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Guias e Dicas
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manual - parto - aborto - puerperio, Manuais, Projetos, Pesquisas de Cultura

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Tipologia: Manuais, Projetos, Pesquisas

Antes de 2010

Compartilhado em 06/10/2008

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Baixe manual - parto - aborto - puerperio e outras Manuais, Projetos, Pesquisas em PDF para Cultura, somente na Docsity! CASCRORAO re cepa = ppapagado SP geç ig Esp ARTES A porte pad qu pescasei, EA ] a p é ) 0 l Ministério da Saúde Ministério da Saúde FEBRASGO ABENFO Parto, Aborto e Puerpério Assistência Humanizada à Mulher Brasília, DF 2001 5 Assistir às mulheres no momento do parto e nascimento com segurança e dignidade é compromisso fundamental do Ministério da Saúde. O Programa de Humanização no Pré-natal e Nascimento estabelece os princípios da atenção que deve ser prestada e exorta estados, municípios e serviços de saúde a cumprirem seu papel, propiciando a cada mulher o direito de cidadania mais elementar, dar à luz, recebendo uma assistência humanizada e de boa qualidade. O Ministério da Saúde apresenta esta publicação com o objetivo de disseminar conceitos e práticas da assistência ao parto entre os profissionais de saúde. Pretende, principalmente, integrar a capacitação técnica à necessária humanização do processo de atenção à mulher durante a gestação e o parto. Desta forma, será possível resgatar para mulheres e profissionais de saúde a singularidade dente momento. JOSÉ SERRA APRESENTAÇÃO 9 O conceito de atenção humanizada é amplo e envolve um conjunto de conhecimentos, práticas e atitudes que visam a promoção do parto e do nascimento saudáveis e a prevenção da morbi- mortalidade materna e perinatal. Inicia-se no pré-natal e procura garantir que a equipe de saúde realize procedimentos comprovadamente benéficos para a mulher e o bebê, que evite as intervenções desnecessárias e que preserve sua privacidade e autonomia. A gravidez e o parto são eventos sociais que integram a vivência reprodutiva de homens e mulheres. Este é um processo singular, uma experiência especial no universo da mulher e de seu parceiro, que envolve também suas famílias e a comunidade. A gestação, parto e puerpério constituem uma experiência humana das mais significativas, com forte potencial positivo e enriquecedora para todos que dela participam. Os profissionais de saúde são, coadjuvantes desta experiência e desempenham importante papel. Têm a oportunidade de colocar seu conhecimento a serviço do bem-estar da mulher e do bebê, reconhecendo os momentos críticos em que suas intervenções são necessárias para assegurar a saúde de ambos. Podem minimizar a dor, ficar ao lado, dar conforto, esclarecer, orientar, enfim, ajudar a parir e a nascer. Precisam lembrar que são os primeiros que tocam cada ser que nasce e ter consciência dessa responsabilidade. Contudo, desempenhar este papel não é fácil. A maioria dos profissionais vê a gestação, o parto, o aborto e o puerpério como um processo predominantemente biológico onde o patológico é mais valorizado. Durante sua formação, doenças e intercorrências são enfatizadas e as técnicas intervencionistas são consideradas de maior importância. Entretanto, a gestação é um processo que geralmente decorre sem complicações. Os estudantes são treinados para adotar "práticas rotineiras", como numa linha de produção, sem a PREFÁCIO HUMANIZAÇÃO DA ASSISTÊNCIA OBSTÉTRICA HUMANIZAÇÃO DA ASSISTÊNCIA OBSTÉTRICA 10 avaliação crítica caso a caso. Disto decorre um grande número de intervenções desnecessárias e potencialmente iatrogênicas. Reconhecer a individualidade é humanizar o atendimento. Permite ao profissional estabelecer com cada mulher um vínculo e perceber suas necessidades e capacidade de lidar com o processo do nascimento. Permite também relações menos desiguais e menos autoritárias, na medida em que o profissional em lugar de "assumir o comando da situação" passa a adotar condutas que tragam bem-estar e garantam a segurança para a mulher e o bebê. Na prática, como alterar posturas arraigadas e introduzir uma abordagem humanizada? Certamente, não será com normas ou manuais. Para, de fato, mudar a relação profissional de saúde/mulher é necessário uma mudança de atitude que, de foro íntimo, depende de cada um. Entretanto, algumas questões devem ser vistas como compromissos profissionais indispensáveis: estar sintonizado com novas propostas e experiências, com novas técnicas, praticar uma medicina baseada em evidências, com o olhar do observador atento. Reconhecer que a grávida é a condutora do processo e que gravidez não é doença. E, principalmente, adotar a ética como pressuposto básico na prática profissional. 11 Saúde no contexto sócio-cultural A saúde não deve se restringir ao tradicional conceito de prevenção, diagnóstico, tratamento e reabilitação, mas deve ser abordada também no contexto cultural, histórico e antropológico, onde estão os indivíduos que se querem ver saudáveis ou livres de doenças. Essa abordagem é fundamental ao se analisar a questão da saúde da mulher brasileira, em especial daquela de menor renda, pois esta tem carências marcadas daquilo que se chama de "necessidades básicas", que interferem na sua saúde e seu bem-estar. Este mulher carece, freqüentemente, de alimentação, moradia, trabalho digno e adequadamente remunerado, educação, cultura, lazer, dentre outros. Evidentemente, essa "doença social" - que acomete um número expressivo de mulheres - determina ou agrava condições biológicas e psicológicas que põem em risco sua vida, sua saúde e seu bem-estar. É com essa abrangência conceitual que será possível identificar estratégias e programas de saúde que possam reduzir a distância entre os vastos e importantes conhecimentos científicos e tecnológicos adquiridos neste século e sua limitada aplicação, com uma visão humanística, na promoção da saúde das pessoas. Evidentemente, não se pode aguardar que as medidas estruturais necessárias à correção dos graves problemas econômicos e sociais do país sejam adotadas em sua plenitude e surtam os efeitos desejados para que o setor de saúde se mobilize na correção de seus problemas específicos. Mas, por outro lado, e importante que, no desenvolvimento de programas de combate a esses problemas específicos de saúde de determinados grupos populacionais, não se perca a dimensão da real profundidade da interferência dessas questões político-econômicas e sociais no estado de saúde de cada cidadã e cidadão brasileiros. 1DIREITOS REPRODUTIVOS, SAÚDE MATERNA E PERINATAL DIREITOS MATERNOS, SAÚDE MATERNA E PERINATAL 14 décadas de atraso e talvez motivadas por determinantes distintos daquelas dos países desenvolvidos, passaram a desejar famílias menores. E foram buscar as alternativas disponíveis de métodos anticoncepcionais, ainda que não fossem as ideais. Não pode ter sido outra a razão que culmina na década de 90 com uma prática de planejamento familiar de alta prevalência e baixa qualidade. O ressurgimento do movimento feminista a partir da metade deste século trouxe ao debate novas concepções das relações entre os gêneros e das relações entre o ser humano e a sociedade. Inicialmente adotando uma postura de polarização/antagonismo entre os sexos, o pensamento feminista evoluiu neste final de século para uma posição mais construtiva, de estímulo à cooperação/companheirismo e a valorização da individualidade de cada um dos gêneros, sem exclusões. Evidentemente, as conquistas do feminismo no Brasil e no mundo são significativas e têm permitido uma evolução da sociedade em relação ao reconhecimento dos direitos de cidadania igualitários entre homens e mulheres, também no campo da saúde. Entretanto, e apesar dessas importantes conquistas, observa-se hoje que a quase totalidade das iniciativas relacionadas à saúde das mulheres tem se caracterizado por manipular seus corpos e suas vidas, visando objetivos outros que não seu bem-estar. Os termos que as designam, muitas vezes, servem a priori para ditar normas, visando um comportamento feminino entendido como útil para o poder social vigente. E, talvez por isso, muitas dessas iniciativas não tenham logrado sucesso na melhoria da saúde das mulheres, inclusive porque insistem em expropriar da mulher sua autodeterminação. As elevadas taxas de mortalidade materna e perinatal, o uso abusivo da cesárea e a alta prevalência de mulheres esterilizadas ou usando métodos anticoncepcionais inadequados são exemplos claros dessas distorções. A medicalização do corpo feminino O Brasil ocupou, até há pouco, a nada invejável posição de campão mundial de operações cesarianas. Se, por um lado, a cesárea realizada por razões médicas tem um grande potencial de reduzir a morbi- mortalidade materna e perinatal, por outro lado, o exagero de sua prática tem efeito oposto, inclusive por consumir recursos preciosos do sistema de saúde. Essa profunda distorção na prática médica brasileira é determinada por múltiplos fatores – históricos, estruturais, conjunturais – mas tem, na forma como a sociedade em geral, e a medicina em particular, encara a mulher, a gênese dessa permissividade. Ehrenreich & English apontam para o poder da medicina em transformar eventos fisiológicos em doenças: a medicalização do corpo feminino – que "trata a gravidez e a menopausa como doença, transforma a menstruação em distúrbio crônico e o parto em um evento cirúrgico" – é uma das mais poderosas fontes da ideologia sexista da nossa cultura. Ou ainda, de acordo com Illich: 1 DIREITOS MATERNOS, SAÚDE MATERNA E PERINATAL 15 “Desde que as mulheres do século XIX quiseram se afirmar, formou-se um grupo de ginecologistas: a própria feminilidade transformou-se em sintoma de uma necessidade médica tratada por universitários evidentemente de sexo masculino. Estar grávida, parir, aleitar são outras tantas condições medicalizáveis, como são a menopausa ou a presença de um útero que o especialista decide que é demais.” À parte o exagero dessa afirmação - não se pode negar a contribuição da medicina em geral, e da ginecologia e obstetrícia em particular, na melhoria das condições de saúde e de vida das mulheres -, muitas das distorções historicamente observadas, como, por exemplo, a epidemia de histerectomias nos EUA nas décadas de 60 e 70 ou o excesso de cesáreas no Brasil, refletem exatamente essas inter-relações entre as questões de gênero e a prática médica. E é necessária a compreensão dessas inter-relações para que se possa perceber porque o Brasil ainda apresenta indicadores inadmissíveis de mortalidade materna e mortalidade perinatal, muito além daquela esperada para seu nível de desenvolvimento e um exercício freqüentemente equivocado dos direitos reprodutivos por parte de suas cidadãs. A reprodução afeta a mulher de uma forma que transcende as divisões de classe e permeia todas as suas atividades: sua educação, seu trabalho, seu envolvimento político e social, sua saúde, sua sexualidade, enfim, sua vida e seus sonhos. É necessário que se deixe de romantizar o poder que pode existir da conexão biológica da mulher com a Maternidade. É fundamental deixar de subestimar o poder repressivo sobre as mulheres que se estabelece com essa conexão. Pois essa visão "reprodutiva" das mulheres é muito menos o resultado de sua condição biológica e, acima de tudo, determinada pela organização social e cultural. E não se pode deixar de reconhecer que essa organização tem, até hoje, buscado cercear os esforços das mulheres para ganhar um pouco de espaço de controle sobre suas vidas e seus corpos e para expressar livremente sua sexualidade. Atualmente, pode-se observar no mundo todo, embora, infelizmente, ainda de forma muito tímida no Brasil, uma crescente tendência à contestação de um modelo de desenvolvimento que privilegia a ordem hierárquica, consumista e tecnológica. Essa contestação é evidente nos movimentos de protesto contra as sociedades de modelo político autoritário, na afirmação da liberdade e da democracia e no fortalecimento de uma corrente preservacionista, ecológica, em oposição à tradicional atitude dominadora e apropriativa determinada pelo modo de produção. É sob a ótica desse movimento de transformação que deve ocorrer uma nova reflexão sobre a saúde da mulher. Pensar sobre a mulher e sua saúde é pensar uma nova sociedade, em que o eixo central seja a qualidade de vida do ser humano desde o seu nascimento. 1 DIREITOS MATERNOS, SAÚDE MATERNA E PERINATAL 16 Não se pode negar as contribuições que os avanços técnico-científicos trouxeram à humanidade e à mulher em especial. Esses avanços abriram, teoricamente, espaços para que a mulher se tornasse dona de seu corpo e de seu destino. Os métodos contraceptivos provocaram mudanças qualitativas na vida da mulher a partir dos anos 60, favorecendo a vivência da sexualidade sem o ônus da gravidez indesejada. Porém, a mesma sociedade que criou tais instrumentos não reconhece ideologicamente o direito da mulher à sexualidade plena, torna-a a exclusiva responsável pela reprodução humana e não lhe dá acesso a informações sobre direitos reprodutivos. A desvinculação entre vida sexual e reprodução, em vez de proporcionar a liberdade feminina, tem se apresentado de forma a criar artimanhas que preservam os tabus e a inconsciência, deixando inalterado o modelo tradicional de imposição de alternativas à mulher. Estatísticas recentes demonstram um número expressivo de laqueaduras realizadas em mulheres jovens e desinformadas. Não menos alarmantes são as estimativas sobre os abortos clandestinos realizados no Brasil que resultam em um número desconhecido, mas, seguramente não desprezível, de mortes. Esses fatos revelam contradições na sociedade, que se reproduzem no sistema de saúde e, mais intensamente, no atendimento à saúde da mulher, tanto no que se refere ao desempenho do sistema de saúde, quanto a indicadores de saúde que refletem indiretamente a qualidade de vida da população (probabilidade de morte e esperança de vida ao nascer). Para o desenvolvimento de uma política eficaz de atenção integral à saúde que, sem dúvida, implicara a médio e longo prazo em melhoria da qualidade da vida humana, é preciso considerar essas questões. Um novo conceito de saúde que considere a consciência plena de cidadania dos indivíduos exige novas posições e, portanto, novos ordenamentos culturais. A humanização do nascimento – só possível se cidadãs e cidadãos, profissionais de saúde e gestantes, sociedade em geral, assimilarem esses conceitos – pode ser o primeiro passo. 