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Semiotécnica do sistema digestório, Notas de estudo de Medicina

Material de estudo da semiologia do sistema digestório

Tipologia: Notas de estudo

Antes de 2010
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rafael-moura-18
rafael-moura-18 🇧🇷

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Baixe Semiotécnica do sistema digestório e outras Notas de estudo em PDF para Medicina, somente na Docsity! PRINCÍPIOS DE SEMIOTÉCNICA E DE INTERPRETAÇÃO DO EXAME CLÍNICO DO ABDÔMEN PRINCIPLES OF SEMIOTECHNIC AND INTERPRETATION OF THE ABDOMEN CLINICAL EXAMINATION Ulysses G. Meneghelli & Ana L. C. Martinelli Docentes. Divisão de Gastroenterologia. Departamento de Clínica Médica. Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto - USP. CORRESPONDÊNCIA: Ulysses G. Meneghelli. Divisão de Gastroenterologia. Departamento de Clínica Médica.Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto -USP. Campus Universitário de Monte Alegre. CEP 14049-900 Ribeirão Preto - SP. Fax (16) 633.6695 e.mail: ugmenegh@fmrp.usp.br MENEGHELLI UG & MARTINELLI ALC. Princípios de semiotécnica e de interpretação do exame clínico do abdômen. Medicina, Ribeirão Preto, 37: 267-285, jul./dez 2004. RESUMO: O propósito desta publicação é o de levar aos alunos de Graduação em Medicina alguns conhecimentos básicos sobre como fazer e como interpretar o exame clínico do abdô- men. Para alcançar o objetivo, procurou-se desenvolver os vinte e oito objetivos enunciados pela coordenadoria do Curso de Semiologia Médica do Departamento de Clínica Médica da Faculda- de de Medicina de Ribeirão Preto (USP) e que são exigidos dos respectivos alunos, juntamente com a avaliação do desempenho prático. O conteúdo abrange, de forma sumária, os principais tópicos da inspeção, ausculta, palpação e percussão do abdômen. UNITERMOS: Exame Clínico. Semiologia. Inspeção. Auscultação. Palpação. Percussão. Abdomen. 267 Medicina, Ribeirão Preto, Simpósio SEMIOLOGIA 37: 267-285, jul./dez 2004 Capítulo IX A descrição que será feita limita-se a trazer ele- mentos para a execução e compreensão dos vinte e oito itens constantes do Roteiro de Objetivos do exa- me do abdômen do Curso de Semiologia Geral (RCG 314), ministrado pelo Departamento de Clínica Médi- ca da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (USP), no ano de 2003, aos alunos do terceiro ano médico. Considerando que o curso é muito condensado, dis- pondo os alunos de restrito tempo para o estudo nos compêndios, procurou-se direcionar o aprendizado da semiologia do abdômen para um conjunto de vinte e oito objetivos bem definidos, que representariam o mí- nimo necessário para o futuro médico iniciar seu trei- namento na ciência e na arte do exame físico desse segmento do corpo humano. Evidentemente, é, ape- nas, uma base teórica para o indispensável ensino prá- tico, intensivo, ministrado por docente experimentado, e para pequenos grupos de alunos (máximo de sete). No final, indicam-se algumas obras que serviram de referência para esta apresentação e que podem servir como fonte de informações complementares ao leitor. Na semiologia do abdômen, são empregados os tradicionais métodos de inspeção, ausculta, palpação e percussão, de preferência na ordem indicada. OBJETIVOS 1– Delimitar, a partir dos referenciais adequados, as regiões topográficas da face anterior do abdômen (epigástrio, mesogástrio, hipogás- trio, hipocôndrios, flancos, fossas ilíacas e qua- drantes superiores e inferiores) A divisão topográfica do abdômen é necessária para o médico fazer referência acerca da localização e irradiação de dores ou de outros sintomas abdomi- 268 Meneghelli UG & Martinelli ALC nais na descrição da anamnese, bem como para indi- car o local dos achados do exame físico do abdômen. Há duas formas clássicas de divisão do abdômen; uma que o divide em nove áreas e outra que o divide em quatro áreas. O clínico pode aplicar a que lhe parecer mais fiel e clara para descrever o sintoma ou o acha- do do exame físico. Para a delimitação das nove áreas tradicionais (epigástrio, mesogástrio, hipogástrio, hipocôndrios, flancos, fossas ilíacas), usualmente, são utilizadas três linhas horizontais, duas oblíquas e duas arqueadas, como pode ser observado na Figura 1. Os elementos anatômicos a serem considera- dos para a divisão topográfica do abdômen são: a base do apêndice xifóide, as bordas do gradeado costal (ân- gulo de Sharpy), as extremidades das décimas coste- las, as espinhas ilíacas ântero-superiores, os ramos horizontais do púbis e as arcadas inguinais. A linha horizontal superior tangencia a base do apêndice xifóide, a média une as extremidades das décimas costelas (aproximadamente, no ponto em que as linhas hemiclaviculares, direita e esquerda, cruzam- se com as rebordas costais) e a inferior liga as espi- nhas ilíacas, ântero-superiores. As linhas oblíquas são quase verticais e vão da extremidade da décima costela até a extremidade do ramo horizontal do púbis, respectivamente à direita e à esquerda. As linhas arqueadas acompanham os rebordos costais direito e esquerdo. O nome das nove regiões topográficas do ab- dômen, delimitadas segundo as linhas acima descri- tas, são: epigástrio, mesogástrio, hipogástrio, hipocôn- drios (direito e esquerdo), flancos (direito e esquerdo) e fossas ilíacas (direita e esquerda), conforme indica- do na Figura 1. Considerando o esquema citado, quando um determinado fenômeno interessa as áreas 1,2 e 3 pode ser referido como localizado no andar superior do ab- dômen; igualmente, as áreas 4,5 e 6 compõem o an- dar médio e as áreas 7,8 e 9 o andar inferior do abdô- men. A segunda maneira de dividir topograficamen- te o abdômen, que pode facilitar a referência a dados da anamnese ou do exame físico, é a divisão em qua- drantes, tomando-se, como referência, uma linha ho- rizontal e outra vertical, que se cruzam exatamente na cicatriz umbilical. Dessa forma, o abdômen é divi- dido em quadrantes superiores, direito e esquerdo, e quadrantes inferiores, direito e esquerdo. 