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Guias e Dicas
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Dinâmica da Matéria Orgânica do Solo, Notas de estudo de Agronomia

Dinâmica da Matéria Orgânica do Solo em sistemas conservacionistas - Roscoe et al.(2006).

Tipologia: Notas de estudo

2010

Compartilhado em 04/01/2010

alisson-xavier-12
alisson-xavier-12 🇧🇷

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Baixe Dinâmica da Matéria Orgânica do Solo e outras Notas de estudo em PDF para Agronomia, somente na Docsity! é [Lis Ra aee ro pe gem : BRO Fa ES Saes ae y “SB Editores:, * Renato Roscoe 3 * Fábio Martins Mercante ma Lo ed E pero ed ic DINÂMICA DA MATÉRIA ORGÂNICA DO SOLO EM SISTEMAS CONSERVACIONISTAS Modelagem Matemática e Métodos Auxiliares Exemplares desta publicação podem ser adquiridos na: Embrapa Agropecuária Oeste BR 163, km 253,6 - Trecho Dourados-Caarapó Caixa Postal 661 79804-970 Dourados, MS Fone: (67) 3425-5122 Fax: (67) 3425-0811 www.cpao.embrapa.br E-mail: sacQDcpao .embrapa.br Comitê de Publicações da Unidade Presidente: Renato Roscoe Secretário-Executivo: Júlio Cesar Salton Membros: Augusto César Pereira Goulart, Clarice Zanoni Fontes, Edvaldo Sagrilo, Eli de Lourdes Vasconcelos, Francisco Marques Fernandes, Guilherme Lafourcade Asmus, Márcia Mayumi Ishikawa e Walder Antonio de Albuquerque Nunes Supervisão editorial, Revisão de texto e Editoração eletrônica: Eliete do Nascimento Ferreira Normalização bibliográfica: Eli de Lourdes Vasconcelos Foto da capa: Renato Roscoe 1º edição (2006): online Todos os direitos reservados. A reprodução não-autorizada desta publicação, no todo ou em parte, constitui violação dos direitos autorais (Lei Nº 9.610), CIP-Catalogação-na-Publicação. Embrapa Agropecuária Oeste. Roscoe, Renato Dinâmica da matéria orgânica do solo em sistemas conservacionistas: modelagem matemática e métodos auxiliares / Editores: Renato Roscoe, Fábio Martins Mercante, Júlio Cesar Salton. — Dourados: Embrapa Agropecuária Oeste, 2006. 304 p. : il color. ; 21 cm. ISBN 85-7540-014-2 1. Solo - Matéria orgânica - Modelagem. 2. Matéria orgânica - Solo - Modelagem. 1. Mercante, Fábio Martins. Il. Salton, Júlio Cesar. Ill. Embrapa Agropecuária Oeste. IV. Título. V. Série. O Embrapa 2006 Autores dos Capítulos Alexandre Fonseca d'Andréa Eng. Agrôn., Professor, Dr., Centro Federal de Educação Tecnológica de Urutaí, Departamento de Desenvolvimento Educacional, Coordenação Geral de Ensino, Fazenda Palmital Km 2,5 , Zona Rural, 75790-000 - Urutaí, GO. Telefone: (64) 465-1900, Fax: (64) 465-1900 E-mail: alexdandreaGDgmail.com Arminda Moreira de Carvalho Eng. Agrôn., Pesquisadora, Dra., Embrapa Cerrados, Caixa Postal 08223, 73310-970 - Planaltina, DF. Fone: (61) 388-9898, Fax: (61) 388-9879 E-mail: armindaQDcpac.embrapa.br Beáta Emôke Madari Eng. Agrôn., Pesquisadora, Ph.D., Embrapa Arroz e Feijão, Caixa Postal 179, 75375000 - Santo Antonio de Goiás, GO. Fone: (62) 3533-2110, Fax: (62) 3533-2100 E-mail: madariDenpaf.embrapa.br Bruno José Rodrigues Alves Eng. Agrôn., Pesquisador, Dr., Embrapa Agrobiologia, Caixa Postal 74.505, 23851-970 - Seropédica, RJ. Fone: (21) 2682-1500, Fax: (21) 2682-1230 E-mail: alves(Dcnpab.embrapa.br Carlos Alberto Silva Universidade Federal de Lavras, Departamento de Ciência do Solo, Caixa Postal 3037, 37200-000 - Lavras, MG. Telefone: (35) 3829-1122, Fax: (35) 3829-1100 E-mail: csilvaDufla.br Cláudia Pozzi Jantalia Sisti Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, Departamento de Fitotecnia, BR 465, km 7, 23890-000 - Seropédica, RJ. Telefax: (21) 2682-1353, Fax (21) 3787-3684 David V. de Campos Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, Departamento de Solos, BR 465, km 7, 23890-000 - Seropédica, RJ. Fone: (21) 2682-1308, Fax: (21) 2682-1308 Eduardo de Sá Mendonça Eng. Agrôn., Ph.D., Professor Adjunto da Universidade Federal de Viçosa, Departamento de Solos, Avenida P. H. Rolfs s/n - Campus UFV, 36571-000, Viçosa, MG. Fone: (31) 3899-1047, Fax: (31) 3899-2648 E-mail: esmO.ufv.br. Fábio Bueno dos Reis Júnior Eng. Agrôn., Pesquisador, Dr., Embrapa Cerrados, Caixa Postal 08223, 73310-970 - Planaltina-DF. Fone: (61) 388-9898, Fax: (61) 388-9879 E-mail: fabioDcpac.embrapa.br Fábio Martins Mercante Eng. Agrôn., Pesquisador, Dr., Embrapa Agropecuária Oeste, Caixa Postal 661, 79804-970 - Dourados, MS. Fone: (67) 3425-5122, Fax: (67) 3425-0811 E-mail: mercante cpao.embrapa.br Apresentação A manutenção de sistemas agrícolas produtivos, garantindo o suprimento de alimentos, fibras e energia para a sociedade, sem prejudicar a capacidade de sustentação e sobrevivência das gerações futuras, representa grande desafio para a humanidade. Nesse contexto, a conservação do solo e da água ganha especial destaque, por representarem os recursos básicos da produção agrícola. A matéria orgânica está envolvida com os diversos processos químicos, físicos e biológicos relacionados com qualidade do solo. A dinâmica da matéria orgânica do solo (MOS) determina o fluxo de matéria e energia no sistema solo, definindo entre a tendência a situações sustentáveis ou a processos de degradação. O entendimento dessa função reguladora da MOS é fundamental na busca de sistemas conservacionistas. Diante de sua grande complexidade estrutural e dinâmica, o estudo da MOS exige a combinação de técnicas específicas de análise e abordagens integradoras, através de ferramentas de modelagem matemática e simulação de sistemas. Essas abordagens vêm sendo empregadas em vários ecossistemas, com destaque para a região temperada. Trabalhos em solos tropicais e subtropicais vêm aumentando significativamente nos últimos anos, mas ainda não há uma tentativa de sintetizar as informações e conhecimentos obtidos até omomento. O presente livro, ao trazer informações valiosas sobre a dinâmica da matéria orgânica do solo em sistemas conservacionistas, enfatizando técnicas modernas de análise e de simulação de sistemas, é uma importante contribuição para a geração de conhecimentos visando à manutenção de produtividades elevadas, ao mesmo tempo em que se preservam os recursos naturais. Neste sentido, a Embrapa Agropecuária Oeste, juntamente com seus parceiros nessa importante publicação, espera que esse material contribua para o uso sustentável dos sistemas agrícolas tropicais e subtropicais. Mário Artemio Urchei Chefe-Geral Embrapa Agropecuária Oeste Prefácio Este livro foi idealizado a partir do workshop “Modelagem da Matéria Orgânica do Solo no Sistema Plantio Direto” realizado na Embrapa Agropecuária Oeste, em fevereiro de 2003, quando se notou a falta de um material que sintetizasse os conhecimentos sobre matéria orgânica do solo (MOS) em ambientes tropicais e subtropicais. Inicialmente, pretendia-se elaborar uma publicação que contemplasse os diversos aspectos relacionados à modelagem matemática e simulação de sistemas. Ao longo de três anos, o material foi evoluindo e ficou clara a necessidade de nivelamento do conhecimento sobre alguns métodos auxiliares utilizados na definição dos parâmetros essenciais aos simuladores. Desta forma, este livro foi organizado em duas partes. Na Parte 1, quatro capítulos discutem a dinâmica da matéria orgânica do solo em sistemas conservacionistas, com ênfase à modelagem matemática e simulação de sistemas. Os dois primeiros são de contextualização e revisão conceitual, sendo os dois seguintes voltados para a discussão sobre as ferramentas de modelagem e simulação de sistemas. O Capítulo 1 concentra-se no embasamento teórico sobre como a dinâmica da MOS está relacionada com a sustentabilidade dos sistemas de produção e como o tipo de manejo pode influenciá-la. Discute-se, ainda, como a modelagem matemática e a simulação de sistemas podem auxiliar na melhoria desse entendimento. No Capítulo 2 discute-se a questão de mudanças climáticas globais e como o solo de sistemas agrícolas conservacionistas, a exemplo do sistema plantio direto, pode servir de reservatório para o PARTE 1. Dinâmica da Matéria Orgânica do Solo em Sistemas Conservacionistas: Modelagem Matemática e Simulação de Sistemas 1. Sistemas de Manejo e Matéria Orgânica do Solo Renato Roscoe, Robert Michael Boddey, Júlio Cesar Salton ........ 17 2. O Segjiestro de Carbono no Sistema Plantio Direto: Possibilidades de Contabilização Renato ROSCOE .......... ss sirtrieeeareseeaaessranerareaena 43 3. Modelagem Matemática e Simulação de Sistemas: uma Importante Ferramenta na Pesquisa Agropecuária Rômulo Penna Scorza Júnior ..........ciieieiieiienis 63 4. Modelagem Matemática e Simulação da Dinâmica da Matéria Orgânica do Solo Eduardo de Sá Mendonça, Luiz Fernando Carvalho Leite... 75 PARTE 2. Métodos Auxiliares Utilizados no Entendimento da Dinâmica da Matéria Orgânica do Solo 5. Fracionamento Físico do Solo na Obtenção de Compartimentos Mensuráveis para Uso em Simuladores da Dinâmica da Matéria Orgânica Renato Roscoe, Beáta Emóke Madari, Pedro Luiz Oliveira de Almeida Machado... tereterarererererrrasraraaaaanaaaa 107 6. Emprego do Isótopo Estável “C para o Estudo da Dinâmica da Matéria Orgânica do Solo Bruno José Rodrigues Alves, David V. de Campos, Cláudia Pozzi Jantalia Sisti, Segundo Urquiaga, Robert Michael Boddey .......... 133 7. Biomassa Microbiana do Solo: Fração mais Ativa da Matéria Orgânica Renato Roscoe, Fábio Martins Mercante, lêda de Carvalho Mendes, Fábio Bueno dos Reis Júnior, Júlio Cezar Franchini dos Santos, Mariangela Hungria... 163 8. Emissões de CO, do Solo: Métodos de Avaliação e Influência do Uso da Terra Alexandre Fonseca d'Andréa, Marx Leandro Naves Silva, Carlos Alberto Silva... itrrerreareaeeeeeeeerererereereareaserananaaannes 199 9. Ressonância Magnética Nuclear de “C em Estudos de Caracterização Estrutural da Matéria Orgânica do Solo Flávia Aparecida de Alcântara, Arminda Moreira de Carvalho........ 243 10. Pirólise Associada à Cromatografia Gasosa e Espectrometria de Massa Aplicada a Estudos de Caracteri- zação Química da Matéria Orgânica do Solo Flávia Aparecida de Alcântara ........cistereeeteereeerererees 281 Sistemas de Manejo e Matéria Orgânica do Solo Management Systems and Soil Organic Matter Abstract - soi organic matter (SOM) has fundamental functions related to an adequate soil functioning, being involved in physical, chemical, and biological processes. During soil degradation, losses of SOM represent the starting point, affecting several parameters in a typical chain reaction. No- tillage systems (NTS) tend to preserve SOM, mainly because they reduce SOM decomposition rate and, when NTS is properly adopted (including crop rotation), increase residue production in the system. Pasture and crop integrated systems (PCI) include grass production in the rotation, increasing the amount of plant residue to NTS. In this chapter, we reviewed the major aspects related to organic matter role on matter and energy fluxes in soil, and evaluated the consequences of different management systems on those fluxes. We also discussed how the inadequate soil management can cause SOM losses and promote soil degradation, and how, on the other hand, the use of conservationist systems may provide an adequate organic matter flux in the agro ecosystem, favoring ordination processes and soil quality. Analyzing literature data, we observed that conventional tillage has the potential of reducing total SOM or, in specific situations, only some of its more reactive fractions, but always provokes soil quality losses. NTS represents a good alternative to avoid SOM losses or even increase its content, which strongly depends on crop rotation. The rotation system should include cash crops and cover-crops with high residue production and should maintain a positive N balance in the system. Anegative N balance seems to limit SOM accumulation. The PCI represents an interesting alternative of soil management, especially in regions where climate conditions difficult the maintenance of soil mulching. 