1 ATENÇÃO INSTITUCIONAL AO PARTO 19 atitudes e palavras que ouve e percebe, com o fato inexorável de que é ela quem está com dor e quem vai parir. A perda da autonomia da mulher no parto está relacionada, principalmente, com a intensa medicalização que o corpo feminino sofreu nas últimas décadas. Desta forma, esta discussão não pode estar desvinculada da assistência, porque mais uma vez se estaria repetindo a exclusão que a mulher sofre no momento do parto em relação a sua própria autonomia. Exemplo desta situação é a que diz respeito ao uso excessivo da cesariana nas últimas três décadas. Foram fatores determinantes: o maior pagamento dos honorários profissionais para a cesárea pelo antigo INAMPS, a economia de tempo e a realização clandestina da laqueadura tubária no momento do parto. Após anos desta prática, instituiu-se uma cultura pró-cesárea na população em geral e entre os médicos. Como conseqüência, parte importante dos obstetras não se encontra suficientemente motivada, e até mesmo capacitada, para o acompanhamento ao parto normal. Por sua vez, em uma relação médico-paciente assimétrica, as mulheres têm dificuldade em participar da decisão do tipo de parto, sentido-se menos capacitadas para escolher e fazer valer seus desejos frente às "questões técnicas" levantadas pelos médicos. A assistência hospitalar ao parto deve ser segura, garantindo para cada mulher os benefícios dos avanços científicos, mas fundamentalmente, deve permitir e estimular o exercício da cidadania feminina, resgatando a autonomia da mulher no parto. Assistência ao parto no SUS No Sistema Único de Saúde, a assistência institucional ao parto é realizada atualmente através de uma rede com cerca de 4.757 unidades que atuam em diferentes níveis de complexidade. O parto normal foi o procedimento de maior freqüência no ano de 1999 e o segundo procedimento de maior impacto financeiro. No Brasil, a assistência à mulher no momento do parto é em grande parte hospitalar, com diferentes percentuais para cada região. A Pesquisa Nacional sobre Demografia e Saúde - PNDS, realizada em 1996, mostra estes percentuais, conforme quadro a seguir: 2 ATENÇÃO INSTITUCIONAL AO PARTO 20 Estes dados refletem as diferentes condições de acesso e organização dos serviços em cada região. A pesquisa do PNDS mostra que na região Norte ocorreu o maior número de partos domiciliares, o que é justificado pela insuficiente rede de serviços de saúde aliada às condições geográficas que dificultam o acesso, na maior parte das vezes, apenas fluvial. Entretanto, é a região Nordeste que informa o maior número de partos domiciliares notificados ao SUS, conforme quadro a seguir: Parto Domiciliar SIA - SUS - 1995 a 1999 * Em 1999 os códigos para parto domiciliar incluem 029 - assist. parto s/ distócia p/ parteira(o) PAB e 030 - assist. parto s/ distócia p/ enferm. obstétrica(o) PAB - e os dados apresentados são de 10/99. Embora o número de partos domiciliares seja relativamente pequeno em relação ao total de partos apresentados, de 1,1% a 2.5%, sua análise apresenta alguns elementos importantes. A morbimortalidade associada a este tipo de parto é de fato desconhecida. A maioria destas mulheres vive em área rural ou de difícil acesso, com precária assistência à saúde. Estes registros indicam que o percentual de partos domiciliares notificados vem diminuindo anualmente, ou seja, que mais mulheres tiveram acesso à atenção hospitalar no momento do parto. Mas é importante lembrar que as dificuldades de acesso estão mantidas para notificação da ocorrência do parto, sendo necessário ponderar este dado. Confirma esta preocupação o fato de que a pesquisa do PNDS-96 mostra um percentual de partos domiciliares maior na região Norte do que na região Nordeste. O percentual de parto domiciliar em relação ao total dos partos ocorridos no SUS em 1996 foi de 2.4%, e na região Norte foi de 7.76%, o que fica bem aquém dos dados obtidos pela pesquisa PNDS (15.3%). Embora o universo da pesquisa e o método sejam diversos, o relato de um grande número de partos domiciliares não era esperado, uma vez que somente as áreas urbanas foram pesquisadas nesta região, ou seja, a notificação ao SUS de partos domiciliares deveria ser bem maior. Na atenção hospitalar, as 4757 unidades que fazem assistência ao parto podem ser classificadas de acordo com o porte hospitalar e número de partos. Na tabela abaixo, apresenta-se a classificação 2 ATENÇÃO INSTITUCIONAL AO PARTO 21 por porte de maternidade, segundo o número de partos, dado fundamental para a compreensão desta assistência ao parto porque se relaciona com duas questões fundamentais: o acesso e a complexidade da atenção. Classificação das unidades hospitalares de acordo com o número de partos realizados por ano. Brasil, 1998. Fonte: SIH/SUS Estes dados indicam que 72,2% dos partos ocorrem em unidades de médio porte (1 a 499 partos por ano). Na maioria dos municípios, a resolutividade destas unidades é baixa, causando uma distócia entre o nível de complexidade da atenção e a freqüência dos atendimentos. Soma-se a isto o fato de que a major parte dos encaminhamentos oriundos destas unidades dirige-se a unidades de grande porte, com major complexidade, mas em geral com problemas de superlotação. Os serviços públicos e alguns filantrópicos, que em geral só recusam pacientes por absoluta falta de vagas, não conseguem responder à demanda, provocando em vários centros urbanos uma verdadeira peregrinação no momento do parto. Quando a mulher e/ou o recém- nascido necessitam de atenção especial (gestação de alto risco, prematuridade), a dificuldade em encontrar vagas é ainda maior, somando riscos. A demora no atendimento obstétrico tem conseqüências maternas e neonatais relevantes, além de aumento desnecessário de custos para tratamento das complicações. E atribuição do gestor municipal e estadual conhecer a relação entre a oferta e a demanda por leitos obstétricos e planejar o sistema de atendimento desde o pré-natal até o parto, de baixo e alto risco. As vagas obstétricas, na malaria dos municípios, necessitam ser avaliadas, em conjunto com sua concentração e distribuição por complexidade. Agrava a situação o fato de que, muitas vezes, o gestor local não tem controle das vagas, estando submetido aos prestadores de serviço local, uma vez que parte dos municípios não tem leitos obstétricos próprios. 2 ATENÇÃO INSTITUCIONAL AO PARTO 24 hospital. A introdução, em 1998, destes l imites percentuais para o pagamento de cesarianas realizadas pelo Sistema Único de Saúde - SUS, tem sido responsável, em uma primeira análise, pela redução do número de mulheres submetidas a riscos cirúrgicos desnecessários. As taxas de cesarianas apresentadas ao Sistema Único de Saúde - SUS declinaram de 32% em 1997, para 28% em 1998, 25% em 1999 e 24% em 2000. Mesmo considerando a possibilidade de incorreções devidas à notif icação de uma cesariana como parto normal, ou ainda a não apresentação ao SUS das contas referentes ao excesso de cesarianas pela instituição, a redução da freqüência de partos cirúrgicos no Sistema Único de Saúde - SUS parece ter sido ainda assim significativa, a ponto de fazer declinar pela primeira vez, nos últimos vinte anos, o número total de cesarianas realizadas no Brasil. Esses limites foram estabelecidos para serem cumpridos de forma gradual, considerando o processo de adaptação da rede hospitalar aos novos padrões e a responsabilidade das secretarias estaduais e municipais em divulgar e assessorar os prestadores de serviços para implementar medidas que visem a redução dessas taxas. Considerando as dificuldades para a redução real das taxas de cesárea, a Portaria 466 estabelece que os hospitais, sob a coordenação estadual, poderão ter diferentes limites para o parto cirúrgico, contemplando a complexidade de cada serviço obstétrico a fim de atender as mulheres com segurança. Esta medida representa uma tentativa de corrigir distorções geradas com as portarias anteriores, possibilitando instituições de nível terciário que atendem gestações e partos de risco poderem ter, de fato, uma porcentagem maior de cesarianas. Além disso, contempla a sobrecarga de cesarianas que as maternidades públicas e universitárias experimentara m após a implementação das portarias, por terem que absorver o excedente de potencias cesarianas recusadas pelo setor conveniado. Esta última portaria, de abril de 2001, estabelece os limites de cesárea para este ano, por hospital, nos estados que não aderiram ao pacto de controle estadual estabelecido pela portaria anterior. • Portaria 2.883, de 04 de junho de 1998 • Portaria 1.406, de 15 de dezembro de 1999 O Prêmio Galba de Araújo foi instituído em 1998 com o propósito de revelar ao Brasil experiências inovadoras na gestão pública, privi legiando o acolhimento da mulher e seu companheiro, no momento do parto. A avaliação de maternidades em todo país, nestes dois anos, demonstrou que é possível qualificar e também humanizar serviços, encontrando soluções viáveis, muitas vezes simples e de baixo custo, quando há o compromisso de oferecer o melhor à população. Para esta avaliação, os critérios utilizados contemplam práticas assistenciais baseadas em evidências cientificas e que respeitam a autonomia da mulher e seu acompanhante, compreendendo o parto como um momento único na vida de cada mulher. 2 ATENÇÃO INSTITUCIONAL AO PARTO 25 Portarias • MS/GM 569, de 01 de junho de 2000 • MS/GM 570, de 01 de junho de 2000 • MS/GM 571, de 01 de junho de 2000 • MS/GM 572, de 01 de junho de 2000 Este conjunto de portarias institui o Programa de Humanização no Pré- Natal e Nascimento, com seus diferentes componentes de incentivo à Assistência Pré-Natal, a organização, regulação e novos investimentos na Assistência Obstétrica, estabelecendo uma nova sistemática de pagamento da assistência ao parto. Este programa apresenta duas características marcantes: o olhar para a integralidade da assistência obstétrica e a afirmação dos direitos da mulher incorporados coma diretrizes institucionais. O objetivo principal é reorganizar a assistência, vinculando formalmente o pré-natal ao parto e puerpério, ampliando o acesso das mulheres e garantindo a qualidade com a realização de um conjunto mínimo de procedimentos. No âmbito deste programa, o Ministério da Saúde revisou os manuais técnicos de Assistência Pré-Natal e Gestação de Alto Risco e, em parceria com a FEBRASGO, elaborou um Manual destinado ao atendimento das Urgências e Emergências Maternas. Estes manuais foram distribuídos para a rede de unidades básicas e hospitalares e para todos os profissionais filiados à FEBRASGO. O Ministério da Saúde também distribuiu, em parceria com a OPAS, o Guia Prático para Assistência ao Parto Normal. Os serviços de saúde também receberam Cartões da Gestante e instrumental técnico para a realização do Pré-natal, compondo um kit obstétrico: estetoscópio de Pinard, fita obstétrica, disco de idade gestacional e tabela de peso/altura. Para estimular a participação das mulheres, foram distribuídas dois milhões de agendas com informações sobre a gestação, o parto e os cuidados com os recém-nascidos. O conjunto dessas medidas tornar-se-á efetivo quando, somados a elas, os profissionais de saúde transformarem sua prática na direção de uma relação mais humanizada e segura. É nessa perspective que este manual foi elaborado. O parto precisa ser resgatado como o momento do nascimento, respeitando todos os seus significados devolvendo à mulher o seu direito de ser mãe com humanidade e segurança. 2 26 É fundamental para a humanização do parto a adequado preparo da gestante para o momento do nascimento, e esse preparo deve ser iniciado precocemente durante o pré-natal. Isto requer um esforço muito grande, mas plenamente viável, no sentido de sensibilizar e motivar os profissionais de saúde da rede básica e fornecer-lhes instrumentos para o trabalho com as gestantes. Além dos aspectos técnicos propriamente ditos, o preparo para o parto envolve, também, uma abordagem de acolhimento da mulher e seu companheiro no serviço de saúde, incluindo o fornecimento de informações desde as mais simples, de onde e como o nascimento deverá ocorrer, o preparo físico e psíquico da mulher, idealmente uma visita à maternidade para conhecer suas instalações físicas, o pessoal e os procedimentos rotineiros, entre outros. O preparo da gestante para o parto abrange a incorporação de um conjunto de cuidados, medidas e atividades que têm como objetivo oferecer à mulher a possibilidade de vivenciar a experiência do trabalho de parto e parto como processos fisiológicos, sentindo- se protagonista do e processo. É importante ressaltar que esse atendimento, quando possível, deve ser oferecido à gestante e ao acompanhante, que poderá estar a seu lado durante o pré-natal, no decorrer do trabalho de parto e parto, vivenciando junto à mulher e experiência do nascimento. O profissional de saúde desempenha um papel relevante como facilitador para o desenvolvimento desta atenção como parte dos serviços de pré-natal. Também participa das orientações, aconselhamentos específicos e atividades, no preparo da mulher e seu acompanhante para o parto. Durante o pré-natal, a gestante deve receber orientações em relação aos seguintes temas: processo gestacional, mudanças corporais e emocionais durante a gravidez, trabalho de parto, parto e puerpério, cuidados com o recém-nascido e amamentação. Tais conteúdos devem incluir 3 PREPARANDO A MULHER PARA O PARTO PREPARANDO A MULHER PARA O PARTO 29 melhorando o tônus muscular e aumentando o relaxamento, desta forma favorecendo a evolução do trabalho de parto e do parto. Enfatizam a respiração lenta, o relaxamento muscular e as técnicas para os esforços de puxos. Infelizmente, a utilização de tais métodos não tem sido motivo de estudos clínicos controlados para avaliar sua efetiva contribuição para a evolução do trabalho de parto e parto. As poucas evidências científicas disponíveis sobre este assunto têm demonstrado concretamente apenas uma diminuição na necessidade de drogas analgésicas, uma major satisfação com o processo do nascimento e nenhum efeito adverso. Entretanto, a expectativa com relação aos resultados dente tipo de intervenção deve ser claramente explicitada para que não ocorram expectativas que não correspondam à realidade. 