2- Descrever a forma do abdômen, reconhe- cendo as de apresentação clínica mais fre- qüentes: plano, escavado, globoso, batráquio, avental O abdômen pode apresentar variações de for- ma, segundo idade, sexo e estado de nutrição, do esta- do dos músculos da parede abdominal, além da condi- ção fisiológica da gravidez. As alterações da forma do abdômen podem, entretanto, adquirir significado diag- nóstico. Dependem de alterações que ocorrem tanto no conteúdo da cavidade abdominal, como de altera- ções da parede abdominal, particularmente na muscu- latura e no subcutâneo. Podem ser de dois tipos: simé- tricas e assimétricas. As enunciadas neste item são do tipo de alterações simétricas. O abdômen plano pode ser considerado como uma forma normal, muito embora o termo plano não Figura 1 – Divisão topográfica do abdômen [Porto, 1992 1] . Os pontos de referência estão mencionados no texto. As áreas definidas são as seguintes: 1 - hipocôndrio direito; 2 – epigástrio; 3 – hipocôndrio esquerdo; 4 – flanco direito; 5 – mesogástrio ou umbilical; 6 – flanco esquerdo; 7 – fossa ilíaca direita; 8 – hipogástrio ou suprapúbica; 9 – flanco esquerdo. 271 Semiotécnica e interpretação do exame clínico do abdômen. sinusoidal depende de obstáculo dos próprios sinusói- des, portanto, na intimidade do parênquima hepático (exemplo, cirrose hepática); a pós-sinusoidal pode ser devida a obstáculo nas veias centrolobulares (exem- plo, doença venoclusiva) ou nas veias supra-hepáticas (exemplo, síndrome de Budd-Chiari). À exceção da hipertensão pré-sinusoidal, pré-hepática, quando o re- gime de hipertensão não afeta o ramo esquerdo da veia porta, nas demais, a hipertensão reinante força a vazão pelas veias paraumbilicais, que levam o sangue portal para a região umbilical, periférica. Nas hiper- tensões portais, pós-sinusoidais, a elevação da pres- são no ramo esquerdo da veia porta não é muito ex- pressivo, razão pela qual a circulação colateral pode ser pequena. Na periferia, o sangue portal chega à região umbilical e adjacências, onde existe a conexão entre os dois sistemas cava, acima descritos. Em conse- qüência, o sangue venoso, proveniente do ramo es- querdo da veia porta, toma um ou outro caminho, na dependência do local em que aflorou. Assim, a circulação colateral, visível acima da cicatriz umbilical, drena em direção ascendente para o sistema cava superior, enquanto que a que está abaixo do mesmo ponto drena para baixo, em direção à cava inferior. Em outras palavras, a circulação colateral, visível, do tipo porta caracteriza-se por manter o sen- tido normal da circulação venosa, periférica, do abdô- men, sempre em direção centrífuga em relação ao umbigo (Figura 2); apenas o caudal está aumentado. Em geral, as veias dilatadas costumam ser melhor per- cebidas em território acima da cicatriz umbilical. Quan- do as veias tortuosas e engrossadas, tornam-se exu- berantes em torno do umbigo, caracteriza-se o que é conhecido como cabeça de medusa (caput medusae), muito raramente observada. - Circulação colateral, tipo cava inferior – as ectasias venosas são observadas mais nitidamente no andar inferior do abdômen e nas suas regiões laterais. O sentido da corrente será sempre ascendente, uma vez que a circulação está toda direcionada para a cava superior (Figura 2). A principal causa de obs- trução da veia cava inferior é a trombose. - Circulação colateral, tipo cava superior – eventuais vasos ectasiados, vistos na parte superior do abdô- men, têm sentido de corrente para baixo, na procu- ra de conexão com a cava inferior. - Circulação colateral, tipo misto – costuma ser uma associação entre os dois primeiros descritos e ca- racteriza-se por ampla rede venosa, colateral, com sentido de circulação para cima. Outros achados do exame físico, dados de anamnese e também subsi- diários completarão o diagnóstico. 6– Posicionar adequadamente o paciente para a palpação do abdômen, evitando as posturas inconvenientes ou prejudiciais ao exame Principalmente para a palpação do abdômen, mas, também, para os demais métodos semiológicos, o paciente deve ser posicionado em decúbito dorsal, em mesa de exame provida de colchonete ou na cama comum de enfermaria, com os membros superiores e inferiores estendidos. Um pequeno travesseiro deve suportar a cabeça e os ombros, e um outro pode ser colocado sob os membros inferiores, para manter os joelhos levemente fletidos. O objetivo é colocar o pa- ciente em posição favorável a que se obtenha o máxi- mo de relaxamento muscular da parede anterior do abdômen; a posição não deve restringir a liberdade de atuação do examinador. Posturas inconvenientes são: pernas cruzadas, pescoço excessivamente fletido, bra- ços elevados com as mãos sob a nuca, tronco fletido, ausência de suporte para a cabeça e ombros. Toda a extensão do abdômen deve ser exposta, desde os hipocôndrios até as fossas ilíacas, a fim de não se perder qualquer sinal que possa ser importante para o diagnóstico. Evidentemente, o local de exame deverá ser silencioso, calmo, bem iluminado, de preferência com luz natural, e ter temperatura adequada, evitando-se o frio que tensiona a parede abdominal. ÿþýüûúùø÷öõüöúùôóýùúõòûñóýðþüþùú ôþñöõñöýôù ôþñöõüùùõþðóýþöý Figura 2 – Esquema ilustrativo da disposição aproximada e do sentido da corrente sangüínea das circulações colaterais, superficiais, do tipo portal e do tipo cava inferior, no abdômen. 