19 20 Dinâmica da Matéria Orgânica do Solo em Sistemas Conservacionistas Introdução A importância da matéria orgânica do solo (MOS) para os diversos processos físicos, químicos e biológicos é amplamente reconhecida na literatura. A MOS desempenha diversas funções no ambiente, estando ligada a processos fundamentais como a ciclagem e retenção de nutrientes, agregação do solo e dinâmica da água, além de ser a fonte básica de energia para a atividade biológica. Sua perda pode interferir drasticamente nesses processos, dificultando o desempenho das funções do solo, provocando desequilíbrios no sistema e, consequentemente, desencadeando o processo de degradação. Em decorrência do grande impacto dos sistemas de uso do solo nas condições ambientais, sistemas conservacionistas têm sido propostos com o intuito de reduzir as modificações no ambientes necessárias ao processo de produção de alimentos, fibras e energia. Neste contexto, destaque tem sido dado ao sistema plantio direto (SPD) e à integração lavoura-pecuária (ILP), como alternativas de produção sustentável para as regiões tropical e subtropical. Esses sistemas combinam a ausência do revolvimento do solo e elevado aporte de resíduos, seja pela rotação de culturas anuais ou mesmo pela combinação de lavouras com pastagens. Tratam-se de sistemas extremamente conservacionistas, com efeitos diretos na redução da erosão. Devido a esse caráter e às vantagens decorrentes dos menores custos de produção e maior praticidade, a adoção do SPD tem crescido exponencialmente no Brasil nos últimos 30 anos. De uma área inexpressiva em 1975, estima-se que tenham sido cultivados no Brasil, na safra 2003/2004, mais de 20 milhões de hectares sob SPD (Federação Brasileira... 2005). No SPD, os teores de MOS podem ser preservados, pois há uma redução na taxa de decomposição, em função da não-fragmentação dos resíduos e do não-revolvimento do solo. Desta forma, os resíduos permanecem na superfície, tendo uma menor área de contato com o solo. Entretanto, não somente a redução na taxa de decomposição se faz importante, mas também a capacidade do sistema em suprir carbono para o solo. Para que haja um efetivo acúmulo de MOS no sistema, deve-se ter uma taxa de entrada de C superior à taxa de decomposição. Buscam-se, portanto, esquemas de rotação que resultem em elevada produção de resíduos. Como em condições tropicais essa elevada produção de resíduos tem-se mostrado um problema, cresce a utilização de gramíneas forrageiras com o intuito de formar cobertura de solo, ao mesmo tempo em que possibilita a diversificação da produção Sistemas de Manejo e Matéria Orgânica do Solo agrícola, inserindo animais no sistema. A ILP combina a vantagem de fornecer grandes quantidades de resíduos para formação de cobertura do solo para a lavoura subsequente sob SPD. Ao mesmo tempo, períodos com culturas anuais bem manejadas melhoram as condições das pastagens, com aumento da fertilidade do solo, permitindo maior carga animal e produção de biomassa. O presente capítulo tem como objetivo revisar os principais aspectos relacionados ao papel da matéria orgânica no fluxo de matéria e energia para osolo, e analisar as consequências do uso de diferentes sistemas de manejo sobre esse fluxo. Discute-se como o manejo inadequado do solo pode provocar a perda de MOS e promover a sua degradação, e como, por outro lado, a utilização de sistemas conservacionistas pode proporcionar um fluxo adequado de matéria e energia para os agroecossistemas, favorecendo os processos de ordenação e a qualidade do solo. O Sistema Solo e a Matéria Orgânica Adiscott (1995) descreve o solo como um sistema aberto, onde o fluxo de matéria e energia é controlado por seus processos internos e, sobretudo, por suas relações com o ambiente externo (Fig. 1). As características atuais do solo são resultantes de um longo processo de formação, no qual são combinados os fatores: material de origem, clima, topografia, organismos e tempo (Resende et al., 1997). O material de origem serve de base para a formação da fração mineral, constituída por partículas de tamanho variado (areia, silte e argila), contendo uma combinação de minerais primários e secundários. Seguindo o processo de intemperismo, os minerais primários (aqueles encontrados nas rochas de origem) vão sendo gradativamente transformados em minerais secundários. Nos solos tropicais, a fração argila é dominada por minerais secundários de baixa atividade, como argilas silicatadas do grupo das caulinitas e óxidos e hidróxidos de Fe e AI. A fração areia, por sua vez, é dominada por minerais primários resistentes ao intemperismo, como o quartzo, e por concreções ferruginosas (em solos muito ricos em Fe). A fração silte tem uma composição intermediária. A matéria orgânica do solo (MOS) é composta por todo o carbono orgânico presente no solo, sendo considerados três importantes reservatórios: a MOS transitória, composta, sobretudo, por resíduos de plantas e organismos do 21 24 Dinâmica da Matéria Orgânica do Solo em Sistemas Conservacionistas em compactação, baixa resistência à erosão, menor infiltração e retenção de água e, consequentemente, menor produtividade do sistema vegetal (Roscoe, 2005). A Matéria Orgânica do Solo e o Processo de Degradação do Solo Em ambientes tropicais, o processo de degradação dos solos encontra-se intimamente relacionado à dinâmica da matéria orgânica (Feller & Beare, 1997). Diversos autores têm ressaltado que a conversão da vegetação nativa em área de produção agrícola pode reduzir drasticamente os teores de MOS, devido ao menor suprimento de resíduos e ao aumento na taxa de decomposição, assim como a elevação nas perdas das camadas superficiais dosolo por erosão (Andreux, 1996; Feller & Beare, 1997; Bayer & Mielniczuk, 1999; Christensen, 2000, 2001; Carter, 2001). Desta forma, há uma redução no fluxo de matéria e energia no solo, favorecendo processos dissipativos (Fig. 1). Em virtude de suas importantes funções nos processos físicos, químicos e biológicos no solo, a perda de MOS retro-alimenta o processo de degradação, promovendo a desorganização do sistema (Fig. 1), resultando em menores produções de biomassa e maiores perdas de nutrientes, água e solo (Fig. 2). Os sistemas convencionais de cultivo, envolvendo aração e gradagem, são considerados os de maior poder de degradação, resultando na maioria das vezes na redução dos teores de MOS (Bayer & Mielniczuk, 1999; Resck et al., 1999). Segundo Bayer & Mielniczuk (1999), as perdas da MOS são favorecidas, principalmente, pelo revolvimento do solo e consequente destruição dos agregados, maior fragmentação e incorporação dos resíduos vegetais e diminuição da cobertura do solo, que resultam em alterações na temperatura, umidade e aeração do solo. Silva et al. (1994) trabalharam com 220 amostras de três diferentes classes de solo da região do Cerrado, cultivados continuamente com soja e utilizando grade pesada. Os autores observaram elevadas perdas de MOS em cinco anos de cultivo. As reduções foram de 80% em relação aos teores iniciais para Neossolos Quartzarênicos (< 15% de argila), 76% para Latossolos Vermelho Amarelos textura média (15-30% de argila) e 41% para Latossolos Vermelho Amarelos argilosos (> 30% de argila). Entretanto, nem todos os estudos registram perdas de Sistemas de Manejo e Matéria Orgânica do Solo Redução da permeabilidado o aoração [ERR LAS Maior escorrimento. superficial EEE Fig. 2. Esquema representativo do processo de degradação do solo ligado à perda de matéria orgânica. O uso do agro-ecossistema de forma inadequada reduz a fotossíntese e o aporte de carbono ao solo, resultando na perda de MOS e da cobertura do solo. O solo descoberto recebe a ação direta das gotas de chuva, desencadeando o processo de erosão e contribuindo para perda de água e nutrientes. A redução da MOS afeta os processos de formação e estabilização de agregados do solo, atividade biológica e ciclo de nutrientes, contribuindo para a perda de nutrientes, solo e água. Essas perdas, por sua vez, retro-alimenta o processo de degradação, reduzindo o potencial produtivo do agro-ecossistema (este feedback positivo é representado pelas setas em semicírculo). MOS com o cultivo convencional. Freitas et al. (2000) não registraram perdas de MOS após 25 anos de cultivo de culturas diversas (hortaliças, arroz, milho e feijão), em um Latossolo Vermelho distrófico. Roscoe & Buurman (2003), também em um Latossolo Vermelho distófico muito argiloso, observaram estoques de carbono similares em áreas sob vegetação nativa de cerrado sensu-stricto e cultivadas com milho e feijão em sucessão por 30 anos. Aalta estabilidade da matéria orgânica em Latossolos muito argilosos vem sendo atribuída à presença de altos teores de oxi-hidróxidos de ferro e alumínio, que complexariam a MOS, estabilizando-a (Resende et al., 1997; Roscoe et al., 25 26 Dinâmica da Matéria Orgânica do Solo em Sistemas Conservacionistas 20004). Isso pode ser evidenciado pelas altas percentagens de C nas frações pesadas (densidade > 1,7 g cm”), aquelas representadas pela MOS ligada à matriz mineral (Gregorich & Ellert, 1993). Geralmente, em torno de 90% do C encontra-se nesta fração em Latossolos argilosos (Roscoe et al., 2001; Roscoe & Machado, 2002). Mesmo sem haver decréscimo acentuado nos teores de MOS, a ocorrência de reduções em alguns de seus compartimentos pode desencadear o processo de degradação. No estudo de Roscoe & Buurman (2003), embora não tenham detectado alterações nos teores totais de MOS após 30 anos de cultivo, os autores detectaram significativa redução nos estoques de C na fração leve livre (densidade < 1,7 g cm”) da MOS, ressaltando que a fração orgânica que não estava ligada à fração mineral (livre) foi a mais sensível às alterações no ambiente. Segundo Roscoe & Buurman (2003), o erro experimental nas medições dos teores totais de MOS foi, em termos absolutos, maior que as variações observadas nas frações leves, mascarando o efeito de redução do C orgânico nessa fração específica, na área cultivada. Outros estudos mostraram que o sistema de plantio convencional reduz significativamente a biomassa microbiana e a atividade enzimática do solo (Roscoe et al., 2000b). A redução de frações mais ativas da MOS, como a fração leve livre e o C na biomassa microbiana, pode afetar diversas de suas funções no solo. A manutenção da produção de polissacarídeos, por exemplo, é fundamental para a manutenção da agregação (Golchin et al., 1997), sendo que estes compostos são transitórios no solo e são degradados rapidamente (Stevenson & Cole, 1999). A manutenção de seus níveis depende da atividade biológica. Portanto, uma redução nas frações leve livre e C na biomassa microbiana, que representam as frações mais ativas da MOS, favoreceria a desorganização do sistema, deslocando-o para um nível de ordem inferior, resultando em uma menor estabilidade de agregados, desencadeando o processo de degradação (Fig. 1e 2). Conforme