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Guias e Dicas
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Estudos Regionais, Notas de estudo de Enfermagem

estudo das politicas das regiões do Brasil

Tipologia: Notas de estudo

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valeria-aparecida-siva-viana-1 🇧🇷

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Baixe Estudos Regionais e outras Notas de estudo em PDF para Enfermagem, somente na Docsity! 1 FF FD FF FD FF FD FF FD FF FD FF FD FF FD FF FD FF FD FF FD FF FD FF FD FF FD FF FD FF FD FF FD FF FD FF FD FF FD FF FDESCOLA T CNICA FEDERAL DE S O PAULO Globaliza��������������������� Reestrutura����������������������� tiva Neoliberalismo ANO 99 - Professor Laerte - MUSICAS PARA O ITEM GLOBALIZAÇÃO Cérebro eletrônico (G. Gil) O cérebro eletrônico faz tudo Faz quase tudo Faz quase tudo Mas ele é mudo O cérebro eletrônico comanda, Manda e desmanda Ele é quem manda Mas ele não anda Só eu posso pensar Se Deus existe Só eu Só eu posso chorar Quando estou triste Só eu Eu cá com meus botões De carne e osso Eu falo e ouço. Hum Eu penso e posso Eu posso decidir Se vivo ou morro por que Porque sou vivo Vivo prá cachorro e sei Que cérebro eletrônico nenhum me dá socorro No meu caminho inevitável para a morte Porque sou vivo, sou muito vivo e sei Que a morte é nosso impulso primitivo e sei Que cérebro eletrônico nenhum me dá socorro Com seus botões de ferro e seus Olhos de vidro Pela Internet (Gilberto Gil) Criar meu web site. Fazer minha home-page Com quantos gigabytes se faz uma jangada Um barco que veleje Que veleje nesse infomar, que aproveite a vazante da infomaré Que leve um oriki do meu velho orixá Ao porto de um disquete de um micro em Taipé Um barco que veleje nesse infomar, que aproveite a vazante da infomaré Que leve meu e-mail até Calcutá depois de um hot-link Num site de Helsinque para abastecer Eu quero entrar na rede, promover um debate Juntar via Internet um grupo de tietes de connecticut De Connecticut acessar O chefe da Macmilicia de Milão Um hacker mafioso acaba de soltar Um vírus prá atacar programas no Japão Eu quero entrar na rede prá contactar Os lares o Nepal, os bares do Gabão Que o chefe da polícia carioca avisa pelo celular Que lá na praça Onze tem um vídeopôquer para se jogar Poema de José Paulo Paes A torneira seca (mas pior: a falta de sede) A luz apagada (mas pior: o gosto do escuro) A porta fechada (mas pior: a chave por dentro). Roda Viva (Chico Buarque) Tem dias que a gente se sente Como quem partiu ou morreu A gente estacou de repente Ou foi o mundo então que cresceu A gente quer ter voz ativa No nosso destino mandar Mas eis que chega a roda viva E carrega o destino prá lá Roda mundo, roda-gigante Rodamoinho, roda pião O tempo rodou num instante Nas voltas do meu coração A gente vai contra a corrente até não poder resistir Na volta do barco é que sente o quanto deixou de cumprir Faz tempo que a gente cultiva a mais linda roseira que há Mas eis que chega a roda viva e carrega a roseira prá lá Roda mundo (etc.) A roda da saia, a mulata não quer mais rodar, não senhor Não posso fazer serenata, a roda de samba acabou A gente toma a iniciativa, viola na rua, a cantar Mas eis que chega a roda viva e carrega a viola prá lá Roda mundo (etc.) O samba, a viola, a roseira, um dia a fogueira queimou Foi tudo ilusão passageira que a brisa primeira levou No peito a saudade cativa faz força pro tempo parar Mas eis que chega a roda viva e carrega a saudade prá lá . Roda mundo (etc.) 1 - O QUE É A GLOBALIZAÇÃO 1.1 INTRODUÇÃO 2 "Eles podem aumentar o comércio, facilitar o fluxo financeiro e melhorar os meios de transporte". A ONU ainda defende sete iniciativas em nível mundial para igualar as regras do jogo. Destacam-se a proposta de um mecanismo para controle e vigilância com mais agilidade da liquidez internacional, mudanças nas regras do comércio mundial em benefício dos países pobres e uma associação de empresas multinacionais para fomentar a redução da pobreza. A última proposta se baseia numa constatação surpreendente: das 100 maiores economias do mundo, 50 são megaempresas. Como a GM, cujo faturamento em 1994 foi superior ao PIB de países como Turquia, Dinamarca e África do Sul. É uma tendência em alta. Com as constantes fusões de gigantes empresariais, vai aumentar a importância das multinacionais, em detrimento dos Estados nacionais. E é por essa razão que já há quem prefira chamar a globalização de era da "englobação". (Folha de São Paulo, ano 97) 6. A principal denúncia contra a nova ordem mundial é a de que a globalização econômica está cortando os empregos em escala mundial e num ritmo igualmente veloz. As grandes corporações multinacionais devido à competição global demitem dezenas de milhares de trabalhadores e, na busca de redução de custos, terceirizam parte de seu trabalho, adotam tecnologias mais avançadas e transferem suas operações para países do Terceiro Mundo, com mão-de-obra mais barata. Na Europa de hoje o desemprego está em 10,3% da população ativa. A inserção do Brasil no processo de globalização está também aumentando o desemprego, hoje perto de 10% da PEA (população economicamente ativa). Segundo análise do mercado de trabalho nos anos 90 realizada pelo economista Márcio Pochmann houve uma piora da qualidade do emprego e das relações de trabalho no país. De acordo com Pochmann, na década de 90 observou-se a ampliação das ocupações não-assalariadas e das assalariadas sem registro em carteira. Por outro lado, caiu a participação do emprego assalariado com registro em carteira. "Nos anos 90, de cada dez empregos criados, oito eram não-assalariados; até a década anterior, de cada dez vagas criadas, oito eram assalariadas" , compara. A falta de ocupação, para o economista, é resultado direto das políticas econômicas adotadas a partir de 90 e de seus efeitos, especialmente a abertura do mercado brasileiro às importações e a redução dos investimentos internos (por exemplo, na indústria, na tecnologia, na reforma agrária). E os investimentos internos se reduzem devido também à política do atual governo que mantém o plano real atrelado ao capital financeiro e especulativo. Quanto maior os juros pagos a este capital para ele não deixar o país maior o desemprego. As empresas nacionais precisam de empréstimos e com os juros altos não tem condições de se expandirem e por isso demitem. Mas no caso da abertura do mercado interno é bom lembrar que os governantes do países desenvolvidos não abrem os seus mercados como o Brasil fez. Recomendam isto para nós mas não fazem o mesmo. Ou seja, o lema é: “faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço. Aloysio Biondi, articulista do Jornal “Folha de São Paulo”, no dia 10 de setembro de 98 escreveu: “Quinta-feira, bilhões de olhos e ouvidos ligados ao noticiário sobre a crise mundial. Mais práticos, indiferentes à montanha russa de cotações nas bolsas, governantes de um bloco de países aumentam em 25 pontos percentuais, de 8% para 33%, os impostos sobre a importação de alimentos e produtos agrícolas básicos , como trigo, milho, sorgo e outros grãos.” Quem são estes governantes? Governantes de países europeus. E porque fazem isto? Por que estão sem dólares? Não têm dinheiro para pagar sua dívida externa? Não. Devido à baixa mundial no preço dos alimentos os governos destes países europeus resolveram aumentar as tarifas de importação de alimentos e produtos agrícolas “para garantir mercado à produção de seus próprios países, para garantir empregos no campo, para garantir renda à população rural. Para manter a economia nacional, o nível de emprego, a arrecadação de impostos, o oferecimento de serviços de saúde, educação, transportes e energia à população.” (Aloysio Biondi, in jornal citado) 7. O processo de internacionalização da economia, a chamada globalização, está promovendo a "exportação" de empregos dos países pobres ou empobrecidos, como o Brasil, para os países ricos, como os Estados Unidos.É o que mostra o levantamento feito pelo economista Marcio Pochmann, da Unicamp. A despeito de o número mundial de desempregados ter quase triplicado nos últimos 20 anos, a fatia dos países desenvolvidos nesse bolo está em queda. O G-7, grupo dos sete países mais industrializados no mundo, era responsável por 30,1% dos desempregados do planeta em 1979. Dez anos depois, sua participação caíra para 22,1%. No ano passado ela foi reduzida a 16,9%.Ao mesmo tempo, o número de desempregados no mundo saltou de 44,598 milhões em 1979 para 83,437 milhões em 1989, chegando a 130,6 milhões em 1998.Em parte, esse fenômeno se explica pelo crescimento e envelhecimento da população dos países pobres -uma transição demográfica que ocorreu há duas ou três décadas nos países ricos. O resultado é o aumento da População em Idade Ativa (PIA) e, por consequência, da oferta de mão-de-obra que procura emprego nos países pobres. Mas o problema ocorre também na outra ponta, a da demanda por trabalhadores. Ela caiu na periferia do mundo, o que não ocorreu, ao menos não na mesma intensidade, nos principais centros capitalistas representados pelo G-7. Os integrantes desse clube privilegiado -Estados Unidos, Japão, Canadá, Alemanha, França, Itália e Inglaterra- foram atingidos com menos violência pela crise mundial do emprego ou, na melhor das hipóteses, até poupados. São os casos, por exemplo, dos EUA e da França. Nos últimos anos esses países não só diminuíram sua fatia no bolo do desemprego global, mas reduziram o seu número de desempregados em termos absolutos. O resultado é que, em 1979, seis dos dez países com mais desempregados eram do G-7. Em 1994, só três países ricos permaneciam entre os "top ten". Isso não acontece por acaso. Pochmann lembra que 70% do comércio mundial e dois terços do fluxo mundial de recursos financeiros estão concentrados nos países desenvolvidos. Além disso, desde a intensificação do processo de globalização da economia, os países desenvolvidos tiraram mais proveito de suas relações comerciais com o resto do mundo. Os EUA, por exemplo, passaram de um déficit para um superávit em sua balança comercial com a América Latina. Essa nova ordem mundial começou a ser instalada nos anos 80. Pochmann explica que, após uma década de crise, os países desenvolvidos promoveram uma reestruturação econômica baseada em pesados investimentos em tecnologia e pesquisa. Em boa parte, esses investimentos são patrocinados pelas grandes empresas, cujas sedes estão nos países ricos. Esse fato, somado ao movimento de fusões das maiores companhias, drena a maior parte dos recursos internacionais para os países desenvolvidos. Ao mesmo tempo, os EUA elevam suas taxas de juros, valorizam o dólar e atraem o capital financeiro internacional. Essa reestruturação leva ao acirramento da competição internacional, e os países da periferia, sem o capital tecnológico, perdem espaço. O mercado que sobra às nações não- desenvolvidas é a produção agrícola e de matérias-primas -cujos preços internacionais têm uma tendência de queda no 5 longo prazo. Os poucos países em desenvolvimento que mantêm um parque industrial se especializam em produtos com baixo valor agregado e pequeno índice tecnológico. As novas plantas industriais se limitam, em boa parte, a montar equipamentos cujos insumos são importados dos países desenvolvidos. (Folha de São Paulo, 21de fevereiro de 1999- José Roberto de Toledo) 8. O crescimento recente da participação brasileira no desemprego mundial começou quatro anos atrás, em 1995.Não por acaso, o desemprego acompanha o aumento da abertura do país aos produtos importados (como mostra o gráfico na página ao lado).Entre 1995 e 1998, a exposição à concorrência externa aumentou 30%, e a fatia brasileira no desemprego do mundo, 21%..O grau de abertura comercial é medido pela soma do valor das importações e exportações em relação ao PIB (Produto Interno Bruto, a soma das riquezas de um país). Essa correlação se aplica aos últimos 20 anos. Sempre que a economia brasileira é mais exposta à competição externa, a fatia do Brasil no desemprego mundial acaba aumentando. Não se trata de culpar unicamente a abertura comercial pelo problema. Até porque, como afirma Marcio Pochmann, "é inviável pensar em uma redistribuição de renda no Brasil se a economia estiver fechada". Porém, a abertura comercial desempenha um papel fundamental nesse processo: várias cadeias produtivas da indústria foram desorganizadas pelo crescimento das importações, como a fabricação de produtos têxteis e de peças para veículos.Com o real sobrevalorizado e as tarifas alfandegárias reduzidas, produtos importados se tornaram mais baratos. Os bens produzidos no Brasil não suportaram a concorrência, e os empregos que eles geravam acabaram "exportados" para os países desenvolvidos onde se fabricam os importados. "Perdemos empregos na indústria, que paga mais e exige mais qualificação da mão-de-obra, e criamos empregos de serviços de limpeza e segurança", resume Pochmann. Apesar da abertura comercial, a fatia do Brasil no comércio mundial ficou mais fina. Em 1986, ela chegava a 1,1%. Em 1997, caíra para 0,8%. Motivos: o crescimento das exportações brasileiras não acompanhou o ritmo mundial e o valor dos produtos exportados pelo país (com baixo índice tecnológico) teve uma queda. Nesse cenário, se a recessão levar o país este ano a registrar um recuo de 3,5% no seu Produto Interno Bruto, a fatia brasileira no desemprego mundial deve pular de 5,1% para 7,7%. (Folha de São Paulo, 21/02/99 – José Roberto de Toledo) 9. A mesma lógica econômica que aumenta a fatia dos países pobres no desemprego global pode levar a uma volta da velha ordem mundial que prevalecia até 1930: um pequeno grupo de países industrializados, que concentram a renda e as melhores ocupações, e um largo número de países limitados à produção agrícola e de matérias-primas. A conclusão é do economista Marcio Pochmann, da Unicamp, que fez um levantamento sobre o desemprego mundial. Segundo ele, os países que se baseiam na exportação de produtos primários têm uma baixa dinâmica econômica: sua produção têm pouco valor agregado e, assim, geram poucos empregos, em geral mal remunerados. Mesmo quando há investimentos diretos dos países desenvolvidos, essas novas fábricas se limitam a montar insumos importados dos principais centros. É o que acontece com a indústria automobilística no Brasil, por exemplo, que ainda pertence à segunda onda tecnológica. "A tecnologia é o divisor de águas entre os países que produzem e os que compram", resume Pochmann. As indústrias de ponta, da terceira onda, como as de informática, se concentram nos países desenvolvidos. "Pode até haver ilhas de desenvolvimento dentro dos países pobres, com trabalhadores especializados e bem-remunerados, mas eles estarão rodeados pelo subemprego e de desempregados. Para Pochmann, os únicos modelos de industrialização que tiveram êxito na periferia do capitalismo foram o do Brasil e o da Coréia. Ambos foram tragados pela crise econômica iniciada na Ásia. "Tanto o modelo brasileiro - voltado para o mercado interno, de economia fechada- quanto o coreano - voltado à exportação- foram destruídos pela política de abertura irrestrita às importações", sustenta. O terceiro modelo, do bloco soviético, sucumbiu com o fim do comunismo na Europa. "O FMI fez em três anos aquilo que o Exército americano não conseguiu em 30", diz, numa referência à desorganização da economia russa. (Jornal Folha de São Paulo, 21/02/99 - JRT) 1.2 UM MUNDO INTERLIGADO: O FENÔMENO DA GLOBALIZAÇÃO (Do livro “O trabalho na economia global” , de Paulo Sérgio do Carmo, Editora Moderna, pág. 6 a 13) Releia o item 1 do texto acima, uma notícia de jornal. “Esta notícia de jornal, cujo título é “Americanos fabricam os seus tênis em toda parte”, demonstra duas tendências da economia atual: as empresas produzem em diferentes partes do mundo, onde a mão-de-obra e as matérias-primas, em maior quantidade, são mais baratas e onde os mercados consumidores se constituem em escala internacional. Esse é o fenômeno da GLOBALIZAÇÃO ou da MUNDIALIZAÇÃO da Economia. A globalização implica mudança no ritmo da indústria, do comércio, das comunicações e dos transportes, configurando uma situação de crescente interdependência econômica entre os países. O capital se internacionaliza e investe em inúmeros países, regiões e continentes com diferentes situações econômicas. Seus primeiros movimentos começaram na década de 70. O processo de globalização não se restringe aos aspectos econômicos; envolve também a questão tecnológica, cultural e outras de não menor importância. Trata-se de um amplo rearranjo na economia mundial causado pela revolução tecnocientífica e também pela grande concentração de capitais. A velocidade das trocas tem crescido em ritmo acelerado nos últimos anos, numa integração entre países comandada pelas grandes corporações de empresas multinacionais. O primeiro ato que dá impulso a essa expansão é a revolução tecnológica da informática, que acelerou a capacidade de processar informações entre pessoas e grandes empresas. Decorrente disso, temos o barateamento da transmissão de informações e interurbanos nacionais e internacionais e, por fim, a redução do preço do transporte de carga internacional e o grande aumento na oferta. 6 I - ANTECEDENTES HISTÓRICOS O processo de integração e de circulação de mercadorias para além das fronteiras nacionais existe há muito e não é suficiente para caracterizar algo de novo. Em 1848, dois teóricos do socialismo Marx e Engels, escreveram o Manifesto Comunista, em que mostram o avanço do capitalismo no mundo: “A necessidade de mercados cada vez mais extensos para seus produtos impele a burguesia para todo o globo terrestre. Ela deve estabelecer-se em toda parte (...). Através da exploração do mercado mundial, a burguesia deu caráter cosmopolita à produção e ao consumo de todos os países. Em lugar das velhas necessidades, satisfeitas pela produção nacional, surgem necessidades novas, que para serem satisfeitas exigem produtos das terras e dos climas mais distantes(...). Em lugar da antiga auto-suficiência e do antigo isolamento local e nacional, desenvolve-se em todas as direções um intercâmbio universal, uma universal interdependência das nações.” Esse texto, ainda bastante atual, mostra que a novidade hoje em dia está na aceleração do ritmo dos acontecimentos. Assim, ao retrocedermos ao passado, constatamos que o esforço econômico em direção á superação de fronteiras é um processo antigo, mas sempre progrediu com certa lentidão. Quando os navegadores portugueses quebraram o monopólio comercial das cidades italianas,com o Oriente, uma nova era estava se iniciando e toda a Europa se beneficiava dos produtos oriundos de outros continentes. O acesso ao Oriente e a descoberta da América trouxeram crescentes riquezas para a Europa, resultando num mundo com grandes cidades, indústrias e bancos. O capitalismo se expandia geograficamente por todo o globo e lentamente se formava um sistema único de produção e consumo de mercadoria. Em “A Sociedade global”, o sociólogo Octávio Ianni resume a história da globalização tem três fases distintas. A primeira inicia-se nos séculos XV e XVI com as grandes navegações, que resultaram na descoberta de regiões do globo ainda não exploradas pelos europeus. A Segunda fase ocorreu no século XVIII, no período da Revolução Industrial, com as principais nações européias expandindo seus mercados consumidores em todo o mundo. O desenvolvimento de novas técnicas possibilitou o aumento da produtividade do trabalho humano e, consequentemente, propiciou o aumento da produção de mercadorias com menor custo e lucros maiores. Com a Revolução Industrial surgem novos personagens na cena social, como o operariado e seus mecanismo de luta, os sindicatos e as idéias socialistas de emancipação da classe trabalhadora. A terceira fase, a atual, iniciou-se no pós-guerra com o domínio completo das empresas multinacionais e a integração ainda maior dos grandes mercados mundiais à periferia dos sistema econômico, isto é, os países do chamado Terceiro Mundo. Por se tratar de uma nova espécie de processo social, algo nunca antes visto, muitas são as discussões dos estudiosos. Nossa civilização é cada vez mais transnacional: tecnologia e fontes de informação idênticas nos unem. Esse mundo “transnacional”, não é , porém, um mundo uniforme. Alguns países ou regiões se desenvolvem mais depressa, e diferentes classes sociais podem ser mais ou menos beneficiadas. II - A ALDEIA GLOBAL O fenômeno modernizante parece não parar, difundindo-se pelos mais remotos e recônditos cantos do planeta. Pode-se ver TV no interior da floresta amazônica ou nas montanhas do Tibete. Influenciados por ventos que aconteciam no outro lado do Muro de Berlim, os cidadãos da Alemanha oriental, antes da queda do muro, captaram informações de que algo não ia bem com o regime comunista. Causou espanto no meio político quando se soube que índios guerrilheiros do Estado de Chiapas, no México, embrenhados na selva, passaram a manter comunicação com o mundo via Internet. Vivemos numa “aldeia global”. Esse conceito de “aldeia global” foi criado pelo intelectual canadense Marshall McLuhan, da Universidade de Toronto, na década de 60, para nomear os acontecimento no mundo da comunicação. Ele observou que havia cada vez mais entrelaçamento dos meios de comunicação, mas não suporia, talvez, que na virada do século XX o mundo passasse por mudanças tão profundas e radicais. Via cabo, via satélite, via fax, telefone ou Internet, o homem se transporta para qualquer parte, sem ter de viajar. A tecnologia, para McLuhan, poderia ser compreendida como uma espécie de extensão do nosso corpo. Dessa forma, a roda seria uma extensão dos nossos pés; o telefone, dos nossos ouvidos; o telescópio ou a TV, dos nossos olhos. A rede de comunicação formaria uma teia à semelhança do nosso sistema nervoso e, nesse sentido, de uma rede neural de comunicações nosso cérebro se espalharia pelo mundo todo. Estamos rumando para a era da realidade virtual como se objetos, pessoas e idéias se transfigurassem pela magia da eletrônica. Diante disso, temos a sensação de que o nosso mundo está mudando, está girando mais depressa, como se ele tivesse encolhido. As multinacionais encaminham-se para uma produção pulverizada em todos os cantos do mundo, segundo as suas conveniências de custo, e não dependem de um país específico para sobreviver. Transformações recentes como a microeletrônica, a biotecnologia e a energia nuclear constituem o conjunto tecnocientífico da sociedade “pós-industrial”, conceito que sugere haver um novo modelo de sociedade. Note-se, aliás, como é comum hoje o emprego do prefixo “pós” para tantos fenômenos diversos; ele revela a tentativa de se compreender a nova configuração mundial. O termo “sociedade pós-industrial” descreve a rápida queda no número de operários fabris a partir da década de 70 e ao avanço do setor de serviços. Com a robótica e a microeletrônica, afirma-se que estamos vivenciando a Terceira Revolução Industrial. Mesmo divergindo na interpretação dessas mudanças, os estudiosos têm destacado a importância das tecnologias de ponta no processo de organização da nova produção fabril. São elas que dão possibilidade de configuração global às empresas multinacionais, facilitando o surgimento das subsidiárias, dispersas pelo planeta. Nesse sentido, alguns autores dirão que 7 de liberalização e desregulamentação levadas a cabo pelos países do G7, pelo Gatt e pelo FMI, com o estímulo de Reagan, de Thatcher e do monetarismo triunfante, consolida-se o atual regime de acumulação. 