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Direito Processual Penal, Notas de estudo de Direito Processual Penal

Apostila de processo penal

Tipologia: Notas de estudo

Antes de 2010

Compartilhado em 14/09/2009

milla-guimaraes-9
milla-guimaraes-9 🇧🇷

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Baixe Direito Processual Penal e outras Notas de estudo em PDF para Direito Processual Penal, somente na Docsity! www.RESUMOSCONCURSOS.HPG.COM.BR Apostila: Direito Processual Penal —- por Guilherme Tocha Apostila de Direito Processual Penal Assunto: APOSTILA DE DIREITO PROCESSUAL PENAL Autor: GUILHERME TOCHA www.RESUMOSCONCURSOS.HPG.COM.BR Apostila: Direito Processual Penal —- por Guilherme Tocha > assim, surge entre o réu e o Estado um conflito de interesses qualificado por uma pretensão (exercer o Estado sua pretensão punitiva) resistida (conferida pelo réu em defesa de seu jus libertatis), conflito este que se denomina de lide ou litígio; > para solucionar o conflito, caberá ao Estado-juiz determinar a quem cabe razão, vale dizer, decidir se é o Estado, para exercer sua pretensão punitiva, ou o réu, que deseja continuar em seu jus libertatis. A lide ou litígio que se instaura entre Estado e acusado deve se desenrolar por uma série de atos coordenados entre si que tendem para um fim, a solução ou composição do conflito, determinando o Estado-juiz, de uma vez por todas, qual direito (de punir ou de liberdade) deve, ao final, imperar. A esse conjunto de atos coordenados chama-se processo. Na verdade, o conceito de lide e de processo é único, haja vista que a jurisdição é una (quanto a isso os processualistas civis e penalistas não parecem discordar), mas, para efeitos de organização judiciária e para melhor da prossecução da justiça é que se divide o litígio em cível e penal, e o processo, por conseguinte, em cível e penal. O processo penal é a fórmula encontrada pelos Estados para comporem lides de natureza criminal. 2. Direito Processual Penal 2.1. Conceito Tomando por base as informações até aqui levantadas, poder-se-á definir lapidarmente o Direito Processual Penal como o ramo jurídico que estuda o conjunto de princípios e normas acerca da aplicação jurisdicional do Direito Penal material. Autonomia: Não se discute a autonomia do Direito Processual Penal, porquanto possui objeto, normas e princípios próprios, características mestras que fazem um ramo possuir a própria identidade dentro da dogmática jurídica. Com efeito, se bem que só se fala em Direito Processual Penal se, quando e por conta da existência do Direito Penal, não menos certo é que este último não teria qualquer aspecto de funcionalidade enquanto não pudesse ser efetivamente aplicado aos casos concretos levados a composição pelo Estado-juiz. Imstrumentalidade: O Direito Processual Penal é instrumental, à medida que ele é o meio de que se utiliza o Estado para tirar da inércia o Direito Penal, fazendo-o atuar efetivamente, e aplicá-lo na prática. Einalidade: A finalidade a que se propõe o Direito Processual Penal, tendo-se em conta notadamente seu caráter eminentemente prático, é o de tornar efetivo, real, atuante, perceptível empiricamente, o Direito Penal, a fim de compor a lide penal que se instaura e que deve ser solucionada. www.RESUMOSCONCURSOS.HPG.COM.BR Apostila: Direito Processual Penal —- por Guilherme Tocha Do oemóduio PRINCÍPIOS DO DIREITO PROCESSUAL PENAL 1. Generalidades Este é um tema da mais alta relevância dentro do Direito Processual Penal, sem o qual nada em nossa matéria tem sentido ou aplicação, ou, se o tiver, com toda a certeza o processo não se coadunará com todo o espírito do ordenamento jurídico de um Estado Democrático de Direito. Somente com a obediência a todos os princípios abaixo assinalados é que se poderá falar em “devido processo legal”, cuja transgressão a qualquer um deles poderá ensejar, como quotidianamente enseja, a aplicação de regras das quais, p. ex., confere-se a liberdade do cidadão (ainda que provisória, como no caso de quem é injustamente preso, por coação ilegal ou violência infundamentada de quem quer que seja, mormente quando se trata de abuso de autoridade ou coação ilícita contra a liberdade de ir, vir e ficar, o que poderá acarretar no ajuizamento de habeas corpus), ou a nulidade de certos atos. Sem o estudo aprofundado e acurado dos princípios que regem o processo penal de nada adiantará estudar os demais assuntos que se alastram no transcorrer do curso, por um simples motivo: todo o processo penal respalda-se, de uma maneira direta ou indireta, no conhecimento dos princípios que o regem, e isso é facilmente corroborado à medida que em cada assunto os doutrinadores fazem amiúde referência a algum princípio do processo penal. Ver-se-á, entretanto, que os princípios não são absolutos — como quase nada em Direito, por sinal —, de forma que vez ou outra, por força de mandamento constitucional ou mesmo infraconstitucional (mas com o aval da Carta Magna), admitem-se exceções, consoante veremos. 2. Dos Princípios em Espécie Seria deveras errôneo concluir-se que, em vista dos inúmeros princípios de que se deve valer o aplicador da lei, ele poderá, a seu talante, escolher este ou aquele. Com efeito, os princípios que regem o Direito Processual Penal não se contradizem, antes, complementam-se, a não ser, é claro, no que pertine aos princípios peculiares de institutos que, pela sua própria natureza e finalidade, não podem de maneira alguma seguir a todo o tempo a integralidade dos princípios. Alguns institutos processuais penais, aliás, nem sequer podem seguir todos os princípios, mas apenas aqueles que lhe conferem validade e praticidade, como ocorre, e. g., com a ação penal pública, em que regem os princípio da obrigatoriedade e da indisponibilidade, em contraposição aos da conveniência e da disponibilidade da ação penal privada. www.RESUMOSCONCURSOS.HPG.COM.BR Apostila: Direito Processual Penal —- por Guilherme Tocha Afora casos como de tais, então, o operador do Direito Processual Penal deverá modelar sua atividade de acordo com o conjunto de todos os princípios que se seguem. 2.1. Verdade Real Pelo princípio da verdade real o processo penal, ao contrário do cível, não deve encontrar artificialismos ou formalismos capazes de criar óbices ao conhecimento cabal e verdadeiro do fato, da autoria e de todas as circunstâncias, tais quais eles realmente ocorreram. Donde porque, com a verdade real, o Direito Processual Penal tende a preferir o primado da justiça sobre qualquer elemento ou dado que, pela sua superficialidade formal, possa obstruir a consecução da justiça. Procura-se, pois, averiguar cada caso concreto por meio da apuração da verdade, não da presunção dela. Veja-se, p. ex., que, no processo cível, o réu que deixar de contestar a exordial ou admiti-la em todos os seus termos sucumbirá, visto que tudo o que fora alegado na petição será considerado, por presunção, verdadeiro. O mesmo não ocorre no processo penal, em que, p. ex., o fato de uma pessoa entregar-se à autoridade policial, dizendo-se autora de determinado delito cuja autoria era até então desconhecida não significará que, com certeza, ela será condenada por aquele crime, pois que pode ser que ela esteja faltando com a verdade (para acobertar alguém, por exemplo). Sua “confissão” não gera presunção de verdade (como ocorreria no processo cível), mas apenas, quando muito, uma suspeita de que fora ela mesma quem praticou a infração penal. Veja-se, p. ex., o princípio da verdade real sendo aplicado quando o juiz, independentemente da iniciativa de qualquer das partes, de ofício ordena a execução de determinada diligência, a fim de que ele consiga obter a verdade, nada mais que a verdade. Mesmo diante dos fatos incontroversos pelas partes (isto é, as partes da lide penal não divergem a respeito de um fato) o juiz poderá, não satisfeito com o que tem diante do processo (ausência de contestação por qualquer das partes), ordenar diligências. Mesmo quando o Ministério Público pede a absolvição é possível que o Juiz, analisando que, in casu, cabe legitimidade ao Estado de fazer valer sua pretensão punitiva, poderá condenar o réu (art. 385 do Código de Processo Penal). O princípio da verdade real não é absoluto. Tenha-se em mira, e. g., a sentença absolutória transitada em julgado, que não pode ser mais “desfeita” (tecnicamente, rescindida, modificada) mesmo que sejam apresentadas as mais irrefutáveis provas contra o réu. Quer dizer, a regra processual penal de caráter formal de que a sentença absolutória transitada em julgado não pode ser rescindida, aqui, constitui uma das exceções ao princípio em tela. Diga-se o mesmo, também, na causa extintiva de punibilidade da perempção, que se faz presente mesmo quando há provas conclusivas acerca da materialidade do fato e da sua respectiva autoria: por melhor que seja a redação da queixa-crime, por melhores e mais incontestáveis que sejam as provas nela acostadas, a ausência de pedido de condenação ou de citação do réu gera extinção da punibilidade, nos termos dos arts. 107, IV, in fine, do CP, e 60 do Código de Processo Penal. www.RESUMOSCONCURSOS.HPG.COM.BR Apostila: Direito Processual Penal —- por Guilherme Tocha 2.4 Igualdade das Partes (CF/88, art. 5º, LV) Por este princípio, decorrente diretamente do contraditório, as partes encontram-se, em juízo, em pé de igualdade, de forma que elas exercem e suportam idênticos direitos, ônus, obrigações e faculdades. As partes são, pois, iguais, de forma que nenhuma é mais importante que a outra, ou merecedora de mais ou menos direitos que a outra. No entanto, esse princípio não é absoluto, e deve ficar em posição hierárquica inferior ao princípio do favor rei, pelo qual no conflito entre o jus puniendi e o jus libertatis, a balança da justiça deve inclinar-se em favor deste último. Daí porque em excepcionais ocasiões o Direito Processual Penal prevê ao réu prerrogativas processuais não concedidas à acusação, como se vê, p. ex., no instituto do recurso do protesto por novo júri, dos embargos infringentes, dos embargos de nulidade e da revisão criminal, todos exclusivos da defesa, e o princípio do non reformatio in pejus, pelo qual não se pode reformar uma decisão em desvantagem ao que foi postulado, em sede recursal, pela defesa (a não ser, evidentemente, que a nova decisão se lastreie em recurso da acusação, o que não significa de modo algum uma exceção ao princípio, senão uma decisão que nega provimento ao recurso da defesa e o dá ao da acusação). 2.5 Livre Convencimento (CPP, art. 157) Partindo da premissa de que o processo, e o que nele consta, é o mundo para o juiz, impede-se, pelo princípio do livre convencimento, que ele possa julgar extra-autos, isto é, não pode julgar baseado naquilo que ele tomou conhecimento fora do processo: Quod non est in actis est in hoc mundo (o que não estiver dentro do processo é como se não existisse). Diz-se, que, assim, evita-se de se tomarem decisões parciais. Pelo mesmo princípio advém a norma (art. 157 do Código de Processo Penal) de que “o juiz formará sua convicção pela livre convicção da prova”, quer dizer, ele não está atrelado, em sua decisão, a julgar desta ou daquela forma, segundo esta ou aquela prova, tanto sendo assim que ele pode, até, não considerar todas as provas, ou considerá-las todas mas de forma que algumas tenham maior peso de convicção da verdade real que as demais. Aliás, observe-se o disposto no art. 182 do diploma processual penal. Atente-se, por derradeiro, que o princípio do livre convencimento — ou livre convencimento motivado, ou ainda, da persuasão racional do juiz — não é absoluto — embora seja a regra geral nas provas do processo penal —, sendo que há incidentes de convicção íntima (em que o julgador não precisa fundamentar sua decisão), como sói ocorrer nas decisões do Júri (os jurados são juízes de fato), nas quais, a propósito, os jurados não apenas não precisam como mesmo não podem juridicamente fundamentá- las. 10 www.RESUMOSCONCURSOS.HPG.COM.BR Apostila: Direito Processual Penal —- por Guilherme Tocha Outra exceção ao princípio do livre convencimento é o sistema das provas legais, em que o legislador já determinou, em normas de processo penal, quais provas prevalecem: é o que ocorre nos crimes que deixam vestígios (delicta non transeunctis), nos quais se exige exame de corpo de delito direto (perícias), não podendo supri-lo a prova testemunhal, nem sequer a própria confissão do acusado. 2.6 Publicidade (CF/88, arts. 5º, LV, 93, IX; CPP, art. 792) A regra — aliás, com força imperativa constitucional — é a de que todos os atos processuais são públicos, não devendo sofrer qualquer espécie de restrição ou censura. Isso tem a sua razão de ser: como o sistema processual penal brasileiro é o acusatório, em que os direitos humanos (ao menos em tese...) são salvaguardados, razão não há — ao contrário do que ocorre no sistema inquisitivo, repudiado nas legislações dos povos civilizados — para que o processo penal e o seu desenrolar fiquem às escondidas, longe dos olhos da sociedade (exatamente quem tem mais interesse na fiscalização do andamento de seus interesses, entre eles o da correta e justa aplicação da lei penal à espécie fática). Logo, o processo não é nem deve ser, via de regra, sigiloso. O princípio da publicidade não é absoluto, e de fato nem poderia, pois a publicidade sem limites, e sem exceções acarretaria, decerto, sérios problemas à pessoa do acusado ou da vítima, a depender do caso concreto (imagine-se, e. g., dar-se a mais ampla publicidade a uma vítima de estupro). Daí porque, tendo em vista determinados valores, que devem reinar sobre a publicidade, a Carta Política traçou genericamente os seus limites, determinando que a lei deverá restringir a publicidade dos atos processuais “quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem” (art. 5º, LV). Também se fazem ressalvas à publicidade, secundando-a quando estiver em jogo o interesse público e a segurança da sociedade e do Estado. Vejam-se outras exceções nos arts. 217, 792, 8 2º, 476, 481 e 482, todos do Código de Processo Penal brasileiro. O inquérito policial, como teremos ainda oportunidade de observar, é inquisitório, e como tal é intrinsecamente sigiloso. No entanto, afirmemos desde já, o inquérito policial, primeira fase da persecução criminal, não é e nem faz parte processo penal (tecnicamente falando), de modo que não faltamos com a verdade quando dizemos que o processo penal brasileiro é eminentemente (embora não absolutamente) público. 2.7. Obrigatoriedade (CPP, aris. 5º e 24) Mediante tal princípio, nos crimes que se apurem por meio de ação penal pública — condicionada ou incondicionada — a autoridade policial, tomando deles conhecimento, deve instaurar inquérito policial de ofício (art. 5º do Código de Processo Penal); e o órgão do Ministério Público, tomando deles conhecimento, deverá promover, pela denúncia, a ação penal (art. 24 do mesmo diploma). q www.RESUMOSCONCURSOS.HPG.COM.BR Apostila: Direito Processual Penal —- por Guilherme Tocha Em síntese: os crimes, quanto à ação penal a ser promovida, ou são de ação penal pública, ou de ação penal privada (é a lei penal quem determina isso, seja silenciando, seja fazendo expressiva alusão à necessidade de queixa-crime ou de representação). Os segundos, porque são da alçada privada, são de titularidade exclusiva do ofendido ou de seu representante legal, e eles oferecem a queixa-crime se lhe convierem, vale dizer, o titular da ação penal privada oferece a queixa-crime (peça inicial desta espécie de ação penal) se quiser, não tendo obrigatoriedade para tal, porque o interesse na persecução penal pertencerá, tão-somente, a ele, e não à sociedade. Os crimes de ação penal pública, no entanto, ensejam o interesse público de que sejam devidamente apurados, de modo que não pode a autoridade policial, ao deles tomar conhecimento, deixar de instaurar inquérito policial (embora se alegue, vez ou outra, que não seja bem isso o que ocorre na prática); e ao representante do Ministério Público não cabe “querer ou não querer” oferecer a denúncia (peça em que se consubstancia a ação penal pública), sendo que, antes, ele simplesmente tem de oferecê-la. E se a autoridade policial deixar de instaurar o inquérito policial, ou o representante do Ministério Público deixar de oferecer a denúncia? A depender do caso concreto, poderão eventualmente responder por crime de concussão (art. 316, caput, do CP), de corrupção passiva (art. 317 do CP) ou de prevaricação (art. 319 do CP). Doutrinadores da estirpe de Fernando da Costa Tourinho Filho e Julio Fabbrini Mirabete têm dito que o princípio da obrigatoriedade não oferece exceção alguma, mas uma “mitigação” (abrandamento), nos termos do que dispõem os arts. 74 e 76 da Lei n.