observado, não somente os teores totais de MOS são importantes para o entendimento dos processos de degradação do solo. Faz-se necessário o estudo detalhado de suas diferentes frações, relacionando alterações quantitativas e qualitativas dessas frações, aos distúrbios provocados em suas funções na manutenção da qualidade do solo. Quando se faz tal análise, pode-se concluir que os sistemas convencionais de cultivo promovem degradação e perda de qualidade do solo, mesmo em Latossolos ricos em oxi-hidróxidos de ferro e alumínio, nos quais são observadas Sistemas de Manejo e Matéria Orgânica do Solo convencionais (Bayer & Mielniczuk, 1997a,b; 1999). É importante considerar também que nestas condições as taxas de decomposição dos resíduos são maiores, favorecidas pela presença de umidade no solo. Sendo assim, não basta dispor uma cultura dentro do sistema de rotação com alto aporte de resíduos. Na realidade, o sistema de culturas como um todo que deve retornar quantidades elevadas de resíduos para o solo, de forma a possibilitar saldo positivo no balanço entre entrada e saída de C no solo. Bayer (1996) obteve quantidades crescentes de material orgânico fornecidos por sistemas de rotação envolvendo aveia/milho (14 Mg ha”), aveia + trevo/milho (18 Mg ha”) e aveia + trevo/milho + caupi (21 Mg ha”). Bayer & Mielniczuk (1997a) relataram que, nas áreas com esses tratamentos e sob SPD por 5 anos, houve aumento no teor de MOS seguindo a mesma ordem. Comparando o tratamento com menor aporte de resíduos (sucessão aveia/milho), sob sistema convencional, ao de maior aporte (rotação aveia + trevo/milho + caupi), sob SPD, os autores observaram uma diferença de 6 Mg ha” de carbono em favor do SPD, na camada de 0-17,5 cm. Entretanto, nem sempre maiores quantidades de resíduos culturais depositadas resultam em uma maior acumulação de MOS no solo. Por exemplo, Maria et al. (1999) comparou os efeitos na acumulação de MOS (0- 30 cm) de 9 anos de milho ou soja no verão, ambos com aveia no inverno sob SPD e PC. Apesar dos rendimentos de milho (5,6 a 5,7 Mg ha”) terem sido mais do que o dobro dos rendimentos de soja (2,1 a 2,4 Mg ha”), esta contribuição muito maior de resíduos do milho não proporcionou uma acumulação maior de MOS sob PC, nem sob SPD. Em ambas as sucessões sob SPD e PC os níveis de MOS diminuíram em todos os tratamentos. Resultados recentes (Alves etal., 2002, 2003; Sisti et al., 2004) indicaram que o balanço de nitrogênio no sistema é um determinante crucial na acumulação de MOS sob SPD. Os resultados de Alves et al. (2002) mostraram que, além de a soja manejada sob SPD ser capaz de acumular até 80 % do seu N da fixação biológica de nitrogênio (FBN), a proporção do N da cultura exportada é, frequentemente, muito semelhante, deixando, no solo, baixas quantidades de N para as culturas subsequentes. É óbvio que a MOS contém não somente carbono, mas também outros nutrientes, sendo nitrogênio quantitativamente o mais importante. Para acumular 1 Mg ha”! de C no solo na forma de MOS é necessário pelo menos 80 kg N ha'' (Alves et al., 2002). Como após o cultivo da soja o saldo é praticamente nulo de N para a formação de MOS, é improvável que o solo sob sucessões de sojaítrigo ou soja/aveia acumule MOS ao longo do tempo. Machado et al. (2001) e Freixo et al. (2002) 29 30 Dinâmica da Matéria Orgânica do Solo em Sistemas Conservacionistas registraram resultados semelhantes na avaliação dos estoques de MOS sob sucessões de soja/trigo manejadas com SPD em dois estudos de longo prazo conduzidos na Embrapa Trigo (Passo Fundo, RS) e Embrapa Soja (Londrina PR). Isso foi confirmado no mesmo experimento de longo prazo em Passo Fundo por Sisti et al. (2004), mas em outros tratamentos no mesmo experimento onde foi incorporada nas rotações a leguminosa ervilhaca no inverno, registrou-se uma diferença em estoque do C de 17 Mg C (0-100 cm) em favor do SPD, quando comparado ao PC, em um período de 13 anos. Quase todos os outros estudos feitos no Rio Grande do Sul (Bayer e Mielniczuk, 1997; Bayer e Bertol, 1999; Amado et al., 1999, 2001; Bayer etal., 2000a,b; Diekow et al., 2005), que registraram maiores estoques de MOS sob SPD comparado a PC, uma leguminosa fixadora de N,, além da soja, estava presente nas rotações sob estudo. No caso do estudo de Maria et al. (1999) mencionado anteriormente, uma das sucessões foi soja/aveia e a outra milho/aveia. Mesmo tendo sido o milho adubado com 91 kg N ha”, o N retirado no grão provavelmente foi mais de 70 kg N ha” (5,6 Mg ha” x 1,3% N); portanto, assumindo que teriam algumas perdas de N do fertilizante ou da mineralização rápida dos resíduos de soja (de baixa ralação C:N), em ambos as sucessões o balanço do N teria sido nulo. Isso sugere que, para uma maior obtenção de resíduos e, consequentemente, um acúmulo de MOS, o sistema de rotação deve incluir culturas com alto aporte de resíduos (como as gramíneas) e outras que teriam a função de inserir nitrogênio no sistema (as leguminosas). O que explicaria tal tendência seria o fato de as gramíneas serem extremamente responsivas a nitrogênio. Assim, tendo uma boa quantidade de N entrando no sistema através das leguminosas, a produção de biomassa das gramíneas subsequentes estariam sendo favorecidas. Em contraste à Região Sul, a menor duração da estação de chuvas da região do Cerrado raramente permite que sejam incluídas outras leguminosas além da soja no esquema de rotações. Por esse motivo, é muito pouco provável que as rotações apresentem um balanço anual de N positivo e portanto um acúmulo de MOS. Embora o SPD conserve mais a MOS do que o PC, espera- se que, caso não sejam adicionadas via fertilizantes quantidades de N superiores às exportadas nos grãos, o SPD somente mantenha os níveis existentes. No entanto, quando as quantidades de C aportadas são elevadas, como no caso de pastagens de braquiária, expressivos aumentos no estoque de Cno solo foram verificados para Latossolos de Mato Grosso do Sul, com a rotação soja-pastagem em PD (Salton etal, 2005). Sistemas de Manejo e Matéria Orgânica do Solo Os resultados anteriores sugerem que o aporte de resíduos é um componente fundamental no processo de manutenção e acúmulo de MOS no SPD. Entretanto, é limitado o que se sabe sobre o potencial produtivo de diferentes espécies, em sistemas de rotações/sucessões de cultura no SPD. São poucas as informações quantitativas e, sobretudo, qualitativas. Resultados preliminares, obtidos em campos experimentais da Embrapa Agropecuária Oeste (Dourados, MS), demonstraram que os teores de lignina e hemicelulose na palhada de aveia podem variar significativamente entre o sistema convencional (grade pesada), SPD e integração lavoura (SPD)/pastagem (Mercante et al., dados não publicados). Estudos adicionais são necessários para elucidar o potencial de produção dos diferentes resíduos e como os mesmos estariam influenciando a dinâmica da MOS no SPD. Mesmo sem alterar os teores de C, o SPD pode alterar a distribuição relativa de suas frações ou reservatórios funcionais, interferindo na qualidade do solo enas produtividades das culturas. O fracionamento físico da MOS possibilitou a execução de vários trabalhos em diferentes ambientes, demonstrando entre outras coisas a sensibilidade da fração lábil, que corresponde à MO particulada ou leve, respectivamente para os métodos granulométricos ou densimétricos. Variações no estoque desta fração podem detectar alterações na qualidade do sistema de manejo adotado, o que nem sempre é perceptível ao avaliar apenas o estoque de COT no solo (Diekow et al., 2005; Salton, 2005). Roscoe et al. (2000b) avaliaram, em um Latossolo Vermelho distrófico muito argiloso, o efeito do sistema de preparo do solo no teor de MOS, atividade da enzima urease, teores de nitrogênio na biomassa, recuperação do N-uréia aplicado e produtividade de milho. Os autores observaram que, embora não houvesse diferença no teor de matéria orgânica entre os tratamentos, o SPD apresentou os maiores valores para as demais variáveis avaliadas, quando comparado a dois outros sistemas convencionais (arado de disco e de aiveca). A atividade da urease correlacionou-se positivamente com a produção de matéria seca total e produção de grãos de milho, sendo que as produtividades máximas de milho foram maiores para o SPD (6.177 kg ha”") do que para os demais sistemas (4.640-5.045 kg ha”). Estudos conduzidos na Embrapa Agropecuária Oeste, num Latossolo Vermelho distroférrico típico, demonstraram teores de C da biomassa microbiana mais expressivos no sistema natural (mata nativa), seguido pelo 31 34 Dinâmica da Matéria Orgânica do Solo em Sistemas Conservacionistas Considerações Finais O cultivo convencional promove uma significativa perturbação na dinâmica e no desempenho das funções da MOS, podendo reduzir os seus teores totais ou, como em solos argilosos ricos em oxi-hidróxidos de Fe e Al, somente de algumas de suas frações mais dinâmicas, como a leve-livre ou particulada e a biomassa microbiana. Tal perturbação pode desencadear o processo de degradação e de perda da qualidade do solo. O sistema plantio direto, devido a sua característica de não-revolvimento do solo, tem o potencial de reduzir os efeitos danosos do sistema convencional, preservando a MOS. Entretanto, esse potencial é afetado por particularidades do sistema de manejo adotado, as quais resultam no aporte e na qualidade dos resíduos adicionado ao sistema. Evidências apontam para uma efetiva manutenção da MOS em sistemas de rotação com elevado aporte de resíduos, envolvendo culturas de inverno. Os trabalhos avaliados sugerem, ainda, que as maiores quantidades de resíduos estão sempre relacionadas à presença de mais de uma cultura fixadora de nitrogênio no esquema de rotação. Sucessões contendo somente soja, seguida de aveia ou milho safrinha, parecem não fornecer nitrogênio suficiente para o sistema. Cabe ressaltar que o balanço positivo de N no sistema irá favorecer o acúmulo de MOS, não pelo maior aporte de resíduos da própria leguminosa fixadora, mas sim pela maior produtividade das gramíneas presentes no esquema de rotação, visto que essas são extremamente responsivas ao N. Em esquemas de rotação onde não ocorra o devido suprimento de N pela fixação biológica é necessária a utilização de fertilizantes minerais para a manutenção de balanço positivo de N no sistema. Aintegração lavoura pecuária surge como uma alternativa interessante para áreas onde há dificuldades de estabelecimento de sistemas de rotação de culturas que sejam capazes de fornecer grandes aportes de resíduos para o solo, situação observada para a maior parte do Centro-Oeste do Brasil. Entretanto, vale ressaltar que, mesmo nesses sistemas, o suprimento de resíduos é dependente de um manejo adequado das pastagens. Sistemas de Manejo e Matéria Orgânica do Solo Referências ADDISCOTT, T. M. Entropy and sustainability. European Journal of Soil Science, vol. 46, p. 161-168, 1995. ALVES, B. J. R.; BODDEY, R. M.; URQUIAGA S. The success of BNF in soybean in Brazil. Plant and Soil, Dordrecht, v. 252, p. 1-9, 2003. ALVES, B. J. R.; ZOTARELLI, L.; BODDEY, R. M.; URQUIAGA, S. 