272 Meneghelli UG & Martinelli ALC 7– Efetuar a palpação superficial do abdômen, ve- rificando as condições da parede abdominal no que se refere à espessura, continuidade, toni- cidade e deformações por alterações mais pro- fundas (visceromegalias, tumorações, etc.) A melhor posição que o médico deveria assu- mir para efetuar a palpação do abdômen, tanto a su- perficial como a profunda, seria sentar-se na cama ou mesa de exame, à direita (para os destros), na altura da parte inferior da coxa do paciente. Essa atitude daria confiança ao paciente, permitiria melhor visuali- zação de sua mímica durante o exame e colocaria as mãos do examinador em posição bem adequada. Atual- mente, tem sido recomendado que o médico não se sente na cama do paciente, tendo em vista a luta con- tra a infecção hospitalar. Assim, hoje, a palpação deve ser realizada pelo examinador em pé, ao lado do doente deitado. As mãos não devem estar frias a pon- to de provocar reações desagradáveis ao paciente, ao exame; se estiverem frias, recomenda-se friccioná- las uma contra a outra, para aquecê-las. O paciente deve ser prevenido de que não se lhe causará descon- forto maior e que deve se manifestar caso sinta dor ou qualquer sensação desagradável. A palpação superficial, inicial deve ser feita com as duas mãos relaxadas, tocando-se suavemente, o abdômen do paciente. O examinador deve palpar, com delicadeza, toda a extensão do abdômen, comparan- do, simultaneamente, áreas direitas e esquerdas, res- pectivamente com suas mãos esquerda e direita. A palpação comparativa pode detectar pequenas, mas importantes diferenças, notadamente na tonicidade da musculatura e na sensibilidade, entre áreas direita e esquerda do abdômen, não perceptíveis de outra ma- neira. Toda a face palmar das mãos deve tocar o ab- dômen do paciente. A tonicidade da musculatura e a sensibilidade à pressão (leve) serão avaliadas durante movimento de flexão dos quatro dedos externos (ex- clui-se o polegar) que comprimem levemente a pare- de. A força de flexão dos dedos deve ser bem gradu- ada, executando-se dois ou três movimentos em cres- cendo, em cada área, sem excessos, pois, não se sabe, de início, qual a sensibilidade que se vai encontrar. O tatear palpatório também orienta o médico sobre a presença de anormalidades estruturais da parede (exemplo, orifícios herniários) ou de alterações na cavidade abdominal ou pélvica (exemplos, hepato e esplenomegalias, tumores, ascite, cistos, útero grávido). O detalhamento palpatório, superficial, de uma anor- malidade será feito com uma das mãos. A palpação superficial serve para fixar a aten- ção do médico no que possa existir de anormal no abdômen, orientando o prosseguimento do exame, para ganhar a confiança do paciente e para executar a pal- pação profunda. 8– Discutir os mecanismos responsáveis por hi- pertonia, localizada ou generalizada, da pare- de abdominal A hipertonia da parede abdominal, revelada pela resistência oposta à palpação, decorre de contração forte da musculatura e pode ser de origem voluntária ou involuntária. A hipertonia voluntária, ou falta de relaxamen- to da musculatura abdominal, é decorrente de posicio- namento inadequado do paciente, do frio que ele pode estar sentindo, por sentir cócegas, por tensão emocio- nal ou pelas frias mãos do examinador. Já foram men- cionados os meios para que tais inconveniências se- jam evitadas. A contração espasmódica, involuntária resulta da irritação do peritônio parietal, subjacente, causada por agente infeccioso (exemplo, apendicite aguda), químico (exemplo, ácido clorídrico, gástrico, na perfu- ração de úlcera péptica, em peritônio livre) ou neoplá- sico (exemplo, metástases peritoneais). Geralmente, esse tipo de hipertonia é localizado, enquanto a volun- tária é generalizada. A dor é provocada, quando o pa- ciente tenta levantar o tronco, sem utilizar-se dos bra- ços, porém, a hipertonia não é necessariamente dolo- rosa. A hipertonia ocorre em correspondência com a área irritada, de peritônio parietal (exemplo, no pro- cesso inflamatório agudo, que atinge o apêndice e o peritônio parietal, adjacente, a hipertonia se revela na fossa ilíaca, direita). No início do processo irritativo do peritônio, o grau de hipertonia é pequeno, só detec- tável por acurado exame, mas evolui, acompanhando a intensidade e a extensão da irritação, culminando no grau extremo de rigidez generalizada, conhecida como “abdômen em tábua”. A palpação superficial, bimanual, acima menci- onada é importante método semiológico para detectar as hipertonias localizadas. A hipertonia involuntária, generalizada é indicativa, igualmente, de irritação pe- ritoneal, generalizada. Com os dados obtidos na anamnese e outros achados do exame físico, além de diferenciar a hiper- tonia voluntária da involuntária, o médico pode elabo- rar a hipótese diagnóstica, mais provável. 273 Semiotécnica e interpretação do exame clínico do abdômen. 9– Efetuar a palpação profunda e deslizante do abdômen, identificando os segmentos do tubo digestivo, examináveis por essa técnica A palpação profunda e deslizante visa palpar alguns órgãos contidos na cavidade abdominal e even- tuais “massas” ali existentes. Nenhum dos segmentos do intestino delgado é individualizado por meio desse método. Eventualmente, consegue-se palpar a grande curvatura do estômago e os cólons ascendente e des- cendente. O ceco, o transverso e o sigmóide são fa- cilmente palpáveis. O médico deve anotar as altera- ções que percebeu nas estruturas palpadas, incluindo variações na sensibilidade, consistência, diâmetro, for- ma e mobilidade. A posição do paciente e a do médico, para exe- cutar a palpação profunda e deslizante, são as mes- mas anteriormente descritas. Como já foi mencio- nado, o médico deve fazer a palpação, colocando-se em pé à direita ou à esquerda do paciente, de acor- do com o órgão a ser examinado, embora, tecnica- mente, a melhor posição é a sentada à beira do leito ou da mesa ocupada pelo paciente, bem junto a este. Costuma-se iniciar o exame à direita do paciente e terminar com a palpação do descendente e sigmóide, à esquerda. Conforme o órgão a explorar, a palpação pode ser uni ou bimanual. Quanto à posição das mãos há uma regra geral: as mãos que palpam devem ser colo- cadas de modo tal que seu maior eixo seja perpendi- cular ao eixo longitudinal da porção do intestino que se queira explorar. A mão, levemente fletida, deve fa- zer um ângulo, mais ou menos agudo, com a parede anterior do abdômen, o grau de obliqüidade orientado pelo médico em cada caso, isoladamente. Por vezes, devido ao excessivo volume do abdômen, é necessá- rio que se aplique a mão quase que perpendicular- mente. Como regra geral, o ângulo formado fica por volta de 45 graus. Quando a palpação é bimanual, as mãos de- vem ser dispostas de tal forma que se forme, entre elas, um ângulo agudo com a abertura voltada para o examinador. A palpação será feita pelas extremida- des dos dedos, predominantemente com a face palmar da terceira falange. Pode-se usar quatro, três ou dois dedos de cada mão, desde que a linha que suas extre- midades formem seja retilínea, quando se justapõem numa superfície plana. A palpação feita com a mão nessa posição já foi denominada de “oblíqua, com a fila dos últimos dedos”, na qual, a fila dos últimos de- dos dispõe-se ao longo do comprimento, ao passo que as mãos se colocam oblíquamente à direção da víscera a ser examinada. Em geral, usam-se o terceiro e o quarto dedo de cada mão para compor a linha reta que vai deslizar sobre o órgão a examinar. O método de palpação profunda e deslizante é realizado em dois tempos. 