º 9.099/95, permitindo-se a composição e a transação penais anteriores ao oferecimento da denúncia. Fala-se, então, nas infrações penais de menor potencial ofensivo, em discricionariedade regrada: o Ministério Público pode, desde que atendidas certas condições, deixar de oferecer a denúncia. 2.8 Indisponibilidade (CPP, arts. 17, 42 e 576) Esse princípio muito se assemelha ao que acabamos de tratar, mas com ele não se confunde. Pelo princípio da obrigatoriedade, vimos, a autoridade policial, ao tomar conhecimento do cometimento de fato delituoso que se apura mediante ação penal pública, deverá instaurar o respectivo inquérito policial (art. 5º do CPP), e o órgão do Ministério Público, na mesma hipótese, deverá oferecer a denúncia, a peça inicial da ação penal pública (art. 24 do CPP). Assim, o princípio da obrigatoriedade diz respeito a momento anterior ao inquérito e à denúncia, impondo que sejam levados a cabo pela autoridade a quem cabe cada um desses atos. Pelo princípio da indisponibilidade, em seu turno, o inquérito policial já instaurado não poderá ser arquivado de ofício pela autoridade policial (art. 17 do CPP), e o órgão do Ministério Público, por sua vez, não poderá desistir da denúncia já oferecida (art. 42 do CPP), nem do recurso já interposto (art. 576 do CPP). 12 www.RESUMOSCONCURSOS.HPG.COM.BR Apostila: Direito Processual Penal —- por Guilherme Tocha palavras, o juiz não pode julgar extra petitum (objeto estranho ao que lhe foi pedido) ou ultra petitum (a mais do que se o pediu daquele objeto). O ne eat judex ultra petita partium decorre do ne procedat judex ex officio. Por sinal, aquele princípio está muito bem explicitado nos arts. 128 e 460 do Código de Processo Civil. No entanto, nada obsta que o magistrado, a quem se confere o poder de dizer o direito (narra mihi factum dabo tibi jus — dai-me o fato que lhe darei o direito), possa desclassificar a infração para outra, ainda que mais grave que a que consta da peça acusatória, desde que tenha se constatado que o delito ao qual ele dá nova classificação ele julgar ter realmente ocorrido. Isso pode dar-se de duas formas: ou a acusação narra um fato na peça vestibular (denúncia ou queixa) que realmente tenha ocorrido (segundo entendimento do juiz, lembremos), mas, no pedido de condenação, tenha-o imputado com nomen juris diverso (ex.: ocorrera um roubo, e o Promotor de Justiça descreve que o fato dera-se com subtração mediante grave ameaça, mas vem a pedir a condenação por furto); ou, somente após o oferecimento da peça acusatória, no transcorrer da instrução criminal, é que se apurou ter ocorrido outro delito diverso daquele ao qual o réu fora imputado de ter cometido (ex.: tudo levava a crer, até o momento da denúncia, ter havido realmente um simples furto, mas, por meio de diligências posteriores, o juiz descobre que o réu utilizou-se de grave ameaça). No primeiro caso, aplica-se a regra do art. 383 do Código de Processo Penal (emendatio libelli); no segundo, a do art. 384, caput, do mesmo diploma (mutatio libelli). O que o juiz não pode, sob pena de estar julgando extra petitum é, p. ex., condenar por estupro quando na denúncia pede-se a condenação por furto que não ocorrera (até porque a titularidade da ação penal do estupro é do ofendido ou de seu representante legal). Segundo Fernando da Costa Tourinho Filho, a única exceção do Código de Processo Penal brasileiro ao princípio do ne et judex ultra petita partium está no art. 408, 8 4º (“o juiz não ficará adstrito à classificação do crime feita na denúncia ou queixa, embora fique o réu sujeito à pena mais grave, atendido, se for o caso, o disposto no art. 410 e seu parágrafo”). 2.12 Juiz Natural (CF/88, art. 5º, XXXVII e LILI) Este princípio tem fundamento constitucional no art. 5º, XXXVII (“não haverá juízo ou tribunal de exceção”). Significa que nenhuma lei poderá sob hipótese alguma criar órgão jurisdicional ou designar magistrados especiais para julgarem um caso isolado. Quer dizer, dado um fato, o órgão ou o juiz incumbido de o julgar já deve estar previamente previsto para aquele desiderato. E constitucionalmente vedado, portanto, criação ou designação de órgão ou tribunal após o fato. Além do mais, “ninguém será processado 15 www.RESUMOSCONCURSOS.HPG.COM.BR Apostila: Direito Processual Penal —- por Guilherme Tocha nem sentenciado senão pela autoridade competente” (art. 5º, LIII, da CF/88), o que quer dizer que a cada espécie de fatos cabem processo e julgamento a um órgão competente. Lembram os autores que não ofendem o princípio do juiz natural as modificações de competência, as substituições, o desaforamento e a prorrogação de competência previstas em lei. Inobstante o temos citado no rol dos princípios do processo penal, em verdade e de fato ele não subsiste, ao menos no processo brasileiro. Segundo o princípio, num mesmo processo só poderia atuar um único e só juiz, não se permitindo a sua substituição por outro: o juiz que pratica um ato de um processo necessariamente deverá ser o mesmo para todo o desenrolar do mesmo, nos limites de sua competência. Não é princípio do Direito Processual Penal brasileiro, e não foi consagrado, sequer, pelo art. 538, 8 2º, do Código de Processo Penal brasileiro, tendo em vista que o dispositivo trata do juiz como “órgão jurisdicional”, em caráter impessoal, portanto, pouco importando a pessoa física do juiz. 2.13 Devido Processo Legal (CF/88, art. 5º, LIV) A CF/88, seguinte a esteira da Emenda V da Constituição norte-americana (no person shall be... deprived of life, liberty or property without due process of law), dispõe, em seu art. 5º, LIV, que “ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”. Segundo Eduardo Couture, “em última análise, o due process of law consiste no direito de não ser privado da liberdade e de seus bens, sem a garantia que supõe a tramitação de um processo desenvolvido na forma que estabelece a lei”. Desse princípio decorrem vários outros, como o do contraditório, igualdade das partes, imparcialidade do juiz, juiz natural, iniciativa das partes, oficialidade e da inadmissibilidade das provas obtidas ilicitamente. A afronta ao princípio pode acarretar nulidade do processo (consequência mais comum) e até mesmo constituir-se em fundamento para impetração de habeas corpus, por exemplo. Não há exceções ao princípio, e nem mesmo a prisão provisória, cautelar, processual, constitui exceção ou ofensa a ele, contanto que sejam observadas as formas tais quais devem ser obedecidas para a consecução da prisão. 2.14 Oficialidade (CF/88, arts. 128, le Il, 129, 1, e 144; CPP, arts. 4º ess.) Pelo princípio da oficialidade, os órgão encarregados de empreender a persecutio criminis são oficiais com autoridade para deduzirem a pretensão punitiva in abstracto. Assim é que a apuração das infrações penais cabe à Polícia (art. 144 da CF/88; arts. 4º a 23 do Código de Processo Penal), e a ação penal é oferecida pelo Ministério Público (arts. 128, | 16 www.RESUMOSCONCURSOS.HPG.COM.BR Apostila: Direito Processual Penal —- por Guilherme Tocha e ll, e 129, |, da CF/88; arts. 24 e ss. do CP). Logo, cabem a órgãos oficiais estatais promoverem a persecutio criminis in judictio. A chamada “ação penal popular”, que possibilita a iniciativa de qualquer do povo para oferecer ação penal por crime de responsabilidade do Presidente da República e do Procurador-Geral da República, insculpida no art. 41 da Lei n.º 1.079/50, não tem mais sua razão de ser (o dispositivo está tacitamente revogado pelo art. 129, |, da CF/88). A exceção ao princípio está na ação penal privada (daí porque dizer-se que, com relação à ação penal, o princípio da oficialidade somente é absoluto quanto à ação pública). Na ação privada, a titularidade não é do Ministério Público, mas muito pelo contrário: cabe ao ofendido ou ao seu representante legal promover a ação penal privada, particulares e não autoridades, por conseguinte. 2.15 Inadmissibilidade das Provas Obtidas Ilicitamente (CF/88, art. 5º, LVI) No processo penal, são proibidas as chamadas provas proibidas. As provas proibidas são de suas espécies: ilegítimas e ilícitas. Entre ambas há nítida distinção: as primeiras, provas ilegítimas, são aquelas obtidas com afronta a preceito de legislação processual, isto é, violação do Direito Penal formal; as provas ilícitas, por sua vez, são as que são conseguidas com violação a norma de Direito Penal material, ou seja, são obtidas por meio criminoso ou contravencional. Em todo o mundo, a única Constituição que proíbe taxativamente a obtenção ilícita de provas é a brasileira (art. 5º, Vl). Assim, mesmo que o que se conseguiu apurar seja prova cabal da existência de uma infração penal e da autoria da mesma, se tal se deu ilicitamente, como por meio de tortura (violação a disposições da Lei n.º 9.455/97), microgravadores dissimulados, interceptação telefônica desautorizada (afronta à Lei n.º 9.296/96), fotografias da vida íntima da pessoa, detector de mentiras sem que a pessoa permita, etc., não é admissível em juízo, vale dizer, não pode ser usado pela acusação, ainda que isso enseje (e realmente ensejará) a impunidade do indiciado ou do réu. Também são consideradas ilícitas aquelas obtidas por derivação (teoria norte-americana das fruits of the poisonous tree), quando, por exemplo, a Polícia obtém do acusado, mediante tortura, a confissão de onde está depositada a droga, e até lá se dirige e, preenchendo todas as formalidades legais, apreende o entorpecente — embora a apreensão seja em si lícita, ela decorreu de origem ilícita, e ilícita também, pois, deve ser a primeira considerada, e rechaçada em juízo. Isso porque, entre o desrespeito à Constituição Federal e a impunidade, preferir-se-á esta. Todavia, arrimada no princípio do favor rei, existe forte corrente doutrinária e jurisprudencial no sentido de admitir as provas ilícitas desde que favoráveis à defesa. Isso tem sua razão de ser, muito lógica e plausível: se a prova, ainda que insofismável, da existência do crime e da sua autoria, é inadmissível, absolvendo-se o réu, com muito maior razão não se punirá quem, sendo inocente, prova-a, ainda que com o emprego de 17 www.RESUMOSCONCURSOS.HPG.COM.BR Apostila: Direito Processual Penal —- por Guilherme Tocha Doo oemóduio INQUÉRITO POLICIAL Código de Processo Penal, arts. 4º até 23: “Art. 4º. A polícia judiciária será exercida pelas autoridades policiais no território de suas respectivas circunscrições e terá por fim a apuração das infrações penais e da sua autoria. Parágrafo único. A competência definida neste artigo não excluirá a de autoridades administrativas, a quem por lei seja cometida a mesma função. Art. 5º. Nos crimes de ação pública o inquérito policial será iniciado: | - de ofício; Ill - mediante requisição da autoridade judiciária ou do Ministério Público, ou a requerimento do ofendido ou de quem tiver qualidade para representá-lo. $ 1º. O requerimento a que se refere o nº Il conterá sempre que possível: a) a narração do fato, com todas as circunstâncias; b) a individualização do indiciado ou seus sinais característicos e as razões de convicção ou de presunção de ser ele o autor da infração, ou os motivos de impossibilidade de o fazer; c) a nomeação das testemunhas, com indicação de sua profissão e residência. $ 2º. Do despacho que indeferir o requerimento de abertura de inquérito caberá recurso para o chefe de Polícia. $ 3º. Qualquer pessoa do povo que tiver conhecimento da existência de infração penal em que caiba ação pública poderá, verbalmente ou por escrito, comunicá-la à autoridade policial, e esta, verificada a procedência das informações, mandará instaurar inquérito . $ 4º. O inquérito, nos crimes em que a ação pública depender de representação, não poderá sem ela ser iniciado. $ 5º. Nos crimes de ação privada, a autoridade policial somente poderá proceder a inquérito a requerimento de quem tenha qualidade para intentá-la. Art. 6º. Logo que tiver conhecimento da prática da infração penal, a autoridade policial deverá: | - dirigir-se ao local, providenciando para que não se alterem o estado e conservação das coisas, até a chegada dos peritos criminais; Il - apreender os objetos que tiverem relação com o fato, após liberados pelos peritos criminais; HI - colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e suas circunstâncias; 20 www.RESUMOSCONCURSOS.HPG.COM.BR Apostila: Direito Processual Penal —- por Guilherme Tocha IV - ouvir o ofendido; V - ouvir o indiciado, com observância, no que for aplicável, do disposto no Capítulo HI do Título VII, deste Livro, devendo o respectivo termo ser assinado por 2 (duas) testemunhas que lhe tenham ouvido a leitura; VI - proceder a reconhecimento de pessoas e coisas e a acareações; VII - determinar, se for caso, que se proceda a exame de corpo de delito e a quaisquer outras perícias; VIII - ordenar a identificação do indiciado pelo processo datiloscópico, se possível, e fazer juntar aos autos sua folha de antecedentes; IX - averiguar a vida pregressa do indiciado, sob o ponto de vista individual, familiar e social, sua condição econômica, sua atitude e estado de ânimo antes e depois do crime e durante ele, e quaisquer outros elementos que contribuírem para a apreciação do seu temperamento e caráter. Art. 7º. Para verificar a possibilidade de haver a infração sido praticada de determinado modo, a autoridade policial poderá proceder à reprodução simulada dos fatos, desde que esta não contrarie a moralidade ou a ordem pública. Art. 8º. Havendo prisão em flagrante, será observado o disposto no Capítulo II do Título IX deste Livro. Art. 9º. Todas as peças do inquérito policial serão, num só processado, reduzidas a escrito ou datilografadas e, neste caso, rubricadas pela autoridade. Art. 10. O inquérito deverá terminar no prazo de 10 (dez) dias, se o indiciado tiver sido preso em flagrante, ou estiver preso preventivamente, contado o prazo, nesta hipótese, a partir do dia em que se executar a ordem de prisão, ou no prazo de 30 (trina) dias, quando estiver solto, mediante fiança ou sem ela. $ 1º. A autoridade fará minucioso relatório do que tiver sido apurado e enviará autos ao juiz competente. $ 2º. No relatório poderá a autoridade indicar testemunhas que não tiverem sido inquiridas, mencionando o lugar onde possam ser encontradas. $ 3º. Quando o fato for de difícil elucidação, e o indiciado estiver solto, a autoridade poderá requerer ao juiz a devolução dos autos, para ulteriores diligências, que serão realizadas no prazo marcado pelo juiz. Art. 11. Os instrumentos do crime, bem como os objetos que interessarem à prova, acompanharão os autos do inquérito. Art. 12. O inquérito policial acompanhará a denúncia ou queixa, sempre que servir de base a uma ou outra. Art. 13. Incumbirá ainda à autoridade policial: | - fornecer às autoridades judiciárias as informações necessárias à instrução e julgamento dos processos; IH - realizar as diligências requisitadas pelo juiz ou pelo Ministério Público; HI - cumprir os mandados de prisão expedidos pelas autoridades judiciárias; IV - representar acerca da prisão preventiva. 