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Nevertheless, there are still several methodological restrictions for an effective assessment of carbon sequestration under no-tillage system. Mathematical modeling and simulation of soil organic matter dynamics has a great potential as a suitable alternative for such a assessment, which would allow the inclusion of carbon sequestration under no-tillage system in the national emission inventories. This would allow the inclusion of such a mitigating alternative in international agreements. However, improvements are still necessary for the adaptation of models to tropical and subtropical conditions. Sequestro de Carbono no Sistema Plantio Direto: Possibilidades de Contabilização Introdução As mudanças no ambiente causadas pelas atividades humanas têm provocado sérios problemas ambientais, como a redução da biodiversidade e a degradação do solo e da água. Mais recentemente, com o avanço dos conhecimentos científicos, pesquisadores começaram a perceber que a atividade humana tem afetado, ainda, a atmosfera. Estudos iniciados no final da década de 70 e intensificados nos últimos 20 anos acumularam evidências de que o homem vem causando alterações significativas na composição da atmosfera, emitindo quantidades crescentes de gases causadores de efeito estufa (GEE). O aumento da temperatura na superfície terrestre está associado à elevação da concentração destes gases, o que gera alterações significativas no clima do planeta. Dentre os GEEs emitidos pelas atividades antropogênicas, o gás carbônico é responsável por cerca de 70% do potencial de elevação da temperatura terrestre. Nos últimos 250 anos, a concentração de CO, na atmosfera aumentou 31%, alcançando os atuais 366 ppm, mais alto nível observado nos últimos 420 mil anos (Watson etal., 2001). O carbono emitido pelo homem vem, sobretudo, da queima de combustíveis fósseis e da mudança no uso da terra. O petróleo, carvão mineral e gás natural representam base da produção de energia na sociedade atual, respondendo por dois terços de toda a energia consumida mundialmente. Por essa razão, as emissões de CO, provenientes da queima de combustíveis fósseis atingiram valores quatro vezes superiores à quantidade emitida pela mudança no uso daterra, nas últimas duas décadas. Não obstante, ao longo da história da humanidade, a substituição de florestas por pastagens ou culturas anuais foi responsável por grandes reduções nos estoques de carbono nos ecossistemas terrestres, ao longo da história da espécie humana. Como as mudanças na matriz energética têm um custo econômico extremamente elevado, acredita-se que a recuperação dos estoques de carbono em ecossistemas terrestres, que sofreram perda ao longo de sua história de utilização, possa mitigar os efeitos das atividades humanas, re-absorvendo carbono no solo e na vegetação. Adotando-se estratégias conservacionistas, os ecossistemas terrestres poderiam armazenar o excesso de carbono emitido para a obtenção de energia, permitindo o desenvolvimento tecnológico e a substituição da matriz energética por fontes renováveis. 45 46 Dinâmica da Matéria Orgânica do Solo em Sistemas Conservacionistas Neste contexto, tem-se avaliado o potencial de sistemas conservacionistas emrretirar o carbono da atmosfera, armazenando-o no solo. O sistema plantio direto (SPD), por não promover o revolvimento do solo e a incorporação dos resíduos vegetais, tende a preservar a matéria orgânica do solo, mantendo ou até elevando os estoques de carbono neste reservatório. Entretanto, existem processos importantes envolvidos, os quais determinam ou não o acúmulo de carbono nos sistemas. O entendimento de tais processos, em um sistema complexo como o solo, exige a integração de conhecimentos em uma abordagem sistêmica. Neste capítulo, apresenta-se o ciclo global do carbono e os processos envolvidos em seu balanço nos ambientes terrestres. O objetivo foi o de discutir o papel do sistema plantio direto no contexto da mitigação das emissões de gases de efeito estufa, assim como, a importância da modelagem matemática e simulação da dinâmica da matéria orgânica do solo para o entendimento deste papel. Ciclo Global do Carbono As quantidades de CO, na atmosfera resultam do balanço entre fontes e sumidouros nos seus principais reservatórios: os ecossistemas terrestres, os oceanos e a litosfera (Fig. 1). O maior reservatório de carbono na Terra encontra-se nas rochas sedimentares, sendo estimado em 66 bilhões de Gt de C (German Bundestag, 1989). Os fluxos de carbono entre a atmosfera e esse imenso reservatório ocorrem lentamente, com taxas anuais extremamente baixas. O CO, atmosférico, por sua vez, pode ser absorvido nos ecossistemas terrestres, principalmente, pela fotossíntese! e, nos oceanos, através da fotossíntese e da dissolução na forma de carbonatos (Schlesinger, 1997; Wigley & Schimel, 2000). Nos ecossistemas terrestres, o CO, fixado pela vegetação segue vários caminhos, sendo parcialmente consumido pela respiração dos próprios autotróficos e, posteriormente, servindo de fonte básica de energia para os demais sistemas heterotróficos. Esses organismos consomem parte do carbono pela respiração e repassam “ Solos alcalinos também podem fixar pequenas quantidades de CO, atmosférico na forma de carbonatos. Porém este processo restringe-se a solos de regiões semiáridas e tem uma contribuição irrisória quando comparado à fotossíntese. Sequestro de Carbono no Sistema Plantio Direto: Possibilidades de Contabilização Mitigando as Emissões Na últimas duas décadas, os ecossistemas terrestres vêm funcionando como um dreno de carbono tão eficiente quanto os oceanos, em termos quantitativos (Watson et al., 2000), o que vem sendo atribuído, principalmente, ao crescimento de florestas em altas latitudes (Sarmiento, 2000). Entretanto, as respostas destes ecossistemas a alterações no clima podem afetar significativamente o seu potencial de sequestro de C no próximo século (Sarmiento et al., 1998; Sarmiento, 2000; Cox et al., 2000). Mecanismos de feedback positivos e negativos estarão atuando neste processo em função das mudanças climáticas globais (Sarmiento et al., 1998; Sarmiento, 2000; Cox et al. 2000). O aumento da taxa de decomposição da matéria orgânica do solo, em resposta a uma elevação da temperatura média global, constitui o principal mecanismo favorável ao incremento das emissões. Por outro lado, a “fertilização com CO,” aumentaria a taxa fotossintética, favorecendo o sequestro de carbono pelas vegetações. A magnitude destes feedbacks foi testada por Cox etal. (2000) em uma série de simulações nas quais os autores consideram as emissões do cenário I592a do IPCC (“business-as-usual) e a ausência de políticas estimuladoras do sequestro de carbono em ecossistemas terrestres. Segundo os autores, os ecossistemas terrestres funcionarão como um dreno de carbono até meados do próximo século, quando, então, o processo de fertilização de CO, alcançará um ponto de saturação. A partir daí, o aumento na taxa de decomposição da MOS será o processo dominante e os ecossistemas terrestres passarão a se comportar como uma fonte de CO, para a atmosfera. No balanço final, os biomas terrestres emitirão em torno de 170 Gt de carbono entre 2000-2100. Diante de tal cenário, cientistas vêm recomendando a adoção conjunta de medidas mitigadoras, tanto para reduzir futuras emissões quanto para aumentar a capacidade dos ecossistemas terrestres em sequestrar carbono (Watson et al., 2001). Na tentativa de se estimular o sequestro de carbono, tem-se direcionado a pesquisa em duas áreas básicas: (1) no entendimento dos processos de emissão/absorção por diferentes ecossistemas naturais e (2) na geração de alternativas de uso da terra que promovam o sequestro de CO, por estes sistemas (Watson etal., 2000; Lal, 2004). 49 50 Dinâmica da Matéria Orgânica do Solo em Sistemas Conservacionistas As previsões sobre os impactos de atividades mitigadoras nos estoques de carbono nos solos são ainda pouco conclusivas (Batje, 1999). A falta de informações mais precisas sobre processos específicos de proteção da MOS, assim como a indisponibilidade de mapas mais detalhados de classes de solos, impedem o aprimoramento das previsões (Batje, 1999). Baseado no Mapa Mundial de Solos (FAO, 1995), no Zoneamento Agro-ecológico (FAO, 1999) e em experimentos locais sobre manejo do solo, Batje (1999) estimou os potenciais de sequestro de carbono para os próximos 25 anos, segundo uma série de cenários nos quais medidas para a recuperação de áreas degradadas ou melhoria do sistema de produção seriam adotadas (Tabela 1). Globalmente, fluxos anuais médios de 0,17 a 1,29 Gt C ano” foram preditos. A combinação mais plausível dos cenários seria a recuperação de áreas degradadas e melhoria de manejo em áreas não degradadas (cenários D e F, Tabela 1), o que geraria em média uma taxa de sequestro de carbono em torno de 0,8Gt Cano” ou próximo a 20 GtC nos primeiros 25 anos do século XXI. Tabela 1. Projeções para taxa anual de sequestro de C nos solos nos próximos 25 anos, segundo diferentes cenários de adoção de estratégias de recuperação de áreas degradadas e melhoria no manejo de áreas não degradadas. a Aumento no estoque de C Cenários — AUmenço no estoque cel (GtCano”) (GtCem25 anos) A) Recuperação de toda a área degradada, independentemente do uso/cobertura 1,29 32,2 B) Recuperação de toda a área degradada, excluindo regiões áridas, boreais e 0,93 234 polares C) Recuperação de áreas degradadas na 041 10,2 agricultura somente D) Recuperação de áreas degradadas, na agricultura, pastagens extensivas e 0,52 13,0 florestas secundárias E) Melhor manejo de áreas a grícolas não 0,17 43 degradadas F) Melhor manejo de áreas não degradadas na agricultura, pastagens extensivas e 0,28 69 florestas secundárias Fonte: Batje (1999). Sequestro de Carbono no Sistema Plantio Direto: Possibilidades de Contabilização 1 Em uma vasta revisão sobre sequestro de carbono no solo como estratégia para mitigar o efeito estufa, Lal (2004) chegou a valores de fixação de carbono no solo por práticas conservacionistas bem próximos aos de Batje (1999). Segundo o autor, o potencial de sequestro de carbono nos solos de todo o Mundo seria de 0,9+ 0,3 Gt Cano”, ou entre 30 - 60 Gtnos próximos 50 anos. O Papel do Sistema Plantio Direto O sistema plantio direto (SPD) pode promover incrementos nos estoques de C no solo, contribuindo para a sua retirada da atmosfera. Isso ocorre em função da não-movimentação do solo e da não-incorporação dos resíduos, o que garante uma menor taxa de decomposição (ver Capítulo 1). Estudos em regiões temperadas têm demonstrado resultados discrepantes, variando entre ausência de incremento a aumentos da ordem de 7,5 Mg haano” (Janzen etal., 1998). Smith et al. (2000b), em uma projeção dos impactos do SPD na redução das emissões globais de CO, na Europa, utilizaram incrementos médios anuais de C em solos sob SPD de 0,73% ano”. Subak (2000), revisando trabalhos sob sequestro de C em solos dos EUA, registraram incrementos médios de no máximo 0,10 Mg de C ha” ano”. No Brasil, os resultados mais promissores até o momento foram obtidos em campos experimentais nas regiões subtropicais do Sul do País. Bayer et al. (2001) obtiveram taxas de acúmulo de C entre 0,15 e 0,94 Mg de C ha” ano”. Os melhores resultados foram obtidos quando esquemas de rotação/sucessão incluíram materiais com elevada produção de resíduos. Em um dos experimentos analisados pelos autores, as taxas de acúmulo anual de C na camada de 0-17,5 cm de profundidade foram em torno de três vezes maiores nos sistemas com aveia + ervilhaca/milho + caupi, quando comparados aos sistemas sob rotação aveia/milho (Tabela 2). Diversos autores vêm ressaltando o caráter finito do potencial de sequestro de C em solos sob SPD (Janzen etal., 1998; Smith et al., 2000a,b; Subak, 2000; Bayer et al., 2001). Esse potencial está relacionado com uma nova situação de equilíbrio estabelecida no sistema, como resultado do balanço de entradas e saídas de MOS. O SPD, quando aplicado em sua plenitude, ou seja, incluindo diversificação e rotação de culturas, tende a aumentar o aporte de resíduos (Bayer et al., 2001). Concomitantemente, há uma tendência de redução da taxa de decomposição, diminuindo a perda de MOS do sistema. 