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Guias e Dicas
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Apostila doenças geneticas, Notas de estudo de Genética

Apostila do curso de atualização para professores de biologia em genética humana oferecido pelo IB-USP.

Tipologia: Notas de estudo

2011

Compartilhado em 28/02/2011

mayara-brandao-8
mayara-brandao-8 🇧🇷

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Baixe Apostila doenças geneticas e outras Notas de estudo em PDF para Genética, somente na Docsity! 1 Curso de atualização DOENÇAS GENÉTICAS: o que há de novo? Centro de Estudos do Genoma Humano Depto. de Genética e Biologia Evolutiva Instituto de Biociências Universidade de São Paulo 17 a 21 de julho de 2006 2 Índice Apresentação........................................................................................................................3 Cronograma............................................................................................ .............................5 Introdução às atividades em sala de aula.............................................................................6 Atividade 1, Resgatando conceitos , Oficina 1......................................................................7 Atividades 2 e 3.....................................................................................................................8 Atividades 4 e 5 ....................................................................................................................9 Oficina 2 ..............................................................................................................................10 Oficina 3...............................................................................................................................12 Oficina 4...............................................................................................................................16 Atividade 7...........................................................................................................................18 Prática 1 . Isolamento de DNA.............................................................................................19 Prática 2.- Eletroforese........................................................................................................20 Prática 3 – Interpretação se separação eletroforética de DNA............................................21 Exercícios de Southern........................................................................................................23 Atividade 8 ..........................................................................................................................25 Estudo de heredogramas ....................................................................................................26 Exercícios – Diagnóstico de doenças genéticas .................................................................30 O dogma central da Biologia ...............................................................................................33 A transcrição do DNA...........................................................................................................33 O código genético – efeito de mutações .............................................................................41 A síntese de proteínas ........................................................................................................47 Digestão de ácidos nucléicos ..............................................................................................52 Eletroforese .........................................................................................................................52 Southern blotting .................................................................................................................54 A reação em cadeia da polimerase ……………………………………………………………..56 Conceitos gerais de genética básica aplicáveis à genética humana e médica ..................58 Análise de heredogramas ...................................................................................................65 O DNA mitocondrial humano ..............................................................................................73 As bases cromossômicas das doenças genéticas .............................................................75 Diagnóstico molecular de doenças genéticas .....................................................................84 Aconselhamento genético ...................................................................................................92 Diagnóstico pré-natal ..........................................................................................................96 Leituras complementares ..................................................................................................101 Anexo 1 .............................................................................................................................102 Anexo 2 .............................................................................................................................103 Anexo 3 .............................................................................................................................105 Anexo 4..............................................................................................................................110 5 Cronograma Dia Horário Programa 17/07/2006 manhã 8:30 às 9:00 Recepção e recebimento de material 9:00 às 9:30 Apresentação do curso 9:30 às 10:45 Oficina: Recuperando conceitos: DNA, cromossomo, gene, alelo, organização da cromatina 10:45 às 11:10 Intervalo para café 11:15 às 12:30 Revendo conceitos: DNA, cromossomo, gene, alelo, organização da cromatina 17/07/2006 tarde 13:30 às 15:15 Estudo dirigido: Revendo conceitos: a biologia molecular do gene 15:15 às 15:45 Intervalo para café 15:45 às 17:30 Estudo dirigido: Revendo conceitos: a biologia molecular do gene. Apanhado geral. 