consumidor de ser alvo de publicidade não enganosa e não abusiva”. Segundo o mencionado autor13: “Os direitos coletivos são, assim como os difusos, transindividuais e indivisíveis, mas seus titulares são grupo, classe ou categoria de pessoa ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base (CDC 81 parágrafo único II). É coletivo, por exemplo, o direito dos alunos de determinada escola de ter assegurada a mesma qualidade de ensino em determinado curso. O direitos individuais homogêneos são os direitos individuais, divisíveis, de que são titulares pessoas determinadas, mas que podem ser defendidos coletivamente em juízo em razão de serem direitos que têm origem comum (CDC 81 parágrafo único III). Não se trata de pluralidade de demandas (litisconsórcio), mas de uma única demanda, coletiva, objetivando à tutela dos titulares do direitos individuais homogêneos. É a class action brasileira. São individuais homogêneos, por exemplo, os direitos de proprietários de automóveis que foram produzidos com defeito de fábrica, de obter indenização quanto ao prejuízo que tiveram com o defeito”14. Como bem advertem Nélson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery15: “O que qualifica o direito como difuso, coletivo ou individual homogêneo é o conjunto formado pela causa de pedir e pelo pedido deduzido em juízo. O tipo de pretensão material, juntamente com o seu fundamento é que caracterizam a natureza do direito”. Diante do exposto, concluímos que o interesse coletivo é o que transcende o aspecto individual para irradiar efeitos sobre um grupo ou categoria de pessoas, sendo uma espécie de soma de direitos individuais, mas também um direito próprio do grupo, cujos titulares são indeterminados, mas que podem ser determinados, ligados entre si por uma relação jurídica base. Em razão disso, no Direito do Trabalho, cada categoria 11 Tanto o inciso VI do artigo 6º, como o artigo 81, ambos da lei 8078/90 são aplicáveis ao Direito Material e ao Direito Processual do Trabalho, por força dos artigo 8º e 769, ambos da CLT. 12 NERY JÚNIOR, Nélson e NER, Rosa Maria. Código Civil Comentado e Legislação Extravagante, 3ª Edição, São Paulo, Saraiva, 2005, pág. 1011. 13 Op. cit, pág. 64-02/155. 14 Para Ronaldo Lima dos Santos: “Os direitos individuais homogêneos, assim, são individuais em sua essência (com titulares determinados, divisíveis, de fruição singular e disponíveis), sendo que somente adquire feição coletiva a forma processual pela qual podem ser tratados, dada a sua homogeneidade decorrente da origem comum e a expressão social que adquirem ( Amplitude da Coisa Julgada na Ações Coletivas, in Ação Coletiva na Visão de Juízes e Procuradores do Trabalho, coordenadores: José Hortêncio Ribeiro Júnior, Juliana Vignoli Cordeiro, Marcos Neves Fava e Sebastião Vieira Caixeta, São Paulo, LTR, 2006, pág. 303). 15 Código Civil Comentado e Legislação Extravagante, 3ª Edição, São Paulo, RT, 2005, págs. 1010/1011. 5 pode defender o próprio interesse e também, por meio de negociação coletiva, criar normas a viger no âmbito da categoria. FORMAS DE SOLUÇÃO DOS CONFLITOS COLETIVOS DE TRABALHO Segundo os doutrinadores mais renomados na seara do Direito Coletivo do trabalho, são os meios de solução dos conflitos coletivos de trabalho: autotutela ou autodefesa; autocomposição; heterocomposição. A autotutela ou autodefesa é o meio mais primitivo de resolução dos conflitos. Nesta modalidade, há uma ausência do Estado na solução do conflito, sendo uma espécie de vingança privada. Hoje, nas legislações, ainda há resquícios da autotutela em alguns Códigos, como a legítima defesa da posse no Código Civil, ou o estado de necessidade e legítima defesa na esfera penal. Na esfera do conflito coletivo de trabalho, temos como exemplo de autotutela a greve e o locaute, sendo este vedado no ordenamento jurídico brasileiro pelo artigo 17 da Lei 7783/89. A nosso ver, a greve é um direito fundamental da classe trabalhadora, cuja oportunidade de exercício compete à própria categoria16, entretanto, todo direito tem que ser exercido nos limites da normalidade para que não viole direito de terceiro e cumpra a sua função social. A partir do momento em que o movimento paredista se torna abusivo, os excessos têm que ser devidamente punidos, com as sanções civil e criminais, previstas nos artigos 9º, da CF, 186 do CC e Lei 7783/85. A autocomposição é modalidade de solução dos conflitos coletivos de trabalho pelas próprias partes interessadas sem a intervenção de um terceiro que ira ajuda-las ou até propor a solução do conflito. Como exemplos temos a negociação coletiva para os conflitos coletivos e o acordo ou a conciliação para os conflitos individuais, acompanhados ou não de conciliação ou mediação.17 A mediação, no nosso entendimento, é forma de heterocomposição, embora alguns autores a insiram na autocomposição, pois o mediador, de um jeito ou de outro, mesmo aproximando as partes para a solução do conflito, interfere na solução do litígio. Na esfera do Direito Coletivo do Trabalho temos como instrumentos típicos de autocomposição, os acordos e convenções coletivas, que são produtos de um instituto maior que é a negociação coletiva. A negociação coletiva é um direito fundamental da categoria previsto no artigo 7º, da CF. Embora não esteja explicitamente consagrado na Constituição Federal, implicitamente ele está previsto nos incisos VI, XIII XIV, do artigo 7º, da CF e também no inciso XXVI do mesmo dispositivo constitucional que reconhece os produtos da negociação coletiva, 16 O artigo 591º do Código do Trabalho de Portugal: “1.A greve constitui, nos termos da Constituição, um direito dos trabalhadores. 