1) Posicionamento das mãos no abdômen até um plano profundo resistente Um princípio básico deve nortear todo o pro- cesso do método: palpação profunda não quer dizer que seja realizada com força. A posição da mão e dos dedos, acima descrita, não deve ser fixa, rígida. Todo o processo de palpação exige a conservação dos mo- vimentos dos dedos, porque o movimento é parte inte- grante na percepção palpatória. A aquisição dessa habilidade costuma ser a que mais treinamento exige do aprendiz. A facilidade para o posicionamento das mãos, no plano profundo, dependerá do tono da musculatura da parede abdominal anterior, da espessura do panículo adiposo, da presença de dor, da pressão intra-abdomi- nal e do conteúdo das alças intestinais. A dificuldade maior costuma ser dada pela hipertonicidade dos mús- culos abdominais. O médico deve estar prevenido para usar mais técnica e menos força, para vencer as difi- culdades e alcançar o objetivo da palpação profunda e deslizante. Já foram mencionadas algumas condu- tas para reduzir a tonicidade dos músculos abdomi- nais, mas, um importante ponto a ser observado é abor- dado a seguir. A manobra de aprofundar as mãos até alcançar um ponto profundo, a partir do qual será feito o deslizamento, exige estrita observação dos movimen- tos respiratórios do paciente. Durante a inspiração, ocorre aumento da tensão da musculatura abdominal e elevação da pressão intra-abdominal, ambos desfa- voráveis à manobra pretendida. Ao contrário, na expiração, há diminuição de ambos, tornando essa fase da respiração a mais propícia para a penetração das mãos e, também, para o deslizamento que será feito em seguida. Existem pessoas que têm a tendência de tornar a expiração forçada, quando se chama sua atenção para seu ato respiratório, dificultando ou tornando im- possível a palpação. Por tal razão, é preferível, inicial- mente, procurar fazer a palpação sem pedir ao paci- ente que faça, desta ou daquela maneira, seu ato de respirar. Se julgar necessária respiração mais favorá- 276 Meneghelli UG & Martinelli ALC turbilhões sonoros do componente líquido, daí a deno- minação de ruídos hidroaéreos; de maneira geral, eles são tanto mais evidentes quanto maior for a quantida- de de líquidos em relação à de sólidos. Aparecem no indivíduo normal, mas, há ruídos que indicam processo patológico. Ocorrem, normalmente, com pouca fre- qüência no intestino delgado, mostrando-se mais fre- qüentes no intestino grosso e no estômago. Há quatro tipos de ruídos hidroaéreos de interesse semiológico. 1) Patinhação – assemelha-se ao que se obtém, quan- do são dadas palmadas em uma superfície com água. É obtido em órgãos de grande diâmetro, como o estômago e o ceco, com paredes flácidas e com conteúdo líquido, que faz nível no seu interior. Pes- quisa-se, comprimindo rapidamente a parede do abdômen com a face palmar de três dedos media- nos da mão. A parede do órgão é forçada a bater de encontro com a superfície líquida, produzindo um ruído do tipo clap, clap. É observado no caso de aumento do conteúdo líquido do estômago, quan- do o órgão se esvazia mal, como na obstrução de antro ou piloro. 2) Gargarejo – é o mais característico dos ruídos ab- dominais, percebidos quando é feita a palpação pro- funda e deslizante, particularmente no ceco. Além de ouvir-se o ruído, tem-se a percepção tátil da presença do conteúdo hidroaéreo da víscera. 3) Borborigmo – é dado pela grande predominância de gases em relação ao conteúdo líquido do órgão. É o “ronco da barriga”, que indivíduos normais fre- qüentemente apresentam, quando estão com fome; ouve-se à distância, quando o estômago vazio apre- senta uma forte onda de contração em direção ao piloro. Tal tipo de ruído pode ser considerado como uma variante do ruído hidroaéreo propriamente dito, descrito anteriormente. Em casos de obstrução in- completa do intestino, o ruído hiperativo pode ser audível até a um ou dois metros do paciente. 13– Discutir o significado clínico da ocorrência ou não de ruídos hidroaéreos A resposta a essa questão está no item 27. 14– Descrever as características normais, de per- cussão do abdômen nas suas diferentes re- giões A percussão costuma ser a último das quatro etapas de exame clínico do abdômen, após a inspe- ção, ausculta e palpação. A posição do paciente é a mesma das etapas anteriores do exame. O médico faz a percussão em pé, à direita ou à esquerda do paciente. Quatro tipos de sons podem ser obtidos pela percussão do abdômen: timpânico, hipertimpânico, submaciço e maciço. O timpanismo, dado pela presença de conteúdo gasoso no interior do tubo digestivo, é o som que é apresentado pelo abdômen normal em, praticamente, toda sua extensão. Na posição supina, o som é mais nítido em área de projeção do estômago, na superfície da parede abdominal. A razão é o conteúdo gasoso, costumeiramente, conhecido como “bolha gástrica”, reconhecido facilmente em radiografia simples do ab- dômen, com o paciente em pé. A área do nítido timpa- nismo é conhecida como espaço de Traube, de impre- cisa delimitação. O som timpânico, de uma determi- nada área do abdômen pode ser substituído por sub- macicez ou macicez, se ela for ocupada por estrutura sólida ou líquida. Assim, o timpanismo que caracteriza o espaço de Traube pode ser substituído por macicez ou submacicez, se uma grande esplenomegalia, um tumor peritoneal ou retroperitoneal, um pseudocisto ou um tumor