18/07/2006 manhã 8:30 às 10:15 Oficina: A família Silva e seus genes 10:15 às 10:45 Intervalo para café 10:45 às 12:30 Oficina: A família Silva e seus genes 18/07/2006 tarde 13:30 às 15:15 Oficina: A meiose e as leis de Mendel 15:15 às 15:45 Intervalo para café 15:45 às 17:30 Oficina: A meiose e as leis de Mendel 19/07/2006 manhã 8:30 às 10:15 Prática: Extração de DNA, digestão com enzimas de restrição, eletroforese 10:15 às 10:45 Intervalo para café 10:45 às 12:30 Southern blot, PCR 19/07/2006 tarde 13:30 às 15:15 Padrões monogênicos de herança: estudo dirigido, estudo de heredogramas 15:15 às 15:45 Intervalo para café 15:45 às 17:30 Complicações nos padrões genealógicos básicos: penetrância incompleta, expressão variável, manifestação tardia. 20/07/2006 manhã 8:30 às 10:15 Complicações nos padrões genealógicos básicos: herança mitocondrial, antecipação. 10:15 às 10:45 Intervalo para café 10:45 às 12:30 Diagnóstico de doenças genéticas 20/07/2006 tarde 13:30 às 15:15 Aconselhamento genético 15:15 às 15:45 Intervalo para café 15:45 às 17:30 Projeto Genoma Humano 21/07/2006 manhã 8:30 às 10:15 Projeto Genoma Humano 10:15 às 10:45 Intervalo para café 10:45 às 12:30 Problemas éticos atuais relacionados à Genética Humana 21/07/2006 tarde 13:30 às 14:45 A problemática do ensino de Biologia nos Ensinos Fundamental e Médio 14:45 às 15:15 Intervalo para café 15:15 às 17:30 Avaliação 6 ATIVIDADES EM SALA DE AULA • As atividades em software 1 a 7 e as oficinas 1 e 2 (páginas 7 a 18) têm por objetivo fazer uma revisão dos conceitos básicos de organização e funcionamento do material genético fundamentais para a compreensão dos mecanismos de origem e transmissão das doenças genéticas. • As práticas 1, 2, 3, os exercícios sobre Southern e a atividade 8 (páginas 19 a 25) referem-se à metodologia de manipulação do DNA. Tais técnicas são utilizadas para possibilitar o diagnóstico das alterações moleculares presentes no genoma de portadores de alterações genéticas. • Exercícios de interpretação de heredogramas (páginas 26 a 29) e de diagnóstico de doenças genéticas (páginas 30 e 31). 7 Questão 1. Anote as principais dúvidas que você teve ao assistir esse DVD. 1a. Responda as questões distribuídas em classe (anexo 1). 1. Represente com massa de modelar, sobre uma folha de papel, um par de cromossomos homólogos no período G1 da interfase (antes da duplicação do DNA). 2. Represente separadamente, o mesmo par de cromossomos no período G2 (após a duplicação do DNA). 3. Represente separadamente, o mesmo par de cromossomos em metáfase mitótica. A seguir, represente um gene em heterozigose, nas três fases anteriores. 4. Qual é a constituição química dos cromossomos? 5. Como está organizado o DNA dos cromossomos em cada uma das fases representadas? Desenhe, esquematicamente, ao lado dos modelos. 6. Desenhe, esquematicamente, ao lado dos modelos, a estrutura molecular de um gene. 7. Desenhe a diferença que pode haver entre os dois alelos do gene representado. 8. Redija um texto relacionando os conceitos envolvidos na atividade: cromossomos, DNA, cromátide, gene e alelo (10 linhas no máximo). 9. Relacione as dúvidas que ainda restaram após a realização da atividade. 10. Lembre-se que toda dúvida é válida, não existem perguntas “bobas”. 11. Relacione os conceitos que não estavam claros para algum integrante do grupo e que foram resolvidos durante a discussão. Oficina 1 - Resgatando conceitos Atividade em software 1: http://www.genome.gov/education/on line.htm Resgatando conceitos: DNA, cromossomos, genes, alelos 10 Questões da oficina 2: 12. Desenhe o gene que originou esse RNA mensageiro. 13. O que é proteína? 14. Qual é o efeito da troca do nucleotídeo contendo a base G por um contendo a base C no códon de término? 15. Onde ocorrem as mutações? 16. Comente a afirmação: um gene-um polipeptídeo. 17. Qual é a relação entre a forma da proteína e a função que ela desempenha? 18. Qual a relação entre proteína e fenótipo? Oficina 2: Trabalhando com um modelo para a síntese de proteínas (Amabis e Martho/Editora Moderna) 11 Questões 6. 6.1. Assista a animação da interação entre alelos RR e responda: a) Qual é a característica da proteína codificada pelo alelo R? b) Qual o fenótipo do indivíduo homozigótico para o alelo R? 6.2. Assista a animação da interação entre alelos rr e responda: a) Qual a característica da proteína codificada pelo alelo r? b) Qual o fenótipo do indivíduo homozigótico rr? c) Correlacione o fenótipo do homozigótico rr com as enzimas produzidas por esse alelo. 6..3 Assista a animação da interação entre alelos Rr e responda: a) Qual é o fenótipo do indivíduo heterozigótico Rr? b) Qual dos alelos, R ou r, é dominante? Que resultado possibilita chegar a essa conclusão? c) Do ponto de vista molecular como é o organismo heterozigótico Rr? d) O alelo R impede de alguma forma o alelo r de se manifestar? Atividade em software 6. Do gene ao fenótipo. Interação entre alelos. http://www.whfreeman.com/biology Clicar em Cap. 14 – Interaction between alleles at the molecular level 12 PROCEDIMENTO PARTE 1 Determinação dos fenótipos dos pais 1.1. Observar a aparência (fenótipo) do casal que está sobre a mesa do professor(a). 1.2. Anotar na Tabela I o fenótipo do homem e da mulher com relação às seguintes características: pigmentação da pele, lóbulo da orelha preso ou solto, dentição normal ou hipodontia, número de dedos nas mãos e calvície precoce. Tabela I – Fenótipos e genótipos possíveis dos pais 1.3. Observar, na Tabela II, em anexo, a descrição das características, os genótipos (constituição genética) possíveis para cada uma delas e a maneira como elas são transmitidas para os filhos desse casal. 1.4. A partir das informações contidas na Tabela II preencher a Tabela I com os possíveis genótipos do casal. 1.5. Considerar que os genótipos dos pais sejam os abaixo relacionados. Características Pai Mãe fenótipo genótipos possíveis fenótipo genótipos possíveis Pigmentação da pele (albinismo) Lóbulos das orelhas Ausência de incisivos (hipodontia) Número de dedos nas mãos Calvície precoce Pai Mãe Heterozigótico para albinismo Heterozigótico para lóbulo da orelha Heterozigótico para hipodontia Homozigótico dominante para polidactilia Homozigótico C2 Heterozigótica para albinismo para calvície precoce Homozigótica recessiva para lóbulo da orelha Homozigótica recessiva para hipodontia Homozigótica recessiva para polidactilia Heterozigótica para calvície precoce Oficina 3: A família Silva e seus genes. (Atividade completa no site http://www.ib.usp.br/microgene/ 15 PARTE 5 - Correlacionando conceitos 1. A parte 2 dessa atividade refere-se à formação dos gametas, óvulos e espermatozóides. As fichas representam os alelos, ou seja, as formas alternativas de um gene (A ou a, P ou p, etc). Na célula: a) onde estão localizados os alelos? b) qual é a composição química dos alelos? c) que tipo de informação está contida num alelo? d) que tipo de diferença você imagina que haja entre um alelo e outro? 