2.Compete aos trabalhadores definir o âmbito de interesses a defender através da greve. 3.A greve é um direito irrenunciável”. 17 NASCIMENTO, Amauri Mascaro, Compêndio de Direito Sindical, São Paulo, LTR, 2000., p. 255. 6 quais sejam: as convenções18 e os acordos coletivos19. Além disso, há a disposição do artigo 8º, VI, da CF que prevê a participação obrigatória dos sindicatos nas negociações coletivas. A heterocomposição se exterioriza na forma de um agente exterior às partes20. É forma de solução do conflito por um terceiro desinteressado ao litígio que ira soluciona-lo. Como exemplo, temos a decisão judicial (Poder Normativo da Justiça do Trabalho) e a arbitragem. Alguns doutrinadores também sustentam que a conciliação e mediação, quando há interferência de um terceiro no conflito, são formas de heterocomposição. Amauri Mascaro Nascimento entende que a conciliação não é forma de heterocomposição, mas sim forma de autocomposição, embora também não seja mediação, pois a conciliação tem limites maiores que a mediação.21 BREVE ENFOQUE SOBRE OS SISTEMAS ESPANHOL E PORTUGUÊS DE RESOLUÇÃO DOS CONFLITOS COLETIVOS DE TRABALHO Praticamente todos os países da Europa adotam a forma consensual de solução dos conflitos coletivos, por meio da negociação coletiva, ou mediação. Uma vez fracassadas a negociação ou a mediação, há a possibilidade de arbitragem voluntária. Conforme Alfredo Montoya Melgar, os conflitos coletivos na Espanha podem ser de aplicação do direito e conflitos de regulação. Os conflitos de aplicação do direito seriam semelhantes ao que a doutrina brasileira denomina de conflitos jurídicos e os conflitos de regulação, seriam equivalentes aos nossos conflitos de interesse ou econômicos. Assevera o referido jurista22: “Atendiendo a la finalidad perseguida al plantearse el conflicto, se distinguen los conflictos sobre aplicación de Derecho y los conflitos de regulación, que assimismo son objeto de estúdio inmediato”. O modelo espanhol apresenta, basicamente, as seguintes modalidades de solução de conflitos: conciliação, mediação, arbitragem facultativa e solução jurisdicional apenas para os conflitos jurídicos. Também há a possibilidade de greve. 18 Segundo o “caput” do artigo 611, da CLT, “Convenção Coletiva de Trabalho é o acordo de caráter normativo pelo qual dois ou mais sindicatos representativos de categorias econômicas e profissionais estipulam condições de trabalho aplicáveis, no âmbito das respectivas representações, às relações individuais de trabalho”. 19 O parágrafo 1º do artigo 611 da CLT define acordo coletivo da seguinte forma: “É facultado ao sindicatos representativos de categorias profissionais celebrar Acordos Coletivos com uma ou mais empresas da correspondente categoria econômica, que estipulem condições de trabalho, aplicáveis no âmbito da empresa ou das empresas acordantes às respectivas relações de trabalho”. 20DELGADO, Maurício Godinho, Direito Coletivo do Trabalho, 2ª Edição, 2003, São Paulo, LTR, p. 205. 21NASCIMENTO, Amauri Mascaro, Compêndio..., p. 261. 22 MONTOYA MELGAR. Alfredo. Derecho del Trabajo, 22ª Edição, Editora Tecnos, Madri, 2001, p. 699. 7 detém a competência constitucional para criar normas por meio da chamada sentença normativa. Amauri Mascaro Nascimento enxerga o Poder Normativo como “a competência constitucional dos tribunais do trabalho para proferir decisões nos processos de dissídios econômicos, criando condições de trabalho com força obrigatória”.30 Para José Augusto Rodrigues Pinto, o poder normativo “é a competência determinada a órgão do poder judiciário para, em processo no qual são discutidos interesses gerais e abstratos, criar norma jurídica destinada a submeter à sua autoridade as relações jurídicas de interesse individual concreto na área da matéria legislativa”.31 32 ARGUMENTOS FAVORÁVEIS E DESFAVORÁVEIS AO PODER NORMATIVO Argumentos favoráveis: Dentre os argumentos favoráveis ao Poder Normativo, podemos apontar: a)Acesso à Justiça do Trabalho33; b)garantia de efetividade dos direitos trabalhistas; c)garantia de equilíbrio na solução do conflito coletivo, máxime quando uma das categorias é fraca; d)tradição dos países de terceiro Mundo em solucionar o conflito por meio do Poder Judiciário; e)não impede que trabalhadores e empregadores criem consciência de classe e regulem seus próprios interesses; f)redução da litigiosidade e pacificação social34; g)sindicalização por categoria e unicidade sindical; h)fragilidade do movimento Sindical Brasileiro35; 30NASCIMENTO, AMAURI MASCARO, Curso de Direito Processual do Trabalho, 21ª ed., São Paulo: Saraiva, 2002, p. 633-634. 