1. MÉTODO DE DICK-READ Considerado um dos pilares para a educação preparatória para o parto em diversos países, este método orienta sobre a fisiologia do parto, exercícios para a musculatura do períneo e do abdome, e técnicas de relaxamento. Preconiza o aprendizado do relaxamento através da concentração em cada parte do corpo, separadamente, dos pés à cabeça, contraindo e relaxando os músculos. Recomenda a presença de acompanhante, pois o fato de a mulher permanecer sozinha durante o trabalho de parto gera medo. Possui como objetivo principal evitar a tríade medo – tensão – dor, pois se baseia no fato de que o conhecimento destrói o terror e evita a tensão, controlando a dor. Segundo este método, são três os fatores que causam medo: a) sugestão – as mulheres são condicionadas negativamente em relação ao parto, desde a infância. A comunidade à qual ela pertence e os meios de comunicação exercem um importante papel nessa sugestão, ressaltando os sofrimentos do parto. Infelizmente, essa sugestão também pode partir de profissionais da área da saúde; b) ignorância – a gestante é muito ansiosa por ignorar as modificações que ocorrem em seu organismo durante o ciclo gravídico-puerperal. Com freqüência preocupa-se com o desenvolvimento fetal, sua nutrição, posição dentro do útero, malformações, etc. As gestantes poderiam ser preparadas para o trabalho de parto, sem medo e tensão, se aprendessem a encarar a gravidez e o parto como processo fisiológico; e c) desamparo psicológico – é caracterizado pelo despreparo do profissional de saúde, e também pela indiferença demonstrada na falta de apoio psicológico e informação, por dificuldade de comunicar-se, ou por achar que a parturiente não deve saber da conduta adotada. 3 PREPARANDO A MULHER PARA O PARTO 30 2. MÉTODO DE BRADLEY Este método reafirma o parto como um processo normal. Tem como principal foco as variáveis ambientais, como a penumbra e o silêncio, para que o parto seja uma experiência a mais natural possível. Neste método, o acompanhante assume também um papel de grande importância. No início do trabalho de parto a mulher é estimulada a se movimentar livremente. Ao deitar, é orientada a adotar a posição de Sims (decúbito lateral esquerdo, com os braços posicionados de maneira confortável, perna direita ligeiramente mais fletida que a esquerda e apoiada sobre a cama; deve-se colocar um travesseiro sob a cabeça para aumentar o conforto). Durante cada contração, a mulher deve fechar os olhos, relaxar todos os músculos do corpo e respirar lenta e profundamente (inspirando pelo nariz e expirando pela boca). Neste período, o acompanhante é incentivado a colocar a mão sobre abdome da mulher, durante a contração. 3. MÉTODO DE LAMAZE Este método é também conhecido como método psico-profilático da dor. A mulher pode ser ensinada a substituir suas reações à dor, ao medo e à perda de controle, por um comportamento mais positivo. O método de Lamaze é baseado na Teoria de Pavlov sobre o reflexo condicionado. Atualmente, é o método mais popular para preparação do parto. Nele, são combinados os relaxamentos musculares controlados e as técnicas de respiração. A mulher é ensinada a contrair grupos específicos de músculos, enquanto relaxa outros. Ela também aprende a focalizar um pequeno objeto que, durante o trabalho de parto, será usado como ponto focal. O objeto é colocado onde possa ser facilmente visto pela mulher. Exercícios respiratórios são explicados detalhadamente desde o período do pré-natal ate o pré-parto/parto. O método de Lamaze incentiva a mulher e seu acompanhante a uma participação ativa no trabalho de parto e parto. No pré-natal são, trabalhados os vários tipos de respiração nos diferentes estágios do trabalho de parto, os métodos de relaxamento de certos grupos de músculos e as medidas a serem utilizadas para aumentar o conforto durante o trabalho de parto. Quando inicia o trabalho de parto, a mulher é orientada a inspirar profundamente, focar sua atenção num objeto selecionado e expirar lenta e profundamente, usando o peito. No final da contração, ela novamente deve inspirar. Esta respiração permitirá que a parturiente descanse e recomponha-se. Isso poderá ser feito com a mulher deambulando ou em posição de Sims. À medida que evolui o trabalho de parto, e a mulher entra na fase ativa do parto, a respiração torácica lenta já não e tão eficiente. A mulher é então, estimulada a iniciar pela respiração lenta, passar para uma mais curta, e quando a contração atingir seu pico, voltar à lento. A respiração rápida e realizada por longo período pode causar hiperventilação, um 3 PREPARANDO A MULHER PARA O PARTO 31 estado em que se reduz o nível de pCO2 no sangue. Esta ocorrência é indesejável para o organismo materno e fetal. Na realidade, são utilizadas variações nos padrões respiratórios, pois há algumas mulheres que descobrem um padrão respiratório próprio que lhes é mais confortável. O acompanhante tem papel fundamental no controle das contrações, incentivando a mulher a relaxar. Os métodos contemporâneos de educação preparatória para o parto tendem a combinar aspectos das diversas abordagens dos métodos de Dick-Read, Lamaze e Bradley. Tais métodos não possuem a pretensão de substituir na íntegra os métodos farmacológicos de minimização da dor e, sim, modificar a atitude da mulher e seu acompanhante que, ao invés de ligar o parto a medo e dor, passam a aceita-lo com compreensão, segurança, tranqüilidade e com participação ativa. Considerando que muitas mulheres não têm acesso a essas orientações no período gestacional, é importante que, ao serem admitidas em trabalho de parto, recebam orientações e acompanhamento quando à realização dessas medidas educativas e de minimização de estresse e ansiedade. Tais medidas visam oferecer a estas mulheres uma postura ativa em seu trabalho de parto. Outras medidas de relaxamento e alívio da dor A associação de algumas medidas não farmacológicas como exercícios respiratórios, técnicas de relaxamento e a deambulação auxiliam no alívio da dor durante o trabalho de parto. Escudos recentes demonstram vantagens para a mulher que deambula ou adota outras posições que não a deitada durante o trabalho de parto. Outros estudos ainda sugerem que as contrações uterinas são mais intensas e eficientes para a dilatação do colo, somente com a mudança da posição da parturiente. Outras medidas que podem ser utilizadas com freqüência são o banho de chuveiro ou de imersão, e massagens feitas por acompanhante ou profissional de saúde. O banho pode ser utilizado no início da fase ativa do parto, ou seja, quando as contrações começam a ficar mais intensas. As medidas e/ou técnicas como o use de calor e frio superficiais, acupuntura, musicoterapia, cromoterapia, imersão na água, ervas e aromaterapia com óleos perfumados ainda não possuem escudos controlados para estabelecer sua efetividade. O objetivo principal do preparo da mulher e seu acompanhante é favorecer que o trabalho de parto e parto sejam vivenciados com mais tranqüilidade e participação, resgatando o nascimento como um momento da família. 3 AVALIAÇÃO CRÍTICA DO TIPO DE PARTO 34 Situação Atual A elevação nas taxas de utilização da cesariana para a resolução do parto é um fenômeno que vem ocorrendo em todo o mundo, embora tenha avançado mais genericamente no continente americano e, mais especificamente, no Brasil, onde chega a ser considerada epidêmica. Situações semelhantes enfrentaram ou têm enfrentado outros países como Porto Rico, Estados Unidos, Canadá e Itália, além de alguns outros europeus e latino americanos, que apresentam as maiores taxas de cesárea depois do Brasil, todas superiores ao nível máxima de 15% teoricamente recomendado pela Organização Mundial da Saúde. Entretanto, o Brasil não é mais o campeão mundial de cesáreas. Foi já suplantado pelo Chile, na América Latina, e por alguns outros pequenos países asiáticos. O quadro abaixo mostra a porcentagem de partos por cesariana em países do continente americano, ultrapassando os 20% na maioria deles, além de alguns outros indicadores de saúde reprodutiva destes países. Alguns indicadores de saúde reprodutiva em países das Américas É importante, ainda, considerar que os determinantes médicos, ou melhor, biológicos, para a indicação das cesáreas de fato existem e são realmente mais freqüentes em populações de menor nível de desenvolvimento. Desconhecer esta característica seria permanecer 4 AVALIAÇÃO CRÍTICA DO TIPO DE PARTO 35 alheio ao problema. É maior no Brasil que no Canadá, por exemplo, a prevalência de processos patológicos próprios ou associados à gestação e que contribuem para a indicação do parto cesariana. Porém, este argumento que justificaria a maior proporção de cesáreas entre nós do que no primeiro mundo, não serve para justificar porque o estado de São Paulo ou do Rio de Janeiro têm mais cesáreas que as regiões norte e nordeste do Brasil. Já é fato também bastante conhecido e estudado que os níveis de cesariana não se relacionam de fato com a prevalência de condições patológicas na população que poderiam explicar sua indicação. Na quase totalidade dos países onde seus índices são elevados, a prevalência e diretamente proporcional ao nível de renda da mulher. Ainda que se considerem também os maiores riscos demográficos de parto por cesárea associados, por exemplo, à idade materna precoce ou elevada, ou ainda à paridade baixa ou muito elevada, nem todo o conjunto de possíveis indicações médicos para o parto cesárea consegue explicar a epidemia de partos operatórios abdominais em nosso país. É bem verdade que atualmente se admitem, na Obstetrícia moderna, indicações bem mais alargadas para a realização de uma cesariana, muitas vezes sem uma justificativa obstétrica adequada. Os exemplos mais apropriados nesse sentido são o sofrimento fetal e o antecedente de cesárea. Excetuando-se as causas universalmente aceitas de parto por via cesárea, com rigorosa indicação obstétrica, estas duas causas adicionais representam, na maioria dos contextos, uma importante porcentagem de todos os partos terminados por cesárea. Num contexto como o brasileiro, com uma alta prevalência de cesarianas, cada vez são mais freqüentes as situações de gestantes com antecedente de cesárea. E, embora pouco admitido cientificamente, a repetição das cesarianas é um procedimento bastante comum tanto no Brasil como nos Estados Unidos e em outros países com altas taxas. O significado e as possíveis conseqüências futuras da presença de uma cicatriz uterina não têm sido enfatizados e recordados o suficiente quando se indica a primeira cesárea em uma mulher. A cicatriz e a morbidade a ela associadas poderão influenciar o seu futuro reprodutivo. A tentativa de se consegui um parto vaginal após uma cesárea prévia parece ser uma boa alternativa, adotada por todos os países desenvolvidos em suas políticas de contenção dos níveis de cesarianas. Parece ainda ser uma alternativa vantajosa, sob o ponto de vista de morbidade, tanto materna quando perinatal, às cesáreas com data e hora marcadas, procedimento tão comum na obstetrícia brasileira. É provável, contudo, que esta alternativa só consiga se difundir mais genericamente no país, na medida em que intervenções sejam firmemente dirigidas no sentido de controlar, de maneira séria e tecnicamente correta, a realização da cesariana sem justificativa médica. Há a necessidade da informação e formação de opinião entre as mulheres, para que elas possam reivindicar aquilo que seja mais 4 AVALIAÇÃO CRÍTICA DO TIPO DE PARTO 36 benéfico para a sua saúde e a de seus filhos. Só com a aspiração e a vontade das mulheres, poder-se-ia conseguir que elas tivessem, por exemplo, um PVAC (parto vaginal após cesárea), que seus médicos concordassem e se preparassem para seguir clinicamente um trabalho de parto, convencidos de que esta fosse realmente a melhor alternativa para todos. A vontade da mulher, e conseqüentemente de seus médicos, em se submeter a uma prova de trabalho de parto após uma cesárea tem aumentado bastante nos Estados Unidos e Canadá, a exemplo do que sempre aconteceu na Europa. É uma reivindicação que atualmente faz parte da rotina obstétrica destes países, a tentativa de parto vaginal após uma cicatriz de cesárea, para o qual dispõem de uma sigla que se tornou muito popular, "VBAC" ("vaginal birth after cesarean" ou PVAC, parto vaginal após cesárea), solicitada pela maioria das mulheres nestas condições, situação ainda muito distante de nossa realidade. Riscos associados Apesar da redução dos riscos associados ao procedimento cirúrgico nas últimas décadas, mesmo nos países onde a mortalidade materna é reduzida, o risco relativo de morte materna é ainda mais elevado na cesariana que no parto normal. Além das causas tradicionais de morte materna em países em desenvolvimento, notadamente a hemorragia e infecção, no caso específico da cesárea, a exemplo do que acontece em países desenvolvidos, há também a contribuição da embolia pulmonar e dos acidentes anestésicos como causa de óbito materno. Já é bastante conhecida a maior morbidade materna decorrente de complicações de cesárea, especialmente a infecção e hemorragia, embora os escudos sobre este tema sejam muito mais escassos, pela dificuldade em se padronizar e medir morbidade e também pelas variações populacionais. Outras complicações mais associadas ao procedimento incluem o tromboembolismo, a infecção urinária e, especificamente no caso das cesáreas de repetição, o acretismo placentário e suas conseqüências. Mais recentemente, a necessidade de transfusões sanguíneas e de hemoderivados associada à realização de cesáreas introduziu, ainda, os riscos associados ao procedimento, particularmente o da transmissão do vírus da hepatite e da imunodeficiência humana. Além destas, outras condições de risco estão mais associadas ao parto por cesárea, comparativamente ao parto normal. É importante que o profissional de saúde conheça tais riscos e suas possíveis repercussões para levá-los em consideração no momento de decidir pela via de parto, e também para a informar a mulher e seu companheiro, permitindo uma decisão compartilhada e consciente. Para cumprir com este objetivo de maneira clara e simples, as vantagens e desvantagens associadas ao tipo de parto estão resumidas na tabela que se segue. 