21 www.RESUMOSCONCURSOS.HPG.COM.BR Apostila: Direito Processual Penal —- por Guilherme Tocha Art. 14. O ofendido, ou seu representante legal, e o indiciado poderão requerer qualquer diligência, que será realizada, ou não, a juízo da autoridade. Art. 15. Se o indiciado for menor, ser-lhe-á nomeado curador pela autoridade policial. Art. 16. O Ministério Público não poderá requerer a devolução do inquérito à autoridade policial, senão para novas diligências, imprescindíveis ao oferecimento da denúncia. Art. 17. A autoridade policial não poderá mandar arquivar autos de inquérito. Art. 18. Depois de ordenado o arquivamento do inquérito pela autoridade judiciária, por falta de base para a denúncia, a autoridade policial poderá proceder a novas pesquisas, se de outras provas tiver notícia. Art. 19. Nos crimes em que não couber ação pública, os autos do inquérito serão remetidos ao juízo competente, onde aguardarão a iniciativa do ofendido ou de seu representante legal, ou serão entregues ao requerente, se o pedir, mediante traslado. Art. 20. A autoridade assegurará no inquérito o sigilo necessário à elucidação do fato ou exigido pelo interesse da sociedade. Parágrafo único. Nos atestados de antecedentes que lhe forem solicitados, a autoridade policial não poderá mencionar quaisquer anotações referentes a instauração de inquérito contra os requerentes, salvo no caso de existir condenação anterior. Art. 21. A incomunicabilidade do indiciado dependerá sempre de despacho nos autos e somente será permitida quando o interesse da sociedade ou a conveniência da investigação o exigir. Parágrafo único. A incomunicabilidade, que não excederá de 3 (três) dias, será decretada por despacho fundamentado do juiz, a requerimento da autoridade policial, ou do órgão do Ministério Público, respeitado, em qualquer hipótese, o disposto no art. 89, III, do Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil (Lei nº 4.215, de 27 de abril de 1963). Art. 22. No Distrito Federal e nas comarcas em que houver mais de uma circunscrição policial, a autoridade com exercício em uma delas poderá, nos inquéritos a que esteja procedendo, ordenar diligências em circunscrição de outra, independentemente de precatórias ou requisições, e bem assim providenciará, até que compareça a autoridade competente, sobre qualquer fato que ocorra em sua presença, noutra circunscrição. Art. 23. Ao fazer a remessa dos autos do inquérito ao juiz competente, a autoridade policial oficiará ao Instituto de Identificação e Estatística, ou repartição congênere, mencionando o juízo a que tiverem sido distribuídos, e os dados relativos à infração penal e à pessoa do indiciado.” 22 www.RESUMOSCONCURSOS.HPG.COM.BR Apostila: Direito Processual Penal —- por Guilherme Tocha Este inquérito visa a apurar a conveniência, ou não, da expulsão de estrangeiro do território nacional, segundo regulamentam os arts. 70 e 71 da Lei n.º 6.815/80. O inquérito judicial é presidido pelo Juiz da Vara de Falências, como dispõe a Lei de Falências (Decreto-lei n.º 7.661/45), art. 103 e ss., para colhimento de informações acerca de crimes falimentares. O inquérito civil é presidido pelo órgão do Ministério Público destinado à propositura da ação civil pública de responsabilidade por danos causados ao meio ambiente, ao consumidor, a bens de direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico (Lei n.º 7.347/85). Este trata do poder de investigação das Comissões Parlamentares de Inquérito, que presidem os inquéritos parlamentares (Lei n.º 1.579/52). q Características do Inquérito Policial No sistema processual penal brasileiro, o inquérito policial obedece ao sistema inquisitório, de molde que, além de não obedecer aos princípios do contraditório e da ampla defesa, apresenta-se com os seguintes caracteres: O inquérito policial é sigiloso, para impedir que empecilhos ou óbices se ponham em seu regular caminho, pois do contrário frustradas muitas vezes ficariam as investigações. P. ex., o indiciado já tivesse, de antemão, conhecimento dos próximos movimentos e diligências realizadas pela polícia. O sigilo, porém, não é absoluto, pois não se estende ao Ministério Público (art. 15, III, da Lei Orgânica do Ministério Público) e ao Juiz. Na prática, igualmente, pouco sigilo existe em relação aos advogados, haja vista suas prerrogativas (art. 7º do Estatuto da OAB). Todas as conclusões e informações a que chegou o inquérito policial devem ser deduzidos por escrito, e remetidos ao Judiciário (no caso de ação penal pública) ou ao ofendido ou seu representante legal (no caso de ação penal privada). 25 www.RESUMOSCONCURSOS.HPG.COM.BR Apostila: Direito Processual Penal —- por Guilherme Tocha Tomando conhecimento da prática de crime de ação penal pública incondicionada, deverá a autoridade policial (Delegado de polícia), de ofício, instaurar inquérito policial, sob pena de responder por prevaricação (art. 319 do CP), corrupção passiva (art. 317 do CP) ou concussão (art. 316, caput, do CP)1, a depender do caso concreto. Não existe, e nem é possível, a obrigatoriedade nos casos de ação penal pública condicionada à representação (porque dependerá desta para ser instaurado o inquérito) ou ação penal privada (em que será necessário o requerimento da parte ofendida ou de seu representante legal). Instaurado o inquérito, a autoridade policial não poderá arquivá-lo de ofício, mas tão- somente quando assim requisitado pelo Ministério Público. Pode até se alegar que tal procedimento, o arquivamento de ofício do inquérito, é “praxe” comum, mas isso constitui um atentado grave à lei, à justiça, e configura ilícito penal (prevaricação, corrupção passiva ou concussão, a depender do caso concreto). * Código Penal, arts. 316, 317 e 319: “Art 316. Exigir, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida: Pena — reclusão, de 2 (dois) a 8 (oito) anos, e multa. $1º Seo funcionário exige tributo ou contribuição social que sabe ou deveria saber indevido, ou, quando devido, emprega na cobrança meio vexatório ou gravoso, que a lei não autoriza: Pena — reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos, e multa. $2º. Seo funcionário desvia, em proveito próprio ou de outrem, o que recebeu indevidamente para recolher aos cofres públicos: Pena — reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa. Art. 317. Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem: Pena — reclusão, de 1 (um) a 8 (oito) anos, e multa. $ 1º. A pena é aumentada de um terço, se, em consequência da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou deixa de praticar qualquer ato de ofício ou o pratica infringindo dever funcional. $ 2º. Se o funcionário pratica, deixa de praticar ou retarda ato de ofício, com infração de dever funcional, cedendo a pedido ou influência de outrem: Pena — detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, ou multa. Art 319. Retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal: Pena — detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, e multa” 26 www.RESUMOSCONCURSOS.HPG.COM.BR Apostila: Direito Processual Penal —- por Guilherme Tocha 6. Competência O termo “competência” refere-se, tecnicamente, no campo processual, apenas aos órgãos jurisdicionais, não à polícia. Para esta melhor seria a expressão “atribuições”, muito mais precisa e técnica2. Essa atribuição, de regra, é atribuída de acordo com o lugar da ocorrência do ilícito penal, mas também pode se referir à natureza da infração e à pessoa da vítima. Esta é a regra geral. Os Distritos Policiais de Recife ocupam-se com as infrações penais cometidas em Recife; os Distritos Policiais de Camaragibe ocupam-se com as infrações penais cometidas nesta cidade, e assim por diante. Também é muito comum, principalmente em cidades maiores, que cada Distrito se ocupe com infrações penais ocorridas em uma delimitada área de atuação, denominada circunscrição. A cidade, ou a Comarca, é dividida em diversas circunscrições, e, pela regra da atribuição ratione loci, numa mesma Comarca poderá haver diversas circunscrições, e para cada qual existe um Distrito Policial ao qual incumbe a apuração das infrações penais cometidas dentro desta área. Assim, p. ex., em regra uma Delegacia de Polícia do bairro do Espinheiro não se ocupa de crimes cometidos em Casa Amarela. Isso, contudo, não impede que a Autoridade Policial responsável por uma circunscrição investigue, em outra, fatos de repercussão na primeira, ou mesmo que um Delegado de uma circunscrição X apure uma infração cometida na de Y. A divisão em razão do lugar da infração é uma questão apenas de conveniência, não havendo o que se falar, p. ex., em vício ou irregularidade na prisão em flagrante ocorrida em uma circunscrição sob os auspícios da Autoridade Policial de outra. As atribuições da Polícia também podem ser conferidas de acordo com a natureza da infração penal cometida. É muito comum, p. ex., Delegacias especializadas em roubos, ou em homicídios, ou em entorpecentes, em furtos e roubos de veículos, etc. Quando acontece essa divisão, não importa em que circunscrição ocorreu um delito. Exemplo: Numa Comarca existem dez circunscrições, havendo uma Delegacia de Polícia para cada uma. Na circunscrição X ocorreu um roubo, não havendo nela Delegacia Especializada para esta espécie de delito. Porém, levando em conta que o inquérito policial é procedimento administrativo, podemos, em princípio, concordar com a expressão “competência”, de que versa o próprio Código de Processo Penal, é correta do ponto de vista administrativo. 27 www.RESUMOSCONCURSOS.HPG.COM.BR Apostila: Direito Processual Penal —- por Guilherme Tocha Notitia criminis provocada, que é a mais comum, é aquela transmitida a autoridade policial pelas formas registradas na lei processual penal — Juiz, Ministério Público, ofendido ou seu representante legal, ou por qualquer do povo. Exemplo: Uma pessoa (não necessariamente a vítima do crime) vai à Delegacia e narra ao Delegado um furto cometido nos arredores da vizinhança onde mora. Qualquer pessoa do povo — e não apenas a vítima, seu representante legal, as autoridades judiciárias e ministeriais — pode noticiar à autoridade policial a existência de uma infração penal. Qualquer pessoa física é, portanto, autora em potencial de notitia criminis. Destinatários da notitia criminis são: a Autoridade Policial (art. 5º, Il, $$ 3º e 5º, do CPP), o Ministério Público (arts. 27, 39 e 40 do CPP) e o Juiz (art. 39 do CPP)3. Regra geral, ou seja, no que se refere aos particulares, a notitia criminis constitui mera faculdade, e não um dever. Logo, de ordinário, ninguém tem a obrigação de comunicar coisa alguma a Autoridade Policial, ainda que nada a impeça de tal. Há quem, entretanto, tenha o dever legal de noticiar o fato, sob pena de incorrer em contravenção penal. Com efeito, reza o art. 66 da LCP que: Art. 66. Deixar de comunicar à autoridade competente: L- crime de ação pública, de que teve conhecimento no exercício de função pública, desde que a ação penal não dependa de representação; H- crime de ação pública, de que teve conhecimento no exercício da medicina ou de outra profissão sanitária, desde que a ação penal não dependa de representação e a comunicação não exponha o cliente a procedimento criminal: Pena — multa. No inciso | temos os funcionários públicos que, no exercício de sua função (e não fora dela), tomou conhecimento de crime de ação penal pública incondicionada. E o caso, p. ex., dos Policiais e dos funcionários que trabalham na área de segurança pública (exs.: agentes penitenciários e policiais). Tratando-se de crime militar, a notitia criminis deverá ser encaminhada à autoridade militar competente (art. 7º do Código de Processo Penal Militar). Na hipótese de crimes de responsabilidade de Governador de Estado a notitia criminis pode ser dirigida à Assembléia Legislativa, e no caso de crime de responsabilidade do Presidente da República, à Câmara dos Deputados ou Senado Federal. 30 www.RESUMOSCONCURSOS.HPG.COM.BR Apostila: Direito Processual Penal —- por Guilherme Tocha No inciso Il estão os profissionais da área de Medicina ou outra atividade sanitária (ex.: enfermeiros) que, no exercício de sua profissão (e não fora dela), tomaram conhecimento da prática de crime de ação penal pública incondicionada, desde que a comunicação do fato não exponha o cliente ou paciente a procedimento criminal, sob pena de o profissional vir a responder por crime de violação do segredo profissional (art. 154 do CP)4. Seria o caso, por exemplo, do médico que recebe uma paciente com grave hemorragia, vindo ela a morrer, descobrindo o médico que a causa mortis fora o fato de há poucas horas ter ela sofrido manobras abortivas em clínica clandestina. No entanto, se ela não morre e se recupera, o médico não pode comunicar o fato à Polícia, pois se o fizer estará forçosamente expondo sua paciente a procedimento criminal, haja vista que, em tendo ela dado seu consentimento para a prática abortiva, será enquadrada no art. 124 do CP. Sob determinação judicial, porém, o médico é obrigado a comunicar detalhes do delito perpetrado pelo seu paciente, sob pena de responder por crime de desobediência (art. 330 do CP). 11. Instauração do Inquérito Não existe uma única forma de instauração do inquérito policial, mas várias, a depender da ação penal cabível para a infração que está sendo apurada, se pública ou privada. A ação penal pública pode ser incondicionada ou condicionada. Para cada uma delas a instauração do inquérito se dá de forma distintas. ncondicionadaN Ars SMeMaoNGRRIE Nos casos de crimes apurados mediante ação penal pública incondicionada (exs.: crimes contra a vida, a maioria dos crimes contra o patrimônio, crimes contra a organização do trabalho, a maioria dos crimes contra a família, crimes contra a fé pública, crimes contra a administração pública), o inquérito policial é instaurado: * Código Penal, art. 154: “Art. 154. Revelar alguém, sem justa causa, segredo, de que tem ciência em razão de função, ministério, ofício ou profissão, e cuja revelação possa produzir dano a outrem: Pena — detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, ou multa. Parágrafo único. Somente se procede mediante representação.” 8 Ainda há a possibilidade de instauração de inquérito policial via auto de prisão em flagrante, o qual analisaremos no item 16, infra. 31 www.RESUMOSCONCURSOS.HPG.COM.BR Apostila: Direito Processual Penal —- por Guilherme Tocha a) b) e) De Ofício (art. 5º, |, do CPP): A Autoridade Policial, tomando ciência do delito, deverá instaurá-lo de ofício, mediante uma peça singela e sem muita solenidade chamada portaria. Mediante Requisição do Ministério Público ou de Juiz (art. 5º, |I, 1º parte, do CPP): Requisição é uma ordem, um imperativo. Quem requisita determina algo, ordena que algo seja feito ou realizado. Nesse caso, o Delegado, sendo requisitado pelo Ministério Público ou pelo Juiz, deverá instaurar inquérito policial, sob pena de responder por prevaricação, delito tipificado no art. 319 do CP (alguns autores admitem que, na hipótese, haverá crime de desobediência — art. 330 do CP)6. Mediante Requerimento do Ofendido ou de seu Representante Legal (art. 5º, Il, 2º parte, do CPP): Requerer é pedir, pleitear algo, e não exigir ou determinar, como no caso da requisição. O requerimento deverá conter, sempre que possível for, “a narração do fato, com todas as circunstâncias; a individualização do indiciado ou seus sinais característicos e as razões de convicção ou de presunção de ser ele o autor da infração, ou os motivos de impossibilidade de o fazer; e a nomeação das testemunhas, com indicação de sua profissão e residência” (art. 5º, $ 1º, do CPP). Tratando-se de requerimento, pode o Delegado deixar de atendê-lo nos seguintes casos: 1) quando já estiver extinta a punibilidade; 2) se o requerimento não mencionar o mínimo indispensável para a abertura do inquérito; 3) se a autoridade policial a quem foi dirigido o requerimento não for a “competente”; 4) se o fato narrado for atípico; 5) se o requerente for incapaz. Contra eventual indeferimento do requerimento de instauração do inquérito policial cabe recurso administrativo para o Secretário de Segurança Pública (“chefe de Polícia”, no dizer do art. 5º, 8 2º, do CPP). IMZnnncondicionadaNtArS Sao NGRRJE A ação penal pública condicionada exige como condição ora a representação do ofendido ou de seu representante legal, ora 6 Código Penal, art. 330, verbis: “Art. 330. Desobedecer a ordem legal de funcionário público: Pena — detenção, de 15 (quinze) dias a 6 (seis) meses, e multa.” 32 www.RESUMOSCONCURSOS.HPG.COM.BR Apostila: Direito Processual Penal —- por Guilherme Tocha A autoridade policial se dirigirá ao local onde supostamente foi praticada uma infração penal, para verificar a procedência da notitia criminis que lhe foi formulada e tomar as medidas legais cabíveis. Isola o Delegado a área do lugar do crime, para que nada seja modificado, retirado ou acrescido, a fim de que se tenha um exato “retrato” do ilícito talgualmente ocorrera. O Delegado deverá isolar o local e mandar que se recolha tudo o quanto for encontrado no lugar do crime, para ser posteriormente periciado e enviado ao autor da ação penal. 