31 Op. cit., p. 370. 32 Para Arion Sayão Romita: “o poder normativo da Justiça do Trabalho constitui o instrumento de que se vale o Estado para intervir no conflito capital x trabalho no plano coletivo”. (O Poder Normativo da Justiça do Trabalho: Antinomias Constitucionais, Revista LTr, São Paulo: LTr, vol. 65, n. 03, março/2001, p. 263). 33 Como bem adverte Amauri Mascaro Nascimento: “Não se pode deixar de lado a tendência do direito processual civil com a denominada coletivização das ações. Que vem se revelando tão intensa, entre outros meios, pela substituição processual aplicada aos processos individuais trabalhistas, para a defesa, pelo sindicato, em nome próprio, de direitos difusos, coletivos e até mesmo individuais homogêneos” ( A questão do dissídio coletivo “de comum acordo”.Revista LRT 70-06/649) 34 Segundo Amauri Mascaro Nascimento: “Ninguém pode duvidar que esteja praticamente afetado o próprio direito de propor dissídio coletivo caso se conclua que a sua propositura deve ser autorizada pelo suscitado. Nesse caso, os Sindicatos de trabalhadores, frustrada a negociação coletiva e impossibilitado o dissídio coletivo, terão de encontrar uma desembocadura para o conflito. Certamente, à falta de negociação, os Sindicatos só terão uma alternativa, a greve, o que não é do interesse social e econômico do País. Desse modo, dar validade à exigência do ajuizamento bilateral do dissídio coletivo pode funcionar como um incentivo ao grevismo. Como demonstram Cândido Rangel Dinamarco e Kazuo Watanabe, a litigiosidade contida é perigoso fator de infelicidade pessoa e desagregação social e por isso, constitui missão e dever do Estado à eliminação desses estados de insatisfação. O escopo de pacificar as pessoas mediante a eliminação de conflitos com justiça, é, em última análise, a razão mais profunda pela qual o processo existe e se legitima na sociedade (Cândido Dinamarco)” (Revista LTR 70-06/656) 10 i)tendência universal do acesso à Justiça para a defesa dos interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos36; Críticas: a)interferência indevida do Poder Judiciário na atividade legislativa; b)morosidade do judiciário trabalhista; c)falta de efetividade da sentença normativa, pois muitas vezes divorciada da realidade. Oscar Ermida Uriarte37 utilizou a expressão brecha entre derecho y realidad; d)despreparo técnico dos juízes em conhecer efetivamente o conflito coletivo e a realidade da categoria38; e)engessamento da negociação coletiva; f)acomodação das categorias profissional e econômica; Arion Sayão Romita destaca quatro antinomias constitucionais: “1ª – entre o art. 1º, parágrafo único, e o artigo 114, § 2º: se o povo exerce poder por intermédio de seus representantes eleitos, o poder normativo, exercido pelos juízes, não poderia ser acolhido pela Constituição, pois juízes não são representantes do povo; 2ª – entre o artigo 5º, inciso LV, que reconhece o princípio do contraditório sem qualquer exceção, e o artigo 114, § 2º: no exercício do poder normativo, a Justiça do Trabalho não é obrigada a observar o referido princípio, pois exerce jurisdição de eqüidade, dispensando a manifestação de contrariedade por parte da categoria econômica suscitada no dissídio coletivo; 3ª – entre o artigo 93, inciso IX e o artigo 114, § 2º: como decisão judicial, a sentença normativa não pode deixar de ser fundamentada, sob pena de nulidade; entretanto, o poder normativo se exerce como meio de solução de controvérsia coletiva, mediante edição de normas 35 Como destaca João Oreste Dalazen: “conforme alerta, acertadamente, Antonio Álvares da Silva, ‘nenhuma país civilizado do mundo ocidental chegou ao estágio atual de sua evolução sem contar com a participação dos sindicatos como meio eficiente de solução dos problemas sociais’. .Manifesto que um sindicalismo genuíno e representativo pode atenuar a conflituosidade permanente entre o Capital e o Trabalho, como nos ensina o bem sucedido exemplo da Espanha. A reforma do modelo sindical, portanto, e a palavra de ordem e deveria constituir uma das prioridades da nação” (Reflexões sobre o Poder Normativo da Justiça do Trabalho e a Emenda Constitucional N. 45/04. Revista da Academia Nacional de direito do Trabalho, ano XIII, no 13, São Paulo, LTR, 2006, p.135). 36 Inegavelmente, tem sido uma tendência do direito processual, a chamada “coletivização do processo”, principalmente na esfera trabalhista, onde o trabalhador enfrenta grandes dificuldades no acesso à justiça e também, em razão do vínculo de emprego, há sempre o temor de sofrer retaliações, se ingressar com uma ação durante o contrato de trabalho. Além disso, na esfera trabalhista, há uma certa peculiaridade de normatividade nas decisões, ainda que se referiram à interpretação e aplicação do direito. Como por exemplo, as ações declaratórias de representação sindical (artigo 114, III, da CF), ações anulatórias de acordos e convenções coletivas de trabalho. Ações civis públicas, impondo obrigações de fazer ou não fazer aos empregadores ou tomadores de serviços. Sendo assim, a restrição do Poder Normativo da Justiça do Trabalho estaria na contramão da tendência universal do acesso ao judiciário e à coletivização das ações. 