2. O que ocorre com o número de cromossomos no processo de formação dos gametas? 3. A parte 3 dessa atividade refere-se à formação do zigoto. O que ocorre com o número de cromossomos no processo de fecundação? 4. Na célula, qual é o processo responsável pela redução do número de cromossomos na formação dos gametas? 5. Quantas formas alélicas de um gene existem em cada uma das células somáticas de um ser humano? E em seus gametas? 6. A informação genética está contida no DNA. Na célula, onde está localizado o DNA? 7. A informação genética está contida no DNA. Em que linguagem química essa informação está escrita? 16 PROCEDIMENTO PARTE I - Célula com um par de cromossomos, heterozigótica para um gene (Aa) 1. Desenhar um círculo em um papel, representando os limites da célula que irá sofrer meiose. Lembre-se de que a membrana do núcleo se desfaz quando a célula entra em divisão. 2. Fazer dois rolinhos de massa de modelar, de cores diferentes, com cerca de 10 cm de comprimento e 0,5 cm de diâmetro representando o cromossomo de origem materna e o cromossomo de origem paterna. 3. Aplicar nos bastões de massa os pinos de plástico marcados com as letras A e a, representando os alelos do gene em questão. 4. Duplicar cada cromossomo, materno e paterno, fazendo, com a massa de modelar, dois novos rolinhos em massa da cor correspondente. 5. Unir os rolinhos da mesma cor pelos centrômeros. 6. Colocar o alelo correspondente nas novas cromátides formadas. 7. Com os bastões de massa representando os cromossomos duplicados, simular: a) o emparelhamento dos cromossomos homólogos, b) a primeira divisão da meiose, c) a segunda divisão da meiose. PARTE II - Célula com dois pares de cromossomos, heterozigótica para dois genes localizados em cromossomos diferentes (AaBb) 1. Utilizar quatro bastões de massa de modelar para representar dois pares de cromossomos homólogos. Usar cores diferentes para os cromossomos de origem paterna e materna e para os diferentes pares de cromossomos homólogos. A célula a ser considerada tem número diplóide de cromossomos igual a quatro (2n = 4 cromossomos). 2. Moldar um par de cromossomos metacêntricos (centrômero no meio) e um par de cromossomos acrocêntricos (centrômero na extremidade). 3. Aplicar nos bastões de massa que representam os cromossomos metacêntricos, os pinos de plástico marcados com as letras A e a. Nos bastões de massa que representam os cromossomos acrocêntricos aplique os pinos com as letras B e b. 4. Duplicar cada cromossomo, materno e paterno, fazendo, com a massa de modelar, quatro novos rolinhos da cor correspondente. 5. Unir os rolinhos da mesma cor pelos centrômeros. 6. Colocar o alelo correspondente nas novas cromátides formadas. 7. Com os bastões de massa representando os cromossomos duplicados simular: a) o emparelhamento dos cromossomos homólogos, sem permutação entre os cromossomos homólogos b) a primeira divisão da meiose, c) a segunda divisão da meiose ENTENDENDO A ATIVIDADE 1. Na seção I.2, o que representa cada um dos rolinhos de massa de modelar? Quantas moléculas de DNA formam o cromossomo nessa fase? Explique. 2. Na sua simulação identifique: a) os cromossomos homólogos, b) as cromátides irmãs. Oficina 4. Meiose e as leis de Mendel (atividade completa no site http://www.ib.usp.br/microgene/ 17 3. Quando o alelo presente em uma cromátide é A na cromátide-irmã também está o alelo A. Por que? 4. Quantas possibilidades de posicionamento são possíveis quando dois pares de cromossomos homólogos emparelhados estão na metáfase da primeira divisão da meiose? 5. Compare o comportamento dos cromossomos na meiose com a segregação dos alelos: a) na primeira divisão meiótica. b) na segunda divisão meiótica. 6. Quantos e quais tipos de gametas foram formados na meiose de uma célula duplo- heterozigótica (AaBb)? 7. Segundo a lei da segregação independente (2ª lei de Mendel), quantos e quais tipos de gametas são produzidos por um indivíduo duplo-heterozigótico AaBb? 8. Simule uma permutação entre o par de alelos A e a e o centrômero. Quantos e quais tipos de gametas foram formados? 9. É possível afirmar que a 1ª lei de Mendel é resultado direto da separação do par de cromossomos homólogos para células opostas na 1ª divisão meiótica? Justifique 10. É possível afirmar que a 2ª lei de Mendel resulta do comportamento independente de um par de cromossomos homólogos em relação a outro par de homólogos na 1ª divisão da meiose? Justifique. PROBLEMAS 1) O que herdamos, biologicamente, de nossos pais? 2) Explique como o número de cromossomos é mantido constante nas espécies com reprodução sexuada. 3) É possível ocorrer meiose em uma célula haplóide? E a mitose é possível? Justifique a sua resposta. 4) A síndrome de Down é o tipo mais comum e viável das anomalias cromossômicas humanas e ocorre em 0,15% das crianças nascidas vivas, crianças cujos pais são cromossomicamente normais e sem qualquer histórico da síndrome na família. A causa mais freqüente da síndrome de Down é a trissomia (três cromossomos) do cromossomo 21. Proponha uma hipótese para explicar a possível origem desta trissomia. 5) A autofecundação é um tipo de reprodução sexuada? Justifique a sua resposta. 6) Por que a descendência originada de reprodução sexuada é tão variada? Quais são os fatores responsáveis por esta variabilidade? 7) Uma espécie de verme tem um número diplóide de cromossomos igual a 10. Quantas combinações cromossômicas diferentes são possíveis durante o processo de meiose para a formação dos gametas? 8) É possível afirmar que as 1ª e 2ª leis de Mendel resultam do comportamento dos cromossomos durante a meiose? Justifique a sua resposta. 