13. Instrução Probatória (Art. 6º, IV, V, Vl e VII) O ofendido é a vítima da infração penal, o titular do bem jurídico violado ou ameaçado. Suas informações são muito importantes para a apuração do fato e de sua autoria, devendo ser a primeira ou uma das primeiras pessoas a serem ouvidas pela autoridade policial. A autoridade policial, então, notificará a vítima para que compareça em determinados dia, hora e local para prestar esclarecimentos que elucidem o fato. Se injustificadamente não comparecer, será conduzida à presença da autoridade (art. 201, parágrafo único, do Código de Processo Penal), que determinará, se for o caso, a sua busca e apreensão (art. 240,8 1º,9g, do diploma processual). O indiciado é, na fase do inquérito policial, a pessoa a quem foi imputada a prática de uma infração penal. É chamada de “indiciado” justamente porque os indícios (pistas, testemunhas, perícias, provas, instrumentos, objetos pessoais, impressões deixadas na arma ou no local do crime etc.) levam a crer pela sua responsabilidade penal no caso concreto. Os indícios têm de ser veementes, e não frágeis, não se tratando de mera suposição, de mera suspeita, mas de um conjunto de fatos e objetos que levam muito a crer que a pessoa — e não outra — é autora de uma infração penal. 35 www.RESUMOSCONCURSOS.HPG.COM.BR Apostila: Direito Processual Penal —- por Guilherme Tocha Não raro, imprescinde-se de reconhecimento de pessoas (testemunhas, vítimas, agentes) e de coisas (objetos, instrumentos, armas, papéis, documentos, material deixado no local do crime, pistas etc.) para que o relatório final do inquérito policial alicerce seus fundamentos em sólidas conclusões, sem as quais o titular da ação penal não terá em mãos elementos indiciários suficientes para a propositura da denúncia ou da queixa. Outrossim, pode o Delegado proceder, de ofício, a acareações, ou o Ministério Público as requisitar, ou mesmo serem requeridas pela vítima ou pelo agente. O que seriam as acareações? Acareação é o ato pelo qual se põem, cara a cara, pessoas cujos depoimentos ou declarações são conflitantes. Elas podem se dar entre acusados, entre vítimas, entre testemunhas, entre acusado e vítima, entre acusado e testemunha ou entre vítima e testemunha. E errôneo, portanto, como muitos imaginam, concluir-se que a acareação presta-se exclusivamente à presença, face a face, entre acusados. Quaisquer pessoas que tenham ligação com o crime, quando suas declarações são conflitantes, contraditórias, paradoxais, podem ser acareadas. O Delegado, sem que para isso seja requisitado pelo Juiz ou pelo Ministério Público, pode proceder, de ofício, a requisição de exames periciais relativos ao crime que se apura. E muito comum, p. ex., o Delegado, em crimes de homicídio, requisitar o exame de corpo de delito direto (exame tanatológico). Outras perícias podem ser requisitadas (balística, grafoscópica, documentoscópica, datiloscópica, sexológica, toxicológica, traumatológica etc.). Evidentemente que o Ministério Público pode ainda requisitar, em sede de diligências, outras perícias, podendo requerê-las, também, o titular da ação penal privada. O art. 13 do Código de Processo Penal cita os deveres da Autoridade Policial, cujo descumprimento pode acarretar sua responsabilidade criminal a título de prevaricação ou desobediência. Quanto ao assunto, veja o item 17, infra. O art. 14 do Código de Processo Penal esclarece que “o ofendido, ou seu representante legal, e o indiciado poderão requerer qualquer diligência, que será realizada, ou não, a juízo da autoridade”. Veja-se que as diligências de que trata o art. 13 constituem um imperativo (um dever) a ser cumprido pela Autoridade Policial. Já as que são aduzidas pelo art. 14 refere-se à mera faculdade de a Autoridade Policial proceder a diligências, quando requeridas (observe-se: requeridas, e não requisitadas!) pelo ofendido (vítima do crime), seu representante legal ou mesmo pelo indiciado. Evidentemente que realizar ou 36 www.RESUMOSCONCURSOS.HPG.COM.BR Apostila: Direito Processual Penal —- por Guilherme Tocha não diligências requeridas não pode ser produto de uma arbitrariedade, devendo o Delegado refletir acerca de sua real necessidade no inquérito policial e na busca da verdade real. O art. 16 do Código de Processo Penal, por fim, esclarece que “o Ministério Público não poderá requerer a devolução do inquérito à autoridade policial, senão para novas diligências, imprescindíveis ao oferecimento da denúncia”. Tendo elementos suficientes em mãos para a propositura da denúncia, o Parquet terá o dever de promovê-la (princípio da obrigatoriedade), só não o fazendo se e quando de fato os indícios forem precários para o oferecimento da ação penal pública, quando então devolverá o inquérito policial e requisitará à Autoridade Policial diligências (comportamentos, atos, ações de elucidação e investigação mais apurada, mais detalhada, como oitivas de pessoas, perícias etc.). 14. Indiciamento (Art. 6º, VIII e IX, do CPP) 14.1. Conceito É a imputação a alguém, na fase do inquérito policial, da prática de uma infração penal. A pessoa a quem foi atribuído o indiciamento é chamada de indiciada, e não se confunde com a figura do réu. Aliás, “indiciado” está para o inquérito policial assim como o “réu” está para o processo penal já instaurado. Enquanto não há ação penal, fala-se, quando muito, em indiciado; quando já proposta a ação penal, o indiciado transmuda-se para réu. O art. 6º, VIII, do Código de Processo Penal, afirma dever a Autoridade Policial “ordenar a identificação do indiciado pelo processo datiloscópico, se possível, e fazer juntar aos autos sua folha de antecedentes”. A identificação é o meio pelo qual se estabelece a identidade ou o conjunto de caracteres que individualizam uma pessoa, destacando-a das demais, citando-se-lhe o nome, a filiação, a naturalidade, os caracteres físicos (se necessários, principalmente quando não se sabe ao certo seu nome), sua alcunha (apelido), profissão e endereço. Atualmente, a identificação do acusado faz-se mediante o processo datiloscópico (impressões digitais), dada a certeza científica de que não existem duas pessoas com as mesmas impressões digitais. O indiciado deve se submeter à identificação criminal em toda e qualquer hipótese? Em vista do art. 5º, LVIII, da CF/88, tem-se que: 37 www.RESUMOSCONCURSOS.HPG.COM.BR Apostila: Direito Processual Penal —- por Guilherme Tocha O curador tem de ser um advogado? Não existe qualquer exigência nesse sentido, embora seja preferível que o curador seja um advogado, por ser pessoa que entende de assuntos técnicos relativos ao Direito e portanto com mais capacidade de prover o menor das informações e do discernimento de que ele necessita. Portanto, não existe irregularidade quando o curador do menor é o seu pai ou a sua mãe, ou mesmo outra pessoa absolutamente capaz porém sem habilitação profissional da OAB. O que não pode é que o terceiro que irá assistir ao menor, muito obstante absolutamente capaz perante a lei civil, seja analfabeta. A nomeação de curador ao menor de 21 anos é devida quando o indiciado tinha esta idade à época do interrogatório, não à época do crime. Exemplo: X, de 20 anos de idade, cometeu um crime. Antes de instaurado o inquérito policial, completa 21 anos de idade. Ele será interrogado perante o Delegado em alguns dias. No caso, não precisará de curador, porque, no interrogatório, já terá alcançado a maioridade. Qual a função do curador? É a de assistir ao interrogatório e a todos os demais atos do inquérito que venham a exigir a presença do menor, como nas acareações, nas reproduções simuladas e nos reconhecimentos de pessoas. Pode o curador intervir nesses atos para fazer perguntas ou participar de inquirições? Não, pois sua presença é apenas para suprir a incapacidade do indiciado. No entanto, poderá requerer diligências, como assim o concede o art. 14 do Código de Processo Penal, o que não significa, segundo vimos (sub-item 13.5, supra), que a Autoridade Policial deverá realizá-la. Antes da Carta Magna de 1988 possibilitava-se que o Delegado deixasse o indiciado incomunicável, isto é, o imputado, no prazo de 3 dias, permanecia preso sem que pudesse entrar em contato com familiares, advogados ou quem mais que fosse, segundo o disposto da redação original do art. 21 do Código de Processo Penal. Com a entrada em vigor da CF/88, pacificou-se o entendimento de que a incomunicabilidade tornou-se desde então inconstitucional, sendo tacitamente revogado o art. 21 do Código de Processo Penal pelo art. 136, $ 3º, IV, da Carta Política. Este último dispositivo expressamente veda a incomunicabilidade do preso durante o estado de sítio. Ora, se durante o estado de sítio, quando o Estado passa por convulsões as mais sérias, a incomunicabilidade é proibida, com muita maior razão sê-lo-á quando o Estado passa por período de normalidade, que é o comum de nossos dias. indígenas. Logo, no silêncio da lei, não há necessidade de curador aos indiciados indígenas, a não ser em decorrência de averiguação de desenvolvimento mental incompleto, repise-se. 40 www.RESUMOSCONCURSOS.HPG.COM.BR Apostila: Direito Processual Penal —- por Guilherme Tocha 15. Reprodução Simulada (Art. 7º do CPP) A Autoridade Policial poderá, a fim de chegar à verdade real do fato, proceder à reprodução simulada ou “simulação” do crime, talgqualmente ele ocorreu, desde que não ofenda a moralidade e a ordem públicas. A reprodução simulada nada mais é que uma encenação da infração penal, uma “peça teatral” promovida pela Autoridade Policial, que tem como fito o de verificar detalhes do injusto penal. Pode o suspeito se negar a participar da reprodução simulada? Evidentemente! Lembremos que ninguém é obrigado a acusar a si mesmo, ninguém tem o dever de produzir prova contra si próprio (privillege against self-incrimination). Tendo o cidadão, ainda que preso, o direito de permanecer calado, não teria sentido algum ser ele processado por desobediência à “ordem” de participar da simulação. 16. Prisão em Flagrante (Art. 8º do CPP) Outra forma de ser instaurado o inquérito policial é através do auto de prisão em flagrante, quando o sujeito é preso em algumas das circunstâncias elencadas no art. 302 do Código de Processo Penal: “Art. 302. Considera-se em flagrante delito quem: | - está cometendo a infração penal; Il - acaba de cometê-la; HI - é perseguido, logo após, pela autoridade, pelo ofendido ou por qualquer pessoa, em situação que faça presumir ser autor da infração; IV - é encontrado, logo depois, com instrumentos, armas, objetos ou papéis que façam presumir ser ele autor da infração.” A prisão em flagrante, única modalidade de prisão cautelar que não necessita de decretação judicial, deve ser seguida da lavratura de seu auto, no prazo de 24 horas da prisão, sob pena de nulidade e cabimento de habeas corpus. Quando alguém é preso em flagrante delito, o respectivo inquérito será aberto justamente com o auto de prisão, seja nos crimes de ação penal pública incondicionada, seja nos crimes de ação penal pública condicionada e nos de ação penal privada. Todavia, há que se considerar que nem sempre o inquérito será instaurado. Na verdade, no caso de crime que se apura mediante ação penal pública incondicionada, em vista da prisão em flagrante do suspeito, a Autoridade Policial deverá instaurar o inquérito mediante o auto de prisão em flagrante. Nas hipóteses de prisão em flagrante em crime de ação penal pública condicionada ou ação penal privada, o inquérito só poderá ser instaurado se o titular da representação ou da queixa não se opuser. 41 www.RESUMOSCONCURSOS.HPG.COM.BR Apostila: Direito Processual Penal —- por Guilherme Tocha 17. Deveres da Autoridade Policial (Art. 13 do CPP) O art. 13 do Código de Processo Penal impõe às autoridades policiais deveres que, em não sendo obedecidos, poderão ensejar sua responsabilidade penal (crime de prevaricação, de corrupção passiva, de concussão ou de extorsão) e administrativa. Tratam-se, pois, de deveres, não de meras faculdades de que a autoridade policial possa se abster de realizar. Esses deveres são: Em primeiro lugar, deve o Delegado “fornecer às autoridades judiciárias as informações necessárias à instrução e julgamento dos processos”. Veja-se que o Delegado tem o dever de fornecer quaisquer informações requisitadas pelas autoridades judiciárias, mas esse dever não subiste quando as informações sejam solicitadas pelo Ministério Público. Não é que o Ministério Público não possa solicitar informações, mas o dever de sua prestação, pela Autoridade Policial, aí não subsiste. A obediência é devida apenas aos Magistrados. Outro dever do Delegado é o de “realizar as diligências requisitadas pelo juiz ou pelo Ministério Público”. Agora sim, o dever, que não é mais apenas o de informar, senão o de realizar diligências, referte-se tanto àquelas que são requisitadas pelo Juiz quanto pelo Ministério Público. As diligências requisitadas podem ser a investigação em certo local ou de certa pessoa, a busca e apreensão, reconhecimentos de pessoas ou de coisas, acareações, reprodução simulada, interrogatório, nova oitiva de testemunhas etc. A Autoridade Policial tem, ainda, o dever legal de “cumprir os mandados de prisão expedidos pelas autoridades judiciárias”. Isto é, dado que o Juiz expeça mandado de prisão (preventiva, temporária, por pronúncia ou em decorrência de sentença condenatória), o Delegado não pode se furtar de sua obrigação de cumpri-lo preenchendo todas as formalidades legais e sem excessos, sob pena de, em não o cumprindo, responder por crime de prevaricação ou desobediência, e se o cumprir com excesso demasiado e injustificado, vir a ser incriminado por abuso de autoridade (Lei n.º ). ps o o so o a Por fim, o dever jurídico-legal de “representar acerca da prisão preventiva”. A prisão preventiva pode ser decretada de ofício pelo Juiz, mediante requerimento do Ministério Público ou do querelante ou por representação do Delegado, ou seja, enxergando este a necessidade de que o acusado não deve permanecer solto, o Delegado representará, por escrito, quanto à prisão preventiva, declarando os fundamentos de fato e de direito sobre os quais ele pretende a restrição cautelar da liberdade do suspeito. 42 www.RESUMOSCONCURSOS.HPG.COM.BR Apostila: Direito Processual Penal —- por Guilherme Tocha julgue que o inquérito lhe proporcione o mínimo necessário para ser intentada a ação penal. Ou seja, quando o Ministério Público se achar satisfeito com o que possui em mãos, então sim oferecerá a denúncia no prazo de 5 (cinco) dias, se o réu estiver preso (após os quais ele deverá ser solto, sob pena de cabimento de habeas corpus), e de 15 (quinze) dias, se preso (art. 46 do CPP). Não se olvide, todavia, de que o Ministério Público não está vinculado à conclusão do relatório do inquérito, podendo oferecer a denúncia por outro crime que não aquele que consta do procedimento informativo. Do mesmo modo, o Juiz não está vinculado ao entendimento do Parquet, podendo absolver ou condenar o réu por outro motivo que não o alegado pelo Ministério Público. b) Diligências: Pode acontecer de o Ministério Público não se achar satisfeito com o que foi apurado durante o inquérito, por diversas razões. Daí então remeterá os autos de inquérito de volta à autoridade policial para que proceda a diligências que o Parquet determinar: busca e apreensão (desde que admitida pelo magistrado), depoimento de testemunhas ou da vítima; interrogatório do indiciado; pedido de exames periciais; acareações; reconhecimento de pessoas e coisas; reprodução simulada; colheita de novas provas ou indícios etc. Após realizadas as diligências, a autoridade policial enviará novamente o inquérito ao Judiciário, a fim de que abra novas vistas ao Ministério Público. EAR quivamento: O Ministério Público é o único que pode pedir o arquivamento de autos de inquérito, e o pedirá quando, p. ex., não houver autoria conhecida, não houver provas mais ou menos idôneas a respeito da relação de causalidade ou se estiver presente causa ou condição de exclusão do crime. O arquivamento é pedido à autoridade judiciária, que poderá concordar, ou não, com as razões do pedido. Se concordar, ordenará o arquivamento. Se não concordar, não poderá exigir que o Promotor ofereça a denúncia, mas comunicará o fato ao Procurador-Geral de Justiça, que nesse caso poderá, ou não, concordar com o pedido do Promotor. Se concordar, o inquérito terá de ser arquivado, mesmo contra a vontade do Juiz. Se não concordar, ou ele mesmo irá oferecer a denúncia, ou designará outro representante da instituição para oferecê-la. Contra o pedido de arquivamento e sua concessão não cabe recurso algum. HJExtinção dalPunibilidades O Ministério Público é, antes mesmo que órgão de acusação, fiscal da lei, de forma que deverá atuar de maneira que faça atuar a justiça no caso concreto. E, pois, equívoco pensar-se que o Ministério Público não pode agir em favor do indiciado ou do réu. E é em vista disso que pode acontecer de a punibilidade do indiciado, inobstante inconteste a prática de uma infração penal, estar extinta, pela prescrição ou por outra causa (art. 107 do CP). Desse modo, se o Ministério Público, ao verificar nos autos do inquérito, que a punibilidade do indiciado está extinta, pedirá ao Juiz que a decrete. 