2. Que papel desempenha o capital financeiro nesse processo? O regime de acumulação mundializado sob égide financeira vive, muito mais do que em 1914 ou 1929, à sombra de um capital financeiro altamente concentrado. A mundialização financeira tornou a ser ao menos tão importante quanto a mundialização do capital produtivo. As carteiras de investimento são novamente tão ou mais importantes que o investimento direto. Nisso, o regime atual está mais próximo do imperialismo clássico. É claro que, em comparação com o começo do século, sua configuração modificou-se sob vários aspectos, mas alguns dos aspectos "novos" vão no sentido de um aprofundamento de traços "clássicos". As diferenças dizem respeito ao papel mais importante ora desempenhado pelos investimentos diretos no exterior e pelas operações dos grupos industriais transnacionais na organização dos fluxos comerciais; novo também é o grau crescente de interpenetração de capitais de origens nacionais diversas nos países centrais. Mas há semelhanças notáveis, que respondem pela reconstituição dos fluxos de rendas financeiras internacionais, que transitam por intermédio dos mercados financeiros ditos "emergentes". Neste novo regime, o capital financeiro cuja eutanásia era esperada por J. M. Keynes, reconstituiu-se em escala gigantesca. Ao lado das figuras tradicionais da oligarquia financeira, houve ainda a formação dos fundos de pensão e dos fundos de aplicação ("mutual funds") contemporâneos. Mas essa institucionalização e "democratização" do capital financeiro em nada altera suas características econômicas básicas. Trata-se de um capital financeiro "puro", que conserva a forma do "capital-moeda" (Marx) e que manifesta forte "preferência pela liquidez" (Keynes). Ele se dedica à valorização financeira pura do capital por meio da administração de carteiras de ativos financeiros (sobretudo de letras dos Tesouros nacionais e de ações). Este capital vive de retiradas sobre a riqueza criada na produção, transferidas por meio de circuitos que podem ser diretos (dividendos sobre o lucro de empresas) ou indiretos (juros de obrigações públicas e empréstimos aos Estados, que por sua vez representam retiradas sobre a renda primária circulando no sistema de impostos). Graças a essas retiradas, as relações de força entre o capital industrial e o capital financeiro "puro" modificaram-se claramente, com vantagem para o segundo. Essas relações são muito mais desiguais do que em 1914 ou 1929. Estamos portanto diante de um retorno ao imperialismo clássico, bem como de um reforço de seus traços fundamentais. O capital financeiro "puro" sempre teve fortes traços parasitários, e hoje também são muitas as suas ligações com o narco-capital e outras fontes "ilícitas". 3. Quais são os efeitos positivos da globalização? As transformações do regime de acumulação não têm nada de irreal. O discurso sobre a "mundialização dos benefícios" é a cobertura ideológica que busca mascarar os fundamentos do regime de acumulação financeiro-rentista, bem como seu pobre desempenho em termos de desenvolvimento, revelado pelo último relatório do Unctad. Não há muito como negar o fato de que o novo regime de acumulação permite ao capital explorar a fundo e para seu exclusivo benefício as vantagens da liberalização. Nós não estamos diante de uma miragem. Os observadores sérios têm notado que a economia mundial voltou às taxas médias de crescimento semelhantes às dos tempos do imperialismo "clássico", antes do interregno dos "30 anos gloriosos". Por trás deste crescimento fraco encontra- se uma queda regular das taxas de investimentos, com muitos anos de investimentos nulos ou negativos. Isto é perfeitamente coerente com uma configuração do capital na qual há supremacia da fração que se valoriza por via financeira e com uma situação em que o capital financeiro se beneficia de transferências de enormes massas de riqueza. Essa baixa dos investimentos corresponde a dois grandes processos: a adaptação da oferta a uma demanda efetiva que sofreu um enfraquecimento contínuo de dois de seus componentes - o consumo dos assalariados e as despesas públicas- e dominação de estratégias empresariais em que as reestruturações (o "re-engineering") prevalece sobre a criação de novas capacidades. Num quadro de tensões comerciais crescentes entre as principais potências industriais, o capital tomado como um todo simplesmente administrou a situação por meio da concentração e de um novo impulso monopolista. As vagas sucessivas de fusões-aquisições serviram para adiar as conseqüências da superprodução transferindo para os grupos industriais mais fortes as parcelas de mercado dos grupos adquiridos, os quais são logo absorvidos e rapidamente reestruturados com reduções importantes de efetivos nos países de implantação das filiais. Os processos de fusão-aquisição revelam estratégias voltadas, não para a criação de novas capacidades produtivas, mas para sua reestruturação e, mais freqüentemente ainda, para sua contração em termos de emprego. Este processo tem reduzido em níveis constantes o número total de grupos industriais em escala mundial, instituindo o oligopólio mundial como forma predominante de estrutura de oferta. A administração da superprodução crônica latente por meio da concentração industrial doméstica e transnacional não poderá prosseguir infinitamente. As estratégias de concorrência oligopolística são de natureza a agravar a situação de capacidade ociosa. É o caso da indústria automobilística, por exemplo, onde a rivalidade oligopolística recentemente tomou a forma de decisões de investimento maciço, para os quais não existirá mercado correspondente tão logo as novas capacidades produtivas entrem em operação. 4. Quais são os limites da globalização? A modalidade atual de "desenvolvimento", compreendido como extensão e transplante do nível de industrialização e do nível de vida dos países avançados não representa mais uma perspectiva viável para o conjunto dos países e continentes do mundo. Por um lado, já não é desejado por aqueles que outrora foram seus agentes externos (os grandes grupos industriais); por outro, conhecemos seus limites ecológicos incontornáveis, uma vez que os países avançados não querem renunciar a seus privilégios. 5. Quais os riscos de os Estados perderem autonomia e se tornarem apenas cumpridores das decisões de órgãos como a OMC (Organização Mundial do Comércio)? Não há quase nada a se esperar das organizações internacionais, e menos ainda da Organização Mundial do Comércio. Nas fases finais da Rodada Uruguai, os EUA e os lobbies industriais dos quais os norte-americanos são porta-vozes fizeram triunfar uma "agenda além das fronteiras". Sem que os Parlamentos e, em certos casos, sem que os próprios governos tivessem consciência no momento da assinatura e ratificação do Tratado de Marrakech, teve lugar um crucial abandono de soberania dos países em favor da OMC e, por extensão, aos interesses capitalistas mais poderosos. 10 Com efeito, qualquer exportador pode agora questionar supostos "entraves à liberdade de comércio", isto é, medidas tomadas pelos Estados no campo da saúde, do controle de qualidade de alimentos, da preservação ambiental etc. Para tanto, basta entrar com um recurso diante do novo órgão de regulamentação, cujos "juízes" são árbitros comerciais privados adeptos da noção de que a "liberdade de comércio" deve prevalecer sobre qualquer outro princípio, e cujas decisões finais não podem ser desobedecidas senão com o aval unânime de todos os países membros! O objetivo do Acordo Multilateral sobre o Investimento, em fase de elaboração, é o de estender os mesmos princípios ao investimento estrangeiro, garantidos pelo mesmo sistema de regulamentação, o que acabaria por tornar caducas todas as disposições jurídicas e mesmo constitucionais de controle do investimento, assim como toda e qualquer medida de política industrial voltada seja lá de que maneira para o estímulo à indústria nacional. Os grandes grupos industriais querem total liberdade de ação, sem qualquer entrave. Se o Acordo Multilateral vier à luz, a abdicação de soberania em favor dos grandes interesses capitalistas serão quase totais. Em nome da panacéia do mercado, dar-se-á um golpe de Estado legal e em escala mundial, para maior benefício dos mais ricos e poderosos. 6. Quem ganha e quem perde com a globalização? Como disse Robert Reich (ex-secretário do Trabalho do governo Clinton) em seu livro de 1991, a mundialização é uma modalidade de funcionamento do capitalismo na qual "os ricos ficam mais ricos e os pobres ficam mais pobres". Mecanismos de integração seletiva triam aqueles países mais atrativos do ponto de vista da valorização do capital e aqueles que não o são. Mas os países não são entidades homogêneas. Todos eles estão divididos em classes sociais de interesses econômicos diferentes e com frequência antagônicos. Reich identificou bem quais categorias profissionais e quais camadas sociais saem perdendo ou ganhando no país que domina o movimento de mundialização financeira. As instituições criadas após a crise de 1929 e a Segunda Guerra Mundial haviam estabelecido limites ao poder do capital, e assim representavam um ponto de apoio para os assalariados diante de seus empregadores. A liberalização trazida pela "revolução conservadora" conseguiu enfraquecer fortemente essas instituições, quando não as destruiu. Nos países em que a grande propriedade agrária, ao lado de relações de trabalho típicas das formas de exploração pré- industriais, não foi erradicada e, pelo contrário, deu origem a oligarquias agro-financeiras consolidadas em torno a sistemas bancário-usurários fortemente hipertrofiados, o "espírito empreendedor" teve as maiores dificuldades em se difundir. O Estado "desenvolvimentista" foi uma tentativa de suprir essa ausência e estimular a formação de uma classe capitalista moderna. No quadro de uma mundialização na qual a liberalização permite que os grandes grupos industriais estrangeiros competitivos produzam e vendam sem entraves, na qual as inversões financeiras têm rendimento superior aos investimentos produtivos, o reflexo patrimonial triunfa outra vez. A desnacionalização da indústria (ou a desindustrialização pura e simples) encontra apologistas nos mais altos escalões do Estado. A uma dominação cujos elos estavam nas academias militares estrangeiras sucede um regime mais "civilizado", de integração subordinada ao regime mundial. Suas engrenagens são as grandes universidades, os bancos estrangeiros e os grandes organismos econômicos e financeiros mundiais em Washington ou Genebra. Uma página da história social das nações foi virada.” 1.4 GLOBALIZAÇÃO FINANCEIRA: ORIGENS Paul Singer (Do livro: “O Brasil na crise – perigos e oportunidades” – Paul Singer – Editora Contexto – 1999 – pág.20-28) “Tudo começou quando, no fim dos anos 60, as empresas multinacionais (EMNs) dos EUA colocaram grande parte se suas reservas financeiras no euro-mercado, um mercado até então inexpressivo e completamente excluído de qualquer supervisão e controle por autoridades monetárias nacionais. O euro-mercado começou a crescer rapidamente, atraindo dinheiro particular e público de todos países, até se transformar no grande mercado financeiro internacional, cuja rentabilidade sobrepujava à dos mercados nacionais porque os bancos que nele operavam estavam dispensados de manter reservas obrigatórias proporcionais ao valor dos depósitos. No início dos anos 70, os governos dos grandes países poderiam ter instituído o controle do euro-mercado por parte do FMI (Fundo Monetário Internacional) ou de alguma outra entidade intergovernamental, mas não o fizeram. Esta não-decisão está custando caro á economia mundial, pois ela ficou cada vez mais sujeita às vicissitudes da especulação financeira internacional. É interessante observar que a desregulamentação financeira só se tornou política explícita dos principais governos capitalistas na década de 1980. Ela se impôs de forma casual, como efeito periférico da crise do sistema internacional de pagamentos erigido em Bretton Woods, em 1944. Este sistema tinha por base taxas cambiais não propriamente fixas, mas negociáveis apenas multilateralmente. Isto significava que um país poderia alterar sua taxa cambial desde que contasse com o consentimento dos outros países- membros do FMI. Alterada a taxa, cabia ao governo intervir no mercado de câmbio – vendendo ou comprando divisas – para manter a taxa de câmbio de sua moeda dentro de uma estreita faixa de variação ao redor do novo valor “declarado”. O sistema de Bretton Woods pressupunha que cada governo não só dispusesse de reservas cambiais suficientes para regular adequadamente o mercado de divisas, como também que ele pudesse em última análise subordinar o movimento internacional dos capitais controlados por seus cidadãos a objetivos nacionais. O sistema era administrado pelo FMI mas a moeda chave era dos EUA, cujo governo deveria dar o exemplo, ao garantir a conversibilidade do dólar em ouro a uma taxa “declarada”. Mas, em 1971, o governo de Nixon (presidente dos EUA) foi incapaz de resistir ao ataque especulativo contra o dólar e também não teve competência para negociar com os outros governos um realinhamento das taxas cambiais que permitisse 11 reequilibrar as contas externas do país. Preferiu então quebrar unilateralmente o compromisso da conversibilidade do dólar, liquidando assim em parte o sistema internacional de pagamentos até então em vigor. O sistema de pagamentos que foi improvisado para substituir o de Bretton Woods, consagrou a livre flutuação das taxas de câmbio, deixando a cargo de cada governo adotar o regime cambial que desejasse. Deste modo, os governos ficaram descomprometidos de controlar e monitorar os fluxos internacionais de valores. Cada um seguiu o exemplo dos Estados Unidos, cujo governo gradualmente revogou as sanções fiscais que havia adotado com a finalidade de coibir a exportação de capitais, na vã tentativa de defender a paridade de 35 dólares por onça-ouro. Os governos que constituíam a Comunidade Européia resolveram manter paridades cambiais relativamente fixas entre suas moedas, o que acabou desembocando na unificação monetária do continente, a ser inaugurada em 1999. Apesar da fidelidade européia a um sistema de controle governamental, ao menos do valor externo de cada moeda, não se registrou qualquer tentativa séria de estender este controle aos fluxos internacionais de valores. As EMNs européias surgiram depois das “americanas” e tiveram de lutar com denodo para enfrentá-las e conseguir um lugar ao sol no mercado mundial. Para ter alguma chance, tiveram de se unificar, tomando o mercado comum como base. Impunha-se portanto dar liberdade às EMNs para se fundir e se estabelecer em todos os continentes, exatamente como as dos Estados Unidos já vinham fazendo desde o fim da guerra. A desregulamentação dos mercados financeiros acabou se impondo, a cada um dos governos, de fora para dentro, em função da disputa por um mercado mundial em que as trocas comerciais iam sendo liberalizadas por meio de um laborioso processo de negociação multilateral. A crescente liberdade de comércio permitia às EMNs construir uma divisão internacional de trabalho entre suas filiais, situadas em dezenas de países. Tratando-se de oligopólios internacionais, o ganho proporcionado pelas vantagens comparativas não tinha de ser repassado aos clientes, podendo ser incorporado aos lucros. Surgiu desta forma um segmento específico da economia mundial, formado pelas EMNs, que se apoderava de uma parte do valor produzido em inúmeros países por ser capaz de tirar proveito das diferenças entre eles. Diz um recente relatório da UNCTAD (1996, p. 96): “A produção internacional é agora uma parte integral e importante da economia mundial. Grande número de ETNs (empresas transnacionais) surgiram e estabeleceram filiais no estrangeiro. O número de ETNs sediadas nos quinze principais países desenvolvidos aproximadamente quadruplicou entre 1968/69 e 1993, passando de 7 mil a 27 mil. No mundo todo, há hoje quase 40 mil ETNs com cerca de 270 mil filiais estrangeiras (sem contar ligações em partilha de propriedade [(non-equity)]. O número de filiais por ETN tem aumentado – de cerca de quatro no começo dos 1990 para quase sete em meados desta década.” À medida que este segmento se fortalecia, ele ganhava autonomia em relação aos governos, inclusive dos países em que residiam os grupos controladores. A economia das EMNs passou a apresentar uma lógica que se opunha à dos interesses “nacionais”, mesmo considerando que entre estes interesses prevaleciam os dos capitais. Em outra palavras, a possibilidade de coordenar produção, distribuição, investimento, pesquisa e desenvolvimento de novos produtos e novos processos etc. em muitos países diferentes suscitou uma lógica maximizadora de taxa de lucro para o conglomerado empresarial, formado por cada EMN, que jamais coincidiria com a de empresas circunscritas a uma única economia nacional. Só para dar um exemplo: o conjunto de leis e instituições de cada país determinam, em grande medida, o padrão salarial do trabalhador médio, e portanto o custo do trabalho para a maioria das suas empresas. Para estas, o padrão salarial é um dado que todas compartilham, portanto não é um elemento que interfira na concorrência entre elas. As multinacionais, no entanto, não precisam se conformar com este padrão. Para elas, o salário padrão é uma variável que influi em suas decisões a respeito de onde produzir, vender, comprar, investir etc. Elas minimizam o custo do trabalho, localizando sua produção onde o salário padrão é menor. A desregulamentação financeira não se restringe evidentemente ás EMNs. Ela concede a todos os capitais – grandes e pequenos, nacionais e multinacionais, produtivos e financeiros – a liberdade de se deslocar no espaço global para maximizar seu retorno. Mas, sua instituição só se explica pelas exigências da luta inter-oligopólica das multinacionais. O governo da maior economia, quando ela ficou inferiorizada na competição internacional, tentou conter a saída dos capitais unilateralmente, como vimos acima. Se tivesse tido êxito, as EMNs “americanas” teriam sido rapidamente suplantadas pelas EMNs de outros países – a não ser evidentemente que os outros países tivessem adotado medidas análogas de contenção. Mas, isso não se cogitava mais, pelo menos desde os anos 70. As possibilidades de desenvolvimento nacional foram sendo subordinadas cada vez mais ao desempenho competitivo das EMNs no mercado global. Resta observar que, uma vez desregulamentada a movimentação internacional dos capitais, tornou-se insustentável a regulamentação financeira interna a cada país, pois a diferença de custos levaria os intermediários a globalizar todas as operações. De modo que em vários países, pouco a pouco se processou uma verdadeira regressão institucional: os bancos centrais foram sendo privados dos principais instrumentos de controle da oferta monetária, exceto a administração da dívida pública e sua manipulação diária no “mercado aberto”. Embora o sistema monetário atual seja completamente diferente do padrão-ouro, que vigia até 1971, os dois se assemelham pela liberdade desfrutada pelos intermediários financeiros. 