37 Caracteres, Tendências y Fuguro del Derecho del Trabajo. Palestra Proferida no Congresso Internacional Internacional de Direito do Trabalho Promovido pela AMATRA 15 em 10/11/2006 em Campinas. 38 De outro lado, também não se exigível que o juiz conheça a essência do conflitos, pois o juízo tem que conhecer a realidade do processo, aplicando-se o antigo aforismo: o que não está nos autos não está no mundo. 11 (poder legislativo delegado), tarefa que dispensa fundamentação; 4ª – entre o artigo 9º e o artigo 114, § 2º: enquanto o primeiro dispositivo assegura o exercício do direito de greve pelos trabalhadores, o outro o inviabiliza, pois o poder normativo é utilizado para julgar a greve, inibindo o entendimento direto entre os interlocutores sociais”.39 Não temos dúvidas de que a melhor solução do conflito coletivo se dá por meio da negociação coletiva, máxime quando há equilíbrio entre as categorias profissionais e econômicas40. Não obstante, o nosso sistema sindical apresenta alguns entraves para que a negociação coletiva seja efetiva como a unicidade sindical, negociação por categoria, participação obrigatória dos sindicatos na negociação coletiva, falta de tradição na utilização da arbitragem como meio de solução dos conflitos e um sindicalismo ainda em desenvolvimento, onde falta consciência e informação da classe trabalhadora. Em que pesem os ponderáveis argumentos em sentido contrário, embora possa ser restringido, o poder normativo ainda se faz necessário, como o último subterfúgio de garantia do equilíbrio na solução justa do conflito coletivo. Vale lembrar que a solução judicial do conflito coletivo pela Justiça do Trabalho é uma faculdade das partes e, embora o instituto tenha origem facista, ele deve ser interpretado segundo o atual estágio que vive o direito do trabalho. Cumpre lembrar que a lei, uma vez editada, se desvincula do seu criador para adquirir vida própria. Nesse sentido é a advertência de Henrique Macedo Hinz41: “...a realidade fática de nosso gigante país, com suas gritantes diferenças sociais, política e econômicas, não permite que o Estado, especialmente o Judiciário Trabalhista, simplesmente saia de cena no que se refere aos conflitos coletivos de trabalho, sob pena de aleijar, ainda mais, aqueles pertencentes a categorias menos organizadas e reivindicativas. Se século atrás o distanciamento do Estado das relações sociais mostrou ser desastrosas como um todo, os que militam diuturnamente na área trabalhista sabe, sem sombra de dúvida, as conseqüências advindas da eliminação pura e simples do poder normativo atribuído à Justiça do Trabalho. Não se pode, pura e simplesmente, em face de suas origens, ou de vícios que já vêm sendo eliminados, extinguir aquele que é o único meio de progresso à significativa parcela dos trabalhadores brasileiros”. A QUESTÃO DO COMUM ACORDO PARA AJUIZAMENTO DO DISSÍDIO COLETIVO 39 ROMITA, Arion Sayão, O Poder Normativo da Justiça do Trabalho: Antinomias Constitucionais, Revista LTr, São Paulo: LTr, vol. 65, n. 03, março/2001, p. 268. 40 Ensina Jorge Luiz Souto Maior: “Quando há poder de fogo para negociar, a negociação ocorre e tem sido largamente utilizada. Quando essa situação não existe é que surge o campo de atuação do poder normativo Justiça do Trabalho. De qualquer modo, não é o poder normativo que cria a realidade. Essa realidade lhe é subjacente e é fruto do conhecido baixo nível cultural da população brasileira. Não é a extinção do poder normativo que via alterar esse realidade sociocultural, que se apresenta, no Brasil, um caso crônico. A grande atuação do poder normativo é o reflexos dessa situação e não o inverso” (Poder Normativo da Justiça do Trabalho: uma questão política. Jornal do XI Congresso Brasileiro de Direito Coletivo do Trabalho, LTr, p. 42). 41 HINZ, Henrique Macedo. O poder Normativo da Justiça do Trabalho, São Paulo, LTR, 2000, p. 71. 12 Dissídio coletivo que se julga parcialmente procedente (TRT 2ª Região, ACÓRDÃO Nº: 2006000061 ROCESSO Nº: 20222-2005-000-02-00-0 ANO: 2005 TURMA: SDC, DATA DE PUBLICAÇÃO: 24/01/2006 , Relatora Juíza Wilma Nogueira de Araújo Vaz da Silva). Para outros, o comum acordo a que se refere a EC 45/04 pode ser obtido até de forma tácita, o que equivale à ausência de oposição. Desse modo, se o suscitado comparecer à audiência de conciliação, apresentar defesa e não se opor ao prosseguimento do processo, tacitamente está anuindo, pois não praticou nenhum ato incompatível com a aceitação em se submeter à decisão judicial. Nesse sentido, a seguinte ementa: “Dissídio coletivo de natureza econômica. Artigo 114, p. 2º, da CF.l Comum acordo não significa necessariamente, petição conjunta. Interpretação história. Aplicação do princípio da inafastabilidade da jurisdição. Precedente desta C. SDC. Dissídio que é conhecido e julgado procedente em parte” (TRT 2ª Região - DCE 17.11.2005 Rel. Carlos Francisco Berardo) Por outro lado, há entendimentos no sentido de que o comum acordo tem que ser prévio, vale dizer: obtido quando do ajuizamento do dissídio coletivo, como sendo