20 PROCEDIMENTO Eletroforese de corantes de alimentos • Misture 0,1 g de agarose, 10 ml de água, 0,1 µl de sal de cozinha • Aqueça em forno microondas até a fervura • Despeje a solução em uma bandeja de plástico contendo um mini pente • Aguarde a solidificação e retire, cuidadosamente, o pente. • Coloque o gel na câmara de corrida e complete com uma solução de água e sal até que o gel fique submerso • Aplique, com a ajuda de uma seringa de 1ml, os corantes A, B e C em poços separados do gel • Conecte a câmara de corrida à uma fonte de corrente continua. Questões da prática 2: 2.1. Qual a carga dos corantes analisados? Como você chegou a essa conclusão? 2.2. Explique o aparecimento de mais de uma cor após a corrida eletroforética. Prática 2 – Eletroforese de corantes de alimentos 21 Analise o gel da figura abaixo: 1 2 3 4 5 6 7 8 Figura 14. Raia 1 – DNA do fago lambda digerido com a enzima de restrição Hind III. Esses fragmentos são utilizados como marcadores de peso molecular; Raia 2 – DNA genômico de Drosophila melanogaster, sem digerir; Raia 3 – preparação de DNA genômico de Drosophila digerida com Dnase; Raia 4 – preparação de DNA genômico de Drosophila digerida com Rnase; Raia 5 – DNA genômico de Drosophila digerido com a enzima Eco RI; Raia 6 – DNA do plasmídeo pBr322 digerido com Eco RI; Raia 7 – DNA do plasmídeo pBr322 digerido com Hind III; DNA do fago lambda digerido com Hind III Questões: 1. O que caracteriza uma banda nesse gel de agarose? 2. Estime os tamanhos dos fragmentos de cada amostra. 3. Sabendo-se que o genoma de Drosophila tem 4x108 4. A análise do gel permite concluir a respeito da nuvem de moléculas de baixo peso molecular que se coram com brometo de etídeo? pb, distribuídos em quatro longas moléculas de DNA (os 4 cromossomos), como explicar o padrão observado após o fracionamento por meio de eletroforese? Para responder essa questão leve em consideração a integridade das moléculas de DNA após o procedimento de extração. 5. Comparando os padrões apresentados pelas amostras de DNA das raias 2 e 5 você pode apresentar uma hipótese para o “arrasto” visualizado abaixo da banda de alto peso molecular do DNA na raia 2. Respostas comentadas: 1. Em um gel de eletroforese uma banda contém moléculas (lineares) de mesmo tamanho. 2. Valores aproximados para: • Raia 1 – 22.000; 9.400; 6.500; 4.300; 2.300; 2.000 pares de bases • Raia 2 – 30.000 pb + um gradiente de moléculas com peso molecular inferior a 30.000 pb • Raia 3 – o DNA foi digerido pela DNAse, restando apenas o RNA. • Raia 4 - 30.000 pb + um gradiente de moléculas com peso molecular inferior • Raia 5 – não há bandas definidas na preparação. Uma coleção de fragmentos com peso molecular entre 25.000 e 500 pares de bases foram originados pela digestão. • Raias 6 e 7 – 4.300 pb Prática 3 – Interpretação de separação eletroforética de DNA 22 3. As longas moléculas que compõem os cromossomos de Drosophila sofrem quebras mecânicas e químicas durante a extração. A maioria desses fragmentos possui cerca de 30.000 pb. Um gradiente de moléculas com tamanho entre 30.000 e 1000 pb evidencia que as quebras produzem também fragmentos de menor tamanho. 4. As nuvens são formadas por moléculas de RNA. Essa conclusão é possível observando-se o resultado da digestão da preparação de DNA genômico com RNase: a nuvem desapareceu. 5. Considerando-se que a distribuição dos sítios de corte para uma as enzimas de restrição são ao acaso, fragmentos dos mais variados tamanhos são originados. Assim sendo, um gradiente de tamanho pode ser observado como produto da digestão. 6. A digestão com Eco RI cortou as moléculas com cerca de 30.000 pb majoritariamente presentes numa preparação de DNA genômico, originado fragmentos de tamanhos variados e que são visualizados como um arrasto. 25 Questões 8: 8.1. Comente a afirmação: a reação em cadeia da polimerase é uma reação de replicação in vitro. 8.2. Qual a função dos primers na técnica da PCR? 8.3. É necessário conhecer a seqüência de bases do DNA do segmento que se deseja amplificar? E a seqüência dos segmentos adjacentes ao fragmento que se deseja amplificar? 8.4. Cite pelo menos três aplicações da técnica da PCR Atividade em software 8: Reação em cadeia da polimerase (PCR) http://bcs.whfreeman.com/ clicar Cap 15 clicar PCR 26 1. Verifique os principais símbolos usados na confecção dos heredogramas na figura abaixo: 2. Analise, em grupo, os heredogramas A a F segundo o roteiro de perguntas que acompanha cada um deles. HEREDOGRAMA A Questões A: Discuta com seu grupo as seguintes questões: A1. Há afetados em todas as gerações? A2. Há homens e mulheres afetados? A3. Os homens afetados tiveram descendentes afetados? De eu sexo? A4. As mulheres afetadas tiveram descendentes afetados? A5. Qual o mais provável mecanismo de herança dessa condição? A6. Coloque os genótipos mais prováveis nos indivíduos dessa genealogia. Discussão em grupo: Estudo de heredogramas 27 HEREDOGRAMA B Questões B: Discuta com seu grupo as seguintes questões: B1. Há afetados em todas as gerações? A2. Há homens e mulheres afetados? A3. Os afetados têm genitores afetados? A4. Qual o mecanismo de herança mais provável dessa condição na família? A5. Coloque os genótipos mais prováveis nos indivíduos dessa família. A6. O casamento consangüíneo aumenta a chance de um casal ter crianças afetadas por doenças genéticas? 30 1. A anemia falciforme é uma doença autossômica recessiva causada por substituição de ácido glutâmico (codificado por GAG) por valina (codificado por GTG) na posição 6 da cadeia beta da hemoglobina. A substituição elimina o sítio da enzima de restrição Mst II. Essa enzima corta o DNA de pessoas normais originando um fragmento de 1,1 kb; nas pessoas com a mutação a enzima gera um fragmento de 1,3 kb. a) Faça um esquema desta região do gene indicando sítios de restrição nas pessoas normais e nas com a mutação. b) Faça um esquema do resultado de uma hibridação com uma sonda específica do gene na seguinte família: 1) pai heterozigoto; 2) mãe heterozigota; 3) filho afetado; 4) filha afetada; 5) filha heterozigota; 6) filho heterozigoto; 7) filho homozigoto normal. 2. Esquematize um teste baseado na PCR que permita identificar o número de cópias de uma seqüência de trinucleotídeos em indivíduos portadores de uma doença causada por uma expansão de trinucleotídeos. 