12 política de países da APEC (Cooperação Econômica Ásia-Pacífico) projetando para as primeiras décadas do novo século a formação de uma zona comercial envolvendo países asiáticos e americanos. A selva de blocos regionais não é habitada por uma única espécie de animais. Efetivamente, deve-se distinguir quatro tipos de tratados econômicos diferentes, e ainda uma modalidade de bloco regional espontâneo. O tipo de tratado econômico menos ambicioso consiste na Zona de Livre Comércio. A sua constituição envolve apenas um acordo entre Estados destinado a, na etapa final. eliminar as restrições tarifárias e não-tarifárias que incidem sobre a circulação de mercadorias entre os integrantes. Trata-se de um acordo circunscrito à esfera comercial, que não implica compromissos a respeito do intercâmbio de cada Estado com países externos ao bloco. Teoricamente, um integrante de determinada zona de livre comércio pode se associar a outras zonas similares. A finalidade de um tratado de livre comércio, do ponto de vista da teoria econômica, é ampliar a exposição da economia dos países integrantes à concorrência externa, a fim de estimular ganhos de produtividade na estrutura produtiva nacional. O Nafta é, atualmente, o mais ilustre representante dessa espécie que vaga pelas planícies da selva de blocos regionais. Um pouco mais ambicioso é o tratado de União Aduaneira. Trata-se também de um acordo circunscrito à esfera comercial, mas define duas metas: a eliminação das restrições alfandegárias e a fixação de uma tarifa externa comunitária. Essa tarifa externa consiste em um imposto de importação comum cobrado sobre mercadorias provenientes de países externos ao bloco. obviamente, um integrante de determinada união aduaneira não pode se associar a outro tratado econômico que projete a eliminação de restrições comerciais. A finalidade de uma união aduaneira é atrair investimentos produtivos para o interior do território recoberto pelo tratado. As empresas que nele se instalam - sejam elas controladas por capitais internos ou externos - beneficiam-se do tamanho do mercado consumidor gerado pela regra de livre comércio e da proteção alfandegária comum contra a concorrência de empresas exteriores ao bloco. O Mercosul projeta tornar-se uma união aduaneira. Nos planaltos da selva dos blocos encontra-se o hábitat de um animal superior: o Mercado Comum. O tratado de Mercado Comum engloba as regras da união aduaneira mas não se contenta com elas. Ele tem por objetivo assegurar, além da livre circulação de mercadorias, a de capitais, serviços e pessoas, através das fronteiras políticas dos países integrantes. Dessa forma, não se restringe à esfera comercial, invadindo os domínios da legislação industrial, ambiental, financeira e educacional. Em termos de teoria econômica, o mercado comum almeja estimular a integração internacional das corporações produtivas e financeiras no interior do bloco. A idéia consiste em unificar praticamente todas as dimensões dos mercados nacionais, criando um mercado regional poderoso, capaz de funcionar como trampolim para que as empresas instaladas no seu interior possam concorrer vantajosamente no espaço global. O grande representante dessa espécie é a União Européia. Nos cumes mais altos da selva, existe um animal mítico, que jamais viveu realmente: a União Econômica e Monetária. Esse animal mítico foi criado pelos governos europeus no Tratado de Maastricht. A União Européia pretende tentar o salto mortal para se transfigurar na primeira união econômica e monetária da história. A união econômica e monetária é um mercado comum acrescido de uma moeda única. No seu interior, as moedas nacionais seriam substituídas por uma divisa comunitária, emitida e controlada por um banco central supranacional. Por isso, diferentes análises podem conduzir a distintas delimitações dessas áreas. Pelo mesmo motivo, com o tempo, áreas desse tipo se alastram ou se contraem, independentemente da vontade dos governos ou da ação dos diplomatas. UNIÃO EUROPÉIA O mais antigo dos blocos regionais nasceu no ambiente bipolar da Guerra Fria, que a estruturou internamente. Essa estrutura herdada de um sistema internacional que desapareceu encontrasse atualmente em crise. O Tratado de Roma de 1957 criou a Comunidade Européia (CE), ampliando o alcance da Comunidade do Carvão e do Aço que tinha sido estabelecida cinco anos antes. Na base desse primeiro acordo europeu estava a reaproximação entre a França e a Alemanha – que era, então, a Alemanha ocidental - promovida pela bipartição do Velho Continente em esferas geopolíticas antagônicas. Franceses e alemães enterravam séculos de desconfianças e guerras e assentavam os alicerces para a cooperação política através,, de um tratado econômico. A sombra da União Soviética funcionava como solda da liga franco-alemã. Os alargamentos geográficos da Europa comunitária, durante a Guerra Fria, transformaram o bloco inicial de seis Estados na Comunidade dos Doze, configurada em 1986. A adesão mais importante, política e economicamente, foi a da Grã-Bretanha, em 1973, alcançada depois de quinze anos de desacordos e intrigas entre Paris e Londres. Essa adesão representou a completa integração geopolítica da Comunidade ao ocidente liderado pelos Estados Unidos. Mas o percurso que conduziu à Comunidade dos Doze jamais alterou a estrutura básica do bloco, definida pelo limite estratégico da Cortina de Ferro e pelo eixo franco-alemão, que determinava o sentido e o conteúdo da existência comunitária. O encerramento da Guerra Fria e a reunificação alemã representaram uma completa reformulação do equilíbrio geopolítico europeu. As suas repercussões na Comunidade Européia continuam a se fazer sentir, principalmente sob a forma da crise do eixo franco-alemão. O primeiro alargamento comunitário no pós-Guerra Fria, em 1995, envolveu o ingresso de três antigos Estados neutros: Áustria, Suécia e Finlândia. Simultaneamente, a transição para a economia de mercado nos países do antigo bloco soviético sustentava novos pedidos de adesão. Na virada do século, a União Européia poderá abrigar a Polônia, a Hungria, a República Tcheca, a Eslovênia e, talvez, outros países da Europa centro-oriental. Os alargamentos comunitários projetados representam a reconstituição do espaço europeu integrado que existiu antes da Segunda Guerra Mundial. A nova organização do espaço europeu significará a soldagem da periferia centro-oriental ao núcleo econômico da União. Entretanto, também significará um realinhamento na geometria européia, com a consolidação da liderança da Alemanha unificada. A maior economia do Velho Mundo retomará a sua função de elo de ligação entre o oeste e o leste do continente e espraiará a sua influência para os países do antigo bloco soviético. Em contrapartida, o peso e a influência da França serão reduzidos. 15 O novo alargamento comunitário acentua as diferenças entre as economias da União, multiplicando as dificuldades associadas à implantação da moeda única prevista no Tratado de Maastricht. A necessidade de combinar o alargamento geográfico com o cronograma de aprofundamento da integração gerou a idéia da "Europa a múltiplas velocidades". Segundo esse esquema, um pequeno núcleo de cinco ou seis países adotaria a moeda única nos prazos de Maastricht, enquanto o restante dos países permaneceria, por mais algum tempo, com as suas moedas nacionais. Esse duplo processo desenha os novos contornos da Europa comunitária, no pós-Guerra Fria. Do bloco econômico europeu emana um campo vasto de influência, que se estende para o leste na direção da Rússia e das repúblicas ocidentais da CEI, e para o sul na direção da África do Norte e Oriente Médio. Esse amplo espaço geográfico orienta-se cada vez mais para a órbita do marco alemão e, no futuro, do Euro, a moeda única comunitária. NAFTA E MERCOSUL O Nafta surgiu como fruto das políticas comerciais dos Estados Unidos para o pós-Guerra Fria. Ele foi constituído em duas etapas: na primeira, os Estados Unidos firmaram um acordo bilateral de livre comércio com o Canadá; na segunda, em 1994, o México foi incorporado ao bloco. A estratégia do Nafta representava uma cartada americana para a eventualidade de fracasso das negociações comerciais multilaterais do GATT. Nesse caso, o Nafta estava projetado para constituir a pedra inicial de uma imensa zona de livre comércio das Américas. O alvo visado era a União Européia que, liderada pela França, entravava as negociações sobre o comércio de produtos agro-industriais. O acordo finalmente alcançado nas negociações com a União Européia refreou o ímpeto de Washington. Quase ao mesmo tempo, o colapso econômico mexicano de 1995, provocado por uma crise aguda nas contas externas do país, reativou as críticas de setores políticos e sindicais dos Estados Unidos aos projetos de ampliação do Nafta. O Chile, que negociava a sua adesão, foi levado a orientar-se para o Mercosul, sem abandonar a meta de associação ao Nafta. Entretanto, a política externa americana não abandonou a meta da zona hemisférica de livre comércio: afinal, a América Latina constitui a única macro-área geográfica com a qual os Estados Unidos exibem saldos comerciais positivos. O Mercosul, instituído pelo Tratado de Assunção de 1991, surgiu também a partir de motivações Políticas: tratava-se de romper o padrão de rivalidade histórica entre o Brasil e a Argentina. Além disso, ele representava uma estratégia dos governos de Brasília e Buenos Aires para promover a abertura das economias de ambos os países, expondo-os à concorrência externa e atraindo investimentos internacionais. Mas, na ótica da política externa brasileira, o Mercosul constitui também uma resposta às iniciativas comerciais americanas e ao projeto de uma zona hemisférica de livre comércio negociada nos termos de Washington. A estratégia brasileira - definida no jargão diplomático como "política de building blocks" - consiste em consolidar o bloco do Cone Sul e, em seguida, estabelecer uma área de livre comércio sul-americana. Essas iniciativas formariam o alicerce para as negociações futuras da zona hemisférica proposta pelos Estados Unidos. Os acordos de livre comércio firmados pelo Mercosul com o Chile e a Bolívia e a abertura de negociações para a cooperação entre o Mercosul e a União Européia inscrevem-se nessa estratégia. O Nafta e, em outra escala, o Mercosul, estruturam blocos econômicos nos dois extremos latitudinais do continente americano. Contudo, entre eles, outros tratados comerciais agrupam os países da região andina, do Caribe e do istmo centro-americano. Esse conjunto heterogêneo de blocos comerciais novos ou antigos atravessa processos de redefinição impulsionados pela abertura das economias latinoamericanas à concorrência externa. A configuração de uma zona hemisférica de livre comércio representa apenas uma das possibilidades para a integração dos países do continente na economia global. A BACIA DO PACÍFICO A expressão Bacia do Pacífico associou-se à noção de um bloco econômico na década de 1970, quando os chamados Dragões Asiáticos - Hong Kong, Cingapura, Taiwan e Coréia do Sul - empreenderam a sua acelerada arrancada industrial. Em parte, essa arrancada foi impulsionada por investimentos japoneses diretos, deslocados do arquipélago pelo aumento dos custos de produção associado aos choques de preços do petróleo e à elevação dos salários internos. Uma década depois, outros Dragões despontavam: Tailândia, Malásia e Indonésia. Mais uma vez, os capitais industriais japoneses desempenharam o papel de alavancagem. Em meados da década de 1980, o iene conhecia um movimento de valorização diante do dólar, puxando para cima os custos de produção no interior do Japão e favorecendo os investimentos no exterior. Atualmente, a difusão da economia industrial na macro-área alcança as Filipinas e o Vietnã, evidenciando o vigor da dinâmica regional de integração. Esse percurso de difusão regional da indústria gerou a crença de que se tratava de um fenômeno vinculado exclusivamente à internacionalização da base produtiva japonesa. Contudo, a análise dos investimentos estrangeiros diretos na Ásia revela uma realidade mais complexa. No início do processo, os capitais japoneses (e americanos) efetivamente cumpriram funções decisivas nas arrancadas industriais. Porém, um pouco mais tarde, declina a importância dos investimentos americanos e, principalmente, verifica- se uma explosão de investimentos internacionais provenientes de grupos econômicos dos próprios Dragões Asiáticos. São capitais de Hong Kong, Cingapura, Taiwan e Coréia do Sul procurando oportunidades na Tailândia, na Indonésia, na Malásia e, acima de tudo, na China Popular. A modernização da economia industrial da China Popular - empurrada pela política de abertura conduzida a partir da cúpula do Partido Comunista - é um componente fundamental do chamado “milagre asiático". Os baixos custos da abundante força de trabalho, os vastos recursos naturais, as oportunidades de investimento em infra-estruturas de transportes, comunicações e hotelaria, as garantias fornecidas pelos donos do poder na China tudo isso atrai as corporações empresariais asiáticas para o novo oceano da economia de mercado que se abre. 16 A dinâmica desses investimentos relaciona-se com a presença de uma vasta elite econômica de origem chinesa disseminada pela Ásia meridional e oriental. A diáspora de chineses étnicos na macro-área compreende mais de 50 milhões de pessoas, que se deslocaram da China desde o século XVII. Em Taiwan e Hong Kong - as "Chinas exteriores" - eles são quase a totalidade da população. Na cidade-Estado de Cingapura, formam a maioria da população, mas também representam minorias significativas na Malásia e Tailândia. Porém, o que mais impressiona é a sua participação nas economias locais: os chineses étnicos controlam as economias de Cingapura e Malásia e têm um peso determinante nas economias da Tailândia, da Indonésia e das Filipinas. A antiga colônia britânica de Hong Kong funciona como porta de entrada na China Popular dos investimentos dos chineses étnicos que têm as suas bases no exterior. Os Dragões Asiáticos surgiram como "plataformas de exportação", orientando a sua economia industrial para os mercados do Ocidente e para o Japão. Do ponto de vista comercial, portanto, a integração regional era bastante fraca e tornava-se difícil, inclusive, caracterizar esse conjunto heterogêneo de países e cidades-Estado como um bloco econômico. Entretanto, as sucessivas ondas de investimentos internacionais e o próprio crescimento econômico regional modificaram esse panorama. De um lado, ampliou-se o consumo interno de países como Taiwan e Coréia do Sul, onde a renda da população conheceu um forte aumento. De outro, as unidades de produção implantadas na região passaram a importar máquinas, equipamentos e serviços das suas matrizes, muitas vezes situadas em outros países asiáticos. Esses fenômenos dinamizaram as trocas intra-regionais, configurando um verdadeiro bloco econômico. A ampliação do comércio intra-regional acelerou-se em meados da década de 1980, precisamente quando arrancava para a industrialização o segundo grupo de Dragões. Os investimentos na Tailândia, na Malásia e na Indonésia geravam comércio. Ao mesmo tempo, o aprofundamento da abertura chinesa ativava novos circuitos de intercâmbio. Os diferentes estágios de industrialização dos países da região criavam complementaridades externas, que se traduziam na explosão das trocas asiáticas. Em 1980, o comércio intra-regional não chegava a 40 bilhões de dólares e, em 1986, ultrapassava em pouco os 50 bilhões, mas em 1992 ele aproximava-se da marca de 220 bilhões. Nascia um novo pólo econômico no mundo. REGIONALIZAÇÃO X GLOBALIZAÇÃO A multiplicação dos blocos regionais ameaça fragmentar a economia mundial, isolando macro-áreas fechadas sobre si mesmas? Seria a tendência à regionalização um obstáculo para a integração global dos mercados" A teoria econômica explica que a formação de áreas regionais de livre comércio acarreta duas conseqüências simultâneas. De um lado, fluxos comerciais direcionados, em função da atração exercida pela remoção de barreiras alfandegárias. De outro, criam-se novos fluxos comerciais, na medida em que a retirada de barreiras alfandegárias estimula a importação de mercadorias a custos mais baixos. O primeiro fenômeno atua contra a tendência à globalização; o segundo atua a favor. Atualmente, o forte crescimento do comércio mundial indica que a criação de novas oportunidades de intercâmbio é mais intensa que o redirecionamento de fluxos já existentes. A causa desse predomínio é simples: as políticas econômicas liberais têm suplantado as estratégias protecionistas, de forma que os países integrantes de blocos regionais preferem rebaixar também as tarifas que cobram de mercadorias importadas de fora do seu bloco. Os acordos multilaterais alcançados no âmbito do GATT e as regras da Organização Mundial de Comércio funcionam como garantias da continuidade desse movimento liberalizante. Mas a globalização não se circunscreve ao comércio. No terreno dos investimentos e da ampliação da área de atuação geográfica das transnacionais, os blocos econômicos representam verdadeiros trampolins para a estruturação de um mercado globalizado. A União Européia, com a sua uniformidade interna de regras econômicas, funciona como uma moldura para a concentração de capitais, a fusão de empresas e a cooperação produtiva internacional. O mais interessante é que - ao contrário dos sonhos franceses - predominam as associações entre corporações européias e parceiros americanos ou asiáticos, e não as fusões e aquisições intracomunitárias. Essa tendência, que corresponde ao desejo britânico, decorre das diferenças de políticas industriais dos governos europeus e constitui um entrave para o desenvolvimento de empresas comunitárias suficientemente poderosas para enfrentar a concorrência global. Por outro lado, ela favorece o processo de globalização, ao estreitar os laços da economia européia com as corporações transnacionais dos outros continentes. As coisas se passam de forma similar, e até com mais clareza, no âmbito do Mercosul. A constituição de uma zona de livre comércio, que marcha para ser unia união alfandegária, incentiva os investimentos internacionais no interior dos limites do bloco, pois as unidades produtivas implantadas em qualquer dos países integrantes do Mercosul se beneficiam da remoção das barreiras para a exportação das suas mercadorias para os demais integrantes. A montadora automobilística francesa Renault já deflagrou um programa de pesados investimentos no Brasil, enquanto a Fiat italiana reorganiza as suas linhas de montagem no Brasil e na Argentina a fim de racionalizar a produção para um mercado integrado. Simultaneamente, empresas agro-industriais brasileiras expandem a sua atuação para o mercado argentino e construtoras dos dois países aguardam o lançamento de concorrência para vultosas obras conjuntas de infra-estrutura. A Bacia do Pacífico constitui ilustração ainda melhor do papel dos blocos regionais na edificação dos alicerces para a globalização. Cingapura e Hong Kong funcionam como cidades-Estado internacionalizadas, servindo de pontes entre a economia mundial e o entorno macro-regional. Elas sediam os quartéis-generais das corporações americanas e européias para a Ásia e o Pacífico. São também centros bancários e financeiros para as operações nos mercados de capital dos países vizinhos. Finalmente, servem como terminais portuários de exportação e reexportação situados sobre as grandes rotas transoceânicas. Na macro-região estão surgindo as mais novas corporações transnacionais. Montadoras automobilísticas da Coréia do Sul já atuam agressivamente na Europa, nos Estados Unidos e na América Latina. Atrás delas, vêm grupos econômicos baseados em Hong Kong, na Indonésia, na Malásia, em Taiwan ou na Tailândia, que expandem as suas atividades para os 17 intelectual, pode ser visto como a dificuldade de pensarmos a diferença; no plano afetivo, como sentimentos de estranheza, medo, hostilidade, etc. Perguntar sobre o que é etnocentrismo é, pois, indagar sobre um fenômeno onde se misturam tanto elementos intelectuais e racionais quanto elementos emocionais e afetivos. No etnocentrismo, estes dois planos do espírito humano - sentimento e pensamento - vão juntos compondo um fenômeno não apenas fortemente arraigado na história das sociedades como também facilmente Assim, a colocação central sobre o etnocentrismo pode ser expressa como a procura de sabermos os mecanismos, as formas, os caminhos e razões, enfim, pelos quais tantas e tão profundas distorções se perpetuam nas emoções, pensamentos, imagens e representações que fazemos da vida daqueles que são diferentes de nós. Este problema não é exclusivo de uma determinada época nem de uma única sociedade. Talvez o etnocentrismo seja, dentre os fatos humanos, um daqueles de mais unanimidade. Como uma espécie de pano de fundo da questão etnocêntrica temos a experiência de um choque cultural. De um lado, conhecemos um grupo do eu", o "nosso" grupo, que come igual, veste igual, gosta de coisas parecidas, conhece problemas do mesmo tipo, acredita nos mesmos deuses, casa igual, mora no mesmo estilo, distribui o poder da mesma forma empresta à vida significados em comum e procede, por muitas maneiras, semelhantemente. Aí então de repente, nos deparamos com um "outro", o grupo do "diferente" que, às vezes, nem sequer faz coisas como as nossas ou quando as faz é de forma tal que não reconhecemos como possíveis. E, mais grave ainda, este outro" também sobrevive à sua maneira, gosta dela, também está no mundo e, ainda que diferente, também existe. Este choque gerador do etnocentrismo nasce, talvez, na constatação das diferenças. Grosso modo, um mal-entendido sociológico. A diferença é ameaçadora porque fere nossa própria identidade cultural. O monólogo etnocêntrico pode, pois, seguir um caminho lógico mais ou menos assim: Como aquele mundo de doidos pode funcionar? Espanto! Como é que eles fazem? Curiosidade perplexa? Eles só podem estar errados ou tudo o que eu sei está errado! Dúvida ameaçadora?! Não, a vida deles não presta, é selvagem, bárbara, primitiva! Decisão hostil! O grupo do "eu" faz, então, da sua visão a única possível ou, mais discretamente se for o caso, a melhor, a natural, a superior, a certa. O grupo do "outro" fica, nessa lógica, como sendo engraçado, absurdo, anormal ou ininteligível. Este processo resulta num considerável reforço da identidade do "nosso" grupo. No limite, algumas sociedades chamam-se por nomes que querem dizer "perfeitos", "excelentes" ou, muito simplesmente, "ser humano" e ao "outro", ao estrangeiro, chamam, por vezes, de "macacos da terra" ou "ovos de piolho". De qualquer forma, a sociedade do "eu" é a melhor, a superior. É representada como o espaço da cultura e da civilização por excelência. É onde existe o saber, o trabalho, o progresso. A sociedade do "outro" é atrasada. É o espaço da natureza. São os selvagens, os bárbaros. São qualquer coisa menos humanos, pois, estes somos nós. O barbarismo evoca a confusão, a desarticulação, a desordem. O Selvagem é o que vem da floresta, da selva que lembra, de alguma maneira, a vida animal. O outro" é o "aquém" ou o "além", nunca o "igual" ao "eu". O que importa realmente, neste conjunto de idéias, é o fato de que, no etnocentrismo, uma mesma atitude informa os diferentes grupos. O que importa realmente, neste conjunto de idéias, é o fato de que, no etnocentrismo, uma mesma atitude informa os diferentes grupos. O etnocentrismo não é propriedade, como já disse, de uma única sociedade, apesar de que, na nossa, revestiu-se de um caráter ativista e colonizador com os mais diferentes empreendimentos de conquista e destruição de outros povos. A atitude etnocêntrica tem, por outro lado, um correlato bastante importante e que talvez seja elucidativo para a compreensão destas maneiras exacerbadas e até cruéis de encarar o "outro". Existe realmente, paralelo à violência que a atitude etnocêntrica encerra, o pressuposto de que o “outro" deva ser alguma coisa que não desfrute da palavra para dizer algo de si mesmo. Creio que é necessário examinar isto melhor e vou fazê-lo através de uma pequena estória que me parece exemplar. Ao receber a missão de ir pregar junto aos selvagens um pastor se preparou durante dias para vir ao Brasil e iniciar no Xingu seu trabalho de evangelização e catequese. Muito generoso, comprou para os selvagens contas, espelhos, pentes, etc.; modesto, comprou para si próprio apenas um moderníssimo relógio digital capaz de acender luzes, alarmes, fazer contas, marcar segundos, cronometrar e até dizer a hora sempre absolutamente certa, infalível. Ao chegar, venceu as burocracias inevitáveis e, após alguns meses, encontrava-se em meio às sociedades tribais do Xingu distribuindo seus presentes e sua doutrinação. Tempos depois, fez-se amigo de um índio muito jovem que o acompanhava a todos os lugares de sua pregação e mostrava-se admirado de muitas coisas, especialmente, do barulhento, colorido e estranho objeto que o pastor trazia no pulso e consultava freqüentemente. Um dia, por fim, vencido por insistentes pedidos, o pastor perdeu seu relógio dando-o, meio sem jeito e a contragosto, ao jovem índio. A surpresa maior estava, Porém, por vir. Dias depois, O índio charnou-o apressadamente para mostrar-lhe, muito feliz, seu trabalho. Apontando seguidamente o galho superior de uma árvore altíssima nas cercanias da aldeia, o índio fez o pastor divisar, não sem dificuldade, um belo ornamento de penas e contas multicolores tendo no centro o relógio. O índio queria que o pastor compartilhasse a alegria da beleza transmitida por aquele novo e interessante objeto. Quase indistinguível em meio às penas e contas e, ainda por cima, pendurado a vários metros de altura, o relógio, agora mínimo e sem nenhuma função, contemplava o sorriso inevitavelmente amarelo no rosto do pastor. Fora-se o relógio. Passados mais alguns meses o pastor também se foi de volta para casa. Sua tarefa seguinte era entregar aos superiores seus relatórios e, naquela manhã, dar uma última revisada na comunicação que iria fazer em seguida aos seus colegas em congresso sobre evangelização. Seu tema: "A catequese e os selvagens". Levantou-se, deu uma olhada no relógio novo, quinze para as dez. Era hora de ir. Como que buscando uma inspiração de última hora examinou detalhadamente as paredes do seu escritório. Nelas, arcos, flechas, tacapes, bordunas, cocares, e até uma flauta formavam uma bela decoração. Rústica e sóbria ao mesmo tempo, trazia-lhe estranhas lembranças. Com o pé na porta ainda pensou e sorriu para si mesmo. Engraçado o que aquele índio foi fazer com o meu relógio. 