pancreático, ou uma grande hepatome- galia deslocar, suficientemente, o estômago. O acha- do de “espaço de Traube, livre” ou, muito raramente, “espaço de Traube, ocupado”, como comumente en- contra-se em observações clínicas, em nosso meio, é de paupérrimo significado clínico. A propósito, o pe- queno significado clínico do espaço de Traube con- trasta, enormemente, com a grande contribuição que o mesmo Ludwig Traube deu ao desenvolvimento da medicina experimental e à propedêutica clínica na Ale- manha do século XIX. O espaço de Traube também não deve ser confundido com a área normal de per- cussão do baço. O hipertimpanismo, um timpanismo de timbre mais sonoro, é observado, quando o conteúdo aéreo do tubo gastroentérico apresenta-se aumentado, como no meteorismo, na obstrução intestinal, no pneumo- peritônio, no volvo e no megacólon chagásico. Uma menor quantidade de gases ou a presen- ça de um órgão maciço nas proximidades pode produ- zir um som submaciço. A percussão sobre uma área sólida revela o som maciço. É o típico som que se obtém, quando da per- cussão do fígado no hipocôndrio direito. O desapare- cimento da macicez hepática pode ser devido à interposição de alça intestinal, meteorismo, tórax enfisematoso e ao pneumoperitônio. No abdômen agu- 277 Semiotécnica e interpretação do exame clínico do abdômen. do, o desaparecimento da macicez hepática é conhe- cido como sinal de Jobert e indica perfuração de víscera oca em peritônio livre, em geral, uma úlcera péptica. A percussão não é método recomendado para a iden- tificação do local onde está localizado o bordo hepáti- co, nas hepatomegalias, por ser imprecisa para tal fi- nalidade. A percussão é excelente recurso semiológico para o diagnóstico da ascite. 15– Descrever as alterações da percussão ab- dominal para o diagnóstico da ascite Ascite é o nome dado ao derrame de líquido livre na cavidade abdominal. Esse acúmulo pode ter muitas causas, as quais podem fazer variar o volume (pode ser superior a 20 l), a aparência, a natureza e a composição do líquido. O exame acerca das proprie- dades físicas, do teor de certos componentes, da celu- laridade, da presença de células neoplásicas e de bac- térias contaminantes do peritônio é de grande valor diagnóstico. O abdômen pode mostrar-se mais ou menos flácido ou, então, tenso, caracterizando a cha- mada ascite hipertensa. A presença de hérnia umbili- cal é achado freqüente nas grandes ascites. A causa mais freqüente de ascite é a cirrose hepática. Os principais sinais que diagnosticam a presen- ça de ascite por meio da percussão do abdômen são os indicados a seguir. 1) Sensação de onda ou sinal do piparote – a face palmar de uma das mãos é posicionada em um dos flancos; a seguir, a ponta do dedo médio, dobrado, apoiado e em estado de tensão contra a face palmar do polegar é disparada contra o outro flanco. O abalo produzido pelo piparote produz pequenas on- das de choque no líquido ascítico, perceptíveis pela palma da mão, colocada no flanco oposto. O cho- que pode ser percebido em casos de panículo adi- poso e exagerado ou de edema na parede abdomi- nal. Nesse caso, um assistente, ou o próprio paci- ente, coloca a borda cubital de sua mão sobre a linha mediana, no abdômen central, exercendo um pouco de pressão, a fim de interceptar ondas trans- mitidas pela parede, mas não impedindo a passa- gem da onda de choque do líquido ascítico. Esse sinal é próprio das grandes ascites, não sendo efe- tivo para ascites de médio ou pequeno porte. O sinal pode ser positivo, quando da presença de gran- des tumores líquidos no abdômen (exemplo, cisto de ovário). 2) Semicírculos de Skoda – com o paciente em decúbito dorsal ou em pé, o líquido ascítico coleta- se nas partes mais declives, ou seja, flancos e an- dar inferior do abdômen. Sendo assim, a percus- são, feita desde o andar superior, delimitará uma linha semicircular na transição entre o timpanismo e a macicez ou submacicez das áreas correspon- dentes às porções mais declives; a concavidade da linha semicircular estará voltada para a região epigástrica. Esse sinal poderá fazer o diagnóstico diferencial entre ascite e cisto gigante de ovário, uma vez que, na doença ginecológica, a concavi- dade da linha semicircular estará voltada para o púbis. Tal recurso semiológico foi uma contribui- ção de Josef Skoda, eminente diagnosticista da Uni- versidade de Viena, no século XIX. 3) Macicez móvel – Como o líquido livre, na cavidade peritoneal, se acumula nas porções mais declives, quando o paciente se coloca em um dos decúbitos laterais, para aquele lado a massa líquida se dirigi- rá. Uma primeira percussão será feita no flanco esquerdo, com o paciente inclinado para sua es- querda, quase em decúbito lateral, esquerdo; o lí- quido ascítico ali acumulado propiciará som maci- ço ou submaciço; o paciente, então, vira-se e colo- ca-se em decúbito lateral direito, mantido o dedo de percussão no mesmo local em que se verificou a macicez. A segunda percussão, efetuada no mes- mo ponto em que foi feita a primeira, vai produzir som timpânico. A contra-prova pode ser feita, mu- dando-se o local de percussão para o flanco direi- to, sempre tendo em mente o princípio de que o líquido e a correspondente macicez sempre se mo- vem para as partes mais declives da cavidade ab- dominal. Dentro do mesmo princípio, a percussão do ab- dômen pode ser feita com o paciente em outras posi- ções, para se evidenciar a macicez móvel. Com o pa- ciente em posição de Trendelenburg (paciente esten- dido com os pés em posição mais elevada do que a cabeça) um grande derrame líquido na cavidade peri- toneal tornará maciça a região epigástrica. Uma pe- quena ascite, porém, poderá ser detectada com o pa- ciente ajoelhado sobre a mesa de exame e com o tron- co sustentado pelas mãos, com os braços estendidos em posição popularmente conhecida como “de qua- tro”. A macicez será observada à percussão da re- gião umbilical, pois, a parte da cavidade peritoneal cor- respondente será a mais declive na posição adotada. 