4 ASSISTÊNCIA À MULHER NO TRABALHO DE PARTO 39 Entretanto, é conhecido que os hospitais também apresentam alguma resistência em modificar suas “rotinas” de obstetrícia e poucos são os que têm instalações/condições minimamente adequadas para, por exemplo, permitir a presença de um acompanhante para a gestante do SUS em trabalho de parto ou garantir sua privacidade. Dessa forma, é fundamental que não ocorra um descompasso entre discurso e a prática e que a distância entre o que se recomenda e que se faz possa ser reduzida através da adoção de um conjunto de medidas de ordem estrutural, gerencial, financeira e educativa, de forma a propiciar às mulheres brasileiras - sobretudo áquelas mais carentes - um parto verdadeiramente humanizado. Nesse sentido, o respeito à mulher e seus familiares é fundamental: chamá-la pelo nome (evitando os termos "mãezinha", "dona", etc.), permitir que ela identifique cada membro da equipe de saúde (pelo nome e papel de cada um), informá-la sobre os diferentes procedimentos a que será submetida, propiciar-lhe um ambiente acolhedor, limpo, confortável e silencioso, esclarecer suas dúvidas aliviar suas ansiedades são atitudes relativamente simples e que requerem pouco mais que a boa vontade do profissional. As recomendações a seguir são relativas à assistência ao trabalho de parto. Partem do pressuposto de que não existe uma única assistência "ideal" sensu latu, mas diferentes formas de acompanhar a parturiente durante o período de dilatação, a depender das condições do local da equipe de saúde que fará esse acompanhamento. Adotando o princípio da medicina baseada em evidências, serão discutidas algumas práticas que, embora utilizadas, carecem de demonstrações claras quanto a seus benefícios. Adotar-se-á, na medida do possível, uma seqüência cronológica dos eventos no período de dilatação, e os procedimentos adequados no acompanhamento desses eventos. 1. Aspectos Éticos O trabalho de parto deve ser abordado com ética profissional aplicável a todas as situações de atenção à saúde. A adequada identificação da equipe médica, de enfermagem e outros profissionais de saúde, o vestuário adequado desses profissionais, o respeito à intimidade e à privacidade da parturiente, além dos demais aspectos que pautam a relação profissional de saúde/parturiente/ família devem ser obedecidos com rigor no manejo do parto. 2. Diagnóstico de Trabalho de Parto O diagnóstico do trabalho de parto se faz, em geral, pela presença das seguintes condições: • presença de contrações uterinas a intervalos regulares, que vão progressivamente aumentando com o passar do tempo, em termos de freqüência e intensidade, e que não diminuem com o repouso 5 ASSISTÊNCIA À MULHER NO TRABALHO DE PARTO 40 da gestante. O padrão contrátil inicial é, geralmente, de uma contração a cada 3-5 minutos e que dura entre 20 e 60 segundos. • Apagamento (esvaecimento) e dilatação progressivos do colo uterino. Nas fases mais iniciais do trabalho de parto, nem sempre é possível fazer o diagnóstico diferencial entre verdadeiro e falso trabalho de parto com uma avaliação isolada. Nesses casos, reavaliar a gestante 1 a 2 horas após o primeiro exame pode ser necessário para confirmar o diagnóstico. Nesse sentido, faz-se necessário adequar a estrutura física das salas de admissão dos gestantes, para que a reavaliação nesses casos seja viável. É importante destacar que ao final do processo gestacional, a mulher pode apresentar um quadro denominado falso trabalho de parto, caracterizado por atividade uterina aumentada, permanecendo, entretanto, um padrão de contrações descoordenadas. Algumas vezes, essas contrações são bem perceptíveis, contudo cessam em seguida e a cérvice uterina não apresenta dilatação. Tal situação promove um alto grau de ansiedade e expectativa sobre a premência do nascimento, sendo um dos principais motivos que levam as gestantes a procurarem o hospital. O profissional deve estar atento para tais acontecimentos, a fim de se evitar uma admissão precoce, intervenções desnecessárias e estresse familiar, ocasionando uma experiência negativa de trabalho de parto, parto e nascimento. A perda do tampão mucoso ou “sinal” e a formação da bolsa das águas são indicadores menos precisos do trabalho de parto, na medida em que existem grande variações individuais entre o aparecimento desses sinais e o início real do trabalho de parto. Embora nas gestações a termo, a rotura das membranas ocorra na maioria dos casos durante o trabalho de parto, ela pode ocorrer até vários dias antes do início do mesmo (de 12 a 20%). Ainda não existem evidências claras sobre qual a melhor conduta nesses casos e várias alternativas têm sido utilizadas no manejo da rotura prematura de membranas em gestações de termo: • indução imediata do trabalho de parto; • indução após 6-12 horas; e • conduta expectante por até 48 horas, com observação da gestante, seguida de indução se o trabalho de parto não se inicia espontaneamente. Detalhes sobre as condutas nos casos de amniorrexe prematura estão disponíveis no manual de Gestação de Alto Risco (MS, 2000). Qualquer que seja a conduta adotada, o toque vaginal deve ser evitado até que a gestante esteja em franco trabalho de parto, para minimizar os riscos de infecção ovular e puerperal. 5 ASSISTÊNCIA À MULHER NO TRABALHO DE PARTO 41 3. Momento da internação Não existe um "momento ideal" para internar a gestante em trabalho de parto. Embora o desejável seja a internação já na fase ativa, algumas gestantes poderão se beneficiar de uma internação mais precoce, ainda na fase latente: as que têm dificuldade de acesso ao local do parto e aquelas que - embora ainda não portadoras de condições que caracterizem gestação ou parto de alto risco - têm um potencial um pouco maior de apresentar complicações no trabalho de parto, como as parturientes com idade gestacional superior a 41 semanas, cesárea anterior, amniorrexe prematura e/ou patologias clínicas de grau leve. 4. Procedimento na admissão/internação da parturiente5 • Anamnese Nenhum atendimento em saúde, mesmo nos casos considerados de baixo risco, prescinde de uma anamnese dirigida, onde serão avaliados: antecedentes mórbidos, antecedentes obstétricos (onde se inclui também o levantamento de complicações de partos em gestações anteriores), data da última menstruação, informações sobre a movimentação fetal e dados e evolução de gestação atual. Estes dados já devem rotineiramente fazer parte do Cartão da Gestante que todo serviço deveria fornecer às mulheres em acompanhamento pré-natal. • Exame clínico Ainda que sumária nas gestações de evolução normal (ou de baixo risco), a avaliação clínica da gestante deve incluir medida dos dados vitais (pressão arterial, pulso e temperatura), avaliação das mucosas para inferir a presença ou não de anemia, a presença ou não de edema e varizes nos membros inferiores e a ausculta cardíaca e pulmonar. • Exame Obstétrico A ausculta da freqüência cardíaca fetal (antes, durante e após a contração uterina), a medida da altura uterina, a palpação obstétrica (para determinar a situação, posição, apresentação e insinuação) são, procedimentos obrigatórios na admissão da gestante. Se existe suspeita de amniorrexe prematura ou sangramento genital, o exame especular deve ser rotina, precedendo a decisão pela realização do toque. Os toques vaginais subseqüentes ao do diagnóstico podem ser postergados, até que a gestante se encontre na fase ativa do trabalho de parto, e deve ser utilizado com muita parcimônia nos casos de suspeita/confirmação de amniorrexe prematura. Quando existe sangramento vaginal, o toque deve ser realizado em condições controladas, pois pode se tratar de caso de 5 ASSISTÊNCIA À MULHER NO TRABALHO DE PARTO 44 o prolapso do cordão) e aquelas que apresentem sangramento genital moderado ou severo. 8. Amniotomia Embora existam evidências de que a amniotomia precoce possa reduzir a duração do trabalho de parto em 60 a 120 minutos, efeitos indesejáveis podem ocorrer com essa prática, como o incremento de desacelerações precoces da FCF e alterações plásticas sobre o pólo cefálico (bossa serossanguínea). Existe também um risco aumentado de infecção ovular e puerperal quanto maior for a duração do trabalho de parto com membranas rotas. Dessa forma, a rotura artificial da bolsa deve ser evitada, reservando-se seu uso para aquelas condições onde sua prática seja claramente benéfica, como é o caso de algumas distócias funcionais. É importante esclarecer que a amniotomia não é um procedimento obrigatório quando da realização de analgesia de parto. 9. Partograma: acompanhamento gráfico do trabalho de parto O partograma na avaliação e documentação da evolução do trabalho de parto é um instrumento de importância fundamental no diagnóstico dos desvios da normalidade. O Capítulo 6 trata deste assunto com detalhes. 10. Vigilância da vitalidade fetal O controle rigoroso da freqüência cardíaca fetal (FCF) durante o trabalho de parto assegura, na quase totalidade dos casos, a adoção de medidas apropriadas para garantir o nascimento de uma criança em boas condições. Mesmo a gestação de baixo risco não prescinde do controle periódico da FCF, quer com a utilização do estetoscópio de Pinard, quer com o uso do sonar-doppler. Na fase latente do trabalho de parto e no início da fase ativa, esse controle pode ser feito a cada 60 minutos, reduzindo-se esse intervalo para 30 minutos conforme progride a fase ativa do trabalho de parto. Nas gestações de baixo risco, a monitorização contínua da FCF pode ser contraproducente: limita a movimentação da mulher, restringindo-a ao leito, e tem um potencial de gerar um maior número de intervenções desnecessárias. É importante enfatizar que, quando existe excesso de contratilidade uterina (taquissistolia, hipertonia), quer espontânea, quer iatrogênica, o sofrimento fetal agudo pode se instalar em poucos minutos, o que exige uma vigilância contínua da FCF até que o quadro seja revertido. Embora nestes casos seja desejável o uso de monitores fetais na vigilância contínua da FCF, estes podem ser substituídos pela presença do profissional de saúde ao lado da parturiente, com a vantagem de que essa presença pode contribuir para a tranqüilização da mulher e, conseqüentemente, a resolução mais rápida da hipercontratilidade uterina. 5 45 Partograma é a representação gráfica do trabalho de parto que permite acompanhar sua evolução, documentar, diagnosticar alterações e indicar a tomada de condutas apropriadas para a correção destes desvios, ajudando ainda a evitar intervenções desnecessárias. Para compreender a evolução do trabalho de parto, é necessário o conhecimento prévio da fisiologia da dilatação cervical. De acordo com o Centro Latinoamericano de Perinatologia - CLAP (Schwarcz et al., 1996), a curva de dilatação cervical se processa de forma ascendente, de início com menor velocidade de dilatação. No final, essa velocidade aumenta, ou seja, o parto se desenvolve mais rapidamente a partir dos 4 cm de dilatação. A diferenciação na velocidade da cérvico-dilatação caracteriza a Fase Latente (inicial) e a Fase Ativa (final), de interesse na evolução do trabalho de parto e na construção do partograma (Figura 1). Figura 1 - Curva de evolução da cérvico - dilatação (Schwarcz et al.. 1996) 6USO DO PARTOGRAMA NO ACOMPANHAMENTO DO TRABALHO DE PARTO USO DO PARTOGRAMA NO ACOMPANHAMENTO DO TRABALHO DE PARTO 46 Friedman (1978) estabeleceu uma correspondência entre os períodos clássicos, especificamente entre os períodos de dilatação e expulsivo, e as assim denominadas "divisões funcionais" do parto. Considerou o período de dilatação subdividido em duas fases - a preparatória e a de dilatação propriamente dita. O período expulsivo passou a ser considerado por esse autor como período pélvico, ou seja, período em que se processam os fenômenos mecânicos do parto. Na fase latente do trabalho de parto a conduta é expectante, desde que a vitalidade fetal esteja preservada, e o ideal é que as parturientes sejam acompanhadas de ambulatório quando não se tratar de gestação de risco. Observa-se que, em muitas mulheres, a duração é superior a 20 horas e os ocitóocicos devem ser evitados, pelo risco de aumento na incidência de cesárea, decorrente do colo uterino desfavorável. Os sinais de alerta, como perda de líquido, sangramento uterino, contrações eficientes a cada 5 minutos e diminuição dos movimentos fetais, são orientações para que a parturiente retorne ao hospital no momento adequado. É importante relembrar que, para o acompanhamento do trabalho de parto, a fase ou divisão funcional de interesse na aplicação do partograma é a de dilatação (Friedman, 1978) ou fase ativa (Schwarcz et al., 1996), com velocidade de dilatação cervical mínima de 1 cm/hora. A abertura do partograma na fase latente ou no inicio da dilatação (menor que 3 - 4 cm) implicaria em intervenções não só desnecessárias, mas também iatrogênicas. Os benefícios da interpretação gráfica da evolução do trabalho de parto são inúmeros e o método é simples, podendo ser feita em qualquer folha de papel. Na forma mais comum de montagem do partograma, utiliza-se de papel quadriculado, colocando na abscissa (eixo X) o tempo em horas e, nas ordenadas (eixo Y), em centímetros, a dilatação cervical à esquerda e a descida da apresentação à direita. Para a descida da apresentação, considera-se o plano zero de De Lee ou o correspondente plano III de Hodge - espinhas ciáticas no estreito médio da bacia - acima deste ponto estão os valores negativos e abaixo os positivos de De Lee ou , respectivamente, os planos I, II e IV de Hodge (Figura 2). 