3. Um zoológico adquiriu uma fêmea de tigre para seu programa de reprodução em cativeiro. Apesar da identidade da mãe dessa fêmea ser conhecida, havia dúvida sobre sua paternidade e alguns dos machos potenciais para serem usados no cruzamento poderiam ser muito aparentados a ela. Foi realizado, então, o exame do DNA dessa fêmea de tigre, de sua mãe e de três machos, com o objetivo de se evitar excessiva consangüinidade no cruzamento. Os resultados da análise usando uma sonda de minisatélite estão mostrados na figura abaixo, onde M = mãe; T = tigresa; M1-3 = machos potenciais de serem usados no cruzamento. Qual dos três machos seria o mais adequado para ser cruzado com a tigresa? Justifique sua resposta. 4. Quatro pares de gêmeos, nascidos no espaço de uma hora, foram trocados em uma maternidade. Você foi chamado para resolver o problema. Como um primeiro passo, você deseja identificar os pares de gêmeos. Para isso analisou o sangue de cada criança usando uma sonda que identifica polimorfismos de VNTR. Com base nos resultados mostrados na figura, responda quais crianças são irmãs e como você irá identificar os pais corretos. Exercícios: Diagnóstico de doenças genéticas 31 5. A doença de Huntington é uma doença neurodegenerativa com padrão de herança autossômica dominante. O início dos sintomas ocorre geralmente após a quarta década de vida. O gene da doença foi identificado em 1992. Mas, antes disso, para as famílias que desejassem, era feito o aconselhamento genético com RFLPs mapeados próximos ao gene da doença. Uma das sondas utilizadas é chamada G8 e revela um polimorfismo de sítios de restrição Hind III representado no esquema a seguir. A genealogia representada na próxima página é de uma família estudada na Venezuela e nela estão indicados os resultados do estudo com a sonda G8. Com base nessas informações responda as questões de a-d: a) Esquematize o provável resultado das hibridações após Southern blotting para cada um dos indivíduos identificados pelas letras correspondentes ao tipo de quando este é digerido com Hind III. São todos diferentes? b) Que associação com o RFLP você pode observar na genealogia? c) Existe algum indivíduo excepcional quanto ao padrão de segregação da doença? d) Imagine que o indivíduo VI-11 da genealogia não seja afetado pela doença. O que você diria a ele sobre a possibilidade de manifestar a doença, considerando que ele tem somente 20 anos de idade? 32 Textos de apoio às atividades realizadas 35 Início da transcrição A transcrição tem início quando um primeiro nucleotídeo trifosfatado é posicionado sobre a cadeia molde de DNA, por ação da polimerase do RNA. A polimerase do RNA permanece ligada à região promotora enquanto são adicionados os primeiros nove nucleotídeos da cadeia de RNA sendo sintetizada. Essa fase pode ser prolongada pela ocorrência de eventos abortivos, nos quais a enzima sintetiza transcritos de tamanho inferior a nove nucleotídeos. Essa fase inicial, chamada fase de iniciação, termina quando a polimerase consegue estender a síntese além desse tamanho. Fase de elongação Após a síntese de cerca de nove nucleotídeos da molécula de RNA, a subunidade sigma da polimerase do RNA dissocia-se e diversos fatores de elongação se associam à polimerase, que passa a se deslocar ao longo do DNA, alongando a molécula de RNA em processo de síntese. Essa é a fase de elongação. À medida que a polimerase do RNA se move ao longo do DNA, ela desenrola a hélice, expondo um novo segmento da cadeia molde. Os nucleotídeos vão sendo covalentemente unidos à extremidade 3' da cadeia em crescimento, formando um híbrido DNA/RNA na região desenrolada do DNA. Imediatamente atrás do local onde está ocorrendo a síntese, a região do DNA já copiada volta a se emparelhar, refazendo a dupla hélice. O RNA, que vai se soltando do DNA, emerge como uma fita simples e livre. A etapa final da transcrição, chamada fase de término, envolve o reconhecimento de uma seqüência sinalizadora, a partir da qual nenhuma base deve ser incorporada ao RNA. Quando a última base é adicionada ao RNA, a bolha de transcrição colapsa e o híbrido DNA/RNA é desfeito, as duas cadeias do DNA emparelham-se completamente e o RNA e a enzima se soltam. A seqüência de DNA que sinaliza o término da transcrição é chamada região terminalizadora. O término da transcrição Na bactéria E. coli há dois mecanismos básicos de término de transcrição. No primeiro deles, a terminação é direta e a seqüência de DNA que sinaliza o término da transcrição contém cerca de 40 bases, sendo que na extremidade 3' existe um segmento rico em C e G, seguido por 6 ou mais timinas. No RNA transcrito, a seqüência rica em C e G fica arranjada de modo a que a molécula de RNA possa formar, nessa região, uma alça em forma de grampo de cabelo (hairpin). Na molécula de RNA, essa alça é seguida por uma série de Us que correspondem aos resíduos de adenina da cadeia molde de DNA. A estrutura em forma de grampo, juntamente com a seqüência de Us, provoca a parada e o desprendimento da polimerase do RNA com conseqüente término da transcrição. O segundo mecanismo de término depende da participação de uma proteína que se acredita liga-se à molécula de RNA nascente em algum ponto antes da seqüência que sinaliza o término da transcrição. O RNA MENSAGEIRO Os transcritos de RNA que contêm a informação para a síntese de proteínas são denominados RNA mensageiros (RNAm). Há importantes diferenças nos detalhes da síntese e da estrutura dos RNA mensageiros de pro e eucariontes. Nas bactérias, o RNAm é transcrito e traduzido no único compartimento celular e os dois processos ocorrem acopladamente. Na célula eucarionte, a síntese e a maturação dos RNAm ocorrem exclusivamente no núcleo. Apenas quando o RNAm está maduro é que ele é exportado para o citoplasma e traduzido. Diferenças significativas na tradução dos RNAm de bactérias e de eucariontes são devidas a suas características estruturais e estabilidade. A diferença estrutural é que o RNAm de bactérias freqüentemente codifica para várias proteínas, sendo chamado de policistrônico, enquanto o RNAm de eucariontes na maioria dos casos codifica para apenas uma cadeia polipeptídica, sendo chamado de monocistrônico (Fig. 10). A diferença funcional é que o RNAm de bactérias geralmente é instável, e é por isso traduzido em proteínas durante um 36 período de tempo muito curto, tipicamente poucos minutos. O RNAm