278 Meneghelli UG & Martinelli ALC 16- Descrever os achados da percussão do ab- dômen, que permitem diferenciar a ascite de grandes cistos ou tumores (exemplo: de ovário ou de pâncreas) O líquido ascítico, livre na cavidade peritoneal, procura as partes mais declives. Ao contrário, os lí- quidos dos cistos, pseudocistos ou tumores líquidos são contidos pelas próprias estruturas do processo patoló- gico. Assim, as linhas curvas que delimitam os limites entre timpanismo e macicez ou submacicez têm con- formações distintas, conforme descrito no item 15. 17- Esquematizar os mecanismos responsáveis pelo aparecimento de ascite, exemplifican- do, com pelo menos duas doenças, um dos mecanismos apontados A ascite pode ser definida como o acúmulo de líquido livre no interior da cavidade abdominal. As cau- sas da ascite vêm a seguir. 1) Doenças no peritônio: tuberculose, histoplasmose, implantes de células malignas. 2) Doenças no fígado: a cirrose hepática é a causa mais comum. 3) Congestão hepática: insuficiência cardíaca, pericar- dite constrictiva, síndrome de Budd-Chiari. 4) Extravasamento de suco pancreático (ascite pan- creática): lesão de ducto pancreático, ruptura de pseudocisto pancreático. 5) Doenças que acometem gânglios linfáticos (ascite quilosa): linfomas, tuberculose. 6) Hipoproteinemia: síndrome nefrótica, desnutrição. Os mecanismos de formação de ascite são di- versos, na dependência da doença que desencadeou o processo. As doenças envolvendo peritônio podem cau- sar ascite por aumento da permeabilidade dos capila- res peritoneais, provocando exsudação. Na insufici- ência cardíaca e na síndrome de Budd-Chiari (obstru- ção das veias supra-hepáticas), observa-se congestão hepática com aumento da pressão sinusoidal. A ascite pancreática ocorre por derramamento de suco pan- creático na cavidade peritoneal, podendo provocar peritonite química. As doenças que envolvem os gânglios linfáticos, abdominais podem causar ascite de alto conteúdo linfático (aspecto leitoso, denominada ascite quilosa). Na hipoproteinemia, a diminuição da pressão oncótica é responsável pela ruptura do balan- ço entre a pressão hidrostática e a pressão oncótica nos vasos, causando o extravasamento de líquidos para a cavidade abdominal. A cirrose hepática é responsável por mais de 60% dos casos de ascite. Os mecanismos fisiopatoló- gicos da formação de ascite, na cirrose, são comple- xos. O aumento da pressão hidrostática, nos vasos esplâncnicos, associado à diminuição da pressão on- cótica, secundária à hipoalbuminemia, resulta em extravasamento do fluido para a cavidade peritoneal. Uma vez ultrapassada a capacidade de reabsorção do fluido pelos vasos linfáticos, forma-se a ascite. A pressão portal pode aumentar, se houver au- mento do fluxo sangüíneo portal ou aumento da resis- tência vascular ou de ambos. O aumento da resistên- cia, na cirrose, é de localização intra-hepática e pode ser sinusoidal, pré-sinusoidal e pós-sinunoidal. É co- mum que o aumento da resistência ocorra em várias áreas, além do que, conforme a doença progride, no- vos sítios podem ser envolvidos. Reconhece-se o im- portante papel da alteração estrutural da microcircu- lação hepática (fibrose, capilarização dos sinusóides e nódulos de regeneração) como o mecanismo mais im- portante para o aumento da resistência vascular na cirrose, processo esse que, na maioria das vezes, é considerado irreversível. Recentemente, tem sido de- monstrado que, em associação com o componente mecânico da resistência vascular hepática, existe um componente dinâmico, que se deve ao aumento do tônus vascular. As substâncias vasoativas, produzidas pelo endotélio vascular, como vasodilatadores (prosta- ciclinas e óxido nítrico) e vasoconstrictores (endoteli- nas e prostanóides), agem de forma parácrina na mus- culatura lisa de vasos e nas ativadas células estrelares e modulam o tônus vascular, normal, o qual é mantido pelo balanço entre substâncias vasodilatadoras e vasoconstrictoras. A perturbação desse balanço leva a anormalidades no tônus vascular. O aumento do fluxo sangüíneo portal é conse- qüente à vasodilatação em órgãos esplâncnicos, que drenam o sangue para a veia porta. A vasodilatação também ocorre na circulação sistêmica. Ressalta-se que a vasodilatação é o evento iniciador da circulação hiperdinâmica, que é observada em estágios avança- dos de hipertensão portal. A vasodilatação esplâncnica e periférica atua como ativador de sistemas neuro- humorais, provocando retenção de sódio e ascite. A circulação hiperdinâmica é caracterizada por diminui- ção da resistência vascular, periférica, diminuição da pressão arterial, média, expansão do volume plasmático, aumento do fluxo sangüíneo, esplâncnico e aumento do débito cardíaco. 281 Semiotécnica e interpretação do exame clínico do abdômen. características estruturais, identificadas sem dificul- dade. Quando está moderadamente aumentado, pode ser palpado apenas durante a inspiração. Para ser pal- pável, o baço deve alcançar o dobro do seu tamanho normal. O aumento do baço costuma determinar submacicez ou macicez em áreas entre a linha axilar anterior e a posterior, entre o nono e o décimo-primei- ro intercostos esquerdos, área que não é o espaço de Traube, como aparece em alguns livros de semiologia. Dois fatores facilitam a palpação do baço, pou- co ou moderadamente aumentado, que se esconde sob o gradeado costal no hipocôndrio esquerdo: o movi- mento de decúbito (quando é assumido o decúbito la- teral, direito ou a posição de Schuster) e o movimento de descida durante a inspiração (sobe durante a expiração). Assim, a palpação do baço é facilitada, quando feita durante a inspiração e na posição facili- tadora de sua descida. Dois métodos palpatórios são, habitualmente, utilizados para a palpação do baço: um que é feito com o paciente em decúbito dorsal e outro com o pa- ciente na posição intermediária de Schuster. 