20 Esta estória, não necessariamente verdadeira, porém, de toda evidência, bastante plausível, demonstra alguns dos importantes sentidos da questão do Etnocentrismo. Em primeiro lugar, não é necessário ser nenhum detetive ou especialista em Antropologia Social (ou ainda pastor) para perceber que, neste choque de culturas, os personagens de cada uma delas fizeram, obviamente, a mesma coisa. Privilegiaram ambos as funções estéticas, ornamentais, decorativas de objetos que, na cultura do "outro", desempenhavam funções que seriam principalmente técnicas. Para o Pastor- o uso inusitado do seu relógio causou tanto espanto quanto o que causaria ao jovem índio conhecer o uso que o pastor deu a seu arco e flecha. Cada um "traduziu" nos termos de sua própria cultura o significado dos objetos cujo sentido original foi forjado na cultura do “outro". O etnocentrismo passa exatamente por um julgamento do valor da cultura do "outro" nos termos dá cultura do grupo do "eu". Em segundo lugar, esta estória representa o que se poderia chamar, se isso fosse possível, de um etnocentrismo "cordial", já que ambos - o índio e o pastor - tiveram atitudes concretas sem maiores conseqüências. No mais das vezes, o etnocentrismo implica uma apreensão do "outro" que se reveste de uma forma bastante violenta. Como já vimos, pode colocá-lo como "primitivo", como "algo a ser destruído", como "atraso ao desenvolvimento", (fórmula, aliás, muito comum e de uso geral no etnocídio, na matança dos índios). Assim, por exemplo, um famoso cientista do início do século, Hermann von Ihering, diretor do Museu Paulísta, justificava o extermínio dos índios Caingangue por serem um empecilho ao desenvolvimento e à colonização das regiões do sertão que eles habitavam. Tanto no presente como no passado, tanto aqui como em vários outros lugares, a lógica do extermínio regulou, infinitas vezes, as relações entre a chamada civilização ocidental" e as sociedades tribais. Isso lembra o comentário, tristemente exemplar, de uma criança, de um grande centro urbano, que, de tanto ouvir absurdos sobre o índio, seja em casa, seja nos livros didáticos, seja na indústria cultural, acabou por defini-los dizendo: “o índio é o maior amigo do homem". Em terceiro lugar, a estória ainda ensina que o “outro" e sua cultura, da qual falamos na nossa sociedade, são apenas uma representação, urna imagem distorcida que é manipulada como bem entendemos. Ao "outro" negamos aquele mínimo de autonomia necessária para falar de si mesmo. Tudo se passa como se fôssemos autores de filmes e livros de ficção científica onde podemos falar e pensar o quanto é cruel, grotesca e monstruosa uma civilização de marcianos que capturou nosso foguete. Também, porque somos os autores destes filmes e livros, nada nos impede de criarmos um marciano simpático, inteligente e superpoderoso que com incrível perícia salva a Terra de uma colisão fatal com um meteoro gigante. Claro, como o marciano não diz nada, posso pensar dele o que quiser. Assim, de um ponto de vista do grupo do "eu os que estão de fora podem ser brabos e traiçoeiros bem como mansos e bondosos. Aliás, "brabos" e “mansos" são dois termos que muitas vezes foram empregados no Brasil para designar o "humor" de determinados animais e o "estado" de várias. tribos de índios ou de escravos negros. A figura do louco, por exemplo, na nossa sociedade, é manipulada por uma série de representações que oscilam entre estes dois pólos, sendo denegrida ou exaltada - como o marciano - ao sabor das intenções que se tenha. Isto não só ao longo da história, mas também em diferentes contextos no presente. A expressão "fulano é muito louco" pode ser elogiosa em certos casos e pejorativa em outros. Em alguns momentos da história o louco foi acorrentado e torturado, em outros, foi feito portador de uma palavra sagrada e respeitada. Aqueles que são diferentes do grupo do eu – os diversos “outros” deste mundo - por não poderem dizer algo de si mesmos, acabam representados pela ótica etnocêntrica e segundo as dinâmicas ideológicas de determinados momentos. Na nossa chamada "civilização ocidental", nas sociedades complexas e industriais contemporâneas, existem diversos mecanismos de reforço para o seu estilo de vida através de representações negativas do "outro". O caso dos índios brasileiros é bastante ilustrativo, pois alguns antropólogos estudiosos do assunto já identificaram determinadas visões básicas, determinados estereótipos, que são permanentemente aplicados a estes índios. Eu mesmo realizei, há alguns anos, um estudo sobre as imagens do índio nos livros didáticos de História do Brasil. Estes livros têm importância fundamental na formação de uma imagem do índio, pois são lidos e, mais ainda, estudados por milhões de alunos pré-universitários nos mais diversos recantos do país. Alguns destes livros alcançam tiragens altíssimas e já tiveram mais de duzentas edições. Através deles circula um "saber" altamente etnocêntrico - honrosas exceções sobre os índios. Os livros didáticos, em função mesmo do seu destino e de sua natureza, carregam um valor de autoridade, ocupam um lugar de supostos donos da verdade. Sua informação obtém este valor de verdade pelo simples fato de que quem sabe seu conteúdo passa nas provas. Nesse sentido, seu saber tende a ser visto como algo "rigoroso", sério" e "científico". Os estudantes são testados, via de regra, em face do seu conteúdo, o que faz com que as informações neles contidas acabem se fixando no fundo da memória de todos nós. Com ela se fixam também imagens extremamente etnocêntricas. Alguns livros colocavam que os índios eram incapazes de trabalhar nos engenhos de açúcar por serem indolentes e preguiçosos. Ora, como aplicar adjetivos tais como "indolente" e "preguiçoso" a alguém, um povo ou uma pessoa, que se recuse a trabalhar como escravo, numa lavoura que não é a sua, para a riqueza de um colonizador que nem sequer é seu amigo: antes, muito pelo contrário, esta recusa é, no mínimo, sinal de saúde mental. Outro fato também interessante é que um número significativo de livros didáticos começa com a seguinte informação: os índios andavam nus. Este "escândalo" esconde, na verdade, a nossa noção absolutizada do que deva ser uma roupa e o que, num corpo, ela deve mostrar e esconder. A estória do nosso amigo missionário serviu para a constatação das dificuldades de definir o sentido de um objeto - o relógio ou o arco - fora dos seus contextos culturais. Da mesma maneira, nada garante que os índios andem nus a não ser a concepção que eles mesmos tenham de nudez e vestimenta. Assim, como o "outro" é alguém calado, a quem não é permitido dizer de si mesmo, mera imagem sem voz, manipulado de acordo com desejos ideológicos, o índio é, para o livro didático, apenas uma forma vazia que empresta sentido ao mundo dos brancos. Em outras palavras, o índio é "alugado" na História do Brasil para aparecer por três vezes em três papéis diferentes. 21 O primeiro papel que o índio representa é no capítulo do descobrimento. Ali, ele aparece como selvagem", "primitivo”, “pré-histórico”, “antropófago”, etc. Isto era, para mostrar o quanto os portugueses colonizadores eram "superiores" e civilizados". O segundo papel do índio é no capítulo da catequese. Nele o papel do índio é o de "criança", "inocente", "infantil", "almas virgens", etc., para fazer parecer que os índios é que precisavam da ,,proteção" que a religião lhes queria impingir. O terceiro papel é muito engraçado. É no capítulo “Etnia brasileira”. Se o índio já havia aparecido como "selvagem” ou "criança", como iriam falar de um povo - o nosso - formado por portugueses, negros e "crianças" ou um povo formado por portugueses, negros e “selvagens”? Então aparece um novo papel e o índio, num passe de mágica etnocêntrica, vira “corajoso”, “altivo”, cheio de “amor à liberdade”. Assim são as sutilezas, violências, persistências do que chamamos etnocentrismo. Os exemplos se multiplicam nos nossos cotidianos. A "indústria cultural" - TV, jornais, revistas, publicidade, certo tipo de cinema, rádio - está freqüentemente fornecendo exemplos de etnocentrismo. No universo da indústria cultural é criado sistematicamente um enorme conjunto de "outros" que servem para reafirmar, por oposição, uma série de valores de um grupo dominante que se autopromove a modelo de humanidade. Nossas próprias atitudes frente a outros grupos com os quais convivemos nas grandes cidades são, muitas vezes, repletas de resquícios de atitudes etnocêntricas. Rotulamos e aplicamos estereótipos através dos quais nos guiamos para o confronto cotidiano com a diferença. As idéias etnocêntricas que temos sobre as "mulheres", os ,,negros", os "empregados", os "paraíbas de obra", os "colunáveis", os "doidões", os "surfistas", as "dondocas", os "velhos", os "caretas", os "vagabundos", os gays e todos os demais “outros” com os quais temos familiaridade, são uma espécie de "conhecimento" um "saber", baseado em formulações ideológicas, que no fundo transforma a diferença pura e simples num juízo de valor perigosamente etnocêntrico. Mas, existem idéias que se contrapõem ao etnocentrismo. Uma das mais importantes é a de relativização. Quando vemos que as verdades da vida são menos uma questão de essência das coisas e mais uma questão de posição: estamos relativizando. Quando o significado de um ato é visto não na sua dimensão absoluta mas no contexto em que acontece: estamos relativizando. Quando compreendemos o "outro" nos seus próprios valores e não nos nossos: estamos relativizando. Enfim, relativizar é ver as coisas do mundo como uma relação capaz de ter tido um nascimento, capaz de ter um fim ou uma transformação. Ver as coisas do mundo como a relação entre elas. Ver que a verdade está mais no olhar que naquilo que é olhado. Relativizar é não transformar a diferença em hierarquia, em superiores e inferiores ou em bem e mal, mas vê-la na sua dimensão de riqueza por ser diferença. A nossa sociedade já vem, há alguns séculos, construindo um conhecimento ou, se quisermos, uma ciência sobre a diferença entre os seres humanos. Esta ciência chama-se Antropologia Social. Ela, como de resto quase todas as atitudes que temos frente ao “outro”, nasceu marcada peio etnocentrismo. Ela também possui o compromisso da procura de superá- lo. Diferentemente do saber de "senso comum", o movimento da Antropologia é no sentido de ver a diferença como forma pela qual os seres humanos deram soluções diversas a limites existenciais comuns. Assim, a diferença não se equaciona com a ameaça, mas com a alternativa. Ela não é uma hostilidade do “outro’, mas uma possibilidade que o “outro” pode abrir para o “eu”. 2. O NEOLIBERALISMO 2.1 Neoliberalismo: origem, definição e prática Laerte Moreira dos Santos* A palavra neoliberalismo, é sem dúvida, uma das mais ambíguas tanto, no vocabulário político como no vocabulário econômico. Mas uma coisa é certa: o neoliberalismo tem seu fundamento no chamado "liberalismo clássico", que vem desde o economista clássico inglês Adam Smith(século XVIII). O liberalismo tem uma face econômica e uma política. Vamos destacar aqui a sua face econômica. O liberalismo (econômico) surge na história da Civilização Ocidental como reação ao Mercantilismo que mais do que uma corrente de pensamento é uma prática econômica de países da Europa no início do sistema capitalista. Eis as principais características do Mercantilismo: a) A atividade comercial se destaca. Visava a acumulação de metais preciosos como ouro e prata tendo em vista que na época os metais preciosos eram vistos como a única riqueza de um país. Por isso todos os países ao mesmo tempo que se esforçavam em aumentar as suas exportações, pois isto significava maior quantidade de ouro e prata, evitavam a saída de metais preciosos diminuindo as importações. b) O predomínio da atividade comercial tornou necessários novos mercados e novas fontes de matérias-primas e por conseqüência novas rotas comerciais. Isto colaborou para a descoberta de novos continentes como a América e África. Tais continentes foram colonizados e foi imposto a eles pela metrópole (o país colonizador) um restrito controle comercial: comércio apenas com a metrópole. Nada de livre comércio. c) Toda atividade econômica era controlada pelo Estado. O Estado era um monopólio. Em oposição a esta prática mercantilista surge a primeira corrente de pensamento(em meados do século XVIII), a Escola Fisiocrata, que, apesar de destacar a atividade agrícola e não a industrial, vai abrir caminho para o Liberalismo Econômico. Fisiocrata vem de Fisiocracia que significa “Reino da Natureza”. 22 Esta nova relação entre Economia e Estado vai gerar a criação de um novo modelo: o modelo social-democrático de produção, que terá os seus anos gloriosos desde a Segunda Guerra Mundial até meados da década de setenta . Este modelo fará surgir o chamado Estado do Bem-estar social (“Welfare State”). APOGEU E CRISE DO WELFARE STATE A chamada “economia política da social-democracia” nasce em 1945 convivendo com o padrão de acumulação de capital fordista-taylorista (veja o que foi o Fordismo e Taylorismo entre os textos sobre Reestruturação Produtiva). Tinha como base um processo de produção em massa que contava com consumidores passivos e ávidos por consumo. Neste período de governos social-democratas havia a distribuição de riqueza entre trabalhadores e capitalistas mediante acordos: os trabalhadores e empresários concordaram em elevar ao máximo a produtividade e a intensidade do trabalho em troca de salários e lucros maiores. As entidades representativas de classes (partidos políticos de massa e sindicatos grandes e fortes) lutavam para garantir o cumprimento dos acordos. Mas isto seria impossível sem a intermediação do Estado. Por isso neste período do “Welfare State” esta intervenção do Estado foi legitimada. Este intervinha através de um política de subsídios à acumulação de capital e através de uma política social garantindo seguro-desemprego, transporte subsidiado, educação e saúde gratuitas, etc... ------------------------------------------------- A teoria econômica do economista inglês John Maynard Keynes foi o suporte teórico para o Estado do Bem-estar social. Em 1936 publica o livro “Teoria geral do emprego, do lucro e da moeda”, em que recomenda devido a crise do capitalismo após a Grande Depressão de 1929, a intervenção do Estado na economia. Este, através de investimentos públicos, deveria garantir direitos sociais como transporte, saúde, seguro social, educação, habitação, etc... Desta forma se evitaria o surgimento das crises cíclicas do capitalismo. O keynesianismo alia-se ao fordismo-taylorismo para formar a base da organização do capitalismo deste período. Uma variante do keynesianismo se efetivou em países da América Latina, com a doutrina desenvolvimentista em que o Estado exerce as funções de produção e planejamento. No Brasil, a partir de 1930, o governo investiu pesadamente em infra-estrutura, como hidrelétrica, siderurgia, mineração, ferrovia, petróleo, telecomunicações, e deu um grande impulso ao capital privado. Esta política desenvolvimentista se expressou no modelo de industrialização chamado de substituição de importação. Através dessa política tratava-se de fabricar aqui o que antes era comprado no exterior. Mas a partir do final dos anos sessenta, esse modelo de acumulação de perfil fordista-taylorista e respaldado politicamente por governos social-democratas entra em crise na Europa e tem os seus reflexos na América Latina e no Brasil a partir da década de 80. Do ponto de vista conjuntural o compromisso entre capital e trabalho entra em processo de erosão. Os trabalhadores contestam a organização do trabalho, começam a reivindicar ganhos salariais acima dos ganhos de produtividade. Esta disputa distributiva acaba por aumentar a inflação. Outros fatores conjunturais colaboram para a crise como a alta do preço do petróleo no mercado internacional, o fim do padrão-ouro e da conversibilidade do dólar, a elevação dos juros norte americanos (todos acontecidos na década de 70). Mas há fatores estruturais: podemos afirmar que esta crise do capital que provocou o desmoronamento do “Welfare State” e a crise do sistema de produção fordista pode ser considerada como um crise de superprodução. Suas principais características são: incremento da capacidade produtiva ociosa, excesso de mercadorias e estoque, excedente de capital dinheiro (segundo Kurz, sociólogo alemão, um traço importante deste crise é o predomínio do capital especulativo. O rendimento da produção industrial diminui cada vez mais e os lucros passaram a fluir para a especulação) e um nível elevado de desemprego de caráter estrutural devido a introdução de novas tecnologias dispensadoras de mão de obra. Este fatores conjunturais e estruturais colaboraram para a elevação da inflação e do desemprego. Por isso os gastos do Estado do Bem-Estar Social não poderiam equilibrar-se. Assim a crise do keynesianismo (do “Welfare State”)a partir dos anos 70 se expressa na sua incapacidade de solucionar a coexistência de inflação elevada com o baixo crescimento da produção e o aumento dos índices de desemprego. Os gastos do Estado passaram a ser maiores do que a arrecadação advinda dos impostos recolhidos das empresas, dos operários, dos empréstimos, da emissão de moeda e do lucro das empresas estatais. Por isso o Estado perdeu a sua capacidade de estimular as atividades econômicas que aumentam a produção e geram empregos. Paralelamente e em parte como uma resposta tardia, foi surgindo uma tendência "neoliberal" nos Estados Unidos formada por políticos e intelectuais ligados ao partido democrata, que afirmaram que a intervenção governamental foi no passado excessiva e que se deveria valorizar mais o mercado. Desde então o termo neoliberalismo propôs uma tendência de renascimento e desenvolvimento das idéias liberais clássicas, tais como a importância do indivíduo, o papel limitado do Estado e o valor do mercado livre. ANTECEDENTES POLÍTICOS E ECONÔMICOS A crise do Welfare State e do Fordismo abre a possibilidade da efetivação do receituário neoliberal. 