dos eucariontes é mais estável e pode continuar a ser traduzido por várias horas ou mesmo dias. Vários passos são necessários para produzir o RNA mensageiro maduro dos eucariontes. As moléculas mensageiras recém-sintetizadas pela polimerase II são denominadas transcritos primários. A população de tais transcritos no núcleo foi originalmente denominada RNA heterogêneo nuclear (RNAhn), por causa da grande variação em tamanho que apresentava, contrastando com os RNAs mais uniformes e de menor tamanho realmente necessários para codificar uma proteína. Muita dessa variação em tamanho no RNA recém-sintetizado é devida à presença de longas seqüências de nucleotídeos que serão retiradas do transcrito primário em um processo denominado splicing. Íntrons são removidos do pré-RNAm Para a produção de um RNA mensageiro em células eucarióticas, o segmento inteiro do gene, incluindo íntrons e éxons, é primeiramente transcrito em uma longa molécula de RNA, o transcrito primário. Antes que o RNA deixe o núcleo, todas as seqüências de íntrons são retiradas e os éxons são unidos entre si. O resultado é uma molécula mais curta de RNA, que agora contém uma seqüência codificadora ininterrupta. Quando esse passo, denominado splicing do RNA, é completado, o RNA é uma molécula de RNAm funcional que pode deixar o núcleo e ser traduzida em proteínas. Como a célula determina quais as partes do transcrito primário devem ser removidas? Diferentemente da seqüência de código de um éxon, a seqüência exata de nucleotídeos da maioria dos íntrons parece não ser importante para a célula. Embora haja pouca semelhança entre as seqüências de nucleotídeos de íntrons diferentes, cada íntron contém uma curta seqüência de nucleotídeos que atua como uma marca para sua remoção (Fig. 2). Os íntrons são removidos do RNA por enzimas que, ao contrário de muitas outras enzimas, são compostas por um complexo de RNA e proteína. Essas partículas encarregadas do splicing do RNA são denominadas snRNPs ou snurps (do inglês - small nuclear ribonucleoprotein particles). Em cada íntron, um grupo de snRNPs se associa ao RNA, excisa (ou corta) o íntron, e o reúne à cadeia de RNA liberando o íntron excisado como um laço (Fig. 2 e 3). Um dos papéis do RNA presente nos snRNPs (snurps) é reconhecer e – por complementaridade de bases – emparelhar com a seqüência de nucleotídeos que marcam o início e o ponto de ramificação de cada íntron (veja Fig. 3). Desse modo, os snurps aproximam as duas extremidades do íntron permitindo a ocorrência do splicing. Embora os snurps tenham um papel central na reação de splicing, outras proteínas são também necessárias. Figura 2. Seqüência de nucleotídeos que sinaliza o início e o final de um íntron. As três seqüências de nucleotídeos mostradas são necessárias para remover um íntron. As outras posições de um íntron podem ser ocupadas por qualquer nucleotídeo. As seqüências especiais são reconhecidas por snRNPs, que clivam o RNA nos limites íntron-éxon e ligam covalentemente os éxons. A adenina (A) apontada pela seta forma o ponto de ramificação do laço produzido na reação de splicing (Figura 12) e está tipicamente localizado cerca de 30 nucleotídeos da extremidade 3´do íntron. 37 Figura 3. – Mecanismo de síntese de cadeias polipeptídicas nos organismos eucariontes, mostrando como são removidas as regiões não codificadoras (íntrons) do RNAm. O splicing do RNA em eucariotos permite uma vantagem adicional. O transcritos primários de vários genes eucarióticos podem sofrer splicing de diferentes maneiras para produzir diferentes RNAm, dependendo do tipo de célula no qual o gene está sendo expresso, ou do estágio de desenvolvimento do organismo. Isso garante que diferentes proteínas sejam produzidas a partir do mesmo gene (Fig.4). Em conclusão, ao invés de ser um processo que acarreta desperdício, o splicing do RNA dos eucariotos permite o aumento do já enorme potencial de código de seus genomas. Os RNAm sofrem outras modificações Os RNAs sintetizados pela polimerase II também são modificados em ambas as extremidades, ficando bastante diferentes dos transcritos produzidos por outras polimerases. Essas modificações serão utilizadas posteriormente, no citoplasma, como sinais de que esses RNAs devem ser traduzidos em proteínas. A extremidade 5' da molécula de RNA é "encapada" (do inglês capped) pela adição de um nucleotídeo contendo G metilado. O encapamento ocorre no início da transcrição, quando o transcrito ainda é pequeno com apenas 30 nucleotídeos de comprimento. Essa reação se dá pela ligação de uma molécula de 7-metilguanosina à extremidade 5' do transcrito. A extremidade 5' cap tem um importante papel nos passos iniciais da tradução do RNAm, além de proteger o RNA nascente de degradação. Figura 4. Splicing alternativo do gene da α-tropomiosina de rato. α-tropomiosina é uma proteína que regula a contração das células musculares. Seu papel em outras células não é bem conhecido. Uma vez que o transcrito primário é feito, ele pode sofrer splicing de diferentes modos, e produzir RNAms distintos que originam proteínas variantes. Alguns dos padrões de splicing são específicos para certos tipos de células. Por exemplo, a α- tropomiosina feita em musculatura estriada é diferente da feita na musculatura lisa. A cabeças de seta na parte superior da figura representam sítios onde podem ocorrer clivagem e adição da cauda de poli (A). 40 Figura 7. Representação esquemática de ribossomos. À esquerda, modelos tridimensionais das subunidades de um ribossomo bacteriano observadas de dois ângulos diferentes: (a) subunidade menor, (b) subunidade maior, e (c) subunidades reunidas. À direita, modelo ampliado mostrando a posição do RNAm e da cadeia polipeptídica sendo sintetizada. 