um pressuposto processual. Em sendo um pressuposto processual, o requisito do “comum acordo” deve estar presente já no ingresso do dissídio, sob conseqüência de nulidade do processo, uma vez que os pressupostos processuais, são requisitos de existência, regularidade de desenvolvimento da relação jurídica processual. A nosso ver, se prevalecer o entendimento de que deve haver acordo prévio para a instauração do dissídio coletivo de natureza econômica, o poder normativo da justiça do trabalho foi praticamente extinto, pois dificilmente haverá tal requisito na instauração do litígio, já que, se o conflito chegou até a justiça do trabalho, é porque, presumivelmente, fracassaram as tentativas de solução amigável do litígio ou de arbitragem voluntária. No campo da processualística talvez não seja difícil “escapar” do requisito do comum acordo prévio, pois, interpretando-se tal requisitos como sendo uma condição da ação, esta pode ser preenchida no curso do Processo. Segundo Liebman, as condições da ação ainda que não presentes quando da propositura da ação, é possível que ela seja obtida até o julgamento. No nosso sentir, o Poder Normativo não fora extinto, pois se assim quisesse o legislador ele o teria feito expressamente. Inegavelmente, houve uma restrição do Poder Normativo, ou melhor dizendo, ao acesso a ele. A EC 45 visou a restringir o acesso à Justiça do Trabalho para resolução dos conflitos coletivos de interesse, prestigiando a autocomposição. Interpretando-se literalmente o p. 2º, do artigo 114, da CF nos parece que não há dúvidas de que o “comum acordo” tem que ser prévio, pois a lei fala em “ajuizar, de comum acordo,...” A nosso ver, o comum acordo não é um pressuposto processual e sim uma condição da ação, ou melhor dizendo, um óbice à apreciação da pretensão coletiva trazida em juízo. Por isso não se trata de um requisito de validade da relação jurídica processual, mas uma condição prévia para a apreciação da pretensão. Cumpre destacar que o “comum acordo” se assemelha ao compromisso arbitral e, pelo artigo 301, § 4º do CPC, o juiz não pode conhece-lo de ofício. Como destaca Fredie Didier Júnior44: “o compromisso arbitral, embora seja exceção (matéria que o 44 DIDIER JÚNIOR, Fredie. Pressupostos Processuais e Condições da Ação. O juízo de admissibilidade do Processo, São Paulo, Saraiva, 2005, p. 341. 15 magistrado pode conhecer ex officio), deve ser alegado na contestação e não por exceção instrumental. O silencia do demandado quando ao compromisso não gera qualquer nulidade”. Recentemente, se pronunciou o C. TST, exigindo a presença do comum acordo quando do ajuizamento do dissídio, conforme a dicção da seguinte ementa: “DISSÍDIO COLETIVO. PARÁGRAFO 2º DO ART. 114 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. EXIGIBILIDADE DA ANUÊNCIA PRÉVIA. Não demonstrado o comum acordo, exigido para o ajuizamento do Dissídio Coletivo, consoante a diretriz constitucional, evidencia-se a inviabilidade do exame do mérito da questão controvertida, por ausência de condição da ação, devendo-se extinguir o processo, sem resolução do mérito, à luz do art. 267, inciso VI, do CPC. Preliminar que se acolhe. PROC DC 165049/2005-000-00-00.4 - TST - Carlos Alberto Reis de Paula - Ministro Relator. DJU de 29/09/2006 - (DT - Novembro/2006 – vol. 148, p. 165). Embora não sejamos otimistas com a exigência do “comum acordo” para o ajuizamento do dissídio coletivo de interesse, talvez a jurisprudência poderia experimentar ser mais rígida com a interpretação da expressão “comum acordo” e exigi-lo quando do ingresso do dissídio, como forma de estimular a negociação direta das partes. Também com a escassez do Poder Normativo, poderiam eclodir outras formas negociação coletivas, rompendo com o paradigma da negociação por categoria, como a representação direta dos trabalhadores na empresa (artigo 11, da CF), participação dos trabalhadores na gestão da empresa (artigo 7º, XI, da CF), negociação direta entre trabalhadores e empresa (artigo 617, da CLT). Restringindo-se o Poder Normativo, a Justiça do Trabalho exerceria um controle a posteriori, anulando, por meio de ações anulatórias, as eventuais cláusulas de acordos e convenções coletivas que extrapolem os limites constitucionais mínimos ou não cumpram sua função social. Esta é aliás, a atuação precípua do Judiciário, máxime considerando-se o princípio da liberdade de contratar (artigos 421 e seguintes do Código Civil). Caso tal interpretação mais rígida quanto ao ingresso do dissídio coletivo não funcione, havendo um aumento significativo da litigiosidade, perpetuação do conflito e grande instabilidade social, e até mesmo o aniquilamento de direitos sociais, a interpretação pode retroceder, admitindo o ajuizamento do dissídio sem o comum acordo, podendo este ser obtido a posteriori, ou seja, no curso do Processo, ou até mesmo poder ser suprido judicialmente. Como bem adverte Mozart Victor Russomano45: “Na solução dos conflitos de trabalho, em particular dos conflitos coletivos de natureza econômica, se reitera a velha e válida idéia de que não basta que existam leis boas. É preciso que existam bons cidadãos e bons juízes, dispostos a respeitá-las e a faze-las respeitar. Bons cidadãos que dispensem a interferência dos maus juízes e bons juizes reprimam a conduta dos maus cidadãos. A sentença, sempre é página arrancada da vida de algum homem. A sentença coletiva é página arrancada da história de um povo. Nele se reflete ou dela resulta o drama que chega ao último ato ou tragédia, de final desesperador. Nossa experiência de juiz, durante quarenta anos, permite que a apalavra final deste livro seja de advertência: “Nós os juízes do século XX, 45 RUSSOMANO. Mozart Victor. Princípios Gerais de Direito Sindical, 2ª Edição, Rio de Janeiro, Forense, 2002, p. 293. 