6 USO DO PARTOGRAMA NO ACOMPANHAMENTO DO TRABALHO DE PARTO 49 Figura 4 - Modelo de ficha com partograma, e respectivas linhas de alerta e ação, e outros registros de interesse no acompanhamento do trabalho de parto 6 USO DO PARTOGRAMA NO ACOMPANHAMENTO DO TRABALHO DE PARTO 50 Na evolução normal do trabalho de parto, a curva de dilatação cervical se processa à esquerda da linha de ação. Quando essa curva ultrapassa a linha de ação, trata-se de um parto disfuncional. A construção correta da linha de alerta e de ação é fundamental para que se evitem erros na interpretação do parto (Figura 5). Figura 5 - Erro na construção do partograma - iniciado na fase latente do trabalho de parto 6 USO DO PARTOGRAMA NO ACOMPANHAMENTO DO TRABALHO DE PARTO 51 Na realidade, vários aspectos devem estimular o aprendizado do uso do partograma na assistência clínica ao parto, considerando ainda que a OMS tornou obrigatório o partograma nas maternidades desde 1994. O seu uso facilita o acompanhamento do trabalho de parto por principiantes e a passagem de plantão do pré-parto, favorecendo também a utilização racional de ocitócicos e analgesia. Dessa forma, o uso do partograma deverá interferir sobretudo na elevada incidência de cesáreas sem indicação obstétrica. Sua utilidade também é valorizada pelo diagnóstico precoce das distócias e suas respectivas intervenções. A identificação das distócias é feita pela observação das curvas de dilatação cervical e de descida da apresentação expressas no partograma. As distócias de cada período funcional do parto estão na Tabela 1. Tabela 1 – Distócias diagnosticadas pelo partograma, a partir das linhas de ação 6 USO DO PARTOGRAMA NO ACOMPANHAMENTO DO TRABALHO DE PARTO 54 A parada secundária da dilatação é diagnosticada por dois toques sucessivos, com intervalo de 2 horas ou mais, com a mulher em trabalho de parto ativo. Nesse tipo de distócia, a dilatação cervical permanece a mesma durante duas horas ou mais, ultrapassa a linha de alerta e, por vezes, a linha de ação (Figura 7). Há associação freqüente com sofrimento fetal agravando o prognóstico perinatal. A causa principal e a desproporção céfalo-pélvica relativa ou absoluta. Desproporção céfalo- pélvica absoluta traduz tamanho do pólo cefálico maior que a bacia (feto macrossômico) ou feto de tamanho normal e bacia obstétrica inadequada. Na vigência de desproporção céfalo-pélvica absoluta, a resolução da gestação é feita por cesárea. Considera-se desproporção relativa quando existe defeito de posição da apresentação: deflexão ou variedades de posição transversas ou posteriores. Nestas condições, a deambulação, a rotura artificial da bolsa das águas ou a analgesia peridural podem favorecer a evolução normal do parto. Nos casos de membranas rotas, a deambulação só deve ser recomendada com o pólo cefálico completamente apoiado na bacia materna, para evitar a ocorrência de prolapso de cordão umbilical. A resolução por cesárea deverá ser indicada quando esses procedimentos não forem eficientes para corrigir a evolução anormal da cérvico-dilatação observada no partograma. 6 USO DO PARTOGRAMA NO ACOMPANHAMENTO DO TRABALHO DE PARTO 55 Figura 7 – Parada secundária da dilatação 6 USO DO PARTOGRAMA NO ACOMPANHAMENTO DO TRABALHO DE PARTO 56 O parto precipitado ou taquitócico é diagnosticado quando a dilatação cervical e a descida e expulsão do feto ocorrem num período de 4 horas ou menos (Figura 8). O padrão da contratilidade uterina é de taquissistolia e hipersistolia e, caso a placenta esteja no limite de sua função, pode ocorrer o sofrimento fetal. Lacerações do trajeto também são mais freqüentes neste tipo de parto, pois não há tempo para acomodação dos tecidos pélvicos, ocorrendo descida e expulsão do feto de modo abrupto. O parto taquitócico pode ser espontâneo em multíparas, sendo mais raro em primíparas. Também pode acontecer em decorrência de iatrogenia pela administração excessiva de ocitocina. Neste caso, deve-se suspender a infusão de ocitocina até o retorno a um padrão contratural normal. Orienta-se atenção à vitalidade fetal no período de dilatação cervical e revisão detalhada do canal de parto após a dequitação.6 USO DO PARTOGRAMA NO ACOMPANHAMENTO DO TRABALHO DE PARTO 59 Figura 9 – Período pélvico prolongado 6 USO DO PARTOGRAMA NO ACOMPANHAMENTO DO TRABALHO DE PARTO 60 A parada secundária da descida é diagnosticada por dois toques sucessivos, com intervalo de 1 hora ou mais, desde que a dilatação do colo uterino esteja completa. Considera-se que há parada secundária da progressão da apresentação quando ocorre cessação da descida por pelo menos 1 hora após o seu início (Figura 10). Deve ter pronta correção. Há necessidade de se reavaliar as relações feto-pélvicas, pois a causa mais freqüente desse tipo de distócia é a desproporção céfalo- pélvica relativa ou absoluta. A presença de desproporção absoluta leva à indicação de cesárea. Na vigência de desproporção relativa, com pólo cefálico profundamente insinuado e cérvico-dilatação completa, é válida a tentativa de fórcipe de tração ou rotação, dependendo da variedade de posição. 6 USO DO PARTOGRAMA NO ACOMPANHAMENTO DO TRABALHO DE PARTO 61 Figura 10 - Parada secundária descida 6 64 O progresso técnico e cientifico da medicina em geral, e da Obstetrícia, Neonatologia e Anestesiologia em particular, tornou o parto um procedimento mais seguro e menos doloroso. A adequada assistência ao parto e o necessário respeito aos desejos e direitos da mulher parturiente compreendem seu conforto, segurança e bem-estar. Isto implica uma série de necessidades onde se incluiu o controle adequado da dor do trabalho de parto e o acompanhamento do trabalho de parto por pessoa de sua escolha, que lhe dê o apoio emocional necessário para este período. O parto constitui um dos pontos fundamentais da vida psico-sexual da mulher. Assim, quando é vivenciado com dor, angústia, medo e isolamento, pode levar a distúrbios psicológicos, afetivos e emocionais, podendo influenciar o relacionamento mãe/filho, além de sua vida afetiva e conjugal. 0 medo gera dor e a dor aumenta o medo. O direito ao acompanhamento da gestante é já reconhecido em diversas instâncias, incluindo o Ministério da Saúde, entretanto não e praticado de forma regular e sistemática em todo o país. Ao contrário, de maneira geral, apenas as mulheres mais favorecidas economicamente, que têm seus partos através de seguros em hospitais privados, é que se utilizam deste direito. Idealmente, este acompanhamento durante o trabalho de parto pressupõe o adequado preparo da mulher para este momento, já iniciado durante o pré- natal (ver Capítulo 3). Embora este apoio á parturiente não deva ser entendido estritamente como uma forma alternativa de possível controle da dor durante este período, mas sobretudo como um direito seu no processo de humanização do nascimento, de fato representa um fator de grande ajuda. O acompanhamento pelo marido, companheiro, familiar próximo ou amiga não envolve necessariamente nenhum preparo técnico. Representa, mais que nada, o suporte psíquico 7 ACOMPANHAMENTO DURANTE O TRABALHO DE PARTO (SUPORTE PSICOSSOCIAL) ACOMPANHAMENTO DURANTE O TRABALHO DE PARTO (SUPORTE PSICOSSOCIAL) 65 e emocional da presença reconfortante, do contato físico, para dividir o medo e a ansiedade, para somar forças, para estimular positivamente a parturiente nos momentos mais difíceis. As técnicas de relaxamento e exercícios respiratórios associados às informações recebidas pela gestante em seu preparo para o parto têm sido objeto de estudos quanto à sua influência durante o trabalho de parto e parto. Existem algumas evidências de que se associem a alguns efeitos benéficos, como a menor necessidade de uso de drogas opióides e de analgesia peridural, com uma maior proporção de partos vaginais e com uma maior satisfação da mulher com o parto. O processo de humanização do nascimento, que inclui também a possibilidade de um acompanhante à parturiente, envolve necessariamente uma mudança de atitudes. Inicialmente do profissional de saúde que é parte integrante da equipe que presta atenção integral a esta mulher, revendo seus conceitos, deixando de lado seus preconceitos, para favorecer um acolhimento completo, técnico e humano à mulher. Envolve também a mudança de atitude da instituição, que deve estar estruturada e preparada para esta nova postura, incentivando, favorecendo, estimulando, treinando e controlando seus profissionais para o desempenho destas tarefas. Além disso, as instituições devem também estar administrativa e estruturalmente preparadas para o processo, amparadas e suportadas per normas e diretrizes emanadas pelas instituições responsáveis pela saúde no país. É neste contexto que o Ministério da Saúde tem envidado todos os esforços no sentido de estimular e propiciar a introdução destas novas práticas nas maternidades brasileiras. Acompanhamento no parto (doula) Além do acompanhamento pelo parente ou companheiro, existe também o acompanhamento per outra pessoa, com ou sem treinamento específico para isto, a doula. Ela presta constante apoio a gestante e seu companheiro/acompanhante durante o trabalho de parto, encorajando, aconselhando medidas para seu conforto, proporcionando e orientando contato físico e explicando sobre o progresso do trabalho de parto e procedimentos obstétricos que devem ser realizados. Diversos ensaios clínicos aleatorizados sugerem que o acompanhamento da parturiente pela doula reduz a duração do trabalho de parto, o use de medicações para alívio da dor e o número de partos operatórios. Alguns estudos também mostram a redução do número de cesáreas. Além destas vantagens, também é observado que os grupos de parturientes acompanhadas durante o parto pela doula têm menos depressão pós-parto e amamentam seus recém-nascidos nas primeiras seis semanas de vida em maior proporção que as parturientes dos grupos de controle. A presença de uma pessoa treinada para acompanhamento do trabalho de parto não e cara e não requer infra-estrutura ou aparelhagem especifica. Evidentemente, também não tem qualquer 7 ACOMPANHAMENTO DURANTE O TRABALHO DE PARTO (SUPORTE PSICOSSOCIAL) 66 contra-indicação. O treinamento pode ser feito tanto entre o próprio pessoal profissional das maternidades, como entre indivíduos da comunidade. A opção por qualquer uma destas alternativas deve depender, pelo menos por enquanto, da disponibilidade e estratégia adotada localmente. Recentemente, uma revisão sistemática sobre a prática de um suporte social contínuo, incluindo conselhos e informações, assistência e apoio emocional, durante todo o trabalho de parto, fornecido às mulheres por profissionais de saúde ou pessoas leigas, comparativamente a uma assistência padrão sem estas características, concluiu que este tipo de apoio parece ter vários benefícios para as mães e seus recém nascidos, sem nenhum efeito danoso. Tal apoio emocional pressupõe, entre ambos envolvidos, a presença, o escutar, o dar segurança e afirmação. Avaliando 14 ensaios clínicos envolvendo mais de 5 mil mulheres de países tanto desenvolvidos quanto em desenvolvimento, esta intervenção esteve associada à redução da necessidade de medicação para alívio da dor, do parto vaginal operatório, da cesárea e do depressão neonatal, além de uma leve redução na duração do trabalho de parto. Quando os estudos avaliaram os efeitos desta intervenção sobre a vivência das mulheres quanto ao nascimento, todos os resultados foram favoráveis ao grupo recebendo este apoio contínuo. As pessoas fornecendo este tipo de apoio eram todas mulheres e com experiência, seja porque tinham já dado à luz ou tido treinamento como enfermeiras, obstetrizes, doulas ou educadoras em saúde. Apesar de sugerirem também um efeito benéfico a longo prazo sobre a saúde física e psicossocial das mulheres e sobre o aleitamento materno, as evidências não são definitivas a este respeito. Não se conhece também ainda qual profissional ou leigo teria melhor desempenho exercendo esta intervenção, nem seu efeito a longo prazo sobre a saúde dos recém-nascidos. Dessa forma, dados os inequívocos benefícios e a ausência de riscos associados ao apoio contínuo durante o trabalho de parto, todos os esforços deveriam ser feitos no sentido de garantir que toda mulher em trabalho de parto o recebesse. Ele deveria incluir a presença contínua da pessoa escolhida para acompanhá-la, capaz de transmitir-lhe conforto e encorajamento. É evidente que em algumas circunstâncias isto poderia significar a necessidade de alterar as atribuições de profissionais como enfermeiras e obstetrizes; de programas de educação continuada para o ensino e prática destas atividades; de modificações na estruturação e composição da equipe profissional das unidades que assistem às mulheres em trabalho de parto; e da adoção de políticos institucionais que permitissem e estimulassem a presença de pessoas leigas experientes ao lado das parturientes. Em que pesem todas as experiências recentes, tanto internacionais como brasileiras, de estímulo ao parto domiciliar (por opção e não por falta dela) nas situações de gestação de baixo risco, não existe ainda nenhuma evidência científica demonstrando qualquer claro benefício sobre a saúde da mulher ou do recém-nascido desta intervenção, com relação ao parto institucional. 7 O CONTROLE DA DOR NO TRABALHO DE PARTO 69 por fibras A-8 e C, que penetram no corno dorsal da medula e fazem sinapses com neurônios que prosseguem para centros superiores e outros envolvidos em arcos reflexos medulares, sofrendo neste local um complexo processo de modulação. Este processo, principalmente quando intenso, provoca respostas reflexas segmentares, suprasegmentares e corticais, que incluem estimulação respiratória, circulatória, de centros hipotalâmicos de função neuroendócrina predominantemente simpática, de estruturas límbicas e de mecanismos psicodinâmicos de ansiedade e apreensão. Repercussões Materno-Fetais Dentre as alterações fisiológicas que acompanham a dor, podem se destacar: • aumento do volume minuto, acompanhado de aumento do consumo de oxigênio em torno de 40% acima dos níveis anteriores ao trabalho de parto, podendo chegar até 100% durante o segundo estágio. Esta hiperventilação pode diminuir a PaCO2 materna em 10 a 20 mmHg e elevar o pH arterial até 7,55-7,60. A hipocápnia pode diminuir o estímulo ventilatório materno, reduzindo a PaO2 materna em 10 a 50%. Quando a PaO2 materna cai abaixo de 70 mmHg, o feto pode sofrer hipoxemia e apresentar desacelerações de sua freqüência cardíaca; • aumento progressivo do débito cardíaco materno. Há, inicialmente, um aumento de 10 a 15% no período de dilatação, 50% durante o segundo período e pode chegar até 80% acima dos valores preliminares, imediatamente após o parto; • aumento dos níveis de adrenalina, noradrenalina, cortisol e ACTH no sangue materno; • modificações da função gastrointestinal; e • acidose metabólica materna progressiva. Tanto a dor como a ansiedade e o conseqüente aumento da secreção de cortisol e catecolaminas podem afetar a contractilidade e o fluxo sangüíneo uterinos. Uma vez diagnosticado o trabalho de parto e a regularidade das contrações, a dor pode e deve ser aliviada, pois pode ser prejudicial tanto à mãe quanto ao feto, principalmente quando incide sobre um organismo materno com patologia associada ou unidade feto-placentária com baixa reserva. Métodos de Analgesia Uma das considerações básicas sobre a analgesia e anestesia obstétricas é o adequado preparo psicológico e fisiológico da parturiente. Considera-se que a mulher de hoje é mais exigente quanto às informações que necessita sobre a sua gestação e o parto. Preferencialmente durante o pré-natal, a gestante deve ser esclarecida sobre as formas de analgesia disponíveis, suas vantagens, desvantagens e limitações. Deve-se assegurar que existam várias opções para controlar a dor do trabalho de parto, e que todos os 8 O CONTROLE DA DOR NO TRABALHO DE PARTO 70 esforços compatíveis com a segurança de ambos (mãe e filho), serão despendidos para diminuir seu desconforto. Resumidamente, existem três métodos para o controle da dor durante o trabalho de parto e o parto: não farmacológicos, farmacológicos sistêmicos e farmacológicos regionais. 