41 O CÓDIGO GENÉTICO Regina Célila Mingroni Netto, Eliana Maria Beluzzo Dessen, José Mariano Amabis Sistema de codificação genética Código genético é o conjunto de regras que governa a relação entre a seqüência de nucleotídeos no DNA e a ordem dos aminoácidos nas proteínas. É nessa relação que reside a essência da expressão gênica e a decifração do código genético foi realmente um importante marco na história da Biologia. Código é definido como "um sistema de símbolos (letras, números ou palavras) usado para representar um certo significado pré-estabelecido, às vezes secreto". Por exemplo, o código Morse internacional é constituído por pontos, barras e espaços. Para quem não conhece o código, os pontos e barras não têm o menor significado, mas conhecendo-se as regras do código, os pontos e barras podem ser facilmente convertidos em frases. O código genético permite à célula converter seqüências de bases do DNA em cadeias polipeptídicas. A unidade do código genético Existem 20 diferentes aminoácidos que devem ser especificados durante o processo de síntese de proteínas por algum tipo de combinação das quatro diferentes bases existentes no DNA. Quantas bases devem ser utilizadas para construir um código que permita que os 20 aminoácidos diferentes sejam especificados? Se as palavras desse código tivessem uma base, apenas quatro aminoácidos seriam especificados. Um código baseado em conjuntos de duas bases permitiria 16 combinações diferentes. Já um código baseado em trincas de bases permitiria 64 combinações distintas de bases, o que seria suficiente para determinar os 20 aminoácidos. Como os sistemas celulares são geralmente econômicos, um código baseado em quatro letras seria muito improvável, pois permitiria 256 combinações diferentes. Assim, um código baseado em trincas seria a situação mais razoável. Contudo, ainda fica a seguinte pergunta: Como são lidas essas trincas? Uma após a outra ou uma mesma base pode fazer parte de três trincas adjacentes? Nesta segunda opção diríamos que o código é sobreposto. (Fig.8) Em um código sobreposto, cada base do DNA participaria da codificação de dois ou três aminoácidos. Este tipo de código imporia severas restrições sobre as seqüências de aminoácidos das proteínas. Assim, por exemplo, um aminoácido cujo código fosse CAG não poderia ser seguido por um outro cujo código tivesse como primeira base um T ou um C Figura 8. Comparação entre códigos de três letras sobreposto e não-sobreposto. No código não-sobreposto, a proteína é traduzida por códons que não compartilham nenhum nucleotídeo. Já no código sobreposto, cada códon compartilha um ou mais nucleotídeos, dependendo do grau de sobreposição, com os códons vizinhos. 42 porque, por definição, a primeira base do próximo aminoácido teria que ser A ou G, dependendo da extensão da sobreposição. Brenner, na década de 60, foi o primeiro a propor que o código não era sobreposto, isto é, que cada base participaria na codificação de um único aminoácido. Também devemos considerar que se o código fosse sobreposto, toda vez que uma base fosse alterada na molécula do DNA, um, dois ou três aminoácidos seriam alterados na proteína mutante. A evidência genética, contudo, não falava a favor dessa hipótese. Em estudos sobre mutações no vírus do mosaico do tabaco (TMV), a substituição de um único nucleotídeo no genoma viral resultava geralmente na alteração de um único aminoácido na cápsula protéica do vírus, e não na alteração simultaneamente de três aminoácidos, como seria esperado se o nucleotídeo alterado fizesse parte de três códons ao mesmo tempo. A Natureza tríplice do código Quando Benzer estava trabalhando no sistema rII do fago T4, ele verificou que os indivíduos com mutação de ponto revertiam muito freqüentemente para o tipo selvagem. Ele poderia ter pensado que este fato seria devido à reversão da mutação original que resultaria novamente na seqüência de bases do tipo selvagem. Isso é verdadeiro para a maioria das reversões, no entanto, mutações reversas não constituem a única maneira pela qual indivíduos com mutações de ponto no loco rII podem reverter ao tipo selvagem. Foi verificado que, em alguns casos, os revertidos carregavam uma segunda mutação ocorrida nas proximidades da mutação original. As duas mutações juntas eram responsáveis pela produção de um fenótipo selvagem, isto é, a segunda mutação suprimia o efeito da primeira e foi, por este fato, denominada mutação supressora. Crick e Brenner, em 1961, aproveitaram essas mutações supressoras para provar que o código genético era realmente composto por trincas, oito anos após a idéia ter sido proposta. Eles foram capazes também de demonstrar que a seqüência de bases do DNA era lida a partir de um determinado ponto, trinca por trinca, de maneira não sobreposta. Isto significava que cada mensagem genética tinha uma estrutura de leitura fixa que poderia ser alterada pela adição ou remoção de uma única base. O polipeptídio especificado pela mensagem conteria aminoácidos incorretos a partir do ponto em que a base foi adicionada ou removida. Um aspecto que deve ser ressaltado é o fato destas mutações terem sido induzidas por corantes do tipo acridina, que causam inserção ou deficiência de bases na seqüência de nucleotídios do DNA. Crick e Brenner assumiram que se uma mutação fosse uma inserção de apenas uma base no DNA da região rII (representada por um sinal +), a sua supressora deveria ser uma deleção (representada por sinal -). Assim, se a seqüência de bases do DNA estivesse sendo lida trinca por trinca (da esquerda para a direita), começando de um ponto determinado, a inserção de uma base determina que todas as trincas à direita da mutação fossem lidas de maneira diferente do original; esta seria, portanto, uma mutação do tipo mudança do quadro de leitura. Geralmente, isto resultaria num polipeptídio não funcional. Para compreender melhor os efeitos de uma mutação que afeta o quadro de leitura, observe esta frase em inglês constituída por palavras de apenas três letras: THE FAT CAT ATE THE BIG RAT Deletando C C THE FAT ATA TET HEB IGR AT Inserindo A: A THE FAT ATA ATE THE BIG RAT A inserção suprime o efeito da deleção pois restaura a fase de leitura. Mas sozinha, uma inserção também perturbaria completamente o sentido da frase: 45 mutações sem qualquer efeito significativo no seu funcionamento. Já as mutações em regiões codificantes dos genes têm maior importância. As conseqüências das mutações de ponto que afetam a seqüência de um códon podem ser: a) A mutação pode ser sinônima, isto é, o novo códon especifica o mesmo aminoácido do códon não mutado. A mutação sinônima é uma mutação silenciosa porque o gene mutado codifica para a mesma proteína codificada pelo gene não mutado, por causa da degeneração do código genético. b) A mutação pode ser não