45 www.RESUMOSCONCURSOS.HPG.COM.BR Apostila: Direito Processual Penal —- por Guilherme Tocha EJNNPermanêncialdos Autos emilcanório! sabe-se que o Ministério Público é o titular legítimo da ação penal pública, bem como apenas ao ofendido e seu representante legal é que cabe a propositura da ação penal privada. Daí porque, concluído o inquérito, a autoridade policial deverá remetê-lo ao Ministério Público, caso a infração seja apurada mediante ação penal pública, ou ao ofendido mediante traslado, no caso de a infração investigada for de ação penal privada. Imagine-se, então, que o Ministério Público receba um inquérito no qual se perceba que o crime ali imputado ao indiciado seja de ação penal privada (ex.: estupro sem violência real e praticado por pessoa estranha à vítima de posses). Em tal hipótese, o Ministério Público é parte ilegítima para propor a ação penal. Sendo assim, o Promotor de Justiça, nos termos do art. 19 do Código de Processo Penal, deverá requerer que os autos do inquérito permaneçam em Cartório, aguardando a iniciativa da vítima ou de quem de direito. HminviabilidadeldalRelação Processuais Existem fatos que impedem a viabilidade da relação processual, isto é, desautorizam que, no caso concreto, seja instaurada a relação processual. Nesses casos, o Ministério Público deverá abster-se de oferecer a denúncia. Tais fatos são, por exemplo, a coisa julgada (o indiciado já tinha sido julgado em outra ocasião pelo mesmo fato objeto do inquérito policial recebido), a litispendência (o indiciado, pelo fato objeto do inquérito recebido, já está sendo por este mesmo processado, na mesma Comarca ou não) e a incompetência (p. ex., o Promotor de Justiça de Recife entende que a competência é do juízo da Comarca de Paulista). 46 www.RESUMOSCONCURSOS.HPG.COM.BR Apostila: Direito Processual Penal —- por Guilherme Tocha Do aemóduio AÇÃO PENAL Código Penal, arts. 100 até 106: Art. 100. A ação penal é pública, salvo quando a lei expressamente a declara privativa do ofendido $ 1º. A ação pública é promovida pelo Ministério Público, dependendo, quando a lei o exige, de representação do ofendido ou de requisição do Ministro da Justiça. 8 2º. A ação de iniciativa privada é promovida mediante queixa do ofendido ou de quem tenha qualidade para representá-lo. 8 3º. A ação de iniciativa privada pode intentar-se nos crimes de ação pública, se o Ministério Público não oferece denúncia no prazo legal. S$ 4º. No caso de morte do ofendido ou de ter sido declarado ausente por decisão judicial, o direito de oferecer queixa ou de prosseguir na ação passa ao cônjuge, ascendente, descendente ou irmão. Art. 101. Quando a lei considera como elemento ou circunstâncias do tipo legal fatos que, por si mesmos, constituem crimes, cabe ação pública em relação àquele, desde que, em relação a qualquer destes, se deva proceder por iniciativa do Ministério Público. Art. 102. A representação será irretratável depois de oferecida a denúncia. Art. 103. Salvo disposição expressa em contrário, o ofendido decai do direito de queixa ou de representação se não o exerce dentro do prazo de 6 (seis) meses, contado do dia em que veio a saber quem é o autor do crime, ou, no caso do $ 3º do art. 100 deste Código, do dia em que se esgota o prazo para oferecimento da denúncia. Art. 104. O direito de queixa não pode ser exercido quando renunciado expressa ou tacitamente. Parágrafo único. Importa renúncia tácita ao direito de queixa a prática de ato incompatível com a vontade de exercê-lo; não a implica, todavia, o fato de receber o ofendido a indenização do dano causado pelo crime. Art. 105. O perdão do ofendido, nos crimes em que somente se procede mediante queixa, obsta ao prosseguimento da ação. Art. 106. O perdão, no processo ou fora dele, expresso ou tácito: L- se concedido a qualquer dos querelados, a todos aproveita; IH - | se concedido por um dos ofendidos, não prejudica o direito dos outros; HI — se o querelado o recusa, não produz efeito. 8 1º. Perdão tácito é o que resulta da prática de ato incompatível com a vontade de prosseguir na ação. 47 www.RESUMOSCONCURSOS.HPG.COM.BR Apostila: Direito Processual Penal —- por Guilherme Tocha Art. 41. A denúncia ou queixa conterá a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo, a classificação do crime e, quando necessário, o rol das testemunhas. Art. 42. O Ministério Público não poderá desistir da ação penal. Art. 43. A denúncia ou queixa será rejeitada quando: L- o fato narrado evidentemente não constituir crime; H - já estiver extinta a punibilidade, pela prescrição ou outra causa; HI - for manifesta a ilegitimidade da parte ou faltar condição exigida pela lei para o exercício da ação penal. Parágrafo único. Nos casos do nº IIl, a rejeição da denúncia ou queixa não obstará ao exercício da ação penal, desde que promovida por parte legítima ou satisfeita a condição. Art. 44. A queixa poderá ser dada por procurador com poderes especiais, devendo constar do instrumento do mandato o nome do querelante e a menção do fato criminoso, salvo quando tais esclarecimentos dependerem de diligências que devem ser previamente requeridas no juízo criminal. Art. 45. A queixa, ainda quando a ação penal for privativa do ofendido, poderá ser aditada pelo Ministério Público, a quem caberá intervir em todos os termos subsegúentes do processo. Art. 46. O prazo para oferecimento da denúncia, estando o réu preso, será de 5 (cinco) dias, contado da data em que o órgão do Ministério Público receber os autos do inquérito policial, e de 15 (quinze) dias, se o réu estiver solto ou afiançado. No último caso, se houver devolução do inquérito à autoridade policial (art. 16), contar-se-á o prazo da data em que o órgão do Ministério Público receber novamente os autos. $ 1º. Quando o Ministério Público dispensar o inquérito policial, o prazo para o oferecimento da denúncia contar-se-á da data em que tiver recebido as peças de informações ou a representação. $ 2º. O prazo para o aditamento da queixa será de 3 (três) dias, contado da data em que o órgão do Ministério Público receber os autos, e, se este não se pronunciar dentro do tríduo, entender-se-á que não tem o que aditar, prosseguindo-se nos demais termos do processo. Art. 47. Se o Ministério Público julgar necessários maiores esclarecimentos e documentos complementares ou novos elementos de convicção, deverá requisitá-los, diretamente, de quaisquer autoridades ou funcionários que devam ou possam fornecê-los. Art. 48. A queixa contra qualquer dos autores do crime obrigará ao processo de todos, e o Ministério Público velará pela sua indivisibilidade. Art. 49. A renúncia ao exercício do direito de queixa, em relação a um dos autores do crime, a todos se estenderá. Art. 50. A renúncia expressa constará de declaração assinada pelo ofendido, por seu representante legal ou procurador com poderes especiais. 50 www.RESUMOSCONCURSOS.HPG.COM.BR Apostila: Direito Processual Penal —- por Guilherme Tocha Parágrafo único. A renúncia do representante legal do menor que houver completado 18 (dezoito) anos não privará este do direito de queixa, nem a renúncia do último excluirá o direito do primeiro. Art. 51. O perdão concedido a um dos querelados aproveitará a todos, sem que produza, todavia, efeito em relação ao que o recusar. Art. 52. Se o querelante for menor de 21 (vinte e um) e maior de 18 (dezoito) anos, o direito de perdão poderá ser exercido por ele ou por seu representante legal, mas o perdão concedido por um, havendo oposição do outro, não produzirá efeito. Art. 53. Se o querelado for mentalmente enfermo ou retardado mental e não tiver representante legal, ou colidirem os interesses deste com os do querelado, a aceitação do perdão caberá ao curador que o juiz lhe nomear. Art. 54. Se o querelado for menor de 21 (vinte e um) anos, observar-se-á, quanto à aceitação do perdão, o disposto no art. 52. Art. 55. O perdão poderá ser aceito por procurador com poderes especiais. Art. 56. Aplicar-se-á ao perdão extraprocessual expresso o disposto no art. 50. Art. 57. A renúncia tácita e o perdão tácito admitirão todos os meios de prova. Art. 58. Concedido o perdão, mediante declaração expressa nos autos, o querelado será intimado a dizer, dentro de 3 (três) dias, se o aceita, devendo, ao mesmo tempo, ser cientificado de que o seu silêncio importará aceitação. Parágrafo único. Aceito o perdão, o juiz julgará extinta a punibilidade. Art. 59. A aceitação do perdão fora do processo constará de declaração assinada pelo querelado, por seu representante legal ou procurador com poderes especiais. Art. 60. Nos casos em que somente se procede mediante queixa, considerar-se-á perempta a ação penal: L- quando, iniciada esta, o querelante deixar de promover o andamento do processo durante 30 (trinta) dias seguidos; Il - quando, falecendo o querelante, ou sobrevindo sua incapacidade, não comparecer em juízo, para prosseguir no processo, dentro do prazo de 60 (sessenta) dias, qualquer das pessoas a quem couber fazê-lo, ressalvado o disposto no art. 36; HI - quando o querelante deixar de comparecer, sem motivo justificado, a qualquer ato do processo a que deva estar presente, ou deixar de formular o pedido de condenação nas alegações finais; IV- quando, sendo o querelante pessoa jurídica, esta se extinguir sem deixar sucessor. Art. 61. Em qualquer fase do processo, o juiz, se reconhecer extinta a punibilidade, deverá declará-lo de ofício. Parágrafo único. No caso de requerimento do Ministério Público, do querelante ou do réu, o juiz mandará autuá-lo em apartado, ouvirá a parte contrária e, se o julgar 51 www.RESUMOSCONCURSOS.HPG.COM.BR Apostila: Direito Processual Penal —- por Guilherme Tocha conveniente, concederá o prazo de 5 (cinco) dias para a prova, proferindo a decisão dentro de 5 (cinco) dias ou reservando-se para apreciar a matéria na sentença final. Art. 62. No caso de morte do acusado, o juiz somente à vista da certidão de óbito, e depois de ouvido o Ministério Público, declarará extinta a punibilidade.” 52 www.RESUMOSCONCURSOS.HPG.COM.BR Apostila: Direito Processual Penal —- por Guilherme Tocha De acordo com o crime, o bem jurídico (ofendido ou posto em perigo pelo sujeito ativo) possui tal relevância que o Estado reserva para si, e para mais ninguém, a titularidade do direito da ação penal e, neste caso, diz-se que esta é pública. De outra parte, pode ocorrer que o delito cometido ofenda um bem jurídico da mais franca intimidade do sujeito passivo (ex.: a sua liberdade sexual), e então o Estado acha por bem que o sujeito passivo ou o seu representante legal (dependendo da hipótese) é que tenha a iniciativa para a instauração do procedimento policial e do processo penal, permitindo o ingresso da chamada ação penal privada. Expliquemos melhor. Segundo o crime praticado, este lesa um bem jurídico de tamanha importância para o Estado e para a sociedade que a ação penal deve ser iniciada sem ou até mesmo contra a manifestação de vontade de qualquer pessoa, devendo ser ajuizada até mesmo contra a vontade do próprio sujeito passivo do crime: a ação penal, nesses casos, é pública. Exemplo: no crime de homicídio, há a lesão (se tiver sido consumado) ou o perigo de lesão (no caso de tentativa) ao bem jurídico “vida”, bem jurídico este eivado de grande relevância para a existência da sociedade. Em sendo assim, o Estado, nos delitos de ação pública, obteve para si a titularidade para dar início à ação penal, pouco importando se, p. ex., a sociedade, seja qual for o motivo, pronuncie-se a favor do agente, e até mesmo que não seja da vontade dos familiares do de cujus o ajuizamento da ação penal: o direito de ação, que é do Estado, não depende da manifestação de vontade de quem quer que seja — a autoridade policial, tomando conhecimento da prática do homicídio, deve proceder de ofício; em juízo, a ação penal deve ser exercida pelo seu titular (Estado) sem que se submeta a qualquer requisito. Idem no crime de roubo: a ação penal deve ser iniciada mesmo contra a vontade do sujeito passivo, porquanto o objeto jurídico (“patrimônio”), conquanto pertença ao sujeito passivo, é de interesse público, e deve ser resguardado a todo custo (mesmo contra a vontade do detentor da res). Por outro lado, pode ocorrer de um crime ofender de tal modo seriamente o foro íntimo e secreto do ofendido que o Estado julgou conveniente, nestes casos — inobstante a gravidade da ofensa perpetrada — que o próprio ofendido ou o seu representante legal, desejando, tomasse a decisão de iniciar uma ação penal. Dada a natureza particularista desta modalidade da ação penal, diz-se que ela é privada. Do exposto, concluímos que há duas espécies de ação penal: > ação penal pública; > ação penal privada. 55 www.RESUMOSCONCURSOS.HPG.COM.BR Apostila: Direito Processual Penal —- por Guilherme Tocha Ação Penal Pública 1. Generalidades Como se faz para saber se a ação penal para a apuração de um crime é pública incondicionada, pública condicionada ou exclusivamente privada? Quando o CP, ou lei extravagante, após definir o delito, não fizer qualquer referência ou alusão à ação penal cabível, esta será, com certeza, pública incondicionada. Logo, a regra geral é: os crimes são de ação penal pública incondicionada, todas as vezes que a lei penal silenciar a respeito do tema. Por outro lado, após a tipificação do delito, pode a legislação penal referir-se à ação penal pertinente, e então ela não será pública incondicionada, mas pública condicionada ou exclusivamente privada. Assim, por exceção, temos que a ação penal ou é pública condicionada ou é privada. O crime é de ação penal pública condicionada quando houver um dispositivo na legislação penal que, fazendo referência a ele, expresse-se nesse sentido: “Somente se procede mediante representação”, tendo em vista que a “representação”, como veremos, é um instituto exclusivo da ação penal pública condicionada à representação. O crime é de ação penal privada quando houver na legislação penal um dispositivo que, fazendo referência a ele, expresse-se nesse sentido: “Somente se procede mediante queixa”, haja vista que a “queixa” (também denominada “queixa-crime”) é instituto exclusivo da ação penal privada. Esse critério é exposto pelo art. 100 do CP. Diz o caput: “A ação penal é pública, salvo quando a lei expressamente a declara privativa do ofendido”. Assim, quando a lei silenciar a respeito da ação penal, ela será pública incondicionada. Será exclusivamente privada quando o Código mencionar que a titularidade é exclusiva do ofendido. O art. 100, 8 1º, do CP, diz que “a ação pública é promovida pelo Ministério Público, dependendo, quando a lei o exige, de representação do ofendido ou de requisição do Ministro da Justiça”. Assim, a ação penal será pública condicionada quando a lei penal mencionar a exigência de representação ou de requisição ministerial. Por enquanto, fiquemos com a ação penal pública, que se subdivide em duas modalidades: > ação penal pública incondicionada; > ação penal pública condicionada. 