54 Dinâmica da Matéria Orgânica do Solo em Sistemas Conservacionistas podem ser amortizadas pelo sequestro de carbono em seu território, possibilitando até mesmo o cumprimento das metas estabelecidas sem efetivamente reduzir as emissões. Esta possibilidade é ainda ampliada pelo chamado “comércio de emissões”, segundo o qual nações com excedentes de créditos de emissão podem vender o seu direito de emitir para outros países. Em seu Artigo 3º, o Protocolo de Kyoto institui três princípios básicos para o monitoramento de atividades promotoras do sequestro de carbono: transparência, viabilidade e verificabilidade. Segundo Subak (2000), existem basicamente três formas de monitoramento dos fluxos de carbono para elaboração de inventários nacionais: (1) uso de métodos instrumentais para medir os fluxos de carbono diretamente entre o solo/vegetação e a atmosfera, como torres meteorológicas; (2) amostragem em larga escala dos solos ao nível de propriedade rural, sendo que cada proprietário poderia se beneficiar de incentivos e compensações; e (3) integração de dados experimentais sobre fluxos de carbono em determinados solos, associados a censos regionais e mapas topográficos. As duas primeiras alternativas ferem o princípio básico da “viabilidade”, conforme estabelecido pelo Protocolo. Medidas diretas do fluxo de carbono exigem um monitoramento constante por vários meses consecutivos, envolvendo sofisticada aparelhagem (Grace et al., 1995a,b; Miranda et al., 1996), o que torna experimentos em larga escala inviáveis. Da mesma forma, o monitoramento por amostragens de solo ao nível de propriedades individuais assume dimensões orçamentárias impraticáveis. Subak (2000) estimou o custo de um monitoramento de tal natureza para solos dos Estados Unidos da América (EUA), sob SPD, em 1 bilhão de dólares. Segundo a autora, considerando um valor compensatório de 50 a 100 dólares por tonelada de carbono fixada e uma estimativa de sequestro em sistemas agrícolas de 30 Mt C no período entre 2008-2012 (primeiro “targed period” do Protocolo de Kyoto), seriam gerados 1,5 a 3,0 bilhões de dólares. Esses valores demonstram que, entre um a doisterços do retorno financeiro” potencialmente atingível pelo sequestro de carbono nos solos agrícolas sob SPD seriam gastos somente no monitoramento dos ganhos. O retorno financeiro de atividades sequestradoras de carbono está relacionado com a economia gerada pela não necessidade de se reduzir o crescimento na produção industrial e/ou investir em fontes alternativas de energia (e.g. energia solar), as quais apresentam, em geral, custos mais elevados (Subak, 2000). Sequestro de Carbono no Sistema Plantio Direto: Possibilidades de Contabilização | 99 Diante da impossibilidade de se utilizarem as duas primeiras opções mencionadas anteriormente, a alternativa mais viável parece ser a integração de dados experimentais locais, associados a censos regionais e mapas topográficos. As recentes estimativas de sequestro de carbono pelos solos, tanto em escala de inventários nacionais (Dumanski et al., 1998; Lal et al., 1998; Smith et al., 1997a,b,c; 2000a,b; Cannell et al., 1999; Eve et al., 2000) como em escalas globais (Batje, 1999), baseiam-se em tais extrapolações a partir de campos experimentais, considerando relações lineares entre os tipos de manejo e os estoques de carbono no solo. Entretanto, na maioria destes estudos as questões da “transparência” e “verificabilidade” ficam comprometidas, pois as condições observadas nos campos experimentais (e.g. tipo de solo, vegetação, clima, etc.) geralmente diferem daquelas encontradas na maioria das localidades para onde os dados são extrapolados (Falloon et al., 2001; Paustian, 2001). Recentemente, ganhos consideráveis têm sido obtidos com a utilização de simuladores da dinâmica do carbono (e.g. CENTURY, RothC), associados a ferramentas de SIG (Sistemas de Informação Geográfica) (Falloon et al., 1998, 1999, 2000, 2001). Isso ocorre porque os simuladores levam em consideração variáveis de solo, vegetação, clima, etc., permitindo melhores estimativas em localidades específicas (Falloon et al., 2001). Mesmo assim, problemas estruturais e falta de parametrização desses simuladores, para diversas regiões e tipos de solo, têm comprometido o uso generalizado dos mesmos (Paustian, 2001). A modelagem matemática e simulação da dinâmica de carbono nos ecossistemas terrestres parece ser a opção mais promissora para um efetivo monitoramento de atividades sequestradoras de carbono (Paustian, 2001), respeitando o princípio básico da “viabilidade” (Subak, 2000). Entretanto, para se adequar aos princípios de “transparência” e “verificabilidade”, os simuladores ainda necessitam de ajustes consideráveis (Falloon & Smith, 2000; Paustian, 2001), principalmente para ambientes tropicais. Dinâmica da Matéria Orgânica do Solo em Sistemas Conservacionistas Considerações Finais Embora o Protocolo de Kyoto não considere a fixação de carbono no solo como um mecanismo mitigador das emissões, existe um grande potencial para esse mecanismo. Com isso, acordos bilaterais vêm sendo assinados, mesmo em paralelo ao Protocolo, com o objetivo de promover a fixação de carbono no solo pelo sistema plantio direto (SPD). A efetiva inclusão deste mecanismo em tratados internacionais depende, ainda, de refinamento metodológico nas estimativas dos inventários nacionais. Avanços em modelagem matemática e simulação da dinâmica da matéria orgânica do solo em ambientes tropicais e subtropicais são ainda necessários para se acessar, com maior segurança, os potenciais do SPD em retirar carbono da atmosfera. Atualmente têm-se taxas anuais de fixação de carbono em poucos experimentos pontuais, impedindo uma extrapolação segura para outras áreas. Uma vez adaptados simuladores mais eficientes para as condição tropicais e subtropicais, as extrapolações podem ser ponderadas em função de variáveis que distinguem as condições experimentais das áreas a serem simuladas. Além dos ganhos em relação à precisão dos inventários, vale ressaltar que simulações mais próximas da realidade subsidiariam a seleção de sistemas de sucessão/rotação de culturas mais adequadas ao SPD, de forma a maximizar os outros benefícios gerados pela MOS. Isso implicaria em ganhos de produtividade e maior eficiência no uso de fertilizantes, reduzindo a necessidade de abertura de novas áreas e o consumo de energia para produção dos insumos. Referências BATJE, N. H. Management options for reducing CO concentrations in the atmosphere by increasing carbon sequestration in the soil. Wageningen: ISRIC, 1999. 114 p. (ISRIC. Technical paper, 30). BAYER, C.; MIELNICZUK, J.; LOVATO, T. Potencial de acúmulo de matéria orgânica no solo em sistemas conservacionistas de manejo na Região Sul do Brasil. In: SIMPÓSIO ROTAÇÃO SOJA/MILHO NO PLANTIO DIRETO, 2000, Piracicaba. Anais... Piracicaba: POTAFOS, 2001. 1 CD-ROM. Sequestro de Carbono no Sistema Plantio Direto: Possibilidades de Contabilização JANZEN, H. H.; CAMPBELL, C. A.; IZAURRALDE, R. C.; ELLERT, B. H.; JUMA, N.; MCGILL, W. B.; ZINTNER, R. P. Management effects on soil C storage on the Canadian prairies. Soil and Tillage Research, Amsterdam, v.47,p. 181-195, 1998. LAL, R. 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(Global Change Institute, 6). 64 Dinâmica da Matéria Orgânica do Solo em Sistemas Conservacionistas Mathematical Modelling and System Simulation: an Important Tool for Agriculture Research Abstract - mathematical modeling and system simulation, as tools for agricultural research, allow the integration of processes for a specified system. This integration occurs in a organized way that results in more reliable and completed conclusions. In this chapter | show the main objectives of mathematical modeling and simulation in the context of agricultural research, and also the advantages and disadvantages of these tools. | also present some term definitions with the aim to clarify and stimulate the correct use of them. A broad model classification is presented based on model function and complexity levels. At the end, the main steps to build and test a simulator and mathematical model are presented. Modelagem Matemática e Simulação de Sistemas Introdução Nas últimas décadas, os sistemas agrícolas de produção dominantes visavam principalmente o aumento de produtividade, lucro e maior competitividade. No entanto, percebeu-se ao longo do tempo que esses sistemas de produção estavam causando a exploração indevida do meio ambiente e, portanto, a degradação dos ecossistemas, como, por exemplo, degradação dos solos e poluição dos recursos hídricos por pesticidas, fertilizantes e resíduos orgânicos oriundos das atividades agropecuárias. Os possíveis riscos na qualidade de vida de gerações futuras provenientes desses sistemas agrícolas de produção passaram a ser considerados. Diante dessa realidade, iniciou-se um novo modelo de desenvolvimento agrícola, baseado no princípio da sustentabilidade. Por agricultura sustentável entende-se “o manejo e conservação dos recursos naturais e a orientação de mudanças tecnológicas e institucionais que assegurem a satisfação das necessidades humanas para a presente e futuras gerações. É uma agricultura que conserva o solo, a água e recursos genéticos animais, vegetais e microrganismos, não degrada o meio ambiente e é tecnicamente apropriada, economicamente viável e socialmente aceitável” (Kitamura, 2002). Diante do novo paradigma de agricultura sustentável, enfatiza-se a importância da crescente relação agriculturalhomem/meio ambiente. Com intuito de assegurar a sustentabilidade nessa relação é necessário o conhecimento dos fatores e processos que regem essas relações e, portanto, a necessidade de se visualizar o sistema estudado de forma holística. No entanto, dois problemas surgem quando tentamos a visualização holística de um sistema: (i) sua complexidade devido ao grande número de processos e mecanismos envolvidos e (ii) a visão reducionista por parte dos pesquisadores, que na sua maioria estuda os processos e mecanismos de forma isolada e com interesses específicos. Provavelmente, este último problema esteja relacionado à ausência de uma equipe multidisciplinar para se estudar todo o sistema de forma integrada. Como consequência, conclusões bastante simplistas são obtidas de estudos onde se tem uma visão reducionista do problema estudado. A modelagem matemática e a simulação de sistemas, como ferramentas dentro da pesquisa agropecuária possibilitam a integração e organização do conhecimento sobre os processos que compõem um sistema a ser estudado permitindo conclusões mais completas e confiáveis. A modelagem matemática e a simulação de sistemas permitem que se evolua para um estágio de desenvolvimento metodológico mais avançado, onde se Dinâmica da Matéria Orgânica do Solo em Sistemas Conservacionistas integra de forma organizada o