25 O neoliberalismo surgiu na Europa e América do Norte logo após a Segunda guerra mundial. Adveio como oposição ao Estado intervencionista e de bem estar (“Welfare State”). Como já foi afirmado, inspirou-se na doutrina clássica do liberalismo econômico. Os acordos de Bretton Woods foram importantes para o seu surgimento e a sua permanência. Em 1944, já contando com uma vitória militar sobre os alemães, os aliados, pressionados pelos Estados Unidos convocaram uma conferência monetária e financeira. O objetivo dessa reunião era o de estabelecer regras para o “liberalismo global que iria se impor sobre o mundo após a Segunda guerra. Esta reunião aconteceu em Bretton Woods, New Hampshire, EUA. Participam desta 44 países inclusive a União Soviética. Além de elaborarem nesta reunião as novas regras para um mundo que se globalizava criou-se instituições que possibilitaram a efetivação destas regras como o GATT (General Agreement on Trade and Tariffs), em 1947; o Banco Mundial, em 1945; o fundo Monetário Internacional, em, 1946. A idéia que deu a diretriz para esta conferência foi a seguinte: o protecionismo comercial era o responsável pelas tragédias ocorridas nos 30 anos após o início da primeira guerra mundial ou seja de 1914 a 1944. Por isso “boa parte das deliberações estava dedicada a identificar mecanismo que assegurassem: a) O predomínio do livre comércio e a eliminação de todo vestígio do protecionismo; b) O financiamento externo de países vitimados por problemas de curto prazo (queda nos volume e/ou preços de suas exportações, c) A aprovação de um conjunto de políticas dirigidas a tornar possível a reconstrução e o desenvolvimento das economias devastadas pela guerra. Estes acordos consolidam no terreno da economia mundial a vitória militar dos aliados sobressaindo-se como potência hegemônica os Estados Unidos. ANTECEDENTES TEÓRICOS A base teórica do neoliberalismo vamos encontrar no livro de Friedrich Hayek, escrito em 1944, intitulado “O caminho da servidão”. Hayek condena qualquer intervenção do Estado que vise limiar os mecanismo de mercado. Chegou a fundar em 1947 em Mont Pèlerin, na Suíça, a “sociedade de Mont Pèlerin”, com o propósito de combater o Keynesianismo e o Estado de Bem-Estar social (“Welfare State”). Participavam desta sociedade entre outros Milton Friedman, Karl Popper. Porém as suas idéias durante as décadas de 50 e 60 não encontram condições favoráveis. O “Welfare State” estava no seu auge. No entanto continuavam batendo na mesma tecla: este “igualitarismo (muito relativo, bem entendido) deste período, promovido pelo Estado do Bem-estar, destruía a liberdade dos cidadãos e a vitalidade da concorrência, da qual dependia a prosperidade de todos. Desafiando o consenso oficial da época, eles argumentavam que a desigualdade era um valor positivo – na realidade imprescindível em si – pois disso precisavam as sociedades ocidentais”. (2) Somente em 1973 com o mundo capitalista em meio a uma crise profunda que envolveu o “Welfare State” é que as idéias neoliberais de Hayek vão exercer considerável influência. Até então eram impotentes para impedir o avanço do Keynesianismo que embasava teoricamente a construção e consolidação do Estado de Bem-Estar Social. Finalmente surgiram as condições propícias para as idéias de Hayek e seguidores. A oportunidade para colocar em prática estas idéias surge em fins da década de 70 e no início dos anos 80: a) com o acirramento do sentimento anticomunista em fins da década de 70 Este acirramento foi provocado pela Segunda guerra fria que eclodiu com a intervenção soviética ano Afeganistão b) com a vitória de candidatos conservadores na Europa Estados Unidos Em 1979 Margareth Thatcher ganha as eleições na Inglaterra. Em 1980 Reagan chega à presidência dos Estados Unidos, Khol derrota em 1982, na Alemanha, o regime social-liberal de Helmut Schimidt. Em 1983, Schluter, candidato de uma coalizão de direita, ganha eleição na Dinamarca. Seguem-se as vitórias de candidatos de direita em todo o norte da Europa com exceção da Suécia e da Áustria. Esta condições possibilitaram, durante toda a década de 80, o triunfo do neoliberalismo nos Estados Unidos e na maior parte dos países desenvolvidos da Europa envolvendo também países do terceiro mundo. “Aclamado de forma dominante nas academias e demais centros de produção de conhecimento, foi vulgarizado para o grande público, com apoio e influência decisivos da mídia. Os seus princípios passaram a ser aceitos, consciente ou inconscientemente, pela maior parte da população, evidenciando-se, assim, a constituição de uma hegemonia na forma de se pensar a vida em sociedade, com influência crucial nas ações cotidianas dos indivíduos. Em suma, o neoliberalismo assumiu a condição de hegemonia cultural, no sentido mais abrangente que este conceito possa ter.” (Luiz A . M. Filgueiras - Cadernos do CEAS, nº 171, Salvador/Bahia, set/out 97, pág.10-15; 21-23) Vamos fazer aqui uma síntese das idéias principais de Hayek e de seus seguidores mais próximos: a) Qualquer tipo de planejamento econômico por parte do Estado deve ser rejeitado. O mundo econômico é movido pelas leis que os homens não dominam e não pode ser superada esta ordem espontânea por uma ordem decretada. 26 b) É falsa a idéia de que a economia e sociedade modernas, devido a sua complexidade, requeiram planejamento e coordenação por parte do Estado. A concorrência é a melhor forma de dar coordenação à sociedade tendo em vista que ninguém pode avaliar todas as motivações dos indivíduos nas suas decisões. c) O desenvolvimento da sociedade, por estar baseado nas forças impessoais do mercado, não pode nem deve prover a garantia econômica de ninguém. Hayek cita duas espécies de segurança social: a limitada e a absoluta. A primeira se refere a uma renda básica garantida aos pobres pelo Estado para que tenham o mínimo para alimentação, vestimenta e habitação. Porém para ele a renda mínima é vista como caridade e não como direito, tanto que é “difícil d) decidir se aqueles que dependem da comunidade deveriam gozar indefinidamente as mesmas liberdades que os demais”(Hayek: 1990, pág 124). Parece que a vontade de Hayek seria a de propor uma democracia censitária de novo tipo: não seriam apenas os proprietários que teriam o direito de voto mas o voto estaria restrito àqueles que tivessem ligados à uma atividade econômica, ficando de fora desempregados e excluídos do mercado. Percebe-se claramente que Hayek não morre de amores pela democracia universal. É oportuno lembrar as suas palavras a um conservador jornal chileno, El Mercurio, durante a ditadura de Pinochet que foi o primeiro governo no mundo a implementar as idéias neoliberais. Dizia ele que preferia uma ditadura com mercado livre do que um Estado democrático que interviesse no mercado regulamentando-o . e) O monetarismo é a política econômica do neoliberalismo. Foi Milton Friedman, outro economista neoliberal que pertencia à sociedade Mont Pelèrin e que também foi assessor do ex-presidente norte-americano Ronald Reagan, que melhor o explicitou. Para ele a procura de dinheiro é o fator determinante do controle do desenvolvimento econômico. As variações da atividade econômica não se explicam por investimentos feitos pelo Estado mas por variações da oferta da moeda. Explicando melhor, há elevação de preços (gerando inflação) sempre que os meios de pagamento (ou quantidade de moeda) crescem. Por isso a inflação é resultado do aumento crescente da quantidade de moeda em busca de uma quantidade de bens e serviços que cresce mais devagar que aquela. E porque há excessivo crescimento da moeda? Por culpa dos governos que necessitam financiar seus déficits. Para Friedman o governo é o único responsável pela inflação que acontece por conta de seus gastos na manutenção da máquina governamental e dos programas sociais. f) O poder excessivo do movimento operário através dos seus sindicatos era outro fator a impedir o avanço da acumulação capitalista na medida em que o operariado fazia reivindicações salariais descabidas e pressionava o Estado para que sustentasse desmesuradamente os seus gastos sociais. Este fato diminuía os lucros, aumentava a inflação e gerava recessão. Feito o diagnóstico Hayek e seus seguidores neoliberais propõem esta receita: 1) manutenção de um Estado forte com capacidade de romper com o poder dos sindicatos e de controlar o dinheiro sendo comedido nos gastos sociais e nas intervenções econômicas 2) a meta última deveria se a estabilidade econômica. 3) Para a efetivação da estabilidade monetária seriam imprescindíveis as seguintes ações: a) Contenção dos gastos com bem estar; b) Restauração da taxa “natural” do desemprego ou seja a criação de um exército de reserva de trabalho com o intuito de quebrar o poder dos sindicatos; c) Reforma fiscal com reduções de impostos sobre os rendimentos mais altos e sobre as rendas. d) Liberalização dos preços: o Estado não deve controlar os preços dos produtos no mercado. e) Programa de privatizações: privatização dos serviços públicos (água, luz, telefone, educação, saúde). f) Privatização de empresas estatais. g) Redução dos impostos ás importação para que as empresas nacionais sejam obrigadas a Ter mais eficiência e produtividade. Estas ações combinadas propiciariam novamente o crescimento econômico. O NEOLIBERALISMO NA PRÁTICA A vitória de Margareth Thatcher na Inglaterra em 1979 assegurou para este país o pioneirismo na Europa na efetivação da receita neoliberal. Foi o primeiro país do mundo desenvolvido a se empenhar na concretização do neoliberalismo. E foi aí também que a prática neoliberal se deu da forma mais pura. Quais foram as ações de Thatcher? 1. contração da emissão de moeda 2. elevação da taxa de juros 3. redução considerável dos impostos sobre os rendimentos altos 27 Apesar da hegemonia da ideologia neoliberal é possível se contrapor a ela. A esquerda precisa sair de uma atitude defensiva. A prática neoliberal não conseguiu derrotar definitivamente as lutas sociais de resistência. É necessário sim fortalecer cada vez mais esta resistência. Porém é necessário também adotar uma visão política mais ampla. A partir desta visão será possível criar alternativas viáveis. A esquerda, os progressistas de forma geral, tem que entender finalmente que não pode ser contra a estabilidade monetária e uma administração competente. Não pode deixar isto como bandeira da direita. Porém diferentemente do que faz a direita deve fazer uma articulação com a justiça social. Por exemplo, quanto à inflação, a corrente neoliberal considera que esta acontece quando há excesso de oferta de moeda. A esquerda deve pensar de forma diferente: o crescimento da inflação é produto de um conflito distributivo. Este é resultado da existência de dois grupos sociais que em dado momento entram em conflito. Grupos estes que não se encontram na mesma posição social. Um fixa os preços e assim determina a taxa de lucro. Além disso fixa os salários para a garantia desta taxa de lucro. A inflação deriva justamente dos conflitos provocados por esta fixação. Entendida a inflação desta forma não podemos reduzi-la como fazem os neoliberais, ou seja, penalizando ainda mais os trabalhadores com uma maior redução de seus salários. Poderíamos como alternativa diminuir o grande poder que o setor financeiro tem com a globalização. A esquerda tem que Ter uma política que impeça o dinheiro de se dirigir facilmente para o setor financeiro. Assim se liberará uma quantidade de dinheiro suficiente para investir no setor produtivo. Quanto ao mercado a esquerda não pode reerguer a bandeira do keynesianismo dos anos 50 e 60 e nem do planejamento centralizado da experiência socialista, como se nada tivesse acontecido. Os mercados tem uma dinâmica própria que não pode ser ignorada. Mas é possível intervir no mercado regulamentando. Sabemos também que o mercado por causa de sua crescente sofisticação industrial nunca poderá gerar empresários de forma espontânea. Por isto a necessidade do Estado intervir através de uma política industrial que favoreça determinadas estruturas industriais. Há espaço para começar a reconstrução do Estado sob novas bases. A esquerda ainda confunde público com estatal. Esta confusão impediu que se visse de forma clara que o Estado e suas empresas sempre serviram à acumulação do capital privado. Precisamos pois de um Estado realmente público e de empresas realmente públicas, ou seja, controladas pela sociedade e com objetivos sociais. *Laerte Moreira dos Santos – é professor da ETFSP, lecionando atualmente a disciplina “Estudos Regionais”. (OBSERVAÇÃO: Este texto foi baseado principalmente no livro “Pós-neoliberalismo – as políticas sociais e o Estado Democrático, organizado por Emir Sader e Pablo Gentili, Ed. Paz e Terra, RJ, 1995. As figuras foram tiradas do livreto de educação popular: “O neoliberalismo”, publicado pelo PEDEX – Programa Educativo Dívida Externa – ano 1993) 2.2 Frases Neoliberais X Anti-neoliberais Frases de Neoliberais 1. Milton Friedman – Do livro “Capitalismo e Liberdade”: • “Só há dois meios de coordenar as atividades econômicas de milhões: um é a direção central utilizando a coerção – a técnica do Exército e do Estado totalitário moderno. O outro é a cooperação voluntária dos indivíduos – a técnica do mercado”. • Somente em uma economia de mercado “o consumidor é protegido da coerção do consumidor devido á existência de outros consumidores a quem pode vender. O empregado é protegido da coerção do empregador devido aos outros empregadores para quem pode trabalhar, e assim por diante. E o mercado faz isso, impessoalmente, sem nenhuma autoridade centralizada”. • “se há desemprego se deve baixar os salários. E se esta redução de salários não é capaz de gerar emprego, então é preciso continuar baixando o salário. Assim pode chegar a zero e gerar pleno emprego” 2. Friederich Hayek: • entrevista ao Jornal El Mercúrio (Chile) em 14-4-81: “Uma sociedade livre requer certos valores que, em última instância, se reduzem á manutenção de vidas: não à manutenção de todas as vidas, porque poderias ser necessário sacrificar vidas individuais para preservar um número maior de outras vidas. Portanto as únicas regras morais são as que levam ao “cálculo de vidas”: a propriedade e o contrato.” • “a igualdade perante a lei conflita e é de fato incompatível com qualquer atividade do governo que vise a uma igualdade material ou substantiva intencional entre diferentes indivíduos, e que qualquer política consagrada a um ideal substantivo da justiça distributiva leva à destruição do Estado de direito” (do livro Caminho da Servidão, pág. 91) 30 • “A desigualdade não é lamentável, mas extremamente desejável. Simplesmente, ela é necessária. Em um mundo baseado em idéias igualitárias, o problema da superpopulação não pode ser resolvido. Se garantirmos a sobrevivência de cada pessoa que nasceu, muito logo não seremos capazes de cumprir esta promessa. Com esta superpopulação, existe apenas um freio: que só aqueles povos capazes de auto-alimentar-se se mantenham e se reproduzam.” (em Wirtschafts woche, de 6 de março de 1981) 3. Paul Samuelson: • “Um sistema competitivo é um esmerado mecanismo para a coordenação inconsciente através de um sistema de preços e mercados, um dispositivo visando à combinação do conhecimento e das ações de milhões de indivíduos diversos. Sem contar com uma inteligência central, resolve um dos mais complexos problemas que se possa imaginar, envolvendo milhares de variáveis e relações desconhecidas” Frases de economistas criticando princípios liberais e neoliberais • “Os economistas (liberais)começam supondo que a distribuição ideal dos recursos produtivos pode ser conseguida através de indivíduos que agem de maneira independente, pelo método da tentativa e erro, de tal maneira que os indivíduos que se movimentam na direção correta destruirão, pela competição, aqueles que se movimentam na direção errada. Uma luta cruel pela sobrevivência seleciona os mais eficientes através da falência dos menos eficientes. Esse modo de ver não leva em conta o custo da luta, mas apenas os lucros do resultado final, que se supõe serem permanentes. Como o objetivo é colher as folhas dos galhos mais altos, a maneira mais provável de alcançá-lo é deixar que as girafas com os pescoços mais longos façam morrer de fome as de pescoços mais curtos. Os economistas ortodoxos aplicam as hipóteses do laissez-faire em um mundo real que abandona rapidamente esse pressuposto. Desse modo, entregam-se a um vago otimismo, e a uma crença cômoda, a um descaso com a questão social, uma atitude típica daqueles que estão sentados na escala superior da máquina social”(Keynes, em o “O fim do laissez-faire”) • “o mercado supre a falta de conhecimento, mas jamais fornece propriamente informações, pois ele é simplesmente um mecanismo que transmite reações: pelo mercado sabemos que atividades cortar, mas não que atividades desenvolver. O mercado é, assim, um simples sistema de reações ex- post’, e por esta razão mesma não pode haver no mercado uma tendência ao equilíbrio, uma vez que tal tendência pressupõe a possibilidade de derivar indicações confiáveis de ação ‘ex-ante’.... A noção de equilíbrio perfeito de mercado é autocontraditória, uma vez que se demonstra uma vez que se demonstra a necessidade do mercado pela falta de conhecimento perfeito, o que é o pressuposto do equilíbrio do mercado. Se existisse tal conhecimento, a necessidade do mercado deixaria de existir”(Manfredo Araújo de Oliveira) 3. TEXTOS SOBRE REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA •.1 CARACTERÍSTICAS, ORIGEM E CONSEQUÊNCIAS DA REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA [(Síntese didática feita pelo professor Laerte a partir de textos da revista “De Fato”, CUT – ano 1993 e do Livro de Ricardo Antunes: “Adeus ao Trabalho- ensaio sobre as metamorfoses e a centralidade do mundo do trabalho” (out-novembro 1998)] Onde se originou a prática da chamada reestruturação produtiva? Foi no JAPÃO entre 1950 e 1970. Como foi possível tal fato em um país em um país com uma área exígua e com vários problemas após a segunda guerra mundial? O Japão tem uma área igual a 4,5% dos Brasil, 80% montanhosa e pobre. Atrasou-se na industrialização. Perdeu a guerra, que lhe custou 1,2 milhão de vidas, o parque industrial e cinco anos de ocupação pelos ianques do general MacArthur. Mas, apesar desses pontos fracos, e até graças a eles, é no Japão que nasce um novo paradigma. A indústria foi arrasada? Pode se reestruturar. O mercado é pequeno? A produção será flexível, muitos modelos em pequeno número. Os japonesas são pobres? Cortem-se os custos. A concorrência dos EUA sufoca? Mobilizem o Estado e patriotismo do povo. Assim a montadora Toyota, entre 1950 e 1970, desenvolve, adapta e modifica o fordismo até criar um novo sistema, o toyotismo que vai se constituir no principal modelo da chamada Reestruturação produtiva. Para entender então o que é a reestruturação produtiva precisamos entender o que é o Toyotismo. 31 HÁ QUATRO FASES QUE LEVARAM AO ADVENTO DO TOYOTISMO: 1)a introdução, na indústria automobilística japonesa, da experiência do ramo têxtil, dada especialmente pela necessidade de o trabalhador operar simultaneamente com várias máquinas. 2)a necessidade de a empresa responder à crise financeira, aumentando a produção sem aumentar o número de trabalhadores. 3)a importação das técnicas de gestão dos supermercados dos EUA, que deram origem ao kanban. Segundo os termos atribuídos a Toyoda, presidente fundador da toyota, "o ideal seria produzir somente o necessário e fazê-lo no melhor tempo", baseando-se no modelo dos supermercados, de reposição dos produtos somente depois da sua venda. Segundo Coriat, o método kanban já existia desde l962, de modo generalizado, nas partes essenciais da Toyota, embora o toyotismo, como modelo mais geral, tenha sua origem a partir do pós-guerra. 4)a expansão do método kanban para as empresas subcontratadas e fornecedoras HÁ OUTROS TRAÇOS SIGNIFICATIVOS DO TOYOTISMO: a)a necessidade de atender a um mercado interno que solicita produtos diferenciados e pedidos pequenos, dadas as condições limitadas do pós-guerra no Japão. Diz Coriat, um estudioso: "Nestas condições, a competência e a competitividade determinaram-se a partir da capacidade para satisfazer rapidamente pedidos pequenos e variados.” b)Era necessário também superar o caráter caótico da produção na Toyota, denominado jocosamente de método DEKANSHO (devido a um longo período de preparação, para posterior produção). Como exemplo dessa limitação produtiva basta dizer que, em l955, a indústria automobilística japonesa produziu 69 mil unidades, enquanto os EUA produziram 9,2 milhões, a Alemanha 909 mil e a França 725 mil . c)Por fim, havia que enfrentar o combativo sindicalismo japonês, responsável por uma atuação marcada por muitos confrontos grevistas, e que se constituía num entrave à expansão do toyotismo. em 1950, houve um expressivo movimento grevista contra um processo de demissões em massa na Toyota (entre l600 a 2 mil trabalhadores) A longa greve dos metalúrgicos foi derrotada pela Toyota. Foi, nessa nova contextualidade, a primeira derrota do sindicalismo combativo no Japão. Em 1952/1953, desencadeou-se uma nova luta sindical em várias empresas, contra a racionalização do trabalho e por aumentos salariais, que teve a duração de 55 dias e onde o sindicalismo foi novamente derrotado. É importante lembrar que a Nissan, neste conflito, recorreu ao lockout, como forma de desmoralizar a greve. Após a repressão que se abateu sobre os principais líderes sindicais, as empresas aproveitaram a desestruturação do sindicalismo combativo e criaram o que se constituiu no traço distintivo do sindicalismo japonês da era toyotista: o sindicalismo de empresa, o sindicato-casa, atado ao ideário e ao universo patronal. No ano seguinte, l954, esse mesmo sindicato foi considerado ainda pouco cooperativo, sendo por isso dissolvido e substituído por um novo sindicato inserido no "espírito Toyota" na "Família Toyota". A campanha reivindicatória tornou-se, então, nesse ano, movida pelo lema: "Proteger nossa empresa para defender a vida! Essa foi a condição essencial para o sucesso capitalista da empresa japonesa e, em particular, da Toyota. combinando repressão com cooptação, o sindicalismo de empresa teve, como contrapartida à sua subordinação patronal, a obtenção do emprego vitalício para uma parcela dos trabalhadores das grandes empresas. (cerca de 30% da população trabalhadora) e também ganhos salariais decorrentes da produtividade. Os sindicatos têm, como é o caso da Nissan, papel relevante na "meritocracia" da empresa, na medida em que opinam(com possibilidade de veto) sobre a ascensão funcional dos trabalhadores. Em várias situações a passagem pelo sindicato é uma condição para ascender a funções de responsabilidade, sobretudo em matéria de administração de pessoal, o que vincula ainda mais o sindicato à hierarquia das empresas. Parece desnecessário lembrar que essas práticas subordinam os trabalhadores ao universo empresarial, criando as condições para a implantação duradoura do sindicalismo de envolvimento,. em essência um sindicalismo manipulado e cooptado. Foi a partir destes condicionantes históricos que se gestou o modelo japonês, que aqui estamos chamando de toyotismo. SEUS TRAÇOS CONSTITUTIVOS BÁSICOS PODEM SER ASSIM RESUMIDOS: 1)ao contrário do fordismo, a produção sob o toyotismo é voltada e conduzida diretamente pela demanda. A produção é variada, diversificada e pronta para suprir o consumo. É este quem determina o que será produzido, e não o contrário, como se procede na produção em série e de massa do fordismo. Desse modo, a produção sustenta-se na existência do estoque mínimo. O melhor aproveitamento possível do tempo de produção (incluindo-se também o transporte, o controle de qualidade e o estoque), é garantido pelo just-in-time. O kanban, placas que são utilizadas para a reposição das peças, é fundamental à medida que se inverte o processo: é do final após a venda, que se inicia a reposição de estoques, e o kanbam é a senha utilizada que alude à necessidade de reposição das peças/produtos. Daí o fato de, em sua origem, o kanban estar associado ao modelo de funcionamento dos supermercados, que repõem os produtos, nas prateleiras, depois da venda. 