1) Primeiro método: no transcurso do exame do ab- dômen, é o primeiro método a ser executado na palpação do baço. O paciente permanece em decúbito dorsal, mantendo a musculatura abdomi- nal o mais relaxada possível. O médico posta-se à direita do paciente. Pela palpação superficial, an- teriormente feita, o médico já pode ter percebido baço facilmente identificável. É muito importante a observância dos movimentos respiratórios para a palpação do baço, assim como o é para a palpa- ção do fígado. A penetração da mão, na região onde se situa o órgão, é feita de maneira lenta, sem for- çar, durante as fases expiratórias. Não há necessi- dade de aprofundar muito a mão, uma vez que o bordo esplênico coloca-se logo abaixo da parede abdominal. Estando à direita do paciente, é mais cômodo que o médico use sua mão direita para palpar o baço. Os canhotos, mesmo colocando-se à direita do paciente, costumam adaptar-se e palpar o baço com a mão esquerda. Com a mão espalma- da sobre a região onde se presume estar o baço, formando com a linha mediana um ângulo de cer- ca de 45º, o médico deve pedir ao paciente que faça lentos movimentos respiratórios e um pouco mais profundos do que o habitual. A mão deve ser mantida em posição de palpar, mantendo uma cer- ta resistência à descida do baço, que ocorre du- rante a inspiração. Durante esse movimento respi- ratório, o bordo esplênico, que vem descendo, deve se encontrar com as pontas dos dedos indicador e médio e com a borda radial do indicador, tocando- os ou provocando um ressalto. 2) Segundo método: o baço é palpado, estando o paciente na posição intermediária de Schuster: po- sição intermediária entre o decúbito dorsal e o decúbito lateral, direito. Para que o paciente fique bem acomodado nessa posição e não contraia sua musculatura abdominal, sua perna esquerda é fletida e o joelho esquerdo faz ponto de apoio so- bre a mesa de exame. O paciente, portanto, man- tém-se equilibrado e relaxado na posição interme- diária, apoiando-se na base formada pelo tronco, perna direita estendida e perna esquerda fletida com o joelho tocando a mesa de exame. Portando, não há necessidade de o paciente apoiar-se no corpo do médico, sentado na cama do lado esquerdo do paciente. Além do mais, os preceitos de preven- ção de infecção hospitalar rezam que o médico deve evitar sentar-se na cama do paciente. A posição intermediária de Schuster induz o movimento do baço em direção ao rebordo costal, favorecendo a palpação. O médico pode colocar-se à direita ou à esquerda do paciente. Colocando-se, em pé, à direita, a mão direita com sua palma voltada para cima e levemente encur- vada, posiciona-se na área onde se presume estar a borda esplênica e aprofunda-se de maneira semelhante à anteriormente descrita. O médico deve dar ao paci- ente as mesmas instruções relativas à respiração, mencionadas na descrição do primeiro método. Es- tando em posição, a borda esplênica será percebida pela face palmar de um ou mais dos quatro últimos dedos. Como é interessante obter amplas inspirações para se proceder à palpação do baço, o examinador pode colocar sua mão esquerda sobre o gradeado costal esquerdo do paciente, e exercer manobra de oposição à sua expansão, travando seus movimentos. Presume-se que, com isso, o paciente passe a ter, pre- dominantemente, respiração diafragmática, esquerda, favorecendo a palpação do baço. Posicionando-se à esquerda do paciente, a mão direita em garra procura sentir o pólo inferior, esplênico, abaixo ou junto ao rebordo costal, esquerdo. Além de ser efetuado na posição intermediária de Schuster, o método pode ser aplicado com o paciente em decúbito lateral, direito. Essa forma de palpar, com o médico à esquerda do paciente, é conhecida, também, como 282 Meneghelli UG & Martinelli ALC processo de Mathieu-Cardarelli, podendo ser consi- derada um terceiro método de palpação do baço. Das características palpatórias do baço, a mais importante é o tamanho. A referência ao tamanho é inferida pela distância que vai do rebordo costal, es- querdo ao ponto extremo de palpação do órgão, na linha hemiclavicular, esquerda. Infecções agudas con- ferem ao baço consistência mole, com bordos rom- bos; as esplenomegalias crônicas costumam ser du- ras e ter bordos cortantes. O baço será doloroso, quan- do um processo inflamatório atinge sua cápsula ou na vigência de infarto esplênico. O elemento palpatório para diferenciar o baço de uma massa no quadrante superior, esquerdo (exem- plo, tumor gástrico, rim esquerdo) é o reconhecimento das duas ou três chanfraduras no seu bordo interno, desde que a forma normal do órgão seja conservada. Na distinção entre esplenomegalia e massas no hipo- côndrio ou quadrante superior, esquerdo pode ser útil à percussão; na esplenomegalia, a área de percussão será maciça ou submaciça, o que pode não ocorrer no outro caso. É preciso estar atento para evitar um erro não raro: tomar como baço a palpação da última costela flutuante. 22– Esquematizar os mecanismos responsáveis pelo aumento do volume do baço, exempli- ficando, com pelo menos duas doenças, cada um dos mecanismos apontados Para simplificar, pode-se afirmar que há dois mecanismos básicos, que produzem esplenomegalia. Ela pode ser congestiva, quando o crescimento é for- çado por congestão de sangue venoso, ou proliferativa, quando o aumento do volume é dado por crescimento do contingente celular do órgão. O aumento do órgão pode ser difuso, com manutenção de sua forma nor- mal, ou decorrente de comprometimento focal (exem- plos, cistos, hemangiomas). As principais causas de esplenomegalia, segun- do a natureza do processo patológico envolvido, com alguns exemplos representativos de cada uma das causas são apresentadas a seguir. Inflamatórias a) agudas: septicemia, febre tifóide, mononucleose in- fecciosa, etc b) subagudas: endocardite bacteriana, subaguda c) crônicas: leishmaniose, malária, tuberculose, lúpus eritematoso, cistos hidáticos Congestivas a) hipertensão portal por cirrose hepática, esquistos- somose b) trombose da veia porta, da veia esplênica Hiperplásticas a) anemias hemolíticas b) leucemias c) policitemia vera d) púrpura trombocitopênica Infiltrativas a) doença de Gaucher b) doença de Niemann-Pick c) amiloidose Neoplásicas a) hemangiomas b) linfossarcoma c) doença de Hodgkin Além do exame clínico do órgão, deverá haver dados obtidos na anamnese, no exame físico de outros órgãos e sistemas e exames subsidiários, que indica- rão o diagnóstico definitivo de uma esplenomegalia. 