conhecimento gerado em estudos monodisciplinares (Pessoa etal., 1997). Objetivos Gerais da Modelagem Matemática e da Simulação de Sistemas Dentre os objetivos gerais que a ferramenta modelagem matemática e simulação de sistemas tem dentro da pesquisa agropecuária pode-se destacar: e integrar e sintetizar o conhecimento de forma organizada; e sintetizar os processos que descrevem o sistema em estudo, bem como suas interações; e auxiliar no dimensionamento de novas linhas de pesquisa; auxiliar no planejamento e elaboração de novos experimentos (simulações preliminares podem reduzir a quantidade de experimentos e, portanto, permitir uma economia de tempo e recursos financeiros); e avaliar o comportamento de fatores que possam induzir o aparecimento de impactos negativos ou indesejáveis ao sistema; e auxiliar na compreensão das particularidades dos processos que compõem o sistema (isso porque muitos modelos matemáticos descrevem esses processos de maneira bastante detalhada); e e visualizar o comportamento futuro do sistema através da criação de cenários altemativos que ainda não foram explorados experimentalmente. Vantagens e Desvantagens da Utilização da Modelagem Matemática e da Simulação de Sistemas Comparando-se a experimentação tradicional com a ferramenta modelagem matemática e simulação de sistemas, esta última pode apresentar algumas vantagens a saber: e baixo custo (o custo de execução de um simulador, ou seja, de um programa computacional é bem inferior ao custo de implementação e condução de um experimento de campo ou laboratório. No entanto, o custo Modelagem Matemática e Simulação de Sistemas exemplo de um modelo conceitual que descreve a partição da precipitação na superfície do solo adotada pelo simulador CENTURY. De maneira geral, o total de água proveniente da precipitação é particionado em infiltração, evaporação e transpiração. Precipitação Transpiração . Sd Evaporação 2 ls Infiltração Fig. 1. Modelo conceitual mostrando a partição da precipitação na superfície do solo adotada pelo simulador CENTURY. Fonte: (Parton etal. (1988). 2) Modelo matemático = conforme definido anteriormente, corresponde à descrição de um processo que compõe o sistema estudado utilizando-se da linguagem matemática. Considerando apenas os modelos matemáticos, alguns subtipos são apresentados: 2.1) Modelos descritivos ou empíricos = são os modelos mais difundidos no meio agronômico. Correspondem a equações matemáticas que apenas representam os dados experimentais de forma aceitável, sem nenhuma preocupação em explicar os processos envolvidos. Como consequência, 70 Dinâmica da Matéria Orgânica do Solo em Sistemas Conservacionistas qualquer extrapolação das conclusões para condições diferentes daquelas em que o experimento foi realizado é extremamente perigosa. Dessa forma, esses modelos apresentam uma limitação na sua capacidade preditiva. Como exemplo, tem-se o modelo matemático utilizado para descrever a retenção da água no solo em função do seu potencial matricial (Van Genuchten, 1980): 9 o(v)=0, + (ep vi)” eeemenenencenenenens (2) -0 (pow onde 0, é a umidade volumétrica residual (cm” cm), 0, é a umidade volumétrica saturada (cm” cm”) e a e n são parâmetros específicos de cada solo e obtidos através do ajuste dos dados medidos à equação (2). Para cada tipo de solo estudado, novos valores dos parâmetros a e n devem ser obtidos, o que limita então a capacidade preditiva do modelo quando em condições diferentes daquelas em que foram obtidos os dados experimentais. 2.2) Modelos explanatórios = são modelos que buscam descrever os dados experimentais através da explicação dos processos e/ou mecanismos que fazem parte do problema estudado. Na verdade, esses modelos somente são possíveis porque pode-se estabelecer diferentes níveis de organização dentro de um sistema. Esses níveis de organização, por sua vez, podem ser distinguidos por diferentes níveis de integração nos quais os processos ocorrem. Considerando o sistema solo, por exemplo, os diferentes níveis de integração podem ser diferenciados com base na dimensão ou escala do sistema. Partindo-se da menor escala para a maior tem-se: (i) molécula, (ii) partículas de solo, (iii) agregados, (iv) perfil do solo, (v) pedon, (vi) gleba, (vii) bacia hidrográfica e (viii) região. Os modelos explanatórios demandam pelo menos dois níveis de integração. A Fig. 2 mostra um exemplo da aplicação de um modelo explanatório para se estudar a dinâmica da matéria orgânica do solo em condições de campo, com base em dados coletados sobre a sua dinâmica em agregados do solo. Em síntese, os dados provenientes de estudos em laboratório sobre a dinâmica da matéria orgânica em agregados de solo são utilizados para alimentar um modelo explanatório (ou até mesmo um simulador) que, por sua vez, irá explicar o comportamento da matéria orgânica em uma escala maior em nível de campo. Como se observa na Fig. 2, os modelos explanatórios utilizam-se de dois níveis de integração: (i)onível explicativo (agregados do solo) e (ii)o nível a ser explicado (campo). Modelagem Matemática e Simulação de Sistemas Comportamento da matéria orgânica do solo em nível de campo Nível a ser explicado Dados de clima solo =P» | Modelo explanató; Modelo explanatório e culturas Comportamento da matéria orgânica nos o nai, agregados do solo Nível explicativo Fig. 2. Esquema de um modelo explanatório para descrever o comportamento da matéria orgânica do solo em nível de campo, baseando-se no conhecimento obtido em estudos de laboratório, utilizando-se agregados do solo. Fonte: Adaptado de Boesten (2000). 2.3) Modelos determinísticos = são também chamados de modelos não- probabilísticos. Têm como característica principal a representação dos dados de entrada através de valores únicos. Dessa forma, também geram valores simulados únicos. 2.4) Modelos estocásticos = são também chamados de modelos probabilísticos, já que os dados de entrada podem ser representados por variáveis aleatórias. Entende-se por variáveis aleatórias aquelas que podem ser representadas por uma distribuição de probabilidade, ou seja, designa-se uma probabilidade para sua ocorrência. Consequentemente, os resultados simulados correspondem a intervalos de valores e não apenas a valores únicos. 71 74 Dinâmica da Matéria Orgânica do Solo em Sistemas Conservacionistas Referências BOESTEN,J.J.T. |. From laboratory to field: uses and limitations of pesticide behaviour models for the soil/plant system. Weed Research, Oxford, v. 40, p. 123-138, 2000. DE WiT, C. T. 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O crescente volume de informações sobre os diversos processos envolvidos na dinâmica da MOS, além do grande avanço na capacidade de processamento de dados, tem propiciado o desenvolvimento de eficientes simuladores dessa dinâmica. Vários simuladores vêm sendo utilizados com bons resultados em diversos ecossistemas, principalmente em ambientes temperados. A universalização dos simuladores, no entanto, necessita de maior desenvolvimento para áreas tropicais e subtropicais. Neste capítulo serão revisados os principais aspectos relacionados com a modelagem matemática e simulação da dinâmica da matéria orgânica do solo, sendo discutidos os principais simuladores existentes, suas vantagens e limitações, assim como as possibilidades de sua utilização em ambientes tropicais e subtropicais. Dentre os simuladores disponíveis o Century apresenta-se como um dos mais promissores, demonstrando ótimo potencial para simular a dinâmica da MOS em diversos agroecossitemas. Todavia, ajustes são necessários para aumentar a acurácia do simulador, com a possível inclusão de novas variáveis de entrada e adequação das taxas de decomposição dos compartimentos de carbono às condições tropicais e subtropicais. 76 Dinâmica da Matéria Orgânica do Solo em Sistemas Conservacionistas Mathematic Modelling and Simulation of Soil Organic Matter Dynamics Abstract - soi organic matter (SOM) dynamics results from the interaction among the different environmental factors and anthropogenic interferences. The adequate understanding of these processes allows a better soil management, since soil organic matter affects directly soil quality and productivity. The increasing amount of information on processes involved in SOM dynamics has given the opportunity of developing efficient simulation models. Several models have been used with good results in various ecosystems, mainly on temperate environments. The universalization of those models, however, demands an better development to tropical and subtropical areas. In this chapter, the major aspects of modeling soil organic matter dynamics will be revised, discussing the characteristics of the principal available models, their advantages and limitations, as well as their possibilities for tropical and subtropical environments. Among the available options, Century represents one of the most promising models, showing a good potential to simulate SOM dynamics in several ecosystems. Nevertheless, several adjustments are needed to increase the accuracy of the model, with the possible inclusion of new input variables and the modification of decomposition rates of the different SOM pools under tropical and subtropical conditions. Modelagem Matemática e Simulação da Dinâmica da Matéria Orgânica do Solo 79 húmus, consistem de moléculas humificadas em arranjos complexos, não bem caracterizadas quimicamente. Esse compartimento é o principal componente da MOS, consistindo na reserva orgânica do solo e, por isso, a maior parte da pesquisa com matéria orgânica está voltada para o estudo dessa fração. O material humificado consiste de uma série de polieletrólitos de coloração amarelada à preta, com grande peso molecular e muito ácido. Essas substâncias são formadas por reações secundárias de síntese e têm propriedades distintas dos biopolímeros de organismos vivos, incluindo a lignina das plantas superiores. No solo, podem ser adsorvidas pelos colóides argilosos, formando complexos argilo-húmico, ou reagir, por exemplo, com os íons Ca? e AI”, ficando, nessas condições, mais resistentes à biodegradação. Algumas frações húmicas do solo podem subsistir durante alguns anos e chegar, até mesmo, a 20 mil anos. Por outro lado, há casos em que a duração dafração húmica do solo é muito curta, como, por exemplo, em solos tropicais, com baixos teores de argila. Compartimentalização da Matéria Orgânica do Solo Definir a qualidade, disponibilidade e atividade dos nutrientes nos substratos orgânicos em diferentes compartimentos do solo é a chave para entender e descrever os processos de mineralização-imobilização dos nutrientes na forma orgânica. Independente da forma orgânica do nutriente, a matéria orgânica dos diferentes tipos de solos difere quanto à qualidade e habilidade de suprir nutrientes às plantas. Assim, a tentativa de compartimentalizar a MOS pode ser um bom instrumento para se compreender o seu potencial de fornecimento de nutrientes. Com base em vários trabalhos, Duxbury et al. (1989) sugeriram a organização da MOS em compartimentos protegidos e não-protegidos (Tabela 1). Os compartimentos não-protegidos BIO (biomassa microbiana) e LAB (lábil) se caracterizam pela biomassa microbiana e pelos resíduos vegetais e microbianos parcialmente decompostos e seus respectivos produtos de transformação. O tamanho desses compartimentos está diretamente relacionado com o aporte de material orgânico e sua