2)Para atender às exigências mais individualizadas de mercado, no melhor tempo e com melhor "qualidade" é preciso que a produção se sustente num processo produtivo flexível, que permita a um operário operar com várias máquinas (em média cinco máquinas, na Toyota), rompendo-se com a relação um homem/uma máquina que fundamenta o fordismo. É a chamada "polivalência" do trabalhador japonês, que mais do que expressão e exemplo de uma maior qualificação, estampa a capacidade do trabalhador em operar com várias máquinas, combinando "várias tarefas simples" (conforme o interessante depoimento do Ex-líder sindical japonês, Ben Watanabe, 1993a:9). Coriat fala em desespecialização e polivalência dos operários profissionais e qualificados, transformando-os em trabalhadores multifuncionais. 3)Do mesmo modo, o trabalho passa a ser realizado em equipe, rompendo-se com o caráter parcelar típico do fordismo. Uma equipe de trabalhadores opera frente a um sistema de máquinas automatizadas. Além da flexibilidade do aparato 32 Essa é pois a origem e consequências da chamada reestruturação produtiva. 3.2 ESQUEMA SOBRE REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA A - Antecedentes : no Japão 1. Origem – Japão 2. Quando – 1950 a 1970 3. Causas – condição social, histórica e física do Japão 4. Modelo – toyotismo 5. Como? a) importação de técnicas de gestão dos supermercados dos EUA – kanban b) introdução da experiência do ramo têxtil – trabalho com várias máquinas c) - repressão sobre os trabalhadores • cooptação e manipulação dos trabalhadores emprego vitalício, família toyota, ganho salarial por produtividade, “participação” dos trabalhadores, sindicalismo de empresa 6. Características principais: a) produção conduzida pela demanda e pelo consumo o consumo determina a produção b) produção variada pronta para suprir o consumo c) produção flexível “polivalência” do trabalhador trabalho com várias máquinas d) trabalho em equipe - rompe-se com o trabalho parcela do Fordismo e) horizontalização contra a verticalização fordista f) intensificação do trabalho g) flexibilização dos trabalhadores horas extras, trabalho temporário e subcontratação B - REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA NO OCIDENTE a) Quando?: a partir da década de 70 com a crise do Fordismo-Taylorismo b) Modelo principal: Toyotismo (Japão) c) Como se manifesta? - inovações tecnológicas base microeletrônica (chips) - inovações organizacionais e gerenciais terceirização, just-in-time, kanban, ilhas de produção, trabalho em equipe, condomínio ou polo industrial, CCQ (círculo de controle de qualidade), qualidade total, etc...... d) Desemprego estrutural este tipo de desemprego tende a eliminar funções – é diferente do desemprego conjuntural que não elimina funções e) Aumento dos assalariados de serviços diminuição do proletariado fabril f) Gestão participativa g) Crise do sindicalismo C - REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA NO BRASIL 1. Quando? : a) de forma parcial: início dos anos 80 • causas: por causa da recessão desta década empresas lançam-se ao mercado externo para atenuar a recessão. Os clientes externos obrigam as empresas a se reestruturarem b) de forma intensa: década de 90 - causas: abertura indiscriminada do mercado interno do Brasil aos produtos importados (governo Collor) - a concorrência e a crise obrigaram à reestruturação 2. inovação dominante: organizacional (a tecnológica é pouco expressiva) 2.1 FORDISMO E TAYLORISMO (Do livro: Trabalho: História e Tendências, Aurélio Eduardo do Nascimento, Ed. Ática, págs. 44-48, 1996) A - TAYLORISMO Frederick W. Taylor, no começo deste século, provocou uma renovação na fábrica e inaugurou um novo processo de trabalho com a sua teoria chamada de Taylorismo. O objetivo desta era que o trabalhador se tornasse mais produtivo evitando a exploração de suas forças físicas e mentais até os limites de sua resistência fisiológica. 35 A intenção de Taylor era fazer do corpo e do espírito do trabalhador um mecanismo competente e inteligente perfeitamente integrado aos objetivos empresariais de produtividade. Taylor não inventou uma nova máquina, mas um novo homem frente á máquina. Na verdade, ele não criou um modo de se trabalhar melhor, mas sim de se trabalhar mais. Basicamente, o Taylorismo baseia-se nos seguintes princípios: • Mecanização da produção: repassa o saber do trabalhador para a máquina, sempre que possível • O estudo dos tempos e movimentos: buscar a maneira certa de executa uma tarefa, com o menor gasto de tempo e energia possível. • Seleção e treinamento “científico”: definir um perfil adequado à tarefa a ser executada, com apoio de profissionais das áreas de psicologia e serviço social. • Separação entre a concepção e a execução do trabalho: à gerência cabe o trabalho de “pensar”, de decidir o processo de produção em operações limitadas, de tal forma que se limite ao trabalhador a execução daquilo que foi prescrito e determinado pela chefia. • Plano de incentivo salarial: incentivar monetariamente o trabalhador, pagando-o por peça produzida ou hora trabalhada B - A ALIENAÇÃO A alienação do trabalhador passa a ser um dos subprodutos da “administração científica”. Ao se alienar, ele perde o sentido da totalidade em relação ao processo produtivo, e por conseguinte, do produto. O trabalhador individualmente está cindido, fragmentado, sendo executor de uma tarefa simples e rotineira. A mecanização da produção reduziu o trabalho a um ciclo de movimentos repetitivos. Aquele que trabalha é facilmente treinável e substituível, portanto, muito mais barato. O saber do trabalho, por sua vez, pertence à chefia ou se localiza nas máquinas. Sob esse aspecto, a relação da classe trabalhadora com os meios de produção tornou-se invertida. Podemos dizer que os trabalhadores são “comandados” pelos meios de produção. Ao invés de manejar ferramentas e equipamentos, eles tornam-se apêndices das máquinas. É bom dizer que esse processo de “mecanização” do homem, em que o trabalhador funciona como uma máquina, deu um novo papel ao chamado chefe ou supervisor. Para garantir a eficácia desse modelo, o encargo social com a função de supervisionar e controlar os subordinados ganhou uma grande importância na produção e consequentemente na sociedade. C - O FORDISMO Henry Ford, ao visitar um frigorífico de frango, percebeu que o proprietário havia criado uma espécie de linha de produção. O frango era morto, depenado e transportado por um processo mecânico que o conduzia aos trabalhadores nas diferentes funções de preparação e embalagem do produto. Ford achou curioso e interessante esse sistema. A partir dele inventou, então, a produção estandardizada(padronizada) e a linha de montagem na indústria automobilística, que nascia naquela época. Quem passou a determinar o tempo de produção foi o fluxo da linha de montgem, fixando o trabalhador ao seu posto e estabelecendo o conceito de “tempo imposto”. Isto possibilitou a redução d resistência operária. O Fordismo não é uma ruptura com Taylor. Ele dás as bases técnicas e culturais para um novo impulso na “revolução” da produção, feita principalmente pela indústria automobilística. Outro aspecto do desenvolvimento da linha de produção do Fordismo é a economia em grande escala e a padronização dos produtos. Por exemplo, o custo de uma camisa no alfaiate da esquina é muito maior do que em uma fábrica que produz cem mil camisas por dia. Podemos dizer que, com a linha de produção, os empresários encontraram finalmente a forma “perfeita” de superexploração da força de trabalho D - A RESISTÊNCIA DOS TRABALHADORES Essa forma “perfeita”, contudo, acarreta problemas. A segmentação de funções e o trabalho alienado, ao ser levado ás últimas conseqüências, criam problemas de saúde em milhões de trabalhadores. Isso porque há um aumento constante do ritmo da linha de montagem em busca de mais lucros. As péssimas condições de trabalho fazem com que aumentem os acidentes no emprego. Os danos á saúde física e mental, provenientes da insegurança dos locais de trabalhos, aliados ás agressões ao meio ambiente, favoreceram crescentes contestações ao modelo fordista. Para se manter a disciplina e o aumento d produção, utilizou-se cada vez mais a repressão e a rotatividade no emprego. Com isso, cresceu a resistência operária, tanto ativa (como greves e sabotagens) quanto passiva (como faltas ao trabalho e baixa produtividade). Nesse período, o movimento sindical se expandiu assustadoramente (para os patrões), e os operários passaram a Ter uma crescente influência sobre o processo produtivo. Outra questão importante desses conflitos é o controle do saber do trabalhador. Por mais que o trabalho seja alienado e mecânico, o ser humano, na maioria das vezes, tende a ser criativo e melhorar o dia-a-dia do trabalho. Isso fica evidenciado quando a forma de pressão usada pelos trabalhadores para obter alguma conquista é a “operação padrão” (cumprimento à risca de todas as normas de operação e segurança no trabalho”. Por maior que seja o controle de uma chefia sobre os trabalhadores, o acúmulo de pequenos aperfeiçoamentos no cotidiano na produção faz com que o trabalho realizado dentro das normas prescritas e determinadas pela chefia praticamente paralise ou reduza a produção (esse processo também é conhecido como “operação tartaruga”) 36 É importante destacar que, culturalmente, o Fordismo representa uma mudança importante no mundo do trabalho, pois, contraditoriamente, ele fortaleceu a identidade da classe trabalhadora. Esse fortalecimento se deu com a massificação das linhas de montagem em todos os processos produtivos. Isto aconteceu também por obrigarem milhões de pessoas, com origem, raça, idade e sexo diferentes, a um convívio cotidiano em grandes unidades de produção e em constante colaboração entre si. Essa padronização social se estendeu no enfrentamento dos problemas comuns dos trabalhadores. Os sindicatos, os partidos, as associações e outras inúmeras entidades são espaços de produção de uma “cultura própria” dos trabalhadores. PERGUNTAS 1. A nova divisão do trabalho na fábrica aprofundou a fragmentação entre o trabalho intelectual e o manual. a) Quais as conseqüências dessa divisão para o empresário? b) Quais as conseqüências dessa divisão para o trabalhador? 2. Em que a organização contemporânea do trabalho é diferente do fordismo-taylorismo? 3.4 ESQUEMA SOBRE O FORDISMO-TAYLORISMO Laerte Moreira dos Santos 1. Origem: surgiu na empresa FORD a partir de 1913. 2. Apoio: 2.1 base tecnológica da 2ª revolução industrial 2.2 Taylorismo (método de organização do trabalho) 3. Novidades: 3.1 Esteira de produção na linha de produção 3.2 Produção em massa (grande indústria) 3.3 Redução dos custos 3.4 Aumento salarial 4. Conseqüências: 4.1 Econômicas: a) a produção em massa exige consumo em massa b) Trabalhadores ganham mais 4.1 Políticas: a) Diminuição do poder do trabalhador sobre o processo de trabalho b) Pacto social entre capital e trabalho “welfare state” Governos social-democratas na Europa (impulsionado: crescimento e força movimento operário, “guerra fria” e “ameaça do comunismo”) • Resultado do pacto: Reconhecimentos dos sindicatos pelos capitalistas; reconhecimento da legitimidade da ordem capitalista pelos trabalhadores; investimento do Estado em benefícios sociais (seguro-desemprego...) 5. Crise do Fordismo: 5.1 Quando? - A partir dos anos 70 5.2 Por que? • Inflação, gerada pela disputa distributiva • Fim do padrão-ouro e da conversibilidade do dólar (1972 – presidente Nixon – EUA) • 1973 e 1979 : aumento do preço do petróleo • 1979: elevação dos juros norte-americanos • Reaparição, em 1974-75, da primeira crise "clássica" de superprodução e de superacumulação depois da Segunda Guerra Mundial. • A reconstituição das bases econômicas e sociais de um capital financeiro poderoso, que não tolerou a força dos sindicatos e os gastos sociais pelos diversos governos • A chegada de governos conservadores ao poder em fins da década de 70: Reagan nos EUA, Margareth Thatcher na Inglaterra 3.5 ESQUEMA DAS TRÊS REVOLUÇÕES DO CAPITALISMO (Revista “De Fato”, Central Única dos Trabalhadores, p.22, 1993) PRIMEIRA SEGUNDA TERCEIRA 37 antigos patrões. Num mundo onde todos são produtores de mercadorias, os sindicatos, os antigos instrumentos de luta dos trabalhadores, parecem, pelo menos, supérfluos. Para F. J. S. Teixeira, nós estamos aqui diante de uma espécie de "reposição de formas antigas de pagamento que foram dominantes nos primórdios do capitalismo e até mesmo na época de apogeu da grande indústria", pois o que está ocorrendo é uma forma transfigurada do salário por peça, que, no século passado, tornou possível o prolongamento da jornada de trabalho e o rebaixamento dos salários. Atualmente, em contraposição às formas de pagamento vigentes na indústria, o pagamento destes trabalhadores depende da quantidade de mercadorias que eles fornecem às unidades finais de produção, portanto, seu salário se determina a partir da capacidade de produção por unidade de tempo. Quem controla todo o processo e inclusive estabelece os preços dos produtos? As unidades finais de produção, que, inclusive, submetem os produtores a uma vigilância permanente no que diz respeito à qualidade de produção, sendo que os custos da produção são assumidos pelos fornecedores, caso seus produtos não se ajustem aos critérios de qualidade estabelecidos. Além disto, é também a empresa compradora que estabelece o tempo de trabalho que deve ser despendido em cada unidade como base do pagamento a seus fornecedores, um processo que abre espaço a todo tipo de descontos salariais e de fraudes por parte dos capitalistas, que assim têm mais facilidade de escapar à legislação trabalhista. Já Marx, no século passado, analisando o salário por peça, afirma que tal procedimento faz do trabalhador uma fonte potencializada de auto-exploração, pois o trabalhador, nestas circunstâncias, tem interesse de aplicar sua força de trabalho o mais intensamente possível e prolongar sua jornada de trabalho, ou seja, trata-se, em última instância, de um processo de potencialização de produção de mais- valia. A nova revolução tecnológica provocou transformações também nos próprios métodos de trabalho. São os novos modelos de produção apontados como alternativas ao modelo taylorista-fordista. A tese central é que eles indicam pistas para a consolidação de uma produção flexível, capaz de responder à variabilidade e à complexidade crescentes de uma demanda criada pela abertura ao mercado internacional. Um primeiro deles é o que é denominado Círculo de Controle de Qualidade (CCQ), nascido no Japão, mas já bastante difundido no Brasil, cujo objetivo fundamental é fazer com que os trabalhadores se sintam participantes nos negócios da empresa, conseguindo o aumento da produtividade e, com isto, reduzindo os custos da produção. Estes círculos são constituídos normalmente por grupos de seis a dez trabalhadores de um mesmo setor de trabalho, que se reúnem para propor soluções aos problemas de serviço. Na realidade há uma contraposição entre o que dizem as empresas e o que, de fato, tem ocorrido. Para as empresas estes círculos se destinam, em primeiro lugar, a tratar da melhoria das condições de trabalho, das questões de segurança, higiene etc. De fato, estas questões são secundárias no funcionamento efetivo dos círculos, cuja função principal tem sido mesmo contribuir para a redução dos custos. A participação voluntária é, também, discutível, pois as empresas encontram meios para praticamente obrigar a participação: os trabalhadores engajados nos círculos são contemplados com proteção especial por parte das empresas, por exemplo, não entram no programa de dispensa periódica," Além disso são os preferidos para a participação em cursos e para os planos de promoção das empresas Qual o resultado deste processo para os trabalhadores? Em primeiro lugar, não há uma alteração da estrutura formal das empresas, pois eles não implicam mudança nas relações de chefia, na hierarquia existente nos locais de trabalho. O mesmo se pode dizer em relação à organização do trabalho, que continua não-organizado em grupos. Os círculos não possuem poder para implantar suas próprias decisões, assim que talvez sua atuação primeira seja na direção da racionalização do processo de trabalho, sem qualquer influência nos negócios da empresa. Portanto, não há participação dos trabalhadores na gestão empresarial, nem nos lucros das empresas e, muitas vezes, a implantação destes novos métodos tem significado um desestímulo à ação sindical. Uma outra técnica que provocou mudanças sensíveis no trabalho é o assim chamado sistema Just-in-time/kanban, introduzido aparentemente com o objetivo de reduzir os estoques e melhorar a ocupação da área disponível da fábrica. Just- in-time quer dizer produzir o produto necessário, na quantidade e no momento necessário, isto é, produzir num determinado momento somente o que terá utilização imediata. A lógica subjacente é a da vinculação muito próxima entre produção e mercado, o que implica a flexibilização da produção. Há pressupostos indispensáveis para a introdução do sistema: processos produtivos em forma de ilhas, padronização de tarefas e pouca flutuação na montagem final. A tecnologia exigida consiste em agrupar as máquinas de forma que seja possível que cada grupo de máquinas, a ilha tecnológica, possa produzir toda uma família de peças. Dois são os critérios para o agrupamento das máquinas: as semelhanças geométricas e a seqüência da produção. A produção pode, então, ocorrer sem interrupções, pois dentro da ilha a peça sai de uma operação e entra em outra imediatamente e o estoque não se forma, reduzindo-se o tempo total gasto entre o início e o fim da operação. Por outro lado, a padronização das tarefas é necessária para que o sistema funcione. A administração estabelece, então detalhadamente, os fluxos do processo, os tempos de produção e a quantidade padrão de trabalhadores necessários à operação em cada ilha. A gerência procura definir como os trabalhadores devem trabalhar, tirando-lhes a autonomia sobre seu próprio trabalho. Além disso, é empregada uma série de procedimentos para o controle da qualidade da produção, colocando dispositivos nas máquinas de tal modo que os próprios trabalhadores podem controlar a qualidade do produto. O kanban é um sistema de informações para tornar possível a produção Just-in-time e é este sistema de informações que controla a quantidade de produção em cada processo e substitui as ordens tradicionais de fabricação. A produção de massa flexível de artigos diferenciados e de qualidade é o que hoje se denomina método japonês de produção, que "tem por fim combinar as exigências de qualidade e quantidade, e de opor-se à prática industrial taylorista de divisão de trabalho através de uma recomposição dos trabalhos de fabricação, manutenção, controle de qualidade e gestão dos fluxos de produção, efetuados por um só trabalhador “polivalente". 