56 www.RESUMOSCONCURSOS.HPG.COM.BR Apostila: Direito Processual Penal —- por Guilherme Tocha A legitimidade ativa ad causam para a ação penal pública é, em vista do regramento da Carta Magna (art. 129, |), privativa do Ministério Público. Mesmo nas hipóteses de delitos perpetrados contra bens, serviços ou interesses de pessoas jurídicas, de direito público ou privado, da administração pública federal, estadual, distrital ou municipal, é ao Ministério Público, e não a qualquer das Procuradorias dos entes acima citados, que incumbe a propositura da ação penal. Logo, os Procuradores Municipais, Estaduais e Federais não têm legitimidade para impetrarem ação penal pública, podendo, quando muito, comunicar o fato revestido em tese de criminalidade ao Ministério Público. Os princípios que regem a ação penal pública, tanto a incondicionada quanto a condicionada, são: A ação penal pública só pode ser intentada pela instituição a cuja legitimidade a CF/88 expressamente conferiu. No caso brasileiro, a ação penal pública é promovida, privativamente, pelo Ministério Público (art. 129, |, da CF/88). Qualquer outro órgão ou instituição (exs.: Defensoria Pública, Procuradorias Federais, Estaduais e Municipais e Advocacia-Geral da União) está impossibilitada de intentar a ação penal pública, ainda que o bem jurídico sofrido pelo ataque realizado pelo delito seja de titularidade de alguma das pessoas jurídicas políticas (União, Estados, Distrito Federal e Municípios). Constituir-se-ia gravíssimo equívoco. p. ex., afirmar que quando um crime ofende bem jurídico de um Estado da federação a legitimidade da ação penal é da respectiva Procuradoria: a legitimidade é do Ministério Público estadual. Idem nos crimes que lesam ou ameaçam bens jurídicos do Município. No caso de crimes contra bens, interesses ou serviços do Distrito Federal, a legitimidade dação penal pública é do Ministério Público da União; se de titularidade da União aqueles bens, interesses ou serviços, a legitimidade também é do Ministério Público da União. Não há outra resposta: o Ministério Público (estadual ou da União) tem legitimidade privativa na ação penal pública. Veremos posteriormente, no estudo da ação penal privada supletiva, que tal legitimidade é, como diz a própria CF/88, art. 129, |, privativa, e não exclusiva. bJNNobrigatoriedade (art. 24 do Código de Processo Penal): O Ministério Público tem a obrigação de promover a ação penal pública, quando satisfeitos os requisitos legais, não podendo ele abster-se desse dever jurídico, sob pena de responsabilidade criminal. 57 www.RESUMOSCONCURSOS.HPG.COM.BR Apostila: Direito Processual Penal —- por Guilherme Tocha Visa a qualificação não só a definir contra quem a denúncia é intentada — já que a ação penal não pode ser oferecida contra pessoa não identificada, não sabida, não conhecida sequer com relação ao nome completo — como também a evitar que certos constrangimentos e injustiças sejam cometidos, como seria o de se ver processada pessoa homônima (i. e., pessoa que, coincidentemente, tem o mesmo nome do acusado). Imagine-se, p. ex., uma ação penal intentada contra “José da Silva”, residente em Recife, sem mais se saber dado algum acerca de sua pessoa ou endereço. Com efeito, uma denúncia nesses termos deve ser considerada inepta, não podendo ser recebida pelo magistrado. Observe-se que uma denúncia bem elaborada o é com a qualificação completa do indivíduo contra o qual se imputa a prática de ilícito penal. No entanto, a despeito da negligência ministerial quanto a algum dado da qualificação, não é de se rejeitá-la, contanto que os dados que foram objeto de qualificação sejam suficientes para individualizar a pessoa do réu. Por exemplo, pode acontecer de o Ministério Público não tomar conhecimento da profissão ou da residência do réu, e nem por isso a denúncia deixa de preencher os requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal, porquanto os demais dados a seu respeito já sejam mais do que suficientes para caracterizá-lo e identificá-lo, sem dúvidas, dentre todas as pessoas em sociedade. Alguns problemas especiais vez ou outra surgem com relação à qualificação dos acusados. Aponte-se, em primeiro lugar, a denúncia nos crimes societários (geralmente são crimes contra o meio ambiente, contra a ordem tributária, contra o sistema financeiro, contra a ordem econômica, contra a economia popular e contra as relações de consumo): o Ministério Público constata que agentes, integrantes de pessoas jurídicas, praticaram, p. ex., crime contra a ordem econômica. Daí vem um grande problema: Quem o Ministério Público deve denunciar? Todos os empregadores e empregados da empresa? Apenas os diretores? Apenas os sócios? Apenas alguns administradores? De fato, é muito difícil, em tais casos, saber-se exatamente quem praticou o ilícito em ensejo. E o que é pior: muitas vezes é (quase) impossível o Ministério Público, quando do momento do oferecimento da denúncia, saber com exatidão quem praticou qual conduta, quando, como, com quem e por quais motivos. Em princípio, pode-se sustentar, com bastante plausibilidade, ser ilegal essa forma de agir do Ministério Público, podendo-se advogar que o Parquet só pode denunciar quem realmente tiver praticado o injusto penal. Mas, conforme assinalamos, é muito difícil, senão quase impossível, saber-se tudo e com tanta riqueza de detalhes já na promoção da ação penal, até porque outras provas provavelmente só surgirão no desenrolar do processo. O STF já tem se pronunciado, ora no sentido de que é lícito ao Ministério Público oferecer denúncia contra todos os dirigentes (aí incluídos os diretores, gerentes e administradores), caso não tenha elementos probatórios de que alguns deles não haja co-participado no delito, ora no sentido de que o Ministério Público deve denunciar tão- somente os sócios contra os quais tiver indícios suficientes de autoria. 60 www.RESUMOSCONCURSOS.HPG.COM.BR Apostila: Direito Processual Penal —- por Guilherme Tocha Evidentemente que se, p. ex., uma empresa é composta apenas por três sócios, e o Ministério Público tem certeza de que apenas dois deles é que praticaram o ilícito penal, só deverá oferecer denúncia contra estes, não contra todos. Logo, conclui-se que a jurisprudência, inclusive a do Pretório Excelso, tem admitido (atente-se bem: tem admitido, o que não quer dizer que sempre admita!) a denúncia indeterminada ou genérica nos crimes societários. Todavia, essa mesma jurisprudência, em todo e qualquer caso, não admite a condenação genérica. Ou seja: segundo várias decisões pretorianas, denunciar todos os dirigentes, pode; conforme todas as decisões pretorianas, não pode o magistrado condenar genericamente, sem haver provas conclusivas contra todos, mas apenas proferir julgamento de mérito condenatório contra os que realmente praticaram o delito. Outra questão de maior relevo quanto à ação penal pública tange à denominada denúncia alternativa. Esta diz respeito à possibilidade de o Ministério Público poder oferecer denúncia indicando que o réu praticou um fato ou outro. Exemplo: em vista das provas colhidas, não ficou muito assentado se o réu praticou furto simples ou qualificado; se o crime é de furto ou de apropriação indébita; se o incêndio foi doloso ou culposo. Assim, pela denúncia alternativa o Ministério Público pediria a condenação por um crime ou pelo outro. A jurisprudência tem rechaçado esse entendimento, orientando-se no sentido de que a denúncia deve ser certa e determinada, não podendo o Ministério Público pedir a condenação, p. ex., “por receptação dolosa ou culposa”, mas apenas “por receptação dolosa” ou apenas “por receptação culposa”. Logicamente que estamos aqui pressupondo que o réu praticou uma única conduta, da qual o Ministério Público não tem certeza do tipo legal em que se enquadra. Nada vem a impedir, pois, que, tendo havido concurso de crimes, o Ministério Público denuncie o réu por todos os ilícitos dele resultantes. Mas então, repare-se, a denúncia não estará formulando pedido alternativo, senão pedido cumulativo. 3º) Classificação do Crime: A classificação do crime diz respeito não só ao seu nomen juris como também ao dispositivo penal que foi violado pelo denunciado. O Ministério Público deve, pois, além de expor o fato e qualificar o acusado, determinar quais os ilícitos que este cometeu e, além disso, indicar os dispositivos legais nos quais se enquadra o réu. Portanto, não basta o Ministério Público expor que o réu “disse falsamente que a vítima havia lhe furtado, sabendo-a inocente, daí resultando a instauração de inquérito policial”, senão também, ao pedir a condenação, deve fazê-lo explicitando o nomen juris (denunciação caluniosa) e o tipo penal respectivo (art. 339 do Código Penal). Logo, narra-se o fato delituoso, dá-se-lhe o nomen juris e se indica o dispositivo de lei em que se enquadra. Por acaso o representante do Ministério Público está vinculado à classificação do crime dada pelo Delegado de Polícia no inquérito? Claro que não! O inquérito é apenas 61 www.RESUMOSCONCURSOS.HPG.COM.BR Apostila: Direito Processual Penal —- por Guilherme Tocha procedimento administrativo pré-processual de caráter informativo, sendo até, como sabemos, dispensável (interpretação que se apura dos arts. 39, 8 5º, e 46, 8 1º, do Código de Processo Penal). Logo, se o Delegado indicia alguém por furto simples, nada impede que o Ministério Público, discordando dessa classificação, dê-lhe outra (furto qualificado ou roubo, por exemplo). Argumento ainda mais plausível está em que cabe ao Ministério Público, e não à Autoridade Policial, a formação da opinio delicti. E se o Ministério Público tiver se equivocado na classificação do crime? Exemplo: narra um fato que se enquadra perfeitamente no art. 155 do CP (furto), mas a denúncia requer a condenação por roubo (art. 157 do CP), crime mais grave; ou narra um estupro (art. 213 do CP), mas pede a condenação por corrupção de menores (art. 218 do CP), crime menos grave? Em tal caso, a denúncia não será rejeitada. Por quê? Porque, da mesma forma que o Ministério Público não está vinculado ao inquérito policial, podendo discordar do Delegado de Polícia, o Juiz não está vinculado à denúncia, podendo dar ao fato outra classificação, desde que a peça acusatória esteja, ao entender do magistrado, equivocada. Contudo, repare-se que o momento oportuno para o Juiz dar a correta classificação do delito é a dos arts. 383 e 384 do Código de Processo Penal, isto é, na sentença. Se o magistrado, no momento já do recebimento da denúncia, desclassificar o crime capitulado pelo Ministério Público para outro (ex.: o Juiz recebe a denúncia por furto, e não por roubo, como o desejava o Ministério Público), contra tal decisão caberá impetração de recurso em sentido estrito (art. 581, |, do Código de Processo Penal), no prazo de 5 (cinco) dias, visto que não receber a denúncia talqualmente formulada equivale a não recebê-la. E se o Ministério Público der excessiva classificação ao crime? Por exemplo, o Ministério Público narra um crime de furto no qual o agente haja entrado no domicílio da vítima e de lá haja subtraído bens. O Ministério Público, então, denuncia-o por furto em concurso material com violação de domicílio. Nesse caso, o certo seria a denúncia apenas por crime de furto, porque a violação de domicílio é absorvida, como antefactum impunível do segundo crime. O Juiz deve rejeitar a denúncia? Não. Recebe-a e, no momento oportuno, isto é, na prolatação da sentença, faz a correta capitulação da infração, tolhendo o quantum acusatório da denúncia. 4º) Rol de Testemunhas: Se o Ministério Público tiver interesse em arrolar testemunhas, deve fazê-lo logo na denúncia, sob pena de preclusão do ato, isto é, não poderá mais o Ministério Público arrolar testemunhas posteriormente, salvo quando alguma ou algumas das testemunhas arroladas não tiver sido encontrada, quando então poderá o Ministério Público pedir a substituição. De qualquer sorte, mesmo essa substituição só será possível se e quando a testemunha não encontrada tiver sido arrolada na denúncia (art. 397 do Código de Processo Penal). Há, entretanto, exceção a essa regra do arrolamento de testemunhas logo na denúncia. E que os arts. 13 e 18, caput, da Lei n.º 4.898/65 (Lei dos Crimes de Abuso de Autoridade), deixam margem a 62 www.RESUMOSCONCURSOS.HPG.COM.BR Apostila: Direito Processual Penal —- por Guilherme Tocha ou seu representante legal pode oferecer queixa-crime, nos crimes de ação penal privada. Se a vítima ou seu representante legal oferecer queixa-crime em crime de ação penal pública, a peça deverá ser rejeitada pelo Juiz. Igualmente, exige-se que a denúncia seja oferecida contra quem é realmente parte legítima passiva (réu) na relação processual. Imagine-se uma denúncia oferecida contra uma testemunha do crime (não estamos aqui tratando de crime de falso testemunho) :ela é um dos sujeitos processuais, mas não é parte no processo, porque não foi ela quem praticou o ilícito penal. Mais absurdo ainda é o oferecimento de denúncia contra coisa ou animal, pois só quem pode cometer infrações penais (visto que só possuem capacidade penal) são os seres humanos. 4º) Quando faltar condição exigida pela lei para o exercício da ação penal (inciso Ill, in fine): E rejeitada a denúncia, outrossim, quando estiver ausente condição objetiva de punibilidade (exs.: sentença declaratória de falência, nos crimes antefalimentares; entrada do agente em território brasileiro, nos crimes praticados no exterior por estrangeiro contra brasileiro) ou condição de procedibilidade (exs.: oferecimento de representação, nos crimes de ação penal pública condicionada à representação; requisição do Ministro da Justiça, nos crimes de ação penal pública condicionada a ela; trânsito em julgado da sentença anulatória do casamento, no crime definido no art. 236 do CP; prévia licença da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal, nos crimes praticados por membro do Congresso Nacional; defesa preliminar de acusado por crime de responsabilidade; tentativa de reconciliação, nos crimes contra a honra; exame pericial, nos crimes contra a propriedade imaterial, quando tiverem deixado vestígios). Consoante se depreende do art. 43, parágrafo único, do Código de Processo Penal, as hipóteses de rejeição elencadas no inciso Ill não obstam que, posteriormente, possa ser oferecida a denúncia, contanto que por parte legítima (Ministério Público) contra quem realmente esteja no pólo passivo do litígio (réu), ou satisfeita a condição exigida para o seu oferecimento (exs.: quando presente a representação do ofendido ou de seu representante legal, nos crimes de ação penal pública condicionada; requisição de Ministro da Justiça, nas ações a ela condicionadas; existência de licença da Casa da qual é membro o congressista acusado de crime; sentença de declaração de falência, nos crimes antefalimentares etc.). 