taxa de decomposição. O Dinâmica da Matéria Orgânica do Solo em Sistemas Conservacionistas Tabela 1. Compartimentos da matéria orgânica do solo, generalizando a taxa de ciclagem e hipótese dos controles primários do tamanho dos compartimentos. Tempo de Controle do tamanho Compartimentos Ciclagem dos compartimentos -NÃO-PROTEGIDO 2,5 anos em clima - BIO (biomassa microbiana) temperado e 0,25 ano em clima tropical úmido 20 anos em clima : ' ipi ani Clima e disponibilidade - LAB (lábil) temperado e 5 anos em de substrato (CA) (CI) clima tropical úmido Disponibilidade de substrato (CA) -. PROTEGIDO - vaia oia ida 1000anos Mineralogia e texturado q proteg . solo (CI) (CP) (proteção coloidal) Sistemas de preparo do - Matéria orgânica Dependente do manejo solo, quebra de fisicamente protegida do solo (resistência q A na agregados textura do (proteção estrutural) física) solo (CP) CA = Compartimento ativo - macroagregados; Cl = Compartimento intermediário - microagregados dentro de macroagregados; CP = Compartimento passivo - intra microagregados. Fonte: Adaptado de Duxbury et al. (1989). compartimento BIO pode representar até 4% do COT. Leite et al. (2003) avaliaram, em um Argissolo Vermelho-Amarelo, a proporção carbono da biomassa microbiana em relação ao carbono orgânico total (C,/COT) e verificaram, na profundidade de 0-10 cm, maiores valores para o solo sob Floresta Atlântica (2,6%) e sob plantio direto (2,3%) em relação ao solo sob preparo convencional (2,2%). Esta tendência também foi observada, em um Latossolo Roxo do Paraná, sob sistema plantio direto (1,18% a 1,68%) e convencional (1,16% a 1,48%), nas profundidades de 0-5, 5-10 e 10-15 cm (Balota et al., 2004). O compartimento BIO é o de menor tempo de ciclagem da MOS e é composto por células vegetativas em plena atividade funcional, o que o torna um importante reservatório de nutrientes potencialmente disponíveis Modelagem Matemática e Simulação da Dinâmica da Matéria Orgânica do Solo 81 às plantas. Portanto, é esperado que a ciclagem dos nutrientes nos compartimentos não-protegidos (BIO e LAB) seja alta, fazendo com que os tamanhos destes compartimentos de carbono e de nutrientes sejam menores emrregiões tropicais do que em regiões temperadas. Por outro lado, sistemas de manejo, como o plantio direto, que priorizam o aporte de matéria orgânica ao solo, devem favorecer um aumento significativo desses compartimentos. Os nutrientes presentes nos compartimentos BIO e LAB têm uma taxa de ciclagem rápida, ficando prontamente disponíveis às plantas ou sendo perdidos por lixiviação (principalmente o nitrogênio), dependendo do sincronismo entre taxa de mineralização e absorção de nutrientes pelas plantas. Atualmente, pode-se assumir que cerca de 5% do carbono (C) e nitrogênio (N) totais do solo estão estocados em células vivas. Os tamanhos dos compartimentos físico e quimicamente protegidos estão relacionados com o manejo, a textura e a mineralogia do solo (Tabela 1). A maior parte da matéria orgânica e dos nutrientes do solo está nesses compartimentos. O tempo de ciclagem dos nutrientes é controlado pelo grau de proteção, intra e inter-microagregados, e pelo grau de interação do nutriente com a matéria orgânica. Os nutrientes que interagem com a matéria orgânica por meio de ligações eletrostáticas estarão prontamente disponíveis para serem absorvidos pelas plantas, enquanto aqueles que formam quelatos com a matéria orgânica quimicamente protegida terão um tempo de ciclagem maior. O tempo de ciclagem varia muito com o manejo e de como o nutriente pode interagir com a matéria orgânica. Como exemplos, tem-se o N orgânico que pode estar na forma aminada ou participando do anel heterocíclico; ou o Ca do sítio de troca, ligado por ligações eletrostáticas, ou o Ca fortemente ligado à matéria orgânica de uma forma não disponível às plantas, formando quelatos com as substâncias húmicas; ou mesmo o P imobilizado nas células microbianas. No Rio Grande do Sul, Bayer et al. (1999) avaliaram a estabilidade da MOS em três solos diferentes, submetidos ao sistema plantio direto e ao preparo convencional. As taxas de decomposição (K,) da MOS no SPD, calculadas como a relação adição anual efetiva (AK,) de C/conteúdo de C no solo (0-17,5 cm), variaram de 4,9% no Argissolo Vermelho-Amarelo a 2,9% no Argissolo Vermelho-Escuro e 1,2% no Latossolo Vermelho distroférrico e foram inversamente proporcionais aos teores de argila, óxidos de ferro e caulinita desses solos. No Argissolo Vermelho-Escuro a taxa de decomposição do MOS no preparo convencional foi 86% maior que a 84 Dinâmica da Matéria Orgânica do Solo em Sistemas Conservacionistas isótopo “N para monitorar as transformações do N do solo, foi o primeiro a propor que a MOS pudesse ser dividida em fases (ou compartimentos) ativas e passivas. Jenkinson & Rayner (1977) aplicaram os mesmos princípios para astransformações do C orgânico do solo e assumiram que os compostos de C em um compartimento teriam reatividades similares. Com o advento de técnicas para estimativa da biomassa microbiana do solo, a maioria dos simuladores passou a incluir pelo menos três compartimentos de reatividades diferentes: ativo ou lábil, com tempo de ciclagem muito rápido (< 10 anos), intermediário (100 a 1.000 anos) e passivo (> 1.000 anos). Por não terem identidade física ou representar diferentes frações químicas no solo, é extremamente difícil caracterizar adequadamente a natureza física e química desses compartimentos, embora diversas tentativas tenham sido feitas para se avaliar fracionamentos e técnicas analíticas capazes de mensurá-los. Em geral, o compartimento ativo tem sido associado a soma do C da biomassa microbiana, obtida pelos processos de fumigação-extração ou irradiação- extração, e o C extraído pelo KSO,, das amostras não fumigadas ou não irradiadas (Metherell et al., 1993; Motavalli et al., 1994). Para o compartimento intermediário ou lento, tem sido sugerido que a matéria orgânica particulada, obtida por meio de fracionamento por granulometria (Cambardella & Elliot, 1992), ou o carbono da fração leve, identificado por meio de flotação em líquido de alta densidade (Janzen et al., 1992), possam representá-lo nos estudos em solos tropicais (Capítulo 5). O compartimento passivo tem sido obtido por diferença, ie. o COT menos a soma dos compartimentos ativo e lento, desde que, não há ainda, um método analítico que possa ser associado ao compartimento teórico, pressuposto nos modelos de simulação. Por outro lado, nos estudos de Leite et al. (2003), observaram-se valores muito próximos do compartimento passivo obtido por diferença e áquele determinado pela soma das substâncias húmicas, o que pode indicar a necessidade de se testar essa associação, para validação deste pressuposto, emoutros ambientes. O número de compartimentos nos simuladores da dinâmica da MOS pode variar. Alguns simuladores consideram a MOS unicompartimental, como o proposto por Henin & Dupuis (1945) e aplicado por Woodruff (1949) para o nitrogênio. Outros simuladores, como o Century, apresentam maior complexidade e consideram a MOS distribuída em vários compartimentos. A vantagem dos simuladores unicompartimentais reside na sua maior simplicidade, uma vez que consideram a matéria orgânica como sendo uniforme no solo. Esta simplificação facilita a sua aplicação e a verificação das Modelagem Matemática e Simulação da Dinâmica da Matéria Orgânica do Solo predições, levando à obtenção de taxas de mineralização médias e, consequentemente, taxas de perda de Ce Nespecíficas para cada local. Além disso, as facilidades na obtenção dos dados e nos cálculos de estimativas são vantagens associadas ao uso desse tipo de simulador. Por outro lado, a mesma simplificação gerada por considerar essa matéria orgânica uniforme, constitui-se numa limitação, pois há diversos processos ocorrendo simultaneamente e há compostos com tempos variáveis de permanência no solo, em função dos mecanismos de estabilização (Parton et al., 1987; Fernandes, 2002). Os fluxos de C entre os compartimentos formam a estrutura dos simuladores da dinâmica da MOS. Cada compartimento é caracterizado pela sua posição na estrutura do simulador e pela sua taxa de decomposição. Estas taxas são usualmente expressas por cinética de primeira ordem em relação à concentração (C ) do compartimento, dada por: dC/dt= -KC, ceeeseeeseessesecereaaeatennes (1) onde t é tempo. A taxa constante k de cinética de primeira ordem é associada ao tempo requerido para reduzir pela metade a concentração do compartimento quando não existe aporte. A meia vida dos compartimentos (h=(In2)/k), ou seu tempo de reciclagem (r=1/k) são algumas vezes usados ao invés de k para caracterizar a dinâmica dos compartimentos; quanto menor a taxa constante de decomposição, maior a meia vida, o tempo de reciclagem e a estabilidade do compartimento orgânico. A estrutura dos simuladores é fundamentada na pressuposição de que os compartimentos da MOS são anéis de uma cadeia ligada por fluxos de C, constituindo-se assim em um catenário de sequência de substratos. Esta sequência representa o C deslocando-se dos resíduos vegetais e animais para a biomassa microbiana do solo e para compartimentos orgânicos de maior estabilidade (Fig. 1). Na maior parte dos simuladores, o fluxo de saída de qualquer compartimento orgânico é dividido para um compartimento microbiano, para outro compartimento orgânico e, sob condições aeróbicas, para CO,. Essa divisão simula as atividades anabólicas e catabólicas simultâneas e o crescimento de população microbiana a partir do uso de determinado substrato e ocorre com base em duas características: eficiência microbiana (utilização) e fator de Dinâmica da Matéria Orgânica do Solo em Sistemas Conservacionistas estabilização (humificação), que controlam o fluxo do C decomposto para os compartimentos da biomassa e do húmus, respectivamente. Outras formas de parametrização têm sido propostas. Por exemplo, o produto da decomposição de cada compartimento orgânico do simulador RothC é alocado para os compartimentos BIO, HUM e CO, e tem relação direta com o conteúdo de argila (Fig. 2). Em alguns simuladores a divisão dos fluxos de entrada para as formas lábeis e resistentes é realizada a partir da especificação de determinada variável. No simulador Century os resíduos superficiais são divididos em compartimentos estruturais e metabólicos de acordo com a relação lignina/nitrogênio (L/N) (Fig 3). [Aporte Atmosférico] Queda da liteira = K A L- hiteira sobre et!» Mineralização Kg — Transformação por microrganismos F — CHS, complexos de substância K> húmicas com resíduos orgânicos não decompostos K4 — Consumo pela Ks — Consumo micro(meso)fauna | pela macrofauna Ke H — húmus ligado a minerais de argila v [Lixiviação] Fig. 1. Compartimentos e fluxos do simulador SOMM. Fonte: Chertov & Komarov, (1996). Modelagem Matemática e Simulação da Dinâmica da Matéria Orgânica do Solo entanto, podem ser superadas pela identificação dos pontos críticos do modelo e a avaliação feita com dados da região com a qual se pretende estudar, certificando-se de que o desempenho é satisfatório e, se necessário, calibrando para condições específicas dos locais. A simulação da dinâmica do C orgânico em profundidade torna-se ineficiente na maioria das vezes, pois muitos dos simuladores são parametrizados para profundidades superficiais. O RothC, por exemplo, foi originalmente desenvolvido para simular