3.7 INOVAÇÃO TECNOLÓGICA E CONTROLE SOBRE OS TRABALHADORES 40 (Do livro: “O futuro do trabalho”, Márcia de Paula Leite Editora Scritta, 1994, pág. 168 a 171) Muitos estudiosos e empresários dizem que o objetivo das inovações tecnológicas, atualmente de base microeletrônica, têm o objetivo de tornar as empresas mais aptas a disputarem em um mercado globalizado. Diminuem os custos de produção, aumentam a produtividade e dão capacidade às empresas de adequação mais rápida da produção ás exigências do mercado. Mas pouco se fala de outro objetivo das inovações tecnológicas: o controle sobre o trabalhador. Isto fica bastante evidente através de depoimentos de gerentes de duas fábricas: “As empresas não podem mais conviver com esse tipo de ineficiência em que, quando um time de futebol perde no Domingo, na Segunda-feira o humor do homem é colocado no processo de qualidade, ou seja, a qualidade já está de antemão comprometida. Com o sistema CNC(controle numérico computadorizado), não. O desempenho da empresa é todo previsível. Você já sabe de antemão o que vai fazer, assegurando uma determinada qualidade de seu produto num determinado espaço de tempo. Essa é a diferença. Hoje nós não dependemos mais do humor do trabalhador.” “No sistema artesanal, o empresário ficava na mão da mão-de-obra. Sempre tinha aquele cara que só ele conseguia fazer aquela peço daquele jeito. Então o processo não era da empresa, era do trabalhador. Dependia dele. E ele negociava com o patrão esse conhecimento. Ele chegava lá e dizia: ‘Ou você me paga mais ou eu vou embora’. No caso do preparador de máquina, o cara podia até ditar disciplina. De repente ele falava: ‘Ninguém vai produzir aqui’ – e ninguém produzia. Como é que uma empresa pode viver numa insegurança dessa? Que negócio pode crescer dentro de um contexto em que você não tem segurança de que o processo vai ser executado? Hoje não. Hoje o processo passou a ser um patrimônio da empresa. Não depende mais do trabalhador.” “No CNC, você tem uma qualidade assegurada. A máquina CNC mantém a mesma medida num lote grande de peças, enquanto pode fabricar três peças boas, mas a Quarta já não sai tão boa porque ele tá cansado e a máquina depende da habilidade manual dele. Já a CNC é toda automática, ela tem os posicionamentos precisos e não depende muito do operador.” “No CNC, a única preocupação da empresa é se a máquina está funcionando. Porque na hora que a máquina tá funcionando você não tem perda nenhuma, porque o avanço é aquele e ninguém vai conseguir mudar, a rotação também é aquela e ninguém vai conseguir mudar. Na hora que fechou a porta e apertou o botão, você não vai diminuir nunca ao tempo daquilo. Então a preocupação maior é realmente a máquina parada, porque na hora que a máquina tá parada não se está produzindo. Na hora que ela começou a funcionar você pode esquecer, porque aquilo vai ser feito de acordo com os tempos estabelecidos. É diferente da convencional. Na convencional, se tá marcado lá avanço de 3 mm e o operário colocar 2, é difícil ficar indo de máquina em máquina verificar quanto ele tá avançando. Então a fiscalização é completamente diferente na CNC. Você não vai fiscalizar se o operário tá matando tempo ou não. Porque na hora que a máquina começa a funcionar, ele não vai conseguir nada.” Agora o depoimento de um operário de uma fábrica: “Quando não tinha automação, o patrão realmente tocava um chicote, era aquela correria toda, os chefes em cima dos operários prá garantir a produção, aquela pressão toda. Mas como os trabalhadores foram evoluindo, se organizando e começaram a fazer tartaruga prá di9minuir a pressão do patrão, eles criaram a automação. Foi uma saída deles prá aumentar o lucro. Como as pessoas se movimentaram contra aquela opressão, não dava mais. Então eles chegaram a uma saída: a automação. Que com o computador já tá tudo controlado. Não precisa mais o chicote.” (torneiro mecânico de uma fábrica) 3.8 CÍRCULO DE CONTROLE DE QUALIDADE (CCQ) NO BRASIL E CONTROLE SOBRE OS TRABALHADORES (do livro: Neoliberalismo e Reestruturação produtiva, vários autores, pág. 173 e 174, Cortez Editora, 1996) A nova revolução tecnológica provocou transformações nos próprios métodos de trabalho. Um primeiro deles é o que é denominado Círculo de controle de Qualidade (CCQ), nascido no Japão, mas já bastante difundido no Brasil, cujo objetivo fundamental é fazer com que os trabalhadores se sintam participantes nos negócios da empresa, conseguindo o aumento da produtividade e, com isto, reduzindo os custos da produção. Estes círculos são constituídos normalmente por grupos de seis a dez trabalhadores de um mesmo setor de trabalho, que se reúnem para propor soluções aos problemas de serviço. Na realidade há uma contraposição entre o que dizem as empresas e o que, de fato, tem ocorrido. Para as empresas estes círculos se destinam, em primeiro lugar, a tratar da melhoria das condições de trabalho, das questões de segurança, higiene etc. De fato, estas questões são secundarias no funcionamento efetivo dos círculos, cuja função principal tem sido mesmo contribuir para a redução dos custos. A participação voluntária é, também, discutível, pois as empresas encontram meios para praticamente obrigar a participação: os trabalhadores engajados nos círculos são contemplados com proteção especial por parte dos empresas, por exemplo, não entram no programa de dispensa periódica. Além disso são os preferidos para a participação em cursos e para os planos de promoção das empresas. Qual o resultado deste processo para os trabalhadores? Em primeiro lugar, não há uma alteração da estrutura formal das empresas, pois eles não implicam mudança nas relações de chefia, na hierarquia existente nos locais de trabalho. O mesmo 41 se pode dizer em relação á organização do trabalho, que continua não-organizado em grupos. Os círculos não possuem poder para implantar suas próprias decisões, assim que talvez sua atuação primeira seja na direção da racionalização do processo de trabalho, sem qualquer influência nos negócios da empresa. Portanto, não há participação dos trabalhadores na gestão empresarial, nem nos lucros das empresas e, muitas vezes, a implantação destes novos métodos tem significado um desestímulo à ação sindical.” 3.9 GLOSSÁRIO SOBRE REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA (Da Revista "De fato"- revista da CUT - dezembro de 1993 - pág. 14 a 25 - Autor: Bernardo Joffily –São Paulo) Automação. Modernizaçao produtiva em que a máquina passa a desempenhar automaticamente um conjunto de funções sem interferência imediata do trabalhador. Biotecnologia. Termo genérico para os avanços recentes na Biologia. Designa em especial: a engenharia genética, que permite a manipulação dos gens, elevando a precocidade, produtividade, qualidade e resistência das plantas e animais; e a pesquisa de novos componentes orgânicos, por exemplo para a indústria farmacêutica. CAD-CAM (de Computer aided Design e Computer Aided Manufacturing). Desenho e produção industrial com auxílio de computadores. O uso das duas siglas unidas indica a passagem automática e direta das especificações do projeto para a produção. CCQ, Círculos de Controle de Qualidade. Grupos de seis a dez trabalhadores, teoricamente voluntários, surgidos no Japão dos anos 60 e introduzidos no Brasil em 1981. Visam racionalizar o processo de trabalho via sugestões e fluxo de informações. Têm também função ideológica, sendo apresentado como "democratizantes". CEP, Controle Estatístico de Processo. Método preventivo de garantia de qualidade. O andamento do trabalho é constantemente comparado com um padrão definido, com imediata correção dos desvios. Emprega técnicas estatísticas, gráficos de controle, histogramas e diagramas causa-efeito. Cinco Zeros. Zero estoque, zero defeito, zero papel, zero espera, zero pane (ver Qualidade Total). CNC, Comando Numérico Computadorizado. Simbiose entre máquina e computador. Flexibilidade ou Sistema flexível de manufatura. Aceita chegada aleatória de ordens de produção e encomendas personalizadas. Focalização. Tendência das empresas a se concentrar na "atividade-foco" em que tem vantagem competitiva. Opõe-se à verticalização(ver terceirização). Gestão Participativa. mobilização dos trabalhadores, com incentivos econômicos (prêmios, estabilidade, carreira) e forte carga ideológica, visando engajá-los na reestruturação produtiva. Ilha de Produção. Mudança do layout do tipo jobshop. Agrupa máquinas de diferentes tipos, em forma de linha ou de "U", e operadas coletivamente por uma equipe. Cada ilha produz uma família de peças semelhantes por sua geometria ou processo. Just in Time (na hora certa). Sistema de organização da produção para produzir na quantidade e no tempo exatos. Reduz drasticamente os estoques e aumenta a flexibilidade. Entregas mais freqüentes e em lotes menores por parte dos fornecedores. As fábricas dos anos 80 têm ruas internas para o fornecedor descarregar diretamente no setor que utilizará a entrega. Kamban. O sistema de informação que alimenta o just in time. Originalmente usa cartões coloridos que acompanham as "encomendas" feitas entre setores ou entre empresas. Modularidade. Método de organização da produção em "famílias" de produtos assemelhados entre si, que, por exemplo, empregam os mesmos componentes. Polivalência. Operação simultânea de várias máquinas diferentes(multiskill worker) ou semelhantes (multitask). Compreende também a redução dos níveis hierárquicos e tipos de cargos na produção, até com rodízio de funções. Porosidade. Lapsos de tempo em que o trabalhador não está produzindo, enquanto espera, por exemplo, que determinada máquina conclua sua tarefa. É drasticamente reduzida no trabalho polivalente. Controladores Programáveis (programmable controillers), ou PC (não confundir com o Personal Computer). Estágio de automatização inferior ao CNC. Qualidade Total. Complexo de procedimentos (CCQ, CEP, etc.) que visa elevar ao máximo a qualidade e reduzir ao máximo os defeitos da produção. Também chamada Cinco Zeros. Robô. Máquina informatizada que substitui totalmente ou em grande parte o trabalho humano em funções complexas, como pintura e soldagem de automóveis. Movimenta e manipula ferramentas e peças à semelhança de um trabalhador. Com freqüência é antropomorfo, com a forma de um braço humano e articulações de ombro, cotovelo, pulso e garra. Possui também órgãos de sentido (visão). O termo, criado pelo escritor Karel Capek em 1921, vem do checo robota, trabalho forçado. Telemática. Associação entre telecomunicações e informática empregada, por exemplo, nos caixas automáticos de bancos. Tempo de Atravessamento (lead time). Tempo em que o produto percorre ('atravessa') o conjunto do processo produtivo dentro da empresa, desde a encomenda até a entrega do produto. Deve ser reduzido ao máximo para reduzir a duração do cicio de reprodução do capital. Terceirização (em inglês outsourcing, fornecimento de fora). Tendência das grandes empresas para subcontratarem outras firmas, empreiteiras ou 'terceiras" para assumir funções auxiliares (faxina, segurança, cozinha, transporte) ou diretamente ligadas ao processo produtivo (manutenção, ferramentaria, setores com emprego intensivo de mão-de-obra e menor emprego de maquinaria) ou fornecer componentes prontos (ver localização). Toyotismo. Sistema de produção, relações interempresariais e relações de trabalho desenvolvido pela montadora automobilística japonesa Toyota, considerado como paradigma da 3ª Revolução Industrial. 42 2. A emergência do desemprego estrutural e do aumento da precarização e da informalização do mercado de trabalho O denominador comum da reestruturação produtiva nas várias empresas é a atitude predatória e ao mesmo tempo conservadora que concebe o trabalho como custo e não como investimento, o que fica patente na gestão autoritária das relações de trabalho, quando se questiona, por exemplo, o direito à livre organização sindical dos trabalhadores. O corte nas despesas salariais das empresas, por meio da redução de salários e das demissões em massa, é uma das principais formas de reajuste estrutural frente à necessidade de menores custos. As inovações tecnológicas, ao pouparem mão-de-obra, também cumprem o mesmo papel. No entanto, muito raramente a sua introdução vem acompanhada de discussão com os respectivos sindicatos. Essa visão conservadora do papel do trabalho no processo produtivo no Brasil trouxe como resultado uma maior flexibilização do mercado de trabalho na década de 90, chegando-se a registrar uma taxa de rotatividade da mão-de-obra de 30% em 1993 - o que significa um terço dos trabalhadores obrigados a trocar de emprego anualmente, na sua grande maioria para ocupar postos criados no setor informal e sem as garantias da legislação trabalhista. Assim, a reestruturação industrial em curso no Brasil - marcada por um forte conservadorismo empresarial e pela ausência de políticas indutoras da competitividade social - tem agravado a concentração de renda, a precarização e a informalização do mercado de trabalho que já estavam presentes nos anos 80. Nesse período, apesar de a taxa anual de geração de empregos ter sido de 3,5% - superando a taxa anual de crescimento do PIB, de 1,5% - houve uma queda de 14% do salário médio real e de 50% do salário mínimo real. Ou seja: foram gerados empregos de menor qualidade e com baixos salários. Ainda assim, o total de empregos gerados no país esteve aquém das nossas necessidades, já que a cada ano 1,5 milhão de jovens engrossam o contingente da força de trabalho. No entanto, a mudança dos anos 80 para os anos 90 criou pela primeira vez uma situação nova e mais complexa para a realidade do mercado de trabalho. Segundo dados do IBGE, entre 1988 e 1992, foram eliminados 2,1 milhões de empregos na indústria – quase 33% do total da força de trabalho nesse setor. O mais dramático, entretanto, é que o emprego na indústria não se alterou frente a uma elevação do produto industrial de 18% no biênio 1993/1994. Isso significa que a indústria não contribuiu, como no passado, para a geração de novos empregos no país. Esse processo resultou, em grande medida, numa taxa de desemprego aberto que resistiu a uma queda inferior a 5%, o que significa quase 4 milhões de brasileiros permanentemente desprovidos de um dos direitos mais elementares da cidadania: o emprego. No caso dos dados de desemprego elaborados pelo convênio Dieese-Seade, somente na grande São Paulo, o desemprego atinge mais de 13%. O período de duração do desemprego tem aumentado em virtude dos novos requisitos de seleção para contratações, por parte das empresas, maiores exigências de escolaridade e de adaptação ao trabalho junto aos novos processos produtivos. Assim parcela crescente dos desempregados tem tido dificuldades cada vez maiores de reinserção no mercado formal de trabalho – a contratação em regime de assalariado por tempo indeterminado e com carteira assinada. Dessa forma, eles são obrigados a exercer vários tipo de bicos e regimes especiais de trabalho com uma visível deterioração das suas condições de trabalho em prol da sobrevivência diária. No entanto,, esse nível de desemprego não dá conta da complexa real idade do mercado de trabalho brasileiro. E fundamental importância é o contingente de 50% da população ocupada composta de trabalhadores informais, autônomos, enfrentando condições precárias de trabalho, o que representa um total de 30 milhões de brasileiros. O cerne do problema da exclusão social no Brasil está na convivência de níveis elevados de desemprego, pelos padrões históricos do país, com a proliferação de formas precárias de emprego. Assim sendo, cada vez menos a posse de um emprego é determinante de qualidade de vida, dada a recente deterioração da qualidade dos empregos. Exemplo disso diminuição da população assalariada em relação ao total de ocupados e o aumento, dentro da população assalariada, daqueles que não têm carteira assinada nos últimos anos. dentro da população assalariada, daqueles que não têm carteira assinada nos últimos anos. Além disso, por volta de 40 milhões de brasileiros vivem em condições de pobreza, dos quais 20 milhões são indigentes, ou seja, não ganham nem mesmo o suficiente para satisfazer suas necessidades alimentares. Dessa forma, o desafio da erradicação da exclusão social no Brasil é de tal importância que programas assistencialistas estilo Comunidade Solidária podem, no máximo, gerar um alívio temporário das condições subumanas em que vive grande parte de população. Para superar a exclusão temos que gerar empregos, e de qualidade. O seguro-desemprego e a formação profissional, portanto, devem funcionar em prol de um objetivo mais geral, ou seja, a realocação efetiva e consistente da mão-de-obra desempregada. Isso tudo é inviável sem crescimento, mas muito mais inviável sem distribuição de renda. A elevação a produtividade da indústria entre 1991 e 1994 foi superior a 35%, mas os trabalhadores (por meio de ganhos de produtividade) e a sociedade (por meio de redução real de preços) não se beneficiaram desse crescimento. Esses elevados níveis de produtividade têm sido obtidos não só por intermédio das inovações tecnológicas e organizacionais no processo produtivo como também pela utilização indiscriminada de jornadas extraordinárias de trabalho. A desigualdade é o fator unificador do mercado de trabalho brasileiro. Melhorar a distribuição pessoal da renda e aumentar a participação dos salários na renda total são um desafio, mas isoladamente não bastam. O combate à desigualdade e à exclusão social no Brasil deve vir acompanhado de um enorme esforço social contrário à discriminação das mulheres e dos negros no local de trabalho. Em 1990, os salários das mulheres eram cerca da metade do valor dos salários dos homens, enquanto os negros recebiam menos da metade que os brancos nas mesmas funções e atividades. Essa luta não é só por melhoria das condições de vida, mas também pela afirmação da cidadania e dignidade do trabalhador. Por isso, o trabalho escravo deve ser combatido a todo custo. É inadmissível que, após 300 anos da morte de Zumbi - líder do Quilombo dos Palmares -, completados no ano passado, existam ainda formas de trabalho escravo no país. Somos também intransigentemente contra o trabalho infantil, pois reproduz no futuro as condições de miséria da população brasileira e perpetua o elevado analfabetismo nas futuras gerações. 45 Esse conjunto de questões relativas ao mundo do trabalho tem colocado para os sindicatos a exigência de articular um universo cada vez mais amplo de interesses dos trabalhadores numa estratégia comum de ação, tendo como objetivo central a consolidação dos valores básicos de solidariedade e sociabilidade. Esse quadro dá a dimensão dos nossos desafios. 3. As diretrizes da CUT para combater o desemprego e a exclusão social A CUT, desde o II Congresso Nacional, vem gradativamente incorporando a agenda da reestruturação produtiva e dos novos modelos de organização do trabalho às suas prioridades e decisões congressuais. A Central não se opõe, em princípio, à inovação tecnológica, organizacional ou, em linhas gerais, à modernização industrial. As inovações podem ter um importante papel na valorização do trabalho e na redução das desigualdades sociais, de renda, regionais e culturais nesse Brasil tão sofrido e excludente. Além disso, a crescente incapacidade do setor produtivo de incorporar parcela desse enorme contingente de excluídos do setor formal (desempregados, informais, autônomos) não se deve isoladamente á crescente difusão das inovações tecnológicas, mas também ao fato de que uma parcela significativa desse setor produtivo não tem sido capaz d se reestruturar e se modernizar. Em virtude do aumento da concorrência interna e externa, muitas empresas reduzem constantemente os seus níveis de produção e de emprego ou desativam totalmente a produção. Queremos dizer com isso que não são apenas as inovações tecnológicas e organizacionais os fatores responsáveis pelo aumento do desemprego, já que também a ausência de inovações pode ter efeitos semelhantes sobre o nível de emprego. Dessa forma, a atitude sindical frente à reestruturação produtiva e à modernização tecnológica deve ultrapassar tanto a aceitação passiva quanto a recusa a qualquer iniciativa das empresas de promover mudanças. A opção pela recusa à inovação não tem resultado em conquistas para os trabalhadores e muito menos no fortalecimento e na maior representatividde dos sindicatos. Ao contrário, essa opção acaba facilitando a estratégia empresarial de estabelecer vínculos individuais ou mesmo coletivos diretamente com os trabalhadores em torno de consensos mínimos no local de trabalho. A simples afirmação de que tais negociações são sempre uma forma de cooptação dos trabalhadores para o projeto da empresa não dá conta da complexidade desse processo e pode criar um distanciamento entre os trabalhadores e a orientação dos sindicatos. Em função do acelerado crescimento da produtividade e da estagnação do emprego na indústria desde o princípio dos anos 90, alguns sindicatos e comissões de fábrica têm obtido, por intermédio de acordos com a direção das empresas, jornadas semanais em média de 40 horas sem redução de salários e com a adoção de mecanismos que coíbem a extensão da jornada extraordinária do trabalho. Dentre esses acordos, o da Mercedes-Benz assumiu enorme importância mobilizadora para o conjunto da categoria dos metalúrgicos do ABC. Da mesma forma que os sindicatos mais organizados, as instâncias horizontais e verticais da CUT estão discutindo formas e mecanismos de ação comuns com o objetivo de fazer com que essas conquistas por empresa ou de sindicatos revertam em benefícios para o conjunto dos trabalhadores. 4.2. Organização por local de trabalho A organização por local de trabalho é uma das melhores maneiras de se negociar e garantir a implementação dos acordos relativos à reestruturação produtiva nas empresas. Aliás, o enfrentamento efetivo e propositivo da reestruturação exige de nós um empenho para reforçar o trabalho de base com vistas a generalizar a garantia da representação sindical no local de trabalho. As categorias ou sindicatos que conseguiram firmar acordos com a direção das empresas e garantir a sua aplicação já tinham comissões de fábrica ou outras instâncias de representação sindical nas empresas. Portanto, para nós, a organização por local de trabalho (OLT) não representa somente a conquista da liberdade de organização sindical, mas um dos mais importantes instrumentos de representação coletiva capaz de propiciar a defesa efetiva dos trabalhadores nas negociações relativas à reestruturação produtiva 4.3. Mudanças organizacionais e tecnológicas Os sindicatos e as comissões de fábrica têm conseguido, ou estão em processo de negociações, obter importantes conquistas relativas às mudanças organizacionais e tecnológicas. Dentre as mais significativas, destacamos: a) Informação prévia quanto ao projeto das empresas sobre mudanças organizacionais, introdução de novos equipamentos, transferência de produção para outras plantas da empresa e previsão de investimentos discriminados por setor no interior da fábrica; b) negociação prévia para a implementação de novos processos produtivos e transferência de atividades para outras plantas da empresa; c) realocação dos trabalhadores eventualmente afetados para postos e funções compatíveis ou semelhantes, mediante retreinamento; d) no que diz respeito ás alterações de funções, cargos e salários, motivadas pelas mudanças organizacionais e tecnológicas as principais reivindicações têm como princípio coibir as atitudes unilaterais por parte das empresas e o estabelecimento de mecanismos e critérios transparentes de progressão profissional, com base na competência técnica existente e naquela adquirida pelo trabalhador a partir dos programas de treinamento, capacitação e requalificação. 