3. Ação Penal Pública Condicionada A ação penal é pública condicionada quando o seu exercício depende de preenchimento de requisitos (condições). Possui duas formas: > ação penal pública condicionada à representação do ofendido ou de seu representante legal; 65 www.RESUMOSCONCURSOS.HPG.COM.BR Apostila: Direito Processual Penal —- por Guilherme Tocha > ação penal pública condicionada à requisição do Ministro da Justiça. Em ambos os casos, a ação penal não pode ser iniciada sem a representação ou a requisição ministerial. Exemplos: arts. 7º, 8 3º, b; 153; 154; 156, $ 1º; 176, parágrafo único, 1º parte. Sem a representação ou a requisição ministerial, nada poderá fazer o Ministério Público em termos de acionamento. Se intentar a denúncia, será rejeitada (art. 43, III, in fine, do Código de Processo Penal). Quando o crime é de ação penal pública condicionada à representação, o Código Penal faz referência expressa à necessidade dessa condição, empregando a seguinte expressão: “Somente se procede mediante representação”. E o que ocorre no crime de ameaça. Após descrever o delito (art. 147, caput), o parágrafo único reza: “Somente se procede mediante representação”. Outros casos: arts. 130, 8 2º; 153; 154; 156, 8 1º; 176, parágrafo único, 1º parte; 182, caput; 225, 8 2º; 345, parágrafo único, todos do cr. Que é representação? É manifestação de vontade do ofendido ou de seu representante legal, no sentido de movimentar-se o jus persequendi in juditio. Noutras palavras, a representação é um pedido-autorização para que o Ministério Público possa oferecer a denúncia, sem o qual esta, repita-se, não poderá vir a ser intentada. Nos termos do art. 39 do CPP, “o direito de representação poderá ser exercido, pessoalmente, ou por procurador com poderes especiais, mediante declaração, escrita ou oral, feita ao juiz, ao órgão do Ministério Público ou à autoridade policial” (caput). Como se vê, não exige fórmula especial, bastando a manifestação de vontade. A representação constitui condição de procedibilidade da ação penal pública. Sem ela, o órgão do Ministério Público não pode iniciar a ação penal mediante o oferecimento de denúncia. Quais seriam as pessoas legitimadas para oferecer a representação? Em princípio, o direito de representação pode ser exercido pelo ofendido ou seu representante legal (CPP, art. 24, caput). E se o ofendido é menor de 21 e maior de 18 anos? Pode exercer o direito de representação sem a assistência do seu representante legal? Pode, aplicando- se o disposto no art. 34 do Código de Processo Penal: “Se o ofendido for menor de 21 (vinte e um) e maior de 18 (dezoito) anos, o direito de queixa poderá ser exercido por ele ou por seu representante legal”. Se ele pode exercer o direito de queixa, que é a própria ação penal privada, evidentemente que pode exercer o minus, que é o direito de representação. Neste caso, tanto ele quanto seu representante legal podem exercer o direito de representação. Com a vigência no Novo Código Civil, que reduziu a maioridade civil para 18 (dezoito) anos completos, surgiu a polêmica sobre se haveria representante legal para vítima com 18 ou mais anos de idade. A questão é controvertida, defendendo uns que o novo 66 www.RESUMOSCONCURSOS.HPG.COM.BR Apostila: Direito Processual Penal —- por Guilherme Tocha diploma legal civilista derroga todos os artigos do CPP que aduzem à curadoria ou representação legal dos menores de 21 anos; outros atestam que enquanto o CPP não for expressamente modificado continuam em pleno vigor suas normas tangentes ao aspecto da menoridade de 21 anos, não podendo o Novo Código Civil exercer qualquer influência sobre ele. E se houver conflito entre o ofendido e o seu representante legal, ou seja, e se um deles quiser oferecer a representação, mas o outro não? Prevalece o disposto no art. 50, parágrafo único, do Código de Processo Penal: “A renúncia do representante legal do menor que houver completado 18 (dezoito) anos não privará este do direito de queixa, nem a renúncia do último excluirá o direito do primeiro”. E se o ofendido é menor de 18 anos? O direito de representação pode ser exercido pelo seu representante legal (pai, mãe, tutor, curador, e a” te, nalguns casos, por vizinho, tio, tia). E se o ofendido não tem representante legal? Neste caso, a representação poderá ser feita por curador especial, nomeado pelo juiz (CPP, art. 33 — “Se o ofendido for menor de 18 (dezoito) anos, ou mentalmente enfermo, ou retardado mental, e não tiver representante legal, ou colidirem os interesses deste com os daquele, o direito de queixa poderá ser exercido por curador especial, nomeado, de ofício ou a requerimento do Ministério Público, pelo juiz competente para o processo penal”). A mesma solução ocorre quando o ofendido é enfermo mental ou colidem os seus interesses com os de seu representante legal (art. 33). E se o ofendido morre ou é declarado ausente por decisão judicial? Aplica-se o disposto no art. 24, $ 1º, do CPP: “No caso de morte do ofendido ou quando declarado ausente por decisão judicial, o direito de representação passará ao cônjuge, ascendente, descendente ou irmão”. Já foi decidido na jurisprudência que a representação pode ser feita pela mãe da vítima, tendo esta pai vivo (RT, 388:96, 397:78, 412:101, 426:320, 431:308, 438:491). O direito de representação também pode ser exercido pelo tio da vítima, amásio da mãe da vítima, madrinha, cunhado, pai de criação ou por quem possui a guarda da vítima (RT, 383:82, 411:95, 415:94, 378:85, 397:59, 373:57, 372:155, 392:391, 416:318, 396:366, 410:63, 395:95, 400:103, 415:94). O ofendido ou seu representante legal, exercido o direito de representação, pode retratar-se, i. e., retirá-la, impossibilitando, assim, de o Ministério Público intentar a denúncia? Nos termos do art. 104 do CP, “a representação é irretratável depois de oferecida a denúncia”. Assim, se o ofendido exerce o direito de representação, pode retirá-la antes do oferecimento da denúncia. No entanto, como deixa claro o art. 104 do CP, em sendo oferecida a denúncia, não mais há a possibilidade de retratação. Não se olvide de que, nesse tema, pode-se falar em retratação da retratação: o ofendido ou seu representante legal, num primeiro momento, oferece a representação; ainda sem que o Ministério 67 www.RESUMOSCONCURSOS.HPG.COM.BR Apostila: Direito Processual Penal —- por Guilherme Tocha Ação Penal Privada 1. Generalidades Quando a titularidade da ação penal pertence ao particular, i. e., quando o direito de iniciá-la pertence à vítima ou seu representante legal, denomina-se ação penal privada. Possui duas formas: a) ação penal exclusivamente privada; b) ação penal privada subsidiária da pública. A primeira espécie ocorre quando o CP determina que a ação penal é de titularidade privativa do ofendido ou de seu representante legal. Exemplo: crime do art. 218 do CP (corrupção de menores). Nada, entretanto, impede a aplicação do art. 31 do Código de Processo Penal, quando falecido ou declarado ausente o ofendido. Na ação penal privada subsidiária da pública, embora a ação penal continue de natureza pública, permite-se que o particular a inicie quando o Ministério Público não a propõe no prazo legal. Exemplo: num roubo, o Promotor Público não ofereça denúncia dentro do prazo legal (CPP, art. 46, caput). Permite-se que o ofendido ou seu representante legal dê início à ação penal (CP, art. 100, 8 3º). 2. Princípios Os princípios que regem a ação penal privada são: O titular da ação penal privada não tem obrigação de intentá-la, isto é, ao contrário do que acontece na ação penal pública, que se rege pelo princípio da obrigatoriedade, o ofendido e seu representante legal não têm obrigação alguma de impetrar queixa-crime. Esta será, ou não, intentada, conforme sua livre conveniência. Isso é facilmente constatado quando o titular renuncia ao direito de queixa, que causa a extinção da punibilidade (art. 107, V, do CP). Ainda quando já intentada a queixa-crime, pode o seu titular desistir no prosseguimento da mesma, tal como acontece no perdão do ofendido, que é causa extintiva da punibilidade (art. 107, V, do CP), ocorrendo o mesmo no recurso que haja interposto. Também aqui o princípio é diverso daquele da ação penal pública. 70 www.RESUMOSCONCURSOS.HPG.COM.BR Apostila: Direito Processual Penal —- por Guilherme Tocha Esse princípio é idêntico ao da ação penal pública: não pode o ofendido escolher contra quem quer intentar a queixa, no caso de co-autoria. Exemplo: a mulher estuprada por três rapazes, mediante grave ameaça, tomando conhecimento da participação de todos, contra todos deverá acionar, sob pena de operar-se o perdão do ofendido, que causa a extinção da punibilidade de todos, visto que o perdão a um a todos beneficia (arts. 107, V c/c 106, |, do CP). 3. Ação Penal Exclusivamente Privada Quando o crime é de ação penal exclusivamente privada, o CP, ou lei penal especial, após descrever o delito, faz referência à expressão: “Somente se procede mediante queixa”. A queixa ou queixa-crime, é a peça inicial da ação penal privada. Exemplo: no crime de exercício arbitrário das próprias razões (art. 345 do CP), após a definição legal (caput), o CP diz: “Se não há emprego de violência, somente se procede mediante queixa” (parágrafo único). Outros casos: arts. 145, caput; 161, 8 3º; 167; 225, caput; 236, parágrafo único; 240, $ 2º, todos do CP. A ação penal privada é promovida mediante queixa do ofendido ou de seu representante legal (CP, art. 100, $ 2º, e CPP, art. 30). Nela, o ofendido ou seu representante legal se denomina querelante; o réu, querelado. A palavra queixa é vulgarmente pronunciada para fazer significar a notitia criminis, o que tecnicamente é um equívoco: notitia criminis é o ato de levar à autoridade policial o conhecimento da prática de um ilícito penal; queixa é a inaugural da ação penal privada. São dois institutos completamente diferentes. A queixa também não se confunde com o requerimento de instauração de inquérito policial por crime de ação penal privada (CPP, art. 5º, 8 5º). O ofendido menor de 18 anos não pode impetrar a queixa por ausência de legitimidade ad processum (capacidade para estar em juízo), devendo o representante legal fazê-lo (pai, mãe, tutor, curador, padrasto, madrasta, etc.). Sendo menor de 21 anos e maior de 18, pode o ofendido exercer o direito de queixa, nos termos do art. 34 do CPP. Nesse caso, tanto ele quanto seu representante legal podem oferecer a queixa. Em sendo o ofendido maior de 21 anos, apenas ele poderá oferecê-la, salvante, obviamente, os casos em que ele falece, quando então passa o cônjuge, ascendente, descendente e irmão a terem a legitimidade para intentar a queixa. Surge uma indagação: E se o ofendido é menor de 18 anos e não tem representante legal? O juiz nomear-lhe-á um curador especial para o fim de oferecer queixa (CPP, art. 33 —- “Se o ofendido for menor de 18 (dezoito) anos, ou mentalmente enfermo, ou n www.RESUMOSCONCURSOS.HPG.COM.BR Apostila: Direito Processual Penal —- por Guilherme Tocha retardado mental, e não tiver representante legal, ou colidirem os interesses deste com os daquele, o direito de queixa poderá ser exercido por curador especial, nomeado, de ofício ou a requerimento do Ministério Público, pelo juiz competente para o processo penal”), não estando o curador obrigado a iniciar a ação penal. Fosse diferente e então a lei estaria de certa forma impondo a obrigação de o curador oferecê-la, o que se contrapõe ao princípio da conveniência. A mesma solução ocorre quando o ofendido é enfermo mental ou colidem os seus interesses com os de seu representante legal. No caso de ofendido maior de 18 e menor de 21 anos, aplica-se o que dissemos acerca da representação: qualquer um pode intentar a queixa. E se houver conflito, isto é, um quiser intentá-la e outro não? No caso, aplica-se o disposto no art. 50, parágrafo único, do Código de Processo Penal: leva-se em conta a vontade do que deseja fazer valer o jus querelandi. Um problema surgido na doutrina e na jurisprudência é: se apenas o ofendido menor de 18 anos tomou conhecimento da autoria do fato criminoso, mas não o tomou seu representante legal, qual a solução? Suponha-se que Maria tenha sido estuprada mediante grave ameaça em 20 de agosto de 2000, quando contava com 17 anos e 5 meses de idade, tendo ela nesta data tomado conhecimento de quem fora o autor, sem que ela tenha contado o ocorrido aos pais até ter completado 18 anos, perderá o direito de queixa? Vejamos a Súmula 594 do STF: “Os direitos de queixa e de representação podem ser exercidos, independentemente, pelo ofendido ou por seu representante legal.” Isso significa que, mesmo sem Maria ter tomado qualquer providência como contar aos pais o estupro, o prazo decadencial, para ela, começa a correr da data de seu aniversário, e para o representante legal, a partir da data em que ele toma conhecimento do fato. Ela, então, poderá intentar queixa-crime até 18 anos e seis meses de idade, e não apenas até 19 de fevereiro de 2001, como se poderia supor. Para o representante legal o prazo correrá da data em que ele tomou conhecimento do autor do fato até Maria completar 21 anos de idade. Assim é que, se já com 19 anos de idade Maria nada contara ao pai ou à mãe, mas estes vêm a descobrir o ocorrido, inclusive a autoria, terão o prazo de 6 (seis) meses para o oferecimento da queixa, contados da data desse conhecimento. E se o ofendido morre ou é declarado ausente por decisão judicial? O direito de oferecer queixa passa ao cônjuge, ascendente, descendente ou irmão (CP, art. 100, 8 4º, e CPP, art. 24, 8 1º), ressalvados os casos dos arts. 236, parágrafo único, e 240, $ 2º, do CP. O que se disse, na oportunidade em que delineamos o direito de representação, sobre o Novo Código Civil, pode e deve ser aplicado também à queixa-crime. Em alguns crimes pode aparecer a figura da ação penal personalíssima: é aquela ação penal privada que só pode ser intentada exclusivamente pelo ofendido, e por mais ninguém, ainda que ele venha a falecer posteriormente. Esses crimes, ao menos do CP, são o de induzimento a erro essencial e ocultação de impedimento (art. 236, parágrafo único) e adultério (art. 240, $ 2º). Ação penal personalíssima é a ação penal 72 www.RESUMOSCONCURSOS.HPG.COM.BR Apostila: Direito Processual Penal —- por Guilherme Tocha Nos termos do que dispõe o art. 101 do CP: Art. 101. Quando a lei considera como elemento ou circunstâncias do tipo legal fatos que, por si mesmos, constituem crimes, cabe a ação pública em relação àquele, desde que em relação a qualquer destes se deva proceder por iniciativa do Ministério Público.” O art. 101 do CP cuida dos chamados crimes complexos, que são os delitos em cujos tipos penais há duas ou mais elementares que por si sós constituem crimes e, igualmente, são os crimes em cujo tipo penal uma elementar e uma circunstância sua apresentam-se, por si sós, como crimes. Como exemplo dos primeiros, cite-se o roubo (art. 157 do CP), que se constitui do furto e do constrangimento ilegal, que, por si sós, como se sabe, já configuram delitos (arts. 155 e 146, respectivamente, do CP). Como exemplos dos segundos há os delitos qualificados pelo resultado, como o latrocínio (art. 157, 8 3º, in fine, do CP), em que o roubo se apresenta como elementar e o homicídio como qualificadora, e a lesão corporal seguida de morte (art. 129, 8 3º, do CP), que se constitui da lesão corporal (art. 129 do CP) e do homicídio culposo (art. 121, 8 3º, do CP). Pela redação do art. 101 do CP chega-se à conclusão de que, no crime complexo, desde que seja de ação penal pública qualquer dos fatos que fazem parte do seu tipo penal, todo o tipo penal do crime complexo virá a ser de ação penal pública. De qualquer sorte, não haveria, decerto, muito trabalho em se saber se o crime complexo é, ou não, de ação penal pública, em vista do critério que determina a ação penal aplicável, ou seja, basta verificar se a norma tratou da ação penal. Se não tratou, o crime é de ação penal pública; se tratou, é privada a ação. Exemplos12: a) Injúria real com lesão corporal (CP, art. 140, 8 2º): a injúria é de ação penal privada; o crime de lesão corporal, de ação pública. A injúria real com lesão corporal, é de ação penal pública conforme determina o art. 145, caput. Logo, é prescindível o princípio do art. 101; Estupro (art. 213) qualificado pela morte da vítima (art. 223, parágrafo único). O crime de estupro (em regra) é de ação penal privada (art. 225, caput); a morte culposa da vítima, que por si constitui crime de homicídio culposo, leva à ação penal pública. Assim, aplicando-se o disposto no art. 101, o crime complexo de estupro qualificado pela morte da vitima é de ação penal pública. Ocorre que o art. 225, caput, que está disposto no Capítulo IV do Título VI, da Parte Especial do CP, diz que são de ação penal privada “os crimes definidos nos capítulos anteriores” (estupro, atentado violento ao pudor, posse sexual mediante fraude, atentado ao pudor mediante fraude, assédio sexual, sedução, *2 JESUS, op. cit., p. 582, $ último. 75 www.RESUMOSCONCURSOS.HPG.COM.BR Apostila: Direito Processual Penal —- por Guilherme Tocha corrupção de menores e rapto), e como o art. 223 do CP está localizado no Capítulo IV (isto é, no mesmo artigo em que está topograficamente disposto o art. 225 do CP), os crimes sexuais que resultam em lesões graves ou morte são todos de ação penal pública incondicionada. No entanto, no que tange ao estupro de que derivou lesão corporal leve, o STF, em sua Súmula 608, considerou-o como de ação penal pública incondicionada: “No crime de estupro, praticado mediante violência real, a ação penal é pública incondicionada.” Muitas são as críticas da doutrina com relação à Súmula em apreço, pois o estupro não é crime complexo, a lesão corporal leve é por ele absorvido e, além disso, ainda que se fosse levar em consideração ser o crime de estupro complexo, a ação penal deveria ser a pública condicionada, pois a lesão corporal é, em vista da Lei n.