16 viemos do povo, pois em seu seio nascemos e nos formamos. Para o fiel desempenho de nossa missão social, devemos continuar ao lado dele, sentindo-lhe o calor , o suor, a puslação, o sofrimento. O verdadeiro juiz, neste final de século, é aquele que consegue incorporar em sua alma a alma coletiva, anônima e comunitária das multidões. Esse é o juiz que enfrentará, certo dia, com tranqüilidade, a face severa do Juiz que o acompanha, o avalia e o qualifica. Foi dito alhures: ‘O povo é o juiz dos juízes’. Deveria ter sido acrescentado: E suas sentença são inapeláveis, porque são as sentenças da história”. Concluindo, a exigência de comum acordo, a nosso ver não extinguiu o poder normativo. Mas sem dúvida, o acesso do poder normativo foi restringido e se criou um obstáculo à sua instauração, que para alguns é uma condição da ação, para outros um pressuposto processual. A QUESTÃO DO COMUM ACORDO NOS DISSÍDIOS DE GREVE Muito tem sido discutido no dissídio de greve, se há a necessidade do comum acordo para o Tribunal apreciar as cláusulas econômicas. O artigo 114, parágrafo 3º da CF assim dispõe: “Em caso de greve em atividade essencial, com possibilidade de lesão do interesse público, o Ministério Público do Trabalho poderá ajuizar dissídio coletivo, competindo à Justiça do Trabalho decidir o conflito”. É de intuitiva compreensão que, no caso de greve que afetar o interesse público, a sociedade não pode sofrer as graves conseqüências da paralisação indefinida de uma atividade que lhe é essencial, como nas áreas de saúde, energia elétrica, comunicação, transporte coletivo, etc46. À primeira vista, sem dúvida, a nosso ver, foi restringida a legitimidade do MP do Trabalho para ajuizar o dissídio de greve. Agora, o MP do Trabalho somente pode atuar quando a greve for em atividades essenciais, definidas de forma exemplificativa na Lei 7783/83. Pensa de forma contrária João Oreste Dalazen47: “...o novel preceito apenas elevou à dignidade constitucional a legitimação ativa do Ministério Público do Trabalho para instaurar dissídio coletivo, em caso de greve, já assegurada anteriormente em lei. Uma vez que a norma insculpida no p. 3º do art. 114 não outorgou legitimação exclusivamente ao Ministério Público do Trabalho, creio que persiste a legitimação concorrente também de qualquer das partes para suscitar dissídio coletivo em caso de greve, como já dispõe expressamente a atual Lei n. 7.783/89 (art. 8º )”. A questão que se coloca é a seguinte: Pode a Justiça do Trabalho, em dissídio de greve, apreciar as cláusulas econômicas? A jurisprudência tem interpretado o p. 3º do artigo 114, sistematicamente com o inciso II, do art. 114 da Constituição Federal48 49, dizendo que 46DALAZEN, João Oreste. Op. cit. p. 144. 47 Op. cit. p. 144. 48 TRT/SP n. 20086200500002009, AC. 2005000777, SDC, Rel. Juíza Wilma Nogueira de Araújo Vaz da Silva, DOE 13.05.2005: “(...) Em relação à primeira preliminar argüida pela PUC, no sentido da extinção do dissídio ante a falta de comum acordo entre as partes, a preliminar fica desde já rejeitada, nos termos do que dispõe a Emenda 45 em seu Artigo 114 17 Além disso, sua remuneração lhe deve permitir, a ele e a sua família, pelo menos uma vida honrada, de acordo – justamente – com esta categoria de ser humano. Deve também fazer que seu trabalho se desenvolva em condições de segurança, higiene e condições adequadas de trabalho. Finalmente, deve ter a certeza de que, desde que cumpra corretamente sua tarefa, terá respeitado seu emprego ou será adequadamente indenizado. Esse princípio é a base da humanização do trabalho, que envolve a proteção do homem trabalhador tanto no seio da empresa como fora dela, compreendendo a família. Toda mudança que se introduza no trabalho, por qualquer razão que seja, e principalmente se em benefício do capital, deve, antes de tudo, tomar em consideração o trabalhador em sua dignidade”. Acreditamos que para assegurar a dignidade da pessoa humana do trabalhador é necessário a fixação de um piso vital mínimo de direitos ao trabalhador, não só ao trabalhador regido pela CLT (aquele que trabalha sob a moldura dos artigos 2º e 3º, da CLT), mas a todos aqueles que trabalham de forma pessoal e colocam sua força de trabalho em prol de outrem, o que configura o relação de trabalho lato sensu54. Como salienta Paolo Barile55, “a garantia de proteção ao trabalho não engloba somente o trabalhador subordinado, mas também aquele autônomo e o empregador, enquanto empreendedor