1. Métodos não Farmacológicos Dentre eles destacam-se as técnicas psicoprofiláticas, acupuntura e estimulação transcutânea elétrica (ETE). O método psicoprofilático mais popular, introduzido por Lamaze em 1954, prepara a mulher para o parto através de um programa educacional sobre a fisiologia do parto, além de exercícios físicos e respiratórios. Este método pode ser usado na fase inicial do trabalho de parto, podendo ser complementado com outros métodos, quando necessário. A acupuntura produz analgesia através da liberação de endorfinas pelo Sistema Nervoso Central. Na maioria dos casos, obtém-se alívio parcial da dor e muitas parturientes necessitam de métodos complementares no segundo estágio do trabalho de parto. A estimulação elétrica transcutânea produz analgesia através da colocação de dois eletrodos superficiais nos dermátomos correspondentes a T10 a L1 lateralmente à linha mediana e mais dois eletrodos no nível das vértebras S2 a S4. O estímulo elétrico consiste de impulsos bifásicos que variam quando à amplitude e freqüência conforme a intensidade da dor. É uma forma de analgesia segura, não invasiva e fácil de aplicar. Seus resultados são variáveis e como desvantagem pode-se citar a interferência elétrica com a monitorização dos batimentos cardíacos fetais. Embora com algumas limitações, os métodos não farmacológicos, quando administrados de forma adequada, apresentam vantagens como: parturientes menos ansiosas e mais cooperativas; redução do consumo de analgésicos sistêmicos; postergação no início de técnicas regionais de analgesia; colaboração ativa da parturiente e maior participação do acompanhante. 2. Métodos Farmacológicos Sistêmicos Geralmente utiliza-se a via parenteral e raramente a via inalatória. Como vantagens pode-se citar a facilidade de administração e a aceitação das parturientes. A administração sistêmica de fármacos requer cautela para não provocar depressão respiratória materna e/ou neonatal. Os opióides são os agentes mais eficientes, quando empregados por via sistêmica, para controlar a dor do trabalho de parto, e a meperidina e o opióide mais empregado por esta via. Pode-se empregar a via intramuscular na dose de 50mg nas fases mais iniciais do trabalho de parto. Como efeitos colaterais maternos, dose-dependentes, podem ocorrer náuseas e vômitos e, mais raramente, depressão respiratória. 8 O CONTROLE DA DOR NO TRABALHO DE PARTO 71 Além disso, a meperidina está associada a depressão neonatal e a pontuações mais baixas nos testes neurocomportamentais, que podem perdurar por 48 horas. A depressão fetal é máxima entre 1 e 4 horas após a administração, provocada talvez por metabólitos ativos. Isso implica na necessidade de profissional treinado para reanimação neonatal e a disponibilidade de drogas antagonistas (naloxone). O uso sistêmico de opióides, sobretudo quando disponíveis outros métodos não farmacológicos, deve ser evitado para a prevenção destes efeitos depressores sobre a respiração neonatal. Eles também dificultam a interação entre mãe e filho no período puerperal, além de comprometerem o início precoce da amamentação. Opióides Iipossolúveis, como fentanil, alfentanil ou sufentanil, são pouco utilizados por via sistêmica, pois seu efeito analgésico e de curta duração e o principal efeito colateral e a depressão respiratória. 3. Métodos Farmacológicos Regionais A analgesia produzida por bloqueios regionais apresenta vantagens sobre os métodos sistêmicos. A deposição do anestésico local próximo às vias de condução nervosa permite uma boa analgesia seletiva, sem depressão do feto e permitindo a cooperação materna. Durante o trabalho de parto ou o parto, varias técnicas regionais podem ser empregadas: bloqueio dos nervos pudendos, peridural lombar ou sacral, raquianestesia e bloqueio combinado raqui-peridural. a. Bloqueio do Pudendo Os nervos pudendos têm sua origem nas raízes sacrais (S2-S4) e inervam o períneo, vagina, reto e parte da bexiga, portanto o seu bloqueio está indicado somente para o segundo estágio, propiciando anestesia adequada ao parto. As complicações estão relacionadas á punção, como hematomas ou abcessos, ou á toxicidade sistêmica dos anestésicos locais por administração intravenosa inadvertida. Técnicas e drogas O nervo pudenda interno é facilmente acessível em sua passagem pela espinha ciática. Desta forma, duas vias de abordagem podem ser utilizadas: a transvaginal ou a perineal. Técnica transvaginal: com a paciente em posição ginecológica e após o preparo do períneo e vagina com solução anti-séptica, introduzem-se os dedos médio e indicador de uma das mãos pela vagina ate palpar a espinha ciática e o ligamento sacroespinhoso. A seguir, introduz-se uma agulha longa (de 8 a 10cm de comprimento), já conectada a uma seringa com anestésico local, deslizando sobre os dedos como guias até o ligamento internamente à espinha. Deve-se atravessar a mucosa e ligamento por cerca de 1,5cm de profundidade e injetar 10mI de lidocaína a 1% com adrenalina 1:200.000. É preciso recordar que a artéria e veia pudenda correm paralelamente ao nervo, portanto e recomendável aspirar durante a injeção do anestésico, para evitar a administração intravenosa. 8 O CONTROLE DA DOR NO TRABALHO DE PARTO 74 podem se beneficiar do procedimento. O fluxo sangüíneo uterino não se altera nas mulheres hígidas após a analgesia peridural e pode aumentar em mulheres com pré-eclampsia. Em comparação a métodos sistêmicos de analgesia, a técnica peridural provê analgesia mais efetiva para o trabalho de parto, além de benefícios fisiológicos potenciais. Através da redução das catecolaminas séricas maternas, a analgesia peridural pode melhorar o fluxo e a atividade uterinos. Uma analgesia efetiva também interrompe o círculo hiperventilação - hipoventilação materno e suas conseqüências para o feto. Finalmente, a analgesia peridural proporciona major flexibilidade às necessidades de cada parturiente em relação à evolução obstétrica: parto normal, fórcipe ou cesariana. Suas contra-indicações formais são poucas, incluindo-se a coagulopatia materna, infecção no local da punção, instabilidade hemodinâmica resultante de hipovolemia e recusa materna. Outras situações requerem uma avaliação mais individualizada, sempre levando em conta a relação risco/beneficio, como a doençaa neurológica pré-existence, infecção materna e algumas cardiopatias. Quando se utiliza bupivacaína em diluições analgésicas por via peridural, obtérn-se uma duração de ação relativamente longa e um bloqueio sensitivo de alto qualidade, com mínimo bloqueio motor (bloqueio diferencial). A analgesia peridural proporciona um alívio da dor considerado bom por 80 a 90% dos parturientes. No entanto, a administração exclusiva de anestésicos locais por via peridural, ainda que satisfatória para o controle da dor, tem sido responsabilizada por efeitos indesejáveis como hipotensão materna secundária ao bloqueio simpático, e relaxamento muscular do assoalho pélvico e da parede abdominal, levando a dificuldades na rotação interna do polo cefálico fetal dentro do canal de parto, e ao eventual prolongamento do período expulsivo, com aumento de incidência de partos instrumentals. Associação Anestésicos Locais e Opióides por via peridural Há cerca de vinte anos, a observação do efeito analgésico de opióides administrados por via espinal trouxe esperanças de se obter uma analgesia efetiva, sem bloqueio simpático ou motor, ideal para obstetricia, pós-operatório e dores crônicas. A associação entre anestésicos locais e opióides e uma excelente opção em termos de qualidade analgésica. Esta combinação parece preservar os benefícios de cada droga e diminuir o risco de efeitos indesejáveis. A explicação para isto reside no fato de que estes agentes atuariam em dois sítios distintos: os anestésicos locais na membrana axonal e o opióide, em receptor especifico da medula espinal, eliminando a dor através de um mecanismo combinado e sinérgico. As soluções diluídas de anestésico local são capazes de bloquear melhor as fibras A-S, enquanto os opióides seriam mais eficientes no bloqueio de impulsos conduzidos pelas fibras C. 8 O CONTROLE DA DOR NO TRABALHO DE PARTO 75 • Bloqueio peridural lombar contínuo – Permite o bloqueio seletivo das fibras que transmitem a dor, de acordo com as diferentes fases do trabalho de parto, respeitando a musculatura abdominal e facilitando a colaboração materna no estágio expulsivo. Atualmente, considera-se a dor materna como o parâmetro mais importante para a indicação da analgesia, porque quando intensa e prolongada, promove alterações nocivas para a mãe e o feto. As cardiopatas e toxêmicas devem receber analgesia precoce para evitar a sobrecarga no sistema cardiovascular. Também é indicada em presença de distócias hipertônicas. Deve-se empregar pequenas doses de anestésicos locais para o alívio das dores decorrentes das contrações uterinas e dilatação do colo. No segundo estágio, o bloqueio precisa ser estendido ate S2-S4, através de doses adicionais de anestésico local pelo cateter. Técnicas e Drogas A punção pode ser realizada com a paciente sentada ou em decúbito lateral, na linha mediana, através dos interespaços L3-L4 ou L4-L5, com agulhas descartáveis, do tipo Tuohy 16 a 17 G e o cateter adequado ao calibre da agulha. Existe a possibilidade de, utilizando pequenas doses de anestésico, permitir a deambulação da parturiente, após certificar-se que não haja comprometimento motor ou de equilíbrio. Pode-se empregar também um esquema de infusão continua através de bomba, para a manutenção da analgesia. Procede-se à instalação da analgesia conforme citado anteriormente e, após obter-se alivio satisfatório da dor materna, inicia-se a infusão continua com um fluxo de 10 - 12 ml/h de bupivacaína a 0,0625 - 0,125%. Drogas e Doses Momento da analgesia: como já explicado, a dor materna e o principal fator que deve ser considerado como parâmetro de indicação quanto ao momento da analgesia, não a dilatação cervical. A dilatação e importante apenas para a escolha da droga e da dose a ser usada. 8 O CONTROLE DA DOR NO TRABALHO DE PARTO 76 • Bloqueio Peridural Lombar Único – Adequado somente no final do primeiro estágio e expulsivo. Nesta situação, procede-se à técnica anestésica como descrita anteriormente, optando-se por uma concentração de anestésico local mais elevada em volume suficiente para a anestesia completa do períneo: 12 - 15 ml de bupivacaina a 0,25% com adrenalina 1: 200.000 ou ropivacaína a 0,2% em igual volume. c. Raquianestesia É adequada no final do primeiro estágio e durante o período expulsivo. É efetiva quando se pretende ter um bom relaxamento perineal (aplicação de Fórcipe) tendo a apresentação fetal já iniciado a progressão dentro do canal de parto. Pode ser indicada também para manipulação e revisão do canal de parto e Útero. Inconvenientes: 1) níveis altos de bloqueio com perda da prensa abdominal seguida de dificuldade na progressão fetal e retardo do período expulsivo. 2) cefaléia pós-punção. Técnica e drogas A punção pode ser realizada com a mulher sentada ou em decúbito lateral, na linha mediana, através dos interespaços L3-L4 ou L4-L5, com agulhas descartáveis de 25 a 27 G e para urgências a 22 G. 0 nível sensitivo não deve ultrapassar os Últimos dermátomos torácicos, empregando-se para isso a lidocaína a 5% hiperbárica 40 - 50 mg (0,8 - 1 ml) ou bupivacaína 0,5% hiperbárica 5 - 7,5 mg (1 - 1,5 ml). d. Bloqueio combinado raqui-peridural Atualmente, esta técnica vem ganhando mais e mais adeptos. Basicamente, consiste na combinação das duas técnicas anteriores. Através da deposição de um opióide associado ou não a AL no espaço subaracnoideo, obtém-se analgesia satisfatória por cerca de duas horas, sem comprometimento motor. À medida que as contrações dolorosas retornam, é possível complementar a analgesia, através da injeção de uma solução diluída de AL no espaço peridural. As técnicas apresentadas anteriormente devem ser executadas por anestesiologistas, e quando realizadas adequadamente, proporcionam um alivio satisfatório da dor materna e ao mesmo tempo oferecem condições técnicas para a realização da maioria dos procedimentos obstétricos. Para se alcançar o resultado esperado, é imprescindível salientar a importância de uma atuação conjunta das equipes de obstetrícia, neonatologia e anestesia e sua interação com a mulher e seu acompanhante. 8 ASSISTÊNCIA À MULHER NO PARTO NORMAL 79 que se diagnosticou a dilatação total. O retardo dos puxos não determinou qualquer efeito nocivo sobre o feto ou recém-nascido; no grupo com puxos precoces observou-se numero significativamente major de aplicação de fórcipe. Embora os resultados tenham sido obtidos em parturientes com analgesia, estão de acordo com a experiência clínica de que se deve retardar o puxo até o aparecimento do reflexo espontâneo. Esta pratica e mais fácil para a mulher e tende a encurtar a fase exaustiva dos esforços maternos. Outros estudos compararam a prática fisiológica dos puxos involuntários, curtos e espontâneos, com o padrão voluntário de puxos longos e dirigidos (manobra de Valsalva), seguidos de apnéia forçada (puxos durante a expiração). Este último método resultou em abreviação do segundo estágio do parto, mas com risco de alterações na freqüência respiratória e no volume de ejeção, causadas pelo tipo de respiração materna. Com os puxos prolongados e decúbito horizontal, por compressão da aorta e diminuição do fluxo útero-placentário, observou- se queda no pH médio da artéria umbilical e tendência a menores índices de Apgar do recém-nascido. As evidências sac) poucas, mas delas emerge um padrão onde os puxos prolongados e precoces resultam em diminuição modesta da duração do segundo período, que não parece trazer benefício algum, com comprometimento das trocas materno-fetais. O puxo espontâneo mais curto parece ser superior. 