46 Além disso, no passado recente alguns sindicatos conseguiram reduzir o número de faixas e grupos na estrutura de salários com a conseqüente elevação da renda dos trabalhadores dos níveis mais baixos; e) Quanto às condições de trabalho, as prioridades nas negociações relativas às mudanças no interior das empresas têm sido o controle de ruído, a ergonomia e as questões relativas ao meio ambiente. As formas propostas de acordo em particular as de controle, têm-se direcionado para a criação de indicadores sobre esses itens de tal forma que possam traduzir-se em metas a serem cumpridas pelas empresas; f) um dos maiores impactos das inovações tecnológicas e organizacionais sobre o trabalho na, empresas é a mobilidade interna dos trabalhadores, seja no interior da planta em que eles estão alocados, seja entre plantas de uma mesma empresa. As empresas têm como objetivo garantir a máxima liberdade de deslocar os trabalhadores de acordo com as suas necessidades de produção e obviamente reduzir suas necessidades de ofertar novos empregos. As propostas de alguns dos sindicatos filiados à CUT, que têm sido referências para as nossas reflexões, vão no sentido de estabelecer critérios concretos que possibilitem aliar a mobilidade interna relativa à constituição de grupos de trabalho efetivamente polivalentes à possibilidade de geração de novos postos de trabalho; g) outro elemento associado à questão do emprego é a negociação dos termos e objetivos relativos à produtividade das empresas de acordo com metas de geração de emprego, tal como ocorreu na câmara setorial do setor automotivo; h) a educação e a formação profissional para nós são vitais para o combate à exclusão social e à utilização predatória do trabalho (alta rotatividade, baixos salários) e para a promoção de cidadania no mundo do trabalho. Desde logo, não reconhecemos a formação profissional como mero adestramento. Entendemos a educação e a formação profissional como elos de uma educação integral. Dessa forma, a CUT está elaborando uma proposta concreta para a integração desses dois processos educacionais com o objetivo de abrir um amplo debate nacional que envolva desde os aspectos relacionados ao conteúdo básico da formação à participação das entidades sindicais no controle das diversas modalidades e níveis do processo de formação e da estrutura de financiamento. Além disso, os sindicatos têm conquistado de forma crescente junto às empresas a criação de modalidades de processos formativos e de reciclagem profissional para o conjunto dos trabalhadores, na forma de recursos homem/ano. Essas reivindicações ou mesmo conquistas têm como objetivo prioritário a elaboração, por parte dos próprios trabalhadores, dos sindicatos e OLT's, de propostas alternativas de organização do trabalho com vistas a privilegiar o enriquecimento do trabalho, a autonomia dos trabalhadores sobre o processo de trabalho, a melhoria da qualidade de vida no local de trabalho e a influenciar o número de trabalhadores necessários para cumprir as metas de produção das empresas. Nesse sentido, realizou-se um acordo muito importante com a Mercedes-Benz. Pela primeira vez na história sindical dos metalúrgicos do ABC, conseguiu-se que a empresa aceitasse a constituição de grupos de trabalho semi-autônomos como forma de organização do trabalho compatível com as chamadas células ou ilhas de produção. O mais importante é que esse acordo foi conquistado sem que se abrisse mão de nenhum dos nossos princípios sindicais, em especial do reconhecimento do conflito de interesses nas relações entre capital e trabalho. abrisse mão de nenhum dos nossos princípios sindicais, em especial do reconhecimento do conflito de interesses nas relações entre capital e trabalho. De toda forma, acordos dessa natureza são ainda pouco numerosos no sindicalismo brasileiro. O nosso objetivo para os próximos anos é reunir experiências que possam servir de referências para outros sindicatos, em particular aglutinadas por setor, tipo de processo industrial ou mesmo ramos de produção. Essa forma de aglutinação de experiências nos permitiria parâmetros semelhantes de negociações e a generalização de processos negociados de reestruturação. 6. Propostas no campo das políticas públicas 7. 5.1. Democratização das políticas públicas A maioria dos países que vêm liderando os processos de reestruturação econômica e industrial está reconhecendo progressivamente o indispensável papel dos trabalhadores, não só no âmbito das empresas como também no campo das políticas públicas. No Brasil, após as experiências positivas das câmaras setoriais, o governo FHC promoveu um recuo nesse processo. Para a CUT, esse instrumento, ou outros mecanismos semelhantes de participação da sociedade na definição das políticas públicas, deve ser reconhecido não só como importante para a democratização das decisões governamentais, mas também como essencial para a eficiência na aplicação de medidas que afetam extensos grupos da sociedade. 5.2. Política Industrial e de Comércio Exterior O principal objetivo da política industrial é a promoção do desenvolvimento em bases democráticas. Para isso, lutamos por uma nova estratégia industrial que estimule o crescimento econômico e a modernização da estrutura industrial a partir do desenvolvimento social. Portanto, o principal desafio de uma nova estratégia industrial para o país é tornar compatíveis as necessidades presentes de reestruturação industrial com as necessidades de reversão das desigualdades sociais e regionais e de incorporação da grande massa de excluídos ao desenvolvimento. Isso implica encarar os trabalhadores de uma só vez como consumidores, produtores e cidadãos. 5.2.1. A elevação da renda dos trabalhadores e a redução das desigualdades regionais podem ser compatíveis com o objetivo de aumento da competitividade industrial 47 O governo usa duas versões para avaliar o problema da diminuição da qualidade dos empregos no Brasil. Oficialmente, nega que o problema exista, enfatiza mudanças na organização e modernização da economia. Na versão interna, mostra-se preocupado. Documento de 30 páginas intitulado "Emprego no Brasil -Diagnóstico e Políticas" do Ministério do Trabalho, "reservado para discussão no âmbito do governo", avalia que "a despeito dos direitos consagrados na CLT, está caindo o grau de proteção dos trabalhadores brasileiros, emblematizado pelo contrato formal de trabalho". Segundo o texto reservado, de março deste ano, "essas mudanças ocorrem no sentido inverso do que seria esperado de um padrão clássico de emprego gerado por um mercado de trabalho moderno, e que abriga seus participantes na rede de proteção social". Nas áreas metropolitanas abrangidas pela Pesquisa Mensal de Empregos do IBGE, a participação dos empregados com carteira no total dos trabalhadores caiu de 53,8%, no segundo trimestre de 91, para 46,9%, no quarto trimestre de 97. No mesmo período, a parcela dos sem-carteira e dos autônomos no total da PEA (População Economicamente Ativa) cresceu, respectivamente, de 20,8% para 24,6% e de quase 20% para 23,3%. Nos países desenvolvidos, a taxa de assalariamento urbana supera 4/5 da PEA. O mercado formal de trabalho do país está se desestruturando, como reconhece o texto do ministério. Estudo do economista Marcio Pochmann, diretor-executivo do Cesit (Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho) da Unicamp, constatou que, na década de 90, de cada 10 empregos criados, 8 são não assalariados. Das ocupações não assalariadas, a de empregador e a de conta própria foram as que mais cresceram. A partir de 1980, a participação relativa do emprego doméstico começou a aumentar. Em 1995, era equivalente à existente em 1950. Inverteu-se a tendência vigente no período 1940-1980, quando o Brasil deu seu salto de industrialização, em que 8 em cada 10 novas vagas eram assalariadas, sendo 7 com registro em carteira e 1 sem registro. As ocupações não assalariadas são em geral empregos de pior qualidade, com menor acesso a direitos como férias, 13º salário e descanso semanal remunerado. O arcabouço institucional que regula as relações trabalhistas está em xeque, tanto pela desestruturação do mercado "de carteira assinada" como por propostas que visam flexibilizar os contratos. Alguns especialistas atribuem o problema da precarização das relações trabalhistas no Brasil ao alto custo dos encargos incidentes sobre a folha de salário e às demissões. O negociador do Sindimaq de São Paulo (a associação sindical das empresas que produzem máquinas e equipamentos), Ariovaldo Lunardi, afirma que, nas reuniões com os trabalhadores, seu esforço tem sido para limitar os direitos e encargos, que, segundo ele, aumentam o custo do trabalho sem benefício para o trabalhador. "Pagamos 102% de encargos sobre a folha salarial, além do custo do salário. Esse pagamento não se destina ao trabalhador, mas a diversos fundos do governo e outros fins. Se o custo para formalização dos contratos fosse menor, haveria um incentivo a que mais trabalhadores fossem contratados." Direitos questionados Depois da aprovação do contrato de trabalho por tempo determinado pelo Congresso no início do ano, empresários questionam agora instituições como o descanso semanal remunerado e o pagamento adicional de horas extras. Do lado dos trabalhadores, o diretor técnico do Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos), Sérgio Mendonça, diz que o custo extra-salarial das firmas com obrigações trabalhistas é de apenas 25%. Acrescenta ainda que o peso da mão-de-obra no custo final dos produtos é baixo. No setor manufatureiro, segundo a Organização Internacional do Trabalho, o custo da mão-de-obra brasileira era em média de US$ 2,68 por hora, em 1993. Na Coréia do Sul era de US$ 4,93; nos EUA, US$ 16,40; e, na Alemanha, US$ 24,87. Além disso, há especialistas que não estão convencidos de que exista relação entre flexibilização do mercado de trabalho e aumento do número de empregos. Mendonça atribui as dificuldades na demanda de empregos à debilidade crescente do mercado interno. A Espanha criou 14 tipos de contratos especiais de trabalho, sem conseguir reduzir a taxa de desemprego, na casa dos 22%. Na Argentina, que também flexibilizou, o desemprego atingiu cerca de 17% da PEA. O presidente Carlos Menem ensaia agora uma "desflexibilização", com a oposição dos empresários e do FMI. 3.12 DESEMPREGO NO MUNDO (Do Livro: “Adeus ao Trabalho? – Ricardo Antunes, Cortez Editora, 1995, pág. 41 a 44) Observa-se, no universo do mundo do trabalho no capitalismo contemporâneo, uma múltipla processualidade: de um lado verificou-se uma desproletarização do trabalho industrial fabril, nos países de capitalismo avançados com maior ou menor repercussão em áreas industrializadas do Terceiro Mundo. Em outras palavras, houve uma diminuição da classe operária industrial tradicional. Mas, paralelamente, efetivou-se uma expressiva expansão do trabalho assalariado, a partir da enorme ampliação do assalariamento no setor de serviços; verificou-se uma significativa heterogeneização do trabalho, expressa também através da crescente incorporação do contingente feminino no mundo operário; vivencia-se também uma subproletarização intensificada, presente na expansão do trabalho parcial, temporário, precário, subcontratado, “terceirizado”, que marca a sociedade dual no capitalismo avançado, da qual os gastarbeiters na Alemanha e o lavoro nero na Itália são exemplos do enorme contingente de trabalho imigrante que se dirige para o chamado Primeiro Mundo, em busca do que ainda permanece do welfare state, invertendo o fluxo migratório de décadas anteriores, que era do centro para a periferia. O mais brutal resultado dessas transformações é a expansão, sem precedentes na era moderna, do desemprego estrutural, que atinge o mundo em escala global. Pode-se dizer, de maneira sintética, que há uma processualidade contraditória que, de 50 um lado, reduz o operariado industrial e fabril; de outro, aumenta o subproletariado, o trabalho precário e o assalariamento no setor de serviços. Incorpora o trabalho feminino e exclui os mais jovens e os mais velhos. Há, portanto, um processo de maior heterogeneização fragmentação e complexificação da classe trabalhadora. Comecemos pela questão da desproletarização do trabalho fabril, industrial. Na França, em 1962, o contingente operário era de 7,488 milhões. Em 1975, esse número chegou a 8,118 milhões e em 1989 reduziu-se para 7,121 milhões. Enquanto em 1962 ele representava 39% da população ativa, em 1989 esse índice baixou para 29,6% (dados extraídos notadamente de Economie et Statistiques, L’INSEE, in Bihr, 1990; ver também Bihr, 1991: 87-108)......... A diminuição do operariado industrial também se efetivou na Itália, onde pouco mais de um milhão de postos de trabalho foram eliminados, havendo uma redução da ocupação dos trabalhadores na indústria, de 40% em 1980, para pouco mais de 30%, em 1990 (Stuppini, 1991;50). Outro autor,...lembra que projeções do empresariado japonês apontam como objetivo “eliminar completamente o trabalho manual da indústria japonesa até o final do século. Ainda que possa haver nisto certo ufanismo, a exposição deste objetivo deve ser levada a sério” (Schaff, 1990:28) Pode-se dizer que nos principais países industrializados da Europa Ocidental, os efetivos de trabalhadores ocupados na indústria representavam cerca de 40% da população ativa no começo dos anos 40. Hoje, sua proporção se situa próxima dos 30%. Calcula-se que baixará a 20 ou 25% no começo dos próximo século (Gorz, 1990 a e 1990b). Esses dados e tendências evidenciam uma nítida redução do proletariado fabril, industrial, manual, especialmente nos países de capitalismo avançado, quer em decorrência do quadro recessivo, quer em função da automação, da robótica e da microeletrônica, gerando uma monumental taxa de desemprego estrutural. Paralelamente a essa tendência, há outra também extremamente significativa, dada pela subproletarização do trabalho, presente nas formas de trabalho precário, parcial, temporário, subcontratado, “terceirizado”, vinculados à “economia informal”, entre tantas modalidades existentes. A título de exemplo: na França, enquanto houve uma redução de 501 mil empregos por tempo completo, entre 1982 e 1988 deu-se, no mesmo período, o aumento de 111 mil empregos em tempo parcial (Bihr, 1990), em ouro estudo, o mesmo autor acrescenta que essa forma de trabalho “atípica’ não pára de se desenvolver depois da crise: entre 1982 e 1986, o número de assalariados em tempo parcial aumentou em 21,35% (Birh, 1991: 88-89). Em 1988, diz outra autora, 23,2% dos assalariados da Comunidade Econômica Européia eram empregados em tempo parcial ou em trabalho temporário (Stuppini, 1991: 51). Na mesma direção segue este relato: “A atual tendência dos mercados de trabalho é reduzir o número de trabalhadores “centrais” e empregar cada vez mais uma força de trabalho que entra facilmente e é demitida sem custos ... Na Inglaterra, os ‘trabahadores flexíveis” aumentaram em 16%, alcançando 8,1 milhões entre 1981 e 1985, enquanto os empregos permanentes caíram em 6%, ficando em 15,6 milhões... Mais ou menos no mesmo período, cerca de um terço dos dez milhões de novos empregos criados no EUA estavam na categoria ‘temporário’” (Harvey, 1992:144)..... 3.13 EXEMPLOS DE REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA 1 - EMPRESA CRIA CONDOMÍNIO DE FORNECEDORES Arthur Pereira Filho Jornal “Folha de São Paulo”, domingo, 8 de outubro de 1995 Com a redução dos estoques e a racionalização do processo de produção, a Ford vai liberar, em sua fábrica de São Bernardo, 77 mil metros quadrados de área construída, de um total de 382 mil metros quadrados. Essa sobra de espaço permitirá a introdução da maior novidade no processo de reestruturação da produção da empresa. É o que a Ford está chamando de “condomínio industrial”. Alguns dos principais fornecedores vão se instalar no interior da fábrica, em galpões que eram usados para estocar peças e para montagem de outros modelos. O condomínio de fornecedores da Ford pode ser considerado um subproduto do chamado “modelo López”. O sistema recebeu esse nome por ter sido inicialmente idealizado pelo vice-presidente mundial da volkswagen, José Ignacio López de Arriortúa. Uma de suas características é a presença do fornecedor no interior da fábrica, entregando conjuntos de peças na linha de montagem. A Ford vai alugar os galpões a alguns de seus fornecedores. Eles vão receber peças de subfornecedores, farão a montagem do conjunto dentro da fábrica e o entregarão na linha de montagem no momento programado. Sem necessidade da manutenção de estoques elevados. “No início da produção, em abril de 96, esperamos contar com três ou quatro empresas já instaladas”, diz Ferran. “Mas temos espaço para pelo menos dez.” Ferran não revela o nome dos fornecedores que deverão entrar nesse sistema. Eles vão entregar os conjuntos já montados e negociar prazos e preços com os subfornecedores. "Os fabricantes de suspensão e pedaleira é quase certo que virão”, afirma Ferran. ------------------ Outra inovação importante é a terceirização do trabalho de pintura dos veículos. “Vamos entregar a operação da cabine de pintura para o fornecedor. Ele fará todo o serviço de preparação da tinta. Não haverá funcionários da Ford na operação", conta Carlos Augusto Marino, diretor de relações trabalhistas da Ford. 51 Como o fornecedor da tinta vai trabalhar diretamente na linha de montagem, Ferran prefere ser cauteloso. Diz que nada está definido e que o sistema está em testes. "Vamos produzir 70 veículos por hora. E nesse ritmo não há margem para erro." Mas Luiz Marinho, 35, vice-presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, confirma que já existe um acordo fechado entre sindicato, Ford e a Renner, empresa que vai fornecer e preparar a tinta. "A Renner vai ficar responsável pelo processo e os 25 funcionários do setor serão transferidos para a empresa.” -------- Ferran conta que a Ford terá uma grande arma para conquistar o consumidor a partir do lançamento do Fiesta. A montadora vai entregar o carro por encomenda: “Vamos garantir a entrega do carro encomendado em, no máximo, 60 dias”. E o objetivo final é chegar a 15 dias. “Ninguém faz isso no mundo ainda.” A entrega do carro por encomenda, na data combinada com o comprador, envolve, diz Ferran, um grande esforço logístico. Toda a cadeia de fornecedores precisa entregar peças e componentes no momento exato em que o carro está passando na linha de montagem. "É o que chamamos internamente de entrega serializada." O fornecedor vai produzir uma peça para um carro específico, já encomendado pelo cliente. Ferran conta que a automação da montagem do Fiesta vai permitir que versões diferentes dos modelos sejam produzidas em uma mesma seqüência, sem necessidade de qualquer mudança no equipamento. “Será possível até montar um carro de duas portas e, em seguida, um de quatro portas”, explica. 2 - FÁBRICA DA GM TERÁ FORNECEDOR EM MÓDULO Arthur Pereira Filho A GM decidiu implantar o sistema modular para produzir automóveis na nova fábrica a ser construída na região metropolitana de Porto Alegre a partir deste ano. Os dez principais fornecedores da nova linha de montagem vão se instalar dentro da fábrica para produzir conjuntos de componentes para o novo carro da GM - um “popular" que deve chegar ao mercado 20% mais barato do que os modelos atuais. O projeto foi batizado internamente como "Arara Azul”. Esse grupo de fornecedores de sistemas estará dividido em cerca de 12 a 14 módulos. Serão responsáveis por cerca de 70% dos componentes do veículo. É o que a montadora chama de "condomínio industrial", uma adaptação para os automóveis do consórcio modular usado pela fábrica de caminhões de Resende (RJ), da Volkswagen. O restante será feito da forma tradicional: as peças serão compradas junto a cerca de 90 fornecedores externos e montadas na linha de produção. A nova fábrica da GM terá perto de cem fornecedores diretos, cerca de 25% do total utilizado em uma fábrica tradicional, como a unidade da GM de São José dos Campos (SP), onde é montado o Corsa. A escolha dos fornecedores que ocuparão os módulos no interior da fábrica começou há dez meses e está em sua fase final. As empresas que entraram na concorrência tiveram que atender a uma exigência da montadora: participar do design do produto que se dispunham a fornecer. A GM exigiu ainda preços e peso dos componentes pelo menos 20% menores do que os existentes hoje para o Corsa. O novo carro será menor e menos sofisticado do que o atual Corsa "popular". Os fornecedores que ocuparem os módulos terão as mesmas vantagens fiscais oferecidas pelo governo do Rio Grande do Sul à GM. Além disso, o contrato de fornecimento vale durante toda a vida do modelo: enquanto a GM continuar produzindo o carro, os fornecedores serão os mesmos. A GM fala em produzir 150 mil carros por ano em Porto Alegre. Mas mesmo os fornecedores mais conservadores fizeram a sua proposta de preço com a perspectiva de uma produção mínima de 200 mil carros/ano. Caso a GM decida transformar o seu minicarro em um produto mundial - passaria a ser montado em alguns países da África e Ásia -, os fornecedores terão garantido contrato de venda também para as demais fábricas. 3 - GM DECIDE TERCEIRIZAR PRODUÇÃO DE BANCOS ATÉ O FIM DO SEMESTRE (Jornal “Folha de São Paulo, 25 de fevereiro de 1997) A General Motors decidiu terceirizar a fabricação dos bancos usados no Corsa e demais modelos da marca. Até o final do primeiro semestre deste ano eles deixam de ser montados pelos funcionários da empresa nas unidades de São Caetano e São José dos Campos. O kit completo - dois bancos dianteiros e o banco traseiro - será fornecido pronto para ser instalado nos carros pela filial brasileira da empresa norte-americana Johnson Controls, uma das líderes mundiais na produção de interiores de veículos - além dos bancos, fabrica painéis, tetos, maçanetas etc. A Johnson venceu a concorrência com a Lear, outra gigante norte-americana do setor, que fornece 2.000 kits por dia para toda a linha da Fiat, em Betim (MG) e 70% dos bancos usados pela Volkswagen na fábrica da Anchieta, em São Bernardo. As duas empresas estão desde 95 no Brasil e repetem aqui a disputa que vêm mantendo desde os anos 80 pela liderança mundial do segmento. Nem a GM nem a Johnson confirmam oficialmente a assinatura do contrato. Mas fornecedores de componentes para a montagem dos bancos, que negociavam até agora com a montadora, já foram comunicados da mudança: a partir de agora terão de fornecer peças diretamente para a Johnson. 52
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