os primeiros 23 cm de solo, enquanto Century foi criado para simular a profundidade de O a 20 cm. Em alguns estudos com o RothC assumiu-se que a maioria do carbono concentrava-se nas camadas mais superficiais do solo, mas aplicou-se o modelo com mesma taxa de reciclagem de matéria orgânica até a profundidade de 1 m (Smith etal., 1999). As diferenças na dinâmica do C orgânico em profundidade causam sérias implicações na dinâmica total da matéria orgânica de um ecossistema. Todos os simuladores da dinâmica da MOS são altamente dependentes da qualidade e da quantidade de aporte de C para o sistema solo. A qualidade da liteira é frequentemente expressa pela relação C:N ou lignina:N, ou ajustada empiricamente a partir de uma relação específica material resistente/material decomponível (McGill, 1996). Para estimar a quantidade de C retornado ao solo, fator crítico na determinação acurada da dinâmica da MOS, alguns simuladores (ex.: Century) apresentam submodelos simples de produtividade primária líquida (PPL) que fornecem aporte de C para várias culturas, outros (ex.: Sundial) tem valores de aportes de C para várias espécies vegetais, obtidos por meio da literatura, enquanto outros (ex. RothC), requerem que o aporte de C pela planta seja informado. Para quaisquer dessas aproximações, pequenos erros na quantidade de C da planta retomado ao solo pode induzir grandes erros na predição da dinâmica da MOS. Por esta razão, o C da planta, retornado ao solo, deve ser estimado efetivamente em qualquer aplicação do modelo. Inicialmente, os simuladores são testados com dados coletados de experimentos detalhados e bem controlados, embora nem sempre haja disponibilidade de informações minuciosas para todos os locais que se pretende simular. Se por um lado é possível coletar dados de boa qualidade para características do solo, por meio de amostragem de solo e para dados de uso de solo e recentes mudanças no uso da terra, a partir de sensoriamento remoto (fotografia aérea e imagens de satélites), é frequentemente mais difícil obter informações confiáveis acerca do histórico do manejo. Os detalhes do 89 90 Dinâmica da Matéria Orgânica do Solo em Sistemas Conservacionistas histórico do uso da terra são essenciais para estabelecer tamanhos dos compartimentos iniciais de MOS, pois áreas cultivadas há dez anos terão, por exemplo, características bem diferentes daquelas cultivadas há duzentos anos (Smith etal., 1999). Além desses problemas, em alguns simuladores, como o Century, o número de variáveis a ser parametrizado é muito grande e para algumas é difícil obter os dados experimentais, mesmo por meio da literatura. Ainda, as variáveis de saída são muitas e em diferentes submodelos, o que também dificulta sua utilização. O Simulador Century Pressupostos O Century, versão 5.0, foi desenvolvido com o objetivo de simular a dinâmica de Ce de nutrientes (N, Pe S) e tem sido amplamente testado e aplicado em diversos biomas naturais e cultivados, tipos de solos e climas (Falloon & Smith, 2002). As principais variáveis de entrada do modelo são: temperatura do ar, precipitação mensal, conteúdo de lignina do material vegetal, conteúdo de N,PesS do material vegetal, textura do solo, aporte de N do solo e da atmosfera e teor inicial de C, N, Pe S nos diferentes compartimentos do solo. O modelo contém vários submodelos, tais como, o submodelo de água, o submodelo de produção vegetal e o submodelo de dinâmica da MOS. O submodelo de MOS consiste de três compartimentos: a) ativo, que está relacionado com os microrganismos e seus produtos, e que apresenta tempo de reciclagem de um a cinco anos; b) intermediário ou lento, material resistente de lignina e produtos microbianos estabilizados no solo, com tempo de reciclagem de 20 a 40 anos; e c) passivo, associado à matéria orgânica física e quimicamente protegida, com tempo de reciclagem de 200 a 500 anos. No Century, a decomposição dos resíduos vegetais é decorrente da atividade microbiana, com perda de CO, devido à respiração microbiana. O material vegetal é dividido em estrutural (compartimento mais recalcitrante de difícil decomposição) e metabólico (compartimento prontamente decomponível pela ação microbiana). A divisão dos resíduos nesses compartimentos é controlada pela relação lignina:N. Quanto maior essa relação, maior a Modelagem Matemática e Simulação da Dinâmica da Matéria Orgânica do Solo 9 proporção de carbono do resíduo que é alocado no compartimento estrutural. A fração lignina não é alocada para o compartimento ativo, mas incorporada diretamente ao compartimento lento da MOS, quando o material estrutural se decompõe. Essa alocação da lignina para MOS lenta é baseada em dados de incubação, determinados em laboratório com material de lignina marcado, que evidenciam pequena fração (< 2 %) da lignina encontrada na biomassa microbiana, com a maior parte (70%) sendo estabilizada no solo (Stott et al., 1983). Além da lignina, algumas plantas tropicais apresentam altos teores de polifenóis, especialmente sob condições de estresse ambiental (Palm, 1995). Esses compostos podem competir com os microrganismos pelo N, acarretando redução na taxa inicial de decomposição do material vegetal. Talvez simuladores como o Century, que objetivem simular a dinâmica da MOS em região tropical, possam melhorar sua capacidade preditiva com a incorporação dessa informação. Similarmente à lignina, a textura do solo apresenta papel importante no fluxo de C entre os compartimentos. A taxa de reciclagem da MOS ativa decresce linearmente com o aumento do conteúdo de silte mais argila, enquanto a eficiência de estabilização da MOS lenta aumenta. A formação da MOS passiva e os fluxos de C da MOS ativa para MOS passiva e da MOS lenta para a MOS passiva são dependentes do conteúdo de argila. Maiores detalhes dos pressupostos e das equações que controlam o fluxo de C nos compartimentos de MOS no modelo Century, podem ser observados no trabalho de Leite & Mendonça (2003). Os submodelos de N, P e S são semelhantes aos do C. Em cada compartimento da MOS tem uma faixa de relação C:nutriente que permite a ciclagem, baseada no modelo de McGill & Cole (1981). O N é estabilizado em associação direta com o C. Dessa forma, a relação C:N que controla o processo é mais estreita do que C:P e C:S. Arelação C:nutriente é função da quantidade de cada elemento no compartimento lábil inorgânico. Essa relação regula a partição entre os processos de mineralização e imobilização. A taxa de decomposição é reduzida se a quantidade de um elemento é insuficiente para atender a demanda de imobilização promovida pelo microbiota do solo. 94 Dinâmica da Matéria Orgânica do Solo em Sistemas Conservacionistas 1830 1850 1970 1990 2010 20350 2050 1930 1950 1970 1990 2010 2030 2050 Anos Anos es N Passivo (Mgha”!) “ando da 1930 1950 “970 1890 2010 2030 2050 1830 1850 1970 1990 2010 2030 2050 Anos Anos —— PD GPAD —— Periodo Anterior ao Experimento + Início Experimento Fig. 5. Simulação pelo modelo Century da dinâmica do nitrogênio total (NT) e dos compartimentos de nitrogênio (N) em um Argissolo Vermelho-Amarelo, em Viçosa,MG. PD: plantio direto; GPAD: grade pesada + arado de disco. Fonte: adaptado de Leite et al. (2004). Modelagem Matemática e Simulação da Dinâmica da Matéria Orgânica do Solo No Brasil, Fernandes (2002) observou em um Argissolo Vermelho, no Rio Grande do Sul, sob sistemas de preparo e de culturas, que os estoques de COT, simulados pelo modelo Century, foram super e subestimados em relação aos estoques medidos no solo sob sistema convencional (aração e gradagem) e no solo sob sistema plantio direto, respectivamente. Nos estudos de Leite etal. (2004), os estoques de COT nos solos sob sistemas de preparo, medidos e simulados pelo modelo Century, foram similares, especialmente no solo sob sistema plantio direto. Por outro lado, nos solos sob sistema convencional os estoques de C orgânico, simulados pelo modelo, foram maiores do que aqueles medidos, embora esta diferença tenha sido de até 6% (Tabela 2). A superestimação dos estoques de C em solos sob sistema convencional pode ser devido ao coeficiente de preparo, usado no modelo como variável de entrada, não representar de maneira suficiente o distúrbio e o consequente aumento na decomposição da MOS, provocado pelas etapas de aração e gradagem, como reportado também por Fernandes (2002). Tabela 2. Estoques de carbono orgânico total medidos (COTm) e simulados pelo Century (COTs) em dois agroecossistemas no Brasil. Referência e Tratamento cotm coTs Diferença cememeneno Mg ha”! (%) Fernandes (2002) Preparo Convencional — Aveia/milho 29,94 33,59 +12 (PCAM) Preparo Convencional — Aveia + 34,89 33,72 -3 ervilhaca/milho + caupi (PCAVMC) Plantio Direto — Aveia/milho (PDAM) 36,45 34,16 -6 Plantio Direto — Aveia + ervilhaca/milho + 42,38 34,22 -19 caupi (PDAVMC) Leite et al. (2004 Plantio Direto 38,55 38,45 0 Arado de Disco 31,22 32,65 +4 Grade Pesada + Arado de Disco 30,98 31,22 +1 Grade Pesada 31,26 33,60 +7 95 96 Dinâmica da Matéria Orgânica do Solo em Sistemas Conservacionistas Com relação às estimativas para os compartimentos de C, medidos e simulados pelo modelo Century, os trabalhos de Motavalli et al. (1994) e de Leite et al. (2004) são ainda as principais referências. Em solos florestais na Colômbia, no Peru e no Brasil, com diferentes mineralogias, Motavalli et al. (1994) observaram que os estoques de C da biomassa microbiana mais o C solúvel foram maiores do que os estoques de C estimados para o compartimento ativo. No Brasil, nos locais de Valença, Ouro Preto e Una, em solos com mineralogias oxídicas, os valores estimados pelo simulador foram 46%, 49% e 61% inferiores aos obtidos pelas medições laboratoriais, respectivamente (Tabela 3). De forma similar, Leite et al. (2004) constataram subestimação dos estoques de C simulados pelo modelo para o compartimento ativo de 72% e 52% nos solos sob sistemas plantio direto e convencional, respectivamente. Estes resultados são atribuídos aos fatores que controlam o fluxo de C para o compartimento ativo. O modelo Century inclui umidade do solo, temperatura do solo, textura do solo e manejo como reguladores do compartimento ativo; entretanto, o crescimento microbiano é modulado ainda pela disponibilidade de substrato (matéria orgânica) e propriedades químicas (i.e. pH) que não são considerados pelo modelo. Além disso, os mecanismos associados à exsudação de C pelas raízes e seu metabolismo microbiano não são bem definidos e a falta desses mecanismos pode também contribuir para diminuição a eficiência da capacidade preditiva do simulador. Em Motavalli et al. (1994), os estoques de C no compartimento lento, simulados pelo modelo, foram superestimados (219%-495%) em relação aqueles obtidos pelo C da fração leve, o que foi atribuído ao compartimento lento conter outras substâncias, além do C da fração leve, e a ineficiência do método de extração em isolar completamente a fração leve dos solos estudados. Por outro lado, no trabalho de Leite et al. (2004) houve subestimativa dos estoques de C simulados pelo Century em relação aos estoques medidos, também por meio do C da fração leve, embora as diferenças tenham sido de menor magnitude (12%-16%), o que sugere, diferentemente do trabalho de Motavalli et al. (1994) que esta fração pode ser associada ao compartimento lento pressuposto no simulador, em solos tropicais (Tabela 3).
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