2 – Sala especial de parto Em alguns hospitais, o parto é atendido em sala especial, equipada com luzes fortes e brilhantes, instrumentais e mesa cirúrgica com perneiras ou hastes metálicas. Apesar de mais adequada ao profissional que assiste a parturiente, pela facilidade de intervenção operatória se necessário, para a mãe isto e totalmente incomodo. Quando a evolução do parto e normal, não ha indicação de transferência da parturiente do pré-parto para a sala de parto no período expulsivo. O pré-parto e parto podem ser atendidos na mesma sala. A humanização do parto contempla a criação das salas de parto, onde as parturientes permanecem durante o trabalho de parto (fase de dilatação cervical), parto (expulsão fetal e dequitação placentária) e puerpério imediato com seu acompanhante. Em português a denominação oficial para este conceito (a exemplo do labor and delivery room - LDR da língua inglesa), tem sido o de "sala PPP", ou seja, de pré-parto, parto e puerpério imediato. Essa estratégia tem se mostrado efetiva na humanização do parto e no incentivo ao parto normal, com conseqüente redução nos índices de cesárea. 3 – Posição materna Várias são as proposições da literatura sobre a melhor posição materna durante o trabalho de parto e parto. Dependendo da capacidade e da experiência do profissional com determinada posição, além das informações da própria mulher, os resultados podem ter variações muito grandes. Independentemente das linhas 9 ASSISTÊNCIA À MULHER NO PARTO NORMAL 80 de pensamento relacionadas a prática da assistência ao parto, é consenso geral que a posição horizontal deve ser evitada para prevenir os efeitos da dificuldade de trocas materno-fetais. Alguns resultados de trabalhos científicos apontam vantagens da posição verticalizada ou da inclinação lateral sobre a posição dorsal (decúbito horizontal), entre elas: menor desconforto e dificuldade de puxos, dores menos intensas e menor risco de traumas vaginais ou perineais e de infecções na incisão. Observou-se também menor duração do período expulsivo e melhores resultados neonatais - menor proporção de índices de Apgar <7. Outros estudos atribuíram a posição verticalizada maior número de lacerações dos lábios vaginais, de terceiro grau, embora com números pequenos para uma analise concreta. Apesar de relacionarem maior porcentagem de hemorragias pós-parto, não houve diferença significativa nos níveis de hemoglobina no quarto dia de puerpério. A facilidade de se apurar a perda sanguínea e a major pressão sobre as veias pélvicas e vulvares na posição vertical podem ter contribuído para essa impressão. A OMS (1996), no seu guia prático de Assistência ao Parto Normal, recomenda que, Canto no primeiro quanto no segundo período, as mulheres devam adotar a posição que melhor lhes agradar, desde que evitem longos períodos em decúbito dorsal. Deve-se estimuladas a experimentar aquilo que for mais confortável e, para isso, os profissionais necessitam ser treinados no manejo do parto em outras posições além da supina. 4 – Cuidados com o períneo A lesão de períneo e um dos traumatismos mais freqüentes durante o parto, mesmo em partos e trabalhos de parto com evolução normal. Várias técnicas e práticas visam reduzir os danos ou altera-los a um grau manejável. E divulgada a técnica de proteção do períneo durante a expulsão do polo cefálico - os dedos de uma das mãos (geralmente a direita) apóiam o períneo, enquanto a outra mac) faz leve pressão sobre a cabeça para controlar a velocidade de coroamento, tentando evitar ou reduzir os danos aos tecidos perineais. Essa técnica e conhecida como Manobra de Ritgen - (Figura 2). Figura 2 - Manobra de Ritgen (Cunningham et al., 1997) 9 ASSISTÊNCIA À MULHER NO PARTO NORMAL 81 É passível que, com essa manobra, se evite a laceração do períneo, mas é discutido se a pressão sobre a cabeça fetal não possa impedir o seu movimento de extensão e afastar o arco púbico em direção ao períneo, aumentando assim o risco de lesão perineal. Não foi feito nenhum estudo formal para responder a essa dúvida, portanto não se pode concluir sobre a melhor estratégia. Convém ressaltar que essa manobra é mais facilmente aplicada com a parturiente na posição dorsal e, se ela estiver numa posição verticalizada, o profissional pode fazer o suporte do períneo às cegas, ou então nem praticar tal estratégia. 5 – Laceração de períneo e episiotomia A ocorrência de Iacerações perineais é freqüente, especialmente em primíparas. Lacerações de primeiro grau às vezes não necessitam sutura, as de segundo grau em geral podem ser suturadas com facilidade sob analgesia local e, em regra geral, cicatrizam sem complicações. As Iacerações de terceiro grau podem ter conseqüências mais sérias e sempre devem ser suturadas para prevenir problemas de fístula ou incontinência fecal. Um ensaio clínico aleatorizado, comparando os efeitos de dois tipos de suturas para reparo de Iacerações perineais - intradérmica contínua e pontos separados - avaliou 1.864 mulheres. A sutura intradérmica contínua associou-se à menor intensidade de dor até o 10° dia de puerpério e menor necessidade de remoção da sutura. Não se observou diferença na necessidade de analgesia, de ressutura de parede ou na queixa de dispareunia após três meses do parto. Apesar da episiotomia ser técnica realizada com freqüência, sua incidência é variável. Nos Estados Unidos, 50 a 90% das primíparas são submetidas à episiotomia, o que torna essa técnica o ato cirúrgico mais freqüente daquele país. Muitos centros são mais conservadores quanto ao uso da episiotomia. Nos Países Baixos, as obstetrizes realizam episiotomia em 24,5% das parturientes. Destas, a imensa maioria é médio- lateral e a minoria mediana. As episiotomias medianas são suturadas com mais facilidade e têm a vantagem de melhor cicatrização, entretanto, as médio-laterais são melhores na proteção do esfíncter anal e reto. Uma revisão sistemática da Biblioteca Cochrane sobre a prática e os efeitos da episiotomia, comparando o uso de rotina com o restrito, apontou os seguintes resultados: a) a episiotomia foi aplicada de rotina em 72,7% e, quando de uso restrito, em 27,6% das mulheres avaliadas (2.209 no primeiro grupo e 2.441 no segundo); b) a episiotomia de uso restrito associou-se a menor risco de trauma de períneo posterior, de necessidade de sutura e de complicações na cicatrização; c) o uso restrito também associou-se a major risco de trauma perineal anterior; e d) não se observou diferença significativa no risco de traumas vaginais 9 ASSISTÊNCIA À MULHER NO PARTO NORMAL 84 b) se depois do nascimento, o recém-nascido for colocado ao nível da vulva ou abaixo dele por três minutos, antes do clampeamento do cordão, há transferência de aproximadamente 80 ml de sangue da placenta para o recém-nascido. Os eritrócitos nesse volume de sangue logo serão hemolisados, mas isso fornece cerca de 50 mg de ferro para as reservas do neonato e reduz a freqüência de anemia ferropriva no primeiro ano de vida. Teoricamente, pode causar hipervolemia, policitemia e hiperviscosidade, além de hiperbilirrubinemia. Entretanto, não foram observadas diferenças clinicamente relevantes e nenhuma diferença em relação à morbidade neonatal, quando se compararam os dois momentos de clampeamento do cordão; e c) no que se refere a distúrbios respiratórios neonatais, não houve diferença significativa entre as duas condutas. O clampeamento tardio (ou ausência de clampeamento) é o modo fisiológico de tratar o cordão, e o precoce é intervenção que deve ter indicações precisas. A "transfusão" de sangue da placenta para o recém- nascido, nos casos de clampeamento tardio de cordão, é fisiológica e provavelmente não tem efeitos adversos, pelo menos em casos de baixo risco. As indicações de clampeamento precoce de cordão se relacionam a gestações e partos de risco, como por exemplo, a sensibilização Rh, o parto prematuro, o sofrimento fetal com depressão neonatal grave, o parto gemelar e o da mulher HIV+. Nesses casos, o clampeamento tardio pode causar complicações e deve ser evitado. Imediatamente após o nascimento, deve-se verificar as condições do recém-nascido. Isso é parte integrante da assistência ao parto normal e a OMS enfatiza a importância de uma abordagem unificada à assistência materna e neonatal. Este assunto está contemplado no Capítulo 15. ASSISTÊNCIA À DEQUITAÇÃO Nesse estágio ocorre a separação e expulsão da placenta (dequitação). Os principais riscos maternos são a hemorragia durante ou após essa separação e a retenção de restos placentários. A hemorragia pós-parto é uma das principais causas de mortalidade materna e a maioria desses casos ocorre em países em desenvolvimento. A incidência de hemorragia pós-parto e de retenção de restos placentários aumentam frente a alguns fatores predisponentes, tais como gestação múltipla, polidrâmnio, trabalho de parto complicado (distócias) ou parto vaginal operatório. Também o risco é aumentado quando a parturiente tem antecedentes prévios dessas intercorrências. Embora seja possível selecionar as mulheres de risco, mesmo em gestações de baixo risco e partos de evolução normal, podem-se observar hemorragias severas e retenção placentária. Em vista disso, várias medidas preventivas foram testadas em estudos aleatorizados e serão discutidas a seguir. 9 ASSISTÊNCIA À MULHER NO PARTO NORMAL 85 1 – Uso profilático de ocitócicos A administração profilática de ocitocina é usada em vários momentos durante o terceiro período do parto. Mais freqüentemente é aplicada por via intramuscular, na dose de 10Ul, imediatamente após o desprendimento do ombro anterior, ou após o nascimento da criança. As drogas mais empregadas são a ocitocina e derivados do ergot, como a ergotamina, ou uma combinação de ambos, a sintometrina. Tanto a ocitocina como os derivados do ergot diminuem a perda sangüínea pós- parto, mas o efeito do ergot parece ser um pouco menor. Não está bem clara a ação dessas drogas sobre a retenção dos restos placentários, embora alguns resultados sugiram que a administração rotineira de ocitocina possa aumentar esse risco. Náuseas, vômitos e cefaléia são relacionados mais freqüentemente aos derivados do ergot e, em menor escala, à ocitocina. A ocorrência de hipertensão arterial pós-parto é um efeito colateral praticamente exclusivo dos derivados do ergot. Também podem ocorrer problemas raros, porém sérios, atribuídos secundariamente à hipertensão arterial pelo uso de ergometrina intra-parto - parada cardíaca e hemorragia intra-craniana, infarto do miocárdio, eclâmpsia puerperal e edema agudo de pulmão. Apesar da dificuldade em avaliar tais efeitos, pela raridade com que ocorrem, os indícios disponíveis sugerem que a ocitocina é a melhor escolha, além de ser mais estável que a ergotamina em países de clima tropical. Por isso, o uso dos derivados do ergot para esta situação é classificado como intervenção prejudicial ou ineficaz que deve ser abandonada. 2 – Tração controlada do cordão A tração controlada do cordão envolve a tração do cordão, combinada com contrapressão sobre o corpo uterino na direção cefálica, feita pela mão oposta colocada logo acima da sínfise púbica. Estudos comparativos entre tração controlada e abordagens mais expectantes, às vezes envolvendo pressão fúndica, demonstraram menor perda sangüínea média e encurtamento do terceiro estágio na tração controlada. Entretanto, deve-se atentar para o risco de inversão uterina facilitada por essa manobra. Apesar de rara, é ocorrência bastante grave, relacionada à inexperiência e negligência do parteiro em praticar tal estratégia. Segundo a OMS (1996), é classificada como "prática em relação á qual não existem evidências suficientes para apoiar uma recomendação clara e que devem ser utilizadas com cautela até que mais pesquisas esclareçam a questão (categoria C)". 3 – Comparação entre manejo ativo e expectante Os efeitos combinados do uso de ocitócicos e tração controlada do cordão são condensados, algumas vezes, no termo "manejo ativo do terceiro estágio", em contraste com o manejo expectante ou fisiológico. Entretanto, esse termo também pode indicar combinações de diferentes intervenções com diferentes resultados. Daí a dificuldade de se avaliar os vários resultados e definir a melhor estratégia entre manejo ativo e conduta conservadora na dequitação placentária. 9 ASSISTÊNCIA À MULHER NO PARTO NORMAL 86 Na literatura em geral, o manejo ativo tem melhores resultados quando se avaliam intensidade de hemorragia pós-parto e níveis de hemoglobina no puerpério. Mas, são mais comuns vômitos, náuseas e hipertensão, provavelmente causados pelo uso de ergotamina. Existem fundamentos para sérias dúvidas sobre o uso profilático de ergometrina ou de uma combinação de ocitocina e ergometrina (sintometrina) como procedimentos de rotina na assistência à dequitação. Como conclusão, a administração de ocitocina na assistência à dequitação e a tração controlada do cordão podem apresentar vantagens em indicações precisas - mulheres com risco para hemorragia pós-parto e aquelas portadoras de anemia . severa. A despeito das orientações anteriores da OMS (1990 e 1994), a recomendação do manejo ativo do terceiro período , como prática de rotina no parto de baixo risco, parece ser prematura e depende de estudos mais específicos (OMS, 1996). 