do crescimento do país”56. Nossa Constituição Federal prevê no artigo 1º, incisos III e IV, a dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho como fundamentos do Estado Democrático de Direito, e no artigo 3º, III, IV, menciona como objetivos da República Federativa do Brasil a erradicação da pobreza e a marginalização, com a redução das desigualdades sociais e regionais, bem como promover o bem de todos, 54 Acreditamos que o trabalhador que presta serviços em situação diversa da prevista pelos artigos 2º e 3º, da CLT também deve ter assegurado um piso vital mínimo de direitos, como os previstos nos artigos 5º, 6º e 225, da CF, exemplificativamente: direito à intimidade, à imagem, à privacidade, à saúde, ao lazer à proteção à maternidade à previdência social, função social da propriedade, direito de associação, direito ao meio ambiente salubre de trabalho. Também alguns direitos previstos no artigo 7º, da CF podem ser aplicados a outros trabalhadores que seguem regime diverso da CLT, como uma remuneração mínima que garanta dignidade, limitação da jornada, períodos de descanso, proteção contra acidentes do trabalho, aviso prévio, dentre outros. 55Barile, Paolo. Diritti dell”uomo e libertà fondamentali. Bolonha: II Molino, 1984, p. 105, “apud”, Moraes, Alexandre, Direito Constitucional, 15ª Edição, São Paulo, Atlas, 2004, pág. 52. 56 Nesse mesmo diapasão, argumenta com propriedade Gabriela Neves Delgado: “No entender desta obra, quando o art. 7º, caput, da Constituição Federal de 1988, elenca direitos constitucionais trabalhistas ele o faz para todo e qualquer trabalhador e não apenas para os empregados urbanos e rurais. É claro que a concessão dos direitos constitucionais trabalhistas será assegurada a cada trabalhador conforme a possibilidade da própria estrutura de trabalho estabelecida, o que não significa a defesa de discriminações, mas pelo contrário, o respeito às diferenças estruturais que se estabelecem no mundo do trabalho”(O Direito Fundamental ao Trabalho Digno, São Paulo, LTR, 2006, pág. 215). No mesmo sentido é a opinião abalizada de Amauri Mascaro Nascimento, “esses direitos, na esfera das relações de trabalho têm como fundamento a necessidade de garantia de um mínimo ético, que deve ser preservado nos ordenamentos jurídicos, nas relações de trabalho como forma de organização jurídico-moral da sociedade quanto à vida, saúde, integridade física, personalidade e outros bens jurídicos valiosos para a defesa da liberdade e integração dos trabalhadores na sociedade, perante a qual têm o dever-direito ao trabalho. Não são restritos ao empregado, mas, por serem fundamentais, devem estender-se a todo aquele que prestar um trabalho subordinado ou por conta alheia, o que abre o horizonte da sua aplicabilidade para formas atípicas de contratação do trabalho como temporário, avulso, eventual, intermitente e todo aquele que vier a ser enquadrado na rede de proteção da legislação trabalhista. Valverde, Guttiérrez e Murcia, em Derecho del Trabajo (2000), mostram que os direitos fundamentais, reconhecidos para a pessoa em sua condição como tal e não especificamente em sua condição de participante no processo produtivo, podem ser também exercidos pelos trabalhadores no âmbito das relações de trabalho”(Curso de Direito do Trabalho, 19ª Edição, São Paulo, Saraiva, 2004, pág. 434). 20 sem preconceitos de origem, etnia, sexo, cor, idade e qualquer outras formas de discriminação. Interpretando-se sistematicamente os direitos fundamentais previstos nos artigos 1º e 3º, da Constituição Federal, sob a ótica da pessoa humana do trabalhador, de acordo com o princípio da máxima efetividade dos direitos fundamentais (Canotilho), conclui-se que a preservação dos valores sociais do trabalho é uma das formas de se garantir a dignidade da pessoa humana, bem como propiciar ao ser humano uma sociedade mais justa, com igualdades de oportunidades, para o seu pleno desenvolvimento físico e intelectual. No nosso sentir o piso vital mínimo de direitos para garantia da dignidade da pessoa humana do trabalhador abrange: a)direitos fundamentais previstos nos artigos 1º e 3º, da CF; b)direitos individuais previstos no artigo 5º, da CF, máxime os direitos atinentes à vida, à liberdade, à igualdade (“caput); privacidade, imagem e intimidade (incisos V e X); liberdade de exercício de profissão (inciso XIII); liberdade de associação (XX) e acesso à Justiça do Trabalho (XXXV); c)direitos sociais previstos no artigo 6º, máxime os direitos à saúde, lazer, proteção á maternidade, e à previdência social; d)direitos trabalhistas mínimos previstos no artigo 7º, da CF, máxime proteção contra a dispensa arbitrária (I), salário mínimo que atenda às necessidades básicas do trabalhador (IV), limitação de jornada e períodos de descanso (XIII e XV), redução dos riscos de acidentes de trabalho (XXII), vedação à qualquer forma de discriminação (inciso XXX) e proteção em face da automação (XXVII); e)direito à livre filiação sindical (artigo 8º, da CF) e de participar da vida sindical; f)direito de greve (artigo 9º, da CF); g)direito ao meio ambiente equilibrado do trabalho (artigos 200, VIII e 225, da CF). Voltando ao aspecto do Poder Normativo, diz o artigo 766 da Consolidação das Leis do Trabalho que “nos dissídios sobre estipulação de salários, serão estabelecidas condições que, assegurando justos salários aos trabalhadores, permitam também justa retribuição às empresas interessadas”. Em decisão da lavra ao saudoso e ilustre Ministro Coqueijo Costa, encontramos um interessante raciocínio sobre os Limites do Poder Normativo : “ EMENTA: “Poder Normativo. 