º 9.099/95, de ação penal pública condicionada. 76 www.RESUMOSCONCURSOS.HPG.COM.BR Apostila: Direito Processual Penal —- por Guilherme Tocha Como será processado o delinquente que tiver praticado dois crimes em concurso (formal ou material) ou conexos, um de ação penal pública e outro de ação penal privada? Lembremos que quanto aos crimes de ação penal pública o titular legítimo é o Ministério Público, e não de quem quer que seja, nem mesmo do ofendido ou de seu representante legal. No tocante aos crimes de ação penal privada o Ministério Público não é parte legítima, e sim o ofendido e seu representante legal. Nesses casos será imprescindível que se forme um litisconsórcio ativo entre o Promotor de Justiça e o titular do jus querelandi, para que ambos os delitos sejam objeto de acusação e possam ser apreciados conjuntamente na sentença, aplicando-se o disposto no art. 77, Il, do Código de Processo Penal. Cada ação penal é promovida por seu titular, nos termos do art. 100, caput, do CP. 1. Código Penal: Os crimes contra a honra são, no Código penal brasileiro, a CALÚNIA (art. 138), a DIFAMAÇÃO (art. 139) e a INJÚRIA (art. 140). Caluniar é imputar falsamente a alguém fato definido como crime (pena — detenção, de 6 meses a 2 anos, e multa). Difamar é imputar a alguém fato ofensivo à sua reputação (pena — detenção, de 3 meses a 1 ano, e multa). Injuriar é ofender a dignidade ou o decoro de alguém (pena — detenção, de 1 a 6 meses, ou multa). Os crimes contra a honra são, regra geral, de ação penal privada, devendo o ofendido ou seu representante legal oferecer a queixa-crime no prazo máximo de 6 meses, contados 7 www.RESUMOSCONCURSOS.HPG.COM.BR Apostila: Direito Processual Penal —- por Guilherme Tocha $ 3º. Não se admite a prova da verdade contra o Presidente da República, o Presidente do Senado Federal, o Presidente da Câmara dos Deputados, os Ministros do Supremo Tribunal Federal, Chefes de Estado ou de Governo estrangeiro, ou seus representantes diplomáticos. Art. 21. Difamar alguém, imputando-lhe fato ofensivo à sua reputação: Pena: Detenção, de 3 (três) a 18 (dezoito) meses, e multa de 2 (dois) a 10 (dez) salários- mínimos da região. $ 1º. A exceção da verdade somente se admite: a) se o crime é cometido contra o funcionário público, em razão das funções, ou contra órgãos ou entidade que exerça funções de autoridade pública; b) se o ofendido permite a prova. S$ 2º. Constitui crime de difamação a publicação ou transmissão, salvo se motivada por interesse público, de fato delituoso, se o ofendido já tiver cumprido pena a que tenha sido condenado em virtude dele. Art. 22. Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou decoro: Pena: Detenção, de 1 (um) mês a 1 (um) ano, ou multa de 1 (um) a 10 (dez) salários- mínimos da região. Parágrafo único. O juiz pode deixar de aplicar a pena: a) quando o ofendido, de forma reprovável, provocou diretamente a injúria; b) no caso de retorsão imediata, que consista em outra injúria. Art. 23. As penas cominadas nos arts. 20 a 22 aumentam-se de um terço, se qualquer dos crimes é cometido: L- contra o Presidente da República, Presidente do Senado Federal, Presidente da Câmara dos Deputados, Ministros do Supremo Tribunal Federal, Chefe de Estado ou Governo estrangeiro, ou seus representantes diplomáticos; H- contra funcionário público, em razão de suas funções; HI - contra órgão ou entidade que exerça função de autoridade pública. (...) Art. 40. A ação penal será promovida: L- nos crimes de que tratam os arts. 20 a 23: a) pelo Ministério Público, mediante requisição do Ministro da Justiça, no caso do n.º | do art. 23, bem como nos casos em que o ofendido for Ministro de Estado; b) pelo Ministério Público, mediante representação do ofendido, nos casos dos números Il e III do art. 23; c) por queixa do ofendido ou de quem tenham qualidade para representá-lo; d) pelo cônjuge, ascendente, descendente ou irmão, indistintamente, quando se tratar de crime contra a memória de alguém ou contra pessoa que tenha falecido antes da queixa. (Redação dada pela Lei n.º 6.640, de 8/5/79 - D.O. de 10/5/79.) H- nos demais crimes por denúncia do Ministério Público.” 80 www.RESUMOSCONCURSOS.HPG.COM.BR Apostila: Direito Processual Penal —- por Guilherme Tocha São, assim, de AÇÃO PENAL: EmmnnIncondicionada (art. 40,11): Todos os casos não abrangidos pelo inciso | do art. 4013. EmnZnmmncondicionada (art. 40,1,a e b) a) À Representação do Ofendido ou de seu Representante Legal (art. 40, |, b): Nos crimes definidos no art. 23, Il e III (contra funcionário público, em razão de suas funções; contra órgão ou entidade que exerça função de autoridade pública). b) À Requisição do Ministro da Justiça (art. 40, |, a): Nos crimes contra o Presidente da República, Presidente do Senado Federal, Presidente da Câmara dos Deputados, Ministros do Supremo Tribunal Federal, Chefe de Estado ou Governo estrangeiro, ou seus representantes diplomáticos, e Ministro de Estado. Nos casos em que só se procede mediante queixa do ofendido ou de seu representante legal — e aqui estão incluídos o cônjuge, ascendente, descendente ou irmão, indistintamente, quando se tratar de crime contra a memória de alguém ou contra pessoa que tenha falecido antes da queixa. Não se olvide de que, em termos de crimes de imprensa, a queixa obedece a outro prazo, que não o de 6 meses do Código Penal e Código de Processo Penal: ela deve ser intentada no prazo de 3 (três) meses, contados da data da publicação ou transmissão da ofensa (art. 40, 8 1º, da Lei de Imprensa), sob pena de decadência. *º A Lei de Imprensa traz uma impropriedade no inciso Il do art. 40. Este, referindo-se à ação penal pública incondicionada, diz que “a ação penal será promovida: (...) Il - nos demais crimes por denúncia do Ministério Público”. Ora, a ação penal pública — tanto a incondicionada quanto a condicionada à representação do ofendido ou de seu representante legal e a condicionada à requisição do Ministro da Justiça — é ofertada mediante denúncia. Não há razão técnica para que, então, o art. 40, Il, da Lei haja se referido à denúncia tão-somente “nos demais crimes”, porquanto é através de denúncia do Ministério Público que se impetra ação penal nos casos do inciso |, a (condicionada à requisição do Ministro da Justiça) e b (condicionada à representação do ofendido ou de seu representante legal). 81 www.RESUMOSCONCURSOS.HPG.COM.BR Apostila: Direito Processual Penal —- por Guilherme Tocha 3. Código Eleitoral (Lei n.º 4.737/ 65) Os crimes contra a honra, para constituírem delitos eleitorais, devem ser perpetrados “na propaganda eleitoral, ou visando fins de propaganda (sic)”. A calúnia está descrita no art. 324 do Código Eleitoral; a difamação, no art. 325; e a injúria, no art. 326. Todos os crimes contra a honra, para fins eleitorais, são de ação penal pública incondicionada, como deixa claro o art. 355 do diploma eleitoral, verbis: “Art. 355. As infrações penais definidas neste Código são de ação pública.” O dispositivo diz que a ação penal é pública. E como ter-se a certeza de que ela é incondicionada? Basta atentar-se ao fato de que em nenhum dos dispositivos do Código Eleitoral há uma única ressalva com relação à necessidade de representação do ofendido. Silenciado a lei eleitoral, pois, a respeito do pedido-autorização para o ingresso, pelo Ministério Público, da denúncia, fácil constatar que os delitos eleitorais — e entre eles os contra a honra cometidos naquelas condições (propaganda eleitoral) — são de ação penal pública incondicionada. 82 www.RESUMOSCONCURSOS.HPG.COM.BR Apostila: Direito Processual Penal —- por Guilherme Tocha Lei n.º 10.259/01, art. 2º: Art. 2º. Compete ao Juizado Especial Federal Criminal processar e julgar os feitos de competência da Justiça Federal relativos às infrações de menor potencial ofensivo. Parágrafo único. Consideram-se infrações de menor potencial ofensivo, para os efeitos desta Lei, os crimes a que a lei comine pena máxima não superior a dois anos, ou multa29. 2º A lei não tratou das contravenções penais. E nem podia mesmo: a CF/88, em seu art. 109, IV, expressamente as exclui da competência da Justiça Federal. Deve ser aplicado o art. 2º, parágrafo único, da Lei n.º 10.259/2001, tanto para a competência federal quanto para a estadual. O art. 61 da Lei n.º 9.099/95 está derrogado (apenas restaram as contravenções penais, que são da competência dos Juizados Especiais Criminais Estaduais). 85 www.RESUMOSCONCURSOS.HPG.COM.BR Apostila: Direito Processual Penal —- por Guilherme Tocha COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL EM MATÉRIA CRIMINAL Constituição Federal de 1988, art. 102: Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: [> processar e julgar, originariamente: (...) b) nas infrações penais comuns, o Presidente da República, o Vice-Presidente da República, os membros do Congresso Nacional, seus próprios Ministros e o Procurador-Geral da República30; c) nas infrações penais comuns e nos crimes de responsabilidade, os Ministros de Estado, ressalvado o disposto no art. 52, |, os membros dos Tribunais Superiores, os do Tribunal de Contas da União e os chefes de missão diplomática de caráter permanente31; d) o habeas corpus, sendo paciente qualquer das pessoas referidas nas alíneas anteriores (...); (...) 9) a extradição solicitada por Estado estrangeiro; (...) i) o habeas corpus, quando o coator for Tribunal Superior ou quando o coator ou o paciente for autoridade ou funcionário cujos atos estejam sujeitos diretamente à jurisdição do Supremo Tribunal Federal, ou se trate de crime sujeito à mesma jurisdição em uma única instância32; j) a revisão criminal (...) de seus julgados; (...) m) a execução de sentença nas causas de sua competência originária, facultada a delegação de atribuições para a prática de atos processuais; (...) 3º Veja, ao final da apostila, o art. 84 do Código de Processo Penal, com a alteração dada pela Lei n.º 10.628/2002. ! Veja, ao final da apostila, o art. 84 do Código de Processo Penal, com a alteração dada pela Lei n.º 10.628/2002. 32 Atenção: o STF entende que é de sua competência, e não do STJ, o processo e julgamento de habeas corpus contra decisão tomada por Turma Recursal (Estadual ou Federal) de Juizado Especial Criminal. Afasta-se, assim, a regra do art. 105, |, c, da CF/88, para dar lugar à incidência do art. 102, |, i, da CF/88. 86 www.RESUMOSCONCURSOS.HPG.COM.BR Apostila: Direito Processual Penal —- por Guilherme Tocha o) os conflitos de competência entre o Superior Tribunal de Justiça e quaisquer tribunais, entre Tribunais Superiores, ou entre estes e qualquer outro tribunal33; (...) H — — julgar, em recurso ordinário34: a) o habeas corpus, o mandado de segurança, o habeas data e o mandado de injunção decididos em única instância pelos Tribunais Superiores35, se denegatória a decisão36; b) o crime político37; HI — julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decididas em única ou última instância38, quando a decisão recorrida39: a) contrariar dispositivo desta Constituição; b) declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal; c) julgar válida lei ou ato de governo local contestado em face desta Constituição. º Tal alínea poderia ter uma redação mais prática e objetiva. Por exemplo, com a seguinte redação: “os conflitos de competência entre Tribunal Superior e quaisquer tribunais”, cuja interpretação (ainda mais fácil de ser apreendida) é exatamente a que é dada ao art. 102, |, o, da CF/88. 3 Prazo para interposição: 5 (cinco) dias, sem efeito suspensivo. * Ou seja, a decisão impugnada partiu de Tribunal Superior, no exercício da competência originária deste. 38 Nada, pois, poderá fazer o Ministério Público caso a decisão proferida, originariamente, por Tribunal Superior, haja sido favorável ao réu. Pouco importa se a decisão proferida em sede de crime político foi dada por Tribunal ou mesmo pela primeira instância federal, visto que tal alínea não menciona que a decisão impugnada deve ter partido de Tribunal. Tais causas podem ter partido, ou não, de Tribunal Superior. Além do prequestionamento, o que se exige é que contra a decisão não caiba mais outro recurso, ao mesmo tempo que não pode ter havido trânsito em julgado. & Prazo para interposição: 15 (quinze) dias, sem efeito suspensivo. 87 www.RESUMOSCONCURSOS.HPG.COM.BR Apostila: Direito Processual Penal —- por Guilherme Tocha COMPETÊNCIA DOS TRIBUNAIS REGIONAIS FEDERAIS EM MATÉRIA CRIMINAL Constituição Federal de 1988, art. 108: Art. 108. Compete aos Tribunais Regionais Federais: [— processar e julgar, originariamente: a) os juízes federais da área de sua jurisdição, incluídos os da Justiça Militar e da Justiça do Trabalho, nos crimes comuns e de responsabilidade, e os membros do Ministério Público da União, ressalvada a competência da Justiça Eleitoral45; b) as revisões criminais (...) de julgados seus ou dos juízes federais da região; (...) d) os habeas corpus, quando a autoridade coatora for juiz federal; e) os conflitos de competência entre juízes federais vinculados ao Tribunal46; H — — julgar, em grau de recurso, as causas decididas pelos juízes federais e pelos juízes estaduais no exercício da competência federal da área de sua jurisdição47.” *S Veja, ao final da apostila, o art. 84 do Código de Processo Penal, com a alteração dada pela Lei n.º 10.628/2002. 4 Evidentemente, conflitos de competência entre Juízes Federais vinculados a Tribunais Regionais Federais diversos são processados e julgados pelo STJ (CF/88, art. 105, |, d). Corolário do art. 109, $ 4º, da CF/88. 90 www.RESUMOSCONCURSOS.HPG.COM.BR Apostila: Direito Processual Penal —- por Guilherme Tocha QUESTÕES ESPECIAIS EM TORNO DA COMPETÊNCIA CRIMINAL RATI ONE PERSON/E Lei n.º 10.628, de 24 de dezembro de 2002, art. 84: Art. 84. A competência pela prerrogativa de função é do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça, dos Tribunais Regionais Federais e Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal, relativamente às pessoas que devam responder perante eles por crimes comuns e de responsabilidade. $1º. A competência especial por prerrogativa de função, relativa a atos administrativos do agente, prevalece ainda que o inquérito ou a ação judicial sejam iniciados após a cessação do exercício da função pública.48 $ 2º. A ação de improbidade, de que trata a Lei n.º 8.429, de 2 de junho de 1992, será proposta perante o tribunal competente para processar e julgar criminalmente o funcionário ou autoridade na hipótese de prerrogativa de foro em razão do exercício de função pública, observado o disposto no $ 1º.” 1. Fixação da Competência Ratione Persona (Prerrogativa de Foro): Critério da Atualidade da Persecução Criminal e do Julgamento49; Critério do Tempo do Delito ou da Improbidade50. 48 Tal dispositivo parece ser, com algumas alterações, um “ressurgimento” da Súmula 394 do STF, há alguns anos cancelada. 4º Não se aplica o art. 84, $ 1º, do Código de Processo Penal, quando o crime cometido tiver sido comum não-funcional fexs.: estelionato, furto, roubo, extorsão, homicídio). o Aplica-se o art. 84, $ 1º, do Código de Processo Penal, apenas para os crimes funcionais (exs.: peculato, corrupção passiva, prevaricação) e para os atos de improbidade administrativa. 91 www.RESUMOSCONCURSOS.HPG.COM.BR Apostila: Direito Processual Penal —- por Guilherme Tocha Código de Processo Penal, art. 78, Ill: Art. 78. Na determinação da competência por conexão ou continência, serão observadas as seguintes regras: (...) HI — no concurso de jurisdições de diversas categorias, predominará a de maior graduação;51” 5! Isso somente não se dá nos crimes dolosos contra a vida, por expresso imperativo constitucional (CF/88, art. 5º, XXXVIII, d). Assim, por exemplo, se um Juiz de Direito e um particular são co-autores de homicídio doloso, o primeiro é processado e julgado, originariamente, pelo Tribunal de Justiça do Estado onde exerce a função judicante, e o particular, por um Juiz de Direito. 92
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