23 – Efetuar a palpação da vesícula biliar e indi- car seu significado clínico A vesícula biliar, normal não é palpável; somente o será, se apresentar aumento em seu volume, além de tensão aumentada de suas paredes ou aumento de pressão em seu interior, pela dificuldade de esvazia- mento de seu conteúdo. O aumento da vesícula biliar e as mencionadas manifestações correlatas decorrem de obstrução do ducto cístico ou do colédoco. Quando a obstrução está no ducto cístico, não há icterícia. A obstrução do cístico pode ser devida a cálculos, ou por processo inflamatório, que a excluem da árvore biliar. Ela se distende devido ao acúmulo de sua própria secreção e constitui o que é denominado de vesícula hidrópica. Quando é o colédoco o canal biliar obstruído, há icterícia do tipo obstrutivo. A obstrução do colédo- co, que, geralmente, causa distensão da vesícula biliar, é a provocada por tumores do pâncreas ou das própri- as vias biliares, pois a vesícula não calculosa apresen- ta elasticidade conservada. A obstrução por cálculos, em geral, não causa dilatação da vesícula, porque o paciente já apresenta uma vesícula doente (colecistite crônica, calculosa) e já fibrosada ou esclerosada. En- tretanto, há exceções. 283 Semiotécnica e interpretação do exame clínico do abdômen. Na vigência de icterícia obstrutiva, a presença de vesícula palpável é claro indicador do diagnóstico topográfico da doença: a obstrução situa-se fora do fígado (icterícia obstrutiva extra-hepática), no colédo- co ou na sua desembocadura no duodeno; nessa situ- ação, a principal hipótese diagnóstica é de obstrução por neoplasia, a não ser que exista quadro clínico acom- panhante, muito sugestivo de doença calculosa. De qualquer forma, a presença de icterícia obstrutiva com vesícula palpável indica que a resolução terapêutica do caso é de competência cirúrgica. A vesícula biliar é palpável no ponto em que a margem inferior do fígado cruza a borda externa do músculo reto, anterior, direito, do abdômen. Aumentada e tensa será palpada como uma formação arredondada, de superfície lisa e consistên- cia elástica, eventualmente com pequena mobilidade laterolateral, que se destaca da borda inferior do fíga- do, fazendo corpo com ele. Às vezes, a vesícula au- mentada pode provocar pequeno abaulamento da pa- rede abdominal. A palpação pode ser dificultada por dor local. A vesícula biliar pode ser palpada pelo método de Mathieu, semelhante ao descrito para a palpação do fígado: paciente em decúbito dorsal; médico ao seu lado direito, dando-lhe as costas; uma ou duas mãos aplicadas no hipocôndrio direito, com os dedos re- curvados “em gancho”, como para sentir a borda he- pática. A palpação da vesícula ocorrerá durante uma inspiração de profundidade, adequada para cada pa- ciente. O outro método consiste em aplicar a mão di- reita, levemente inclinada e espalmada sobre o hipo- côndrio direito, junto à borda hepática, estando-se em pé ao lado direito do paciente. Durante uma inspira- ção, as extremidades dos três dedos centrais poderão identificar a vesícula biliar. Um processo palpatório interessante é o de se fazer movimentos circulares, com discreta compres- são, na área vesicular, com os três dedos centrais da mão direita. Com tal método, tem-se conseguido palpar muitas vesículas e ele é aplicável, principalmente, nos casos em que há dor local. 24 – Testar a sensibilidade dos rins pela percus- são dos ângulos costovertebrais, com a bor- da cubital da mão (pesquisa do sinal de Giordano) Existem pontos, na região lombar, cuja pal- pação pode despertar dor, na vigência de afecções renais e uretéricas (exemplos, nefrite, pielonefrites agu- das, tuberculose renal). As dores provocadas, muitas vezes, coincidem com dores espontâneas dos pacien- tes. São dois os pontos: o lombar costovertebral (no vértice do ângulo formado pela última costela e a co- luna vertebral) e o lombar costomuscular (no vértice do ângulo formado pela massa muscular sacrolombar e pela última costela). A pesquisa de dor, nesses pon- tos, é feita mediante sua compressão com um único dedo. Tanto nas doenças acima referidas, como no câncer e na litíase renal, a percussão da região lom- bar (o paciente sentado na cama, com o dorso desco- berto e o examinador, desse mesmo lado) mediante golpes secos com a borda cubital de uma das mãos (manobra de Giordano) pode despertar uma intensa dor aguda. Aconselha-se que a referida manobra seja realizada em diferentes alturas das regiões lombares, direita e esquerda. A percussão deve iniciar-se com manobras leves, aumentando-se gradualmente, por- que não se pode prever a intensidade da dor que elas poderão desencadear. Quando a manobra de Giordano produz a dor aguda e intensa, diz-se, habitualmente, que o paciente apresenta o sinal de Giordano positivo, entretanto, nos livros de semiologia consultados, não se encontra tal designação. Deve-se sempre anotar se a positividade da manobra (produção de dor) foi à direita, à esquerda ou em ambas as regiões. 25- Estabelecer o significado clínico da positi- vidade do sinal de Giordano, diferenciando de outras causas de dor à percussão das re- giões lombares A positividade da manobra de Giordano não in- dica, de forma decisiva, uma afecção renal ou pielo- calicial. O abalo ou a trepidação produzida pelo golpe feito com a borda cubital da mão, na região lombar, pode despertar dor em qualquer órgão ou estrutura subjacente, se estiver com algum processo inflamató- rio (apendicite, hepatite aguda, afecção osteomuscu- lar). São os dados colhidos na anamnese, ao lado de outros achados do exame físico, que levantarão a hi- pótese diagnóstica mais plausível. Além disso, exa- mes subsidiários, pedidos de acordo com as sugestões ditadas pela meticulosa observação clínica, serão im- portantes para o diagnóstico definitivo. O sinal de Giordano é um típico exemplo de achado de significa- do inespecífico do exame físico. Seu valor semiológico está relacionado com os demais dados clínicos, apre- sentados pelos pacientes.
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