1. O poder normativo atribuído à Justiça do Trabalho, limita-se, ao norte, pela Constituição Federal; ao sul, pela lei, a qual não pode contrariar; a leste, pela eqüidade e bom senso; e a oeste, pela regra consolidada no artigo setecentos e sessenta e seis, conforme a qual nos dissídios coletivos serão estipuladas condições que assegurem justo salário aos trabalhadores, mas ‘permitam também justa retribuição às empresas interessadas’”57 Diante do parágrafo 2º, do artigo 114, da Constituição Federal, temos que os limites mínimos do Poder Normativo, ou seja, os limites que não podem ser ultrapassados pelo Poder normativo, são as garantias mínimas de proteção ao trabalho, englobando o chamado piso vital mínimo de proteção dos direitos do trabalhador e as normas anteriormente convencionadas. Também, a nosso ver, como o Poder Normativo atua no chamado “branco da lei”, também não pode contrariá-la. 57 TST RODC n. 30/82, em 27.05.82, T. Pleno Rel. Min. Coqueijo Costa. DJ 12.8.82. 21 Pelo exposto, concluímos que os limites mínimos do Poder Normativos, ou seja, seu ponto de partida são: a)as normas coletivas anteriormente convencionadas; b)os direitos mínimos de proteção ao trabalho, máxime os que garantem a dignidade da pessoa humana do trabalhador. Quanto ao limite máximo do poder normativo, ou seja, o seu teto, sempre gerou divergências e discussões acaloradas. Diz o § 2º do artigo 114 da Constituição Federal, que suprimiu a expressão estabelecer normas e condições por decidir o conflito. No projeto de lei de reforma sindical, o artigo 188, tem a seguinte redação: “No fracasso da negociação coletiva destinada à celebração ou à renovação de norma coletiva, os atores coletivos em conflito poderão, de comum acordo, provocar a atuação do tribunal do trabalho, de árbitro ou de órgão arbitrar para o fim de criar, modificar ou extinguir condições de trabalho”(grifou-se). Inegavelmente, decidir o conflito econômico é criar normas e condições de trabalho. Mas qual o teto máximo do Poder Normativo, ou seja, quais são os limites da atividade criativa do judiciário trabalhista. O Supremo Tribunal Federal, mesmo antes da EC 45/04, dirimiu a questão, conforme a ementa abaixo transcrita: “EMENTA “Dissídio coletivo. Recursos extraordinários providos para excluir as cláusulas 2ª (piso correspondente ao salário mínimo acrescido do percentual) e 24ª (estabilidade temporária), por contrariarem, respectivamente, o inciso IV (parte final) e I do art. 7º da Constituição, este último juntamente com o art. 10 do ADCT, bem como a cláusula 29ª (aviso prévio de 60 dias), por ser considerada invasiva da reserva legal específica, instituída no art. 7º, XXI, da Constituição. Recursos igualmente providos, quanto à cláusula 14ª (antecipação para junho, da primeira parcela do 13º salário), por exceder seu conteúdo a competência normativa da Justiça do Trabalho, cujas decisões a despeito de configurarem fonte do direito objetivo, revestem o caráter de regras subsidiárias, somente suscetíveis de operar no vazio legislativo, e sujeitas à supremacia da lei formal (art. 114, § 2º, da Constituição). Recursos de que não se conhece no concernente à cláusula (reajuste salarial), por ausência e pressupostos de admissibilidade, e, ainda, no que toca às cláusulas 52ª (multa pela falta de pagamento de dia de trabalho), 59ª (abrigos para a proteção dos trabalhadores), 61ª (fornecimento de listas de empregados), 63ª (fixação de quadro de aviso), visto não contrariarem os dispositivos constitucionais contra elas invocados, especialmente o § 2º do art. 114.”58 (grifo nosso) Comentando a questão, assinala Ripper59: “Com efeito, entendemos que o poder criativo da Justiça do Trabalho está esvaziado e a Justiça do Trabalho não poderá criar normas ou condições de trabalho não existentes na legislação e nos acordos ou convenções coletivas, antes vigentes entre as mesmas partes. Para finalizar, na mesma esteira do declinado acima, entendemos pela inaplicabilidade do princípio da rebus sic stantibus à sentença normativa, preconizado no artigo 873 da CLT60 – dispositivo tornou-se inconstitucional. Exceção se faz pela via negocial direta entre as partes. Isto porque, há evidente limitação de atuação da Justiça do Trabalho em 58 STF, Reclamante n. 197.911-9, Rel. Min. Octávio Gallotti, DJU 7.11.1997. 59 Op, cit p. 69-7/855. 60 “Art. 873. Decorrido mais de um ano de sua vigência, caberá revisão das decisões que fixarem condições de trabalho, quando se tiverem modificado as circunstâncias que as ditaram, de modo que tais condições se hajam tornado injustas ou inaplicáveis.” 22
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