4 – Revisão da placenta, dos anexos e do canal de parto O exame da placenta, cordão umbilical e membranas, imediatamente após a expulsão, é prática indispensável, principalmente para verificar a integridade, certificando-se de que não foram deixados restos placentários ou de membrana na cavidade uterina. Se a integridade da placenta e membranas for duvidosa, a revisão com exploração da cavidade uterina deve ser iniciada. O exame da placenta e anexos presta-se, também, para o diagnóstico de eventuais anormalidades: infartos, hematomas, inserção anormal de cordão e artéria umbilical única, relacionada a malformações fetais. Em alguns países é prática de rotina a exploração da cavidade uterina no pós-parto imediato. Não existe o menor indício de que essa conduta seja útil, ao contrário, pode causar infecção, traumatismos e até mesmo choque. Recomenda-se, entretanto, a revisão do canal de parto para o diagnóstico de possíveis lacerações de trajeto. CONSIDERAÇÕES FINAIS Em que pese a experiência de muitos obstetras e outros profissionais, o que Ihes permite defender suas condutas e práticas na assistência ao parto, e imputarem a elas um caráter de "verdade absoluta", a Obstetrícia atual vem procurando cada vez mais ditar suas normas com base em evidências científicas. Infelizmente, os resultados de estudos controlados e aleatorizados ainda não conseguiram responder todas as questões relacionadas à prática da assistência ao parto. À exceção de algumas delas, destacadas no Capítulo 21, muitas outras continuam sem definição quanto ao risco-benefício para a mãe e o concepto. Daí a dificuldade em se padronizar a assistência neste momento tão importante da vida da mulher. Entretanto, é certo afirmar que os benefícios e, em decorrência, os melhores resultados maternos e perinatais relacionam-se diretamente à assistência humanizada, respeitando os direitos da parturiente, resgatando o seu papel como protagonista e incentivando o parto natural. 9 ASSISTÊNCIA À MULHER NO PARTO POR CESÁREA 89 do cirurgião. É fundamental, entretanto, que o diagnóstico da intercorrência seja feito imediatamente e, da mesma forma, seu reparo, recorrendo-se a especialistas se assim for necessário. 6. Histerotomia De todas as variantes propostas para a abertura da cavidade uterina (segmentar longitudinal, segmento-corporal, corporal e segmentar transversa), a segmentar transversa, arciforme, de concavidade superior é a de escolha. Existem justificativas para esta preferência. Em primeiro lugar, respeita-se a disposição transversal e paralela das fibras miometrais e da vasculatura. O risco de lesões das artérias uterinas – principal incoveniente da histerotomia segmentar transversa – pode ser minimizado por seu caráter arciforme de concavidade superior. Além disso, por não romper fibras e sim divulsioná-las, garante-se melhor aproximação dos bordos da incisão uterina e, conseqüentemente, maior facilidade para a sutura e melhor cicatrização. A abertura da cavidade uterina é feita praticando-se pequena incisão a bisturi, que se completa delicadamente com pinça tipo Kelly ou Pean, até atingir-se a cavidade uterina. A seguir, com os dedos indicadores introduzidos nesta pequena botoeira, completa-se a abertura lateralmente. A incisão da zona segmentar com tesoura deve ser restrita a casos com a presença de tecido fibrótico espesso sobre cicatriz anterior e a cesáreas antes do estabelecimento do trabalho de parto, quando o segmento inferior do útero ainda não está completamente adelgaçado. Excepcionalmente, nos casos de segmento inferior ainda não formado ou mal desenvolvido, pode ser necessária a utilização da incisão segmento-corporal. Tal decisão, entretanto, exige experiência do obstetra e uma avaliação feita com o ventre aberto. 7. Escoamento do líquido amniótico Deve-se proceder à aspiração cuidadosa do Iíquido amniótico presente, ou permitir o seu escoamento protegido por compressas cirúrgicas, evitando o encharcamento dos campos protetores e facilitando a retirada do feto, por diminuir sua mobilidade. 8. Retirada do feto Tempo cirúrgico muito importante na cesárea, exigindo tranqüilidade do cirurgião, com objetivo de evitar desprendimentos fetais bruscos, com possíveis conseqüências perinatais. Neste momento é fundamental lembrar que uma criança está nascendo: a sala cirúrgica deve estar aquecida (com ar condicionado desligado) e o ambiente silencioso. O obstetra deve anunciar para a mulher o nascimento e o neonatologista deverá levar o recém-nascido para a mãe, assim que for possível. A retirada do feto pode ser feita manualmente ou com a utilização de instrumentos como fórcipes e alavancas. Nas apresentações 10 ASSISTÊNCIA À MULHER NO PARTO POR CESÁREA 90 cefálicas mais profundamente ajustadas, a extração manual é de escolha: introduz-se a mão entre a apresentação e a parede uterina anterior, com delicadeza para evitar o prolongamento da histerotomia, atinge-se o occipício, elevando-o em direção à fenda uterina. Por manobra de deflexão do pólo cefálico e pela compressão auxiliar exercida no fundo uterino, consegue-se, geralmente de modo fácil, o desprendimento do feto. No entanto, em apresentações cefálicas altas e móveis, como freqüentes em prematuros e gestações com polidrâmnio, a utilização de instrumentos como a alavanca de Selheim, facilita sobremodo a retirada do feto. Mesmo assim, por vezes, a extração torna-se difícil como, por exemplo, nas cefálicas defletidas, a demandar conduta mais ativa como a aplicação de fórcipe, cuja técnica obedece aos mesmos tempos que para partos vaginais. Ambos procedimentos impõem necessariamente a habilidade no seu manejo. Nas apresentações pélvicas, igualmente, a retirada do feto obedece rigorosamente aos mesmos tempos e técnicas propostos para o parto vaginal. O obstetra deve estar atento para o cordão umbilical do feto, praticando a chamada "alça de cordão" antes do desprendimento da cintura escapular e verificar a existência de circulares cervicais. O auxiliar desempenha papel importante, conduzindo o pólo cefálico externamente, conservando-o devidamente fletido, até que entre em contato com a abertura uterina. O obstetra não deve tracionar o feto, pois há sempre o risco de deflexão do pólo cefálico, o que dificulta, em muito, a extração fetal. Nas situações transversas, o obstetra deve ter experiência suficiente para executar manobras de versão interna e extração podálica. 9. Clampeamento do cordão e cuidados imediatos com o RN A ligadura do cordão umbilical (clampeamento) pode ser realizada de imediato ou momentos após a extração fetal, exatamente da mesma maneira que no parto atendido por via vaginal, conforme trata o Capítulo 9 deste manual. Essa questão já exigiu estudos controlados sobre os efeitos do momento da ligadura do cordão na mãe e no recém- nascido. Não se verificaram indícios de efeitos significativos sobre a incidência de hemorragia pós-parto ou sobre a transfusão feto-materna. Entretanto, sobre o recém-nascido, várias observações foram relatadas: a) os bebês com clampeamento imediato de cordão têm valores mais baixos de hematócrito e hemoglobina; b) se depois do nascimento, o recém-nascido for colocado à altura da vulva ou abaixo por três minutos, antes do clampeamento do cordão, há transferência de aproximadamente 80 ml de sangue da placenta para o recém-nascido. Os eritrócitos nesse volume de sangue logo serão hemolisados, mas isso fornece cerca de 50 mg de ferro para as reservas do neonato e reduz a freqüência de anemia ferropriva no primeiro ano de vida. Teoricamente, pode causar hipervolemia, policitemia e hiperviscosidade, além de hiperbilirrubinemia. Entretanto, 10 ASSISTÊNCIA À MULHER NO PARTO POR CESÁREA 91 não foram observadas diferenças clinicamente relevantes e nenhuma diferença em relação à morbidade neonatal, quando se compararam os dois momentos de clampeamento do cordão; e c) no que se refere a distúrbios respiratórios neonatais, não houve diferença significativa entre as duas condutas. O clampeamento tardio (ou ausência de clampeamento) é o modo fisiológico de tratar o cordão, e o precoce é intervenção que deve ter indicações precisas. A "transfusão" de sangue da placenta para recém- nascido, nos casos de clampeamento tardio de cordão, é fisiológica e provavelmente não tem efeitos adversos, pelo menos em casos de baixo risco. As indicações de clampeamento precoce de cordão relacionam-se a gestações e partos de risco, como por exemplo, a sensibilização Rh, o parto prematuro, o sofrimento fetal com depressão neonatal grave, parto gemelar e o da mulher HIV+. Nesses casos, o clampeamento tardio pode causar complicações e deve ser evitado. 10. Dequitação Após a retirada fetal, enquanto a equipe cirúrgica individualiza os bordos da histerotomia, a dequitação, na maioria das vezes, ocorre de forma espontânea. Este tempo pode ser diminuído, utilizando-se ocitócicos. Pela vigorosa contração uterina que se obtém, a placenta é expulsa sem grandes dificuldades. Para uma discussão mais detalhada sobre o assunto, ver Capítulo 9. Os estudos controlados que comparam a dequitação espontânea com a remoção manual da placenta têm mostrado que esta última é mais danosa, associando-se ao incremento da perda sanguínea materna e do risco de infecção, estatisticamente significativo. Assim, a retirada manual da placenta deve ficar restrita aos casos em que, espontaneamente, não se deu a dequitação, em período razoável de tempo para o procedimento cirúrgico. 11. Revisão da placenta e da cavidade uterina É tempo obrigatório para a identificação de fragmentos placentários retidos ou de lesões das paredes uterinas, principalmente quando do uso de instrumentação para a retirada do feto. Recomenda-se a curagem da cavidade uterina com compressa para este procedimento. Constitui passo técnico de grande relevância, para a identificação de anomalias (infartos, tromboses, tumores, etc.) e integridade da massa placentária e das membranas, e de anomalias do cordão (nós verdadeiros, e falsos, número de vasos, etc.). 12. Histerorrafia Embora a sutura contínua ancorada seja prática freqüente no Brasil, o fechamento da cavidade uterina com pontos separados, em camada única, é o que fornece melhores resultados quando à cicatrização. Nos casos especiais de incisão segmento-corporal, 10 ASSISTÊNCIA À MULHER NO PARTO POR CESÁREA 94 2. Medicação pós-operatória Hoje é costume disseminado entre os médicos o use de anti-inflamatórios indicados como analgésicos. Tal medida não se justifica à luz da fisiologia, pois a inflamação é processo natural de defesa do organismo e os anti-inflamatórios podem apresentar alguns efeitos colaterais graves como a Insuficiência Renal Aguda. Por isso, analgésicos comuns devem ser de escolha, apenas quando necessários. 3. Sondagem vesical contínua Aconselha-se a drenagem vesical em sistema fechado, por período de aproximadamente seis horas, dadas as óbvias dificuldades de deambulacao e à distensão vesical por demora no restabelecimento da micção espontânea. Não se justifica a continuidade da sondagem após este período de tempo, a menos que, por qualquer motivo, a mulher deva permanecer em repouso no leito por tempo também mais prolongado, ou na eventualidade de que alguma complicação tenha ocorrido. 4. Alimentação Em condições de normalidade do ato cirúrgico, pode ser permitida a alimentação da puérpera em tempo precoce, utilizando-se inicialmente dietas preferentemente líquidas. Decorrido período de aproximadamente 8 a 12 horas, libera-se a dieta. 5. Deambulação O levantar e caminhar precoces são recomendados. A restrição ao leito, além de desconfortável, favorece o aparecimento de fenômenos tromboembólicos. 6. Amamentação precoce A amamentação deve ser estimulada e iniciada o mais precocemente possível. Oferece inúmeras vantagens, entre as quais, o estabelecimento da integração psíquica mãe-filho (ver Capítulo 16). 7. Alta hospitalar A cesárea é procedimento cirúrgico invasivo da cavidade abdominal, sujeita a complicações intra-operatórias que obrigam à atenção pós- operatória. Assim, recomenda-se esperar pelo menos o restabelecimento parcial da função intestinal após a cesárea, e dar alta hospitalar ao final de 48 horas. 8. Retirada de pontos O fechamento da pele com fio tipo nylon implica em retirada dos pontos entre o sétimo e déimo dia pó-operatóro. 10 ASSISTÊNCIA À MULHER NO PARTO POR CESÁREA 95 CONSIDERAÇÕES FINAIS A cesárea é uma laparotomia que, quando bem indicada, tem seu papel na diminuição da morbidade e mortalidade materna e perinatal. Quando se indica uma cesárea, ela deve ser realizada com a técnica adequada, levando em consideração as mais recentes evidências científicas, para minimizar a possibilidade de complicações inerentes ao procedimento. No entanto, como foi discutido no Capitulo 4, a realização de cesáreas desnecessárias é potencialmente danosa, considerando que os riscos de morbidade e mortalidade materna e perinatal são maiores neste procedimento do que no parto vaginal. 10 96 O fórcipe, utilizado na prática obstétrica desde a Antigüidade, continua tendo lugar de destaque na obstetrícia moderna. Quando bem utilizado é instrumento valioso, colaborando de forma efetiva e importante na realização do parto vaginal. Infelizmente, o estigma negativo que lhe foi imputado pelas antigas práticas obstétricas persiste entre os leigos e entre aqueles que não foram adequadamente treinados para seu uso. Hoje, encontram-se afastadas da prática obstétrica as aplicações de fórcipe em cabeças altas ou encravadas no estreito médio do canal do parto (contra-indicação absoluta). O fórcipe baixo, no entanto, é mais requerido atualmente que há 40 anos, diante da comprovada eficácia em evitar a hipóxia fetal, abreviando o período expulsivo e minimizando os riscos de seqüelas neurológicas. Em estudo de metanálise, comparando o fórcipe ao vácuo-extrator, evidenciou-se que este está associado a menor morbidade materna, reduzindo traumas, dor perineal, o uso de anestesia geral e regional e os índices de cesárea. O fórcipe, entretanto, esteve menos associado a cefalohematomas e hemorragias retinianas nos neonatos. Vale destacar, no entanto, que os recémnascidos não apresentaram danos sérios com nenhum dos instrumentos. Neste capítulo serão abordadas as principais funções e características dos fórcipes, os modelos costumeiramente utilizados, as indicações de seu uso e as condições ideais de aplicabilidade do instrumento. As técnicas de aplicação serão encontradas em livros textos adequados. O aprendizado prático deverá ser efetuado em instituições de saúde preparadas para seu ensino, com instrutores devidamente treinados e experientes. Apesar da recente divulgação do vácuo- extrator no Brasil, este instrumento não será abordado. Em termos práticos, sua utilização é muito restrita no território nacional, havendo um número muito pequeno de profissionais treinados. 11 ASSISTÊNCIA À MULHER NO PARTO FÓRCIPE
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