sinônima, isto é, ela gera um novo códon que especifica um aminoácido diferente. A proteína codificada pelo gene mutado terá, portanto, um aminoácido diferente. Freqüentemente, isto não afeta a atividade biológica da proteína porque estas são capazes de tolerar certas mudanças em sua estrutura sem perda de sua função. Contudo, alterações de aminoácidos no sítio ativo de uma enzima têm um impacto maior e podem levar à perda de função da proteína. Uma alteração não sinônima é também chamada de mutação de sentido errado (missense). c) A mutação pode converter o códon que especifica um aminoácido em um códon de parada (nonsense). Essa mutação sem sentido produz uma proteína menor porque a tradução interrompe-se no codon mutado. (do RNA mensageiro). O efeito desta mutação sobre a proteína dependerá do que foi perdido. Em geral, mutações desse tipo resultam em uma proteína não funcional. d) A mutação pode converter um códon de término de tradução em um códon que especifica um aminoácido. Isto resultará em uma proteína com aminoácidos adicionais. As proteínas poderiam tolerar estas mudanças sem o comprometimento de sua atividade biológica. No entanto, dependendo do número de aminoácidos adicionais, isto pode afetar a estrutura tridimensional da proteína, afetando sua função. Como já estudamos, inserções e deleções também podem afetar os genes. Se o número de nucleotídeos perdidos ou inseridos for três (ou múltiplo de três) um (ou mais códons) é perdido ou adicionado produzindo efeitos variados sobre a estrutura da proteína codificada pelo gene. Se o número de nucleotídeos perdidos ou inseridos não for três ou múltiplo de três, haverá mudança no quadro de leitura. Isto significa que todos os códons a jusante (a 3') da mutação terão um quadro de leitura diferente daquele do gene não mutado. Isto resulta em alteração significativa na estrutura da proteína, já que parte do polipeptídeo codificado pelo gene mutado terá uma seqüência de aminoácidos diferente do polipeptídeo codificado pelo gene normal. Os efeitos de mutações que ocorrem em regiões não codificantes do genoma são mais difíceis de serem previstos. Sítios no DNA de ligação a proteínas são susceptíveis a mutações de ponto, inserções e deleções que podem alterar a seqüência de nucleotídeos envolvidos em interações DNA-proteína. Estas mutações poderiam inativar promotores ou seqüências reguladoras da expressão gênica. Origens de replicação também poderiam perder a função se as mutações afetassem sítios relevantes para a ligação a outras proteínas envolvidas em complexos protéicos que participam da replicação do DNA. Mutações também podem ocorrer em introns ou nos limites entre introns e exons. Nestas regiões, mutações serão importantes se afetarem nucleotídeos envolvidos em interações RNA-RNA ou RNA-proteína que ocorrem no processo de splicing. Um resultado possível destas mutações é o de que o intron não seja removido do pré-RNA mensageiro. Conseqüentemente, isto equivaleria à inserção de novos códons, modificando o polipeptídeo traduzido. Efeitos das mutações em microorganismos Os efeitos das mutações em microorganismos podem ser descritos com base nas propriedades de crescimento dos mutantes em diferentes meios de cultura. Assim, eles podem ser enquadrados nas seguintes categorias: 46 a) Mutantes auxotróficos crescem apenas quando suplementados com um nutriente que não é necessário para a célula não mutada (prototrófica). Por exemplo, E. coli sintetiza normalmente seu próprio triptofano, graças às enzimas codificadas por cinco genes pertencentes ao operon triptofano. Bactérias que apresentem mutações nestes genes que levem à falta do aminoácido serão mutantes auxotróficos. Neste caso, o mutante não sobrevive em um meio de cultura não suplementado com triptofano. b) Mutantes letais-condicionais são mutantes que não resistem a determinadas condições de crescimento. Quando crescidos em condições normais (permissivas), eles parecem normais. Entretanto, se transferidos a condições restritivas, seu fenótipo anormal se manifesta. Mutantes sensíveis à temperatura são exemplos típicos de mutantes letais-condicionais. Eles crescem como células selvagens sob temperatura normal mas crescem mal, ou não crescem, quando a temperatura sobe acima de um limiar que pode variar para cada mutante. c) Mutantes resistentes a inibidores podem resistir aos efeitos tóxicos de um antibiótico ou de outro inibidor. Em alguns casos, a mutação modifica a estrutura da proteína que interage com o inibidor. Neste caso, o inibidor perde sua função porque já não pode interagir com a proteína alvo. Em outros casos, a mutação altera a proteína responsável pelo transporte do inibidor ao interior da célula. d) Mutantes de regulação possuem promotores ou outras seqüências reguladoras alteradas. Nesta categoria estão os mutantes constitutivos, aqueles que expressam continuamente genes que, normalmente, estão ativos apenas em certas condições. Esses mutantes serão estudados posteriormente. Os efeitos das mutações nos organismos pluricelulares O primeiro ponto a ser considerado neste caso refere-se à importância de uma mutação para uma célula somática e para um gameta. Como a célula somática não transmitirá a cópia de seu material genético para a próxima geração, uma mutação em uma célula somática é importante para o organismo apenas no momento em que ela ocorre, isto é, ela não tem impacto nas demais gerações. Na verdade, a maioria das mutações somáticas não é significativa mesmo que elas produzam a morte celular porque haverá um número enorme de células idênticas no mesmo tecido. Uma exceção seria quando uma mutação afeta uma célula que, por sua vez, traz dano ao organismo ao induzir, por exemplo, a formação de um tumor. Mutações nas células que originam os gametas são mais importantes, pois elas serão transmitidas aos organismos da geração seguinte e, portanto, estarão presentes em todas as células dos organismos que herdaram a mutação. A maioria das mutações nos gametas sejam as silenciosas ou as que ocorrem em regiões codificantes, não alterará significativamente o fenótipo dos organismos portadores das mesmas. Aquelas que o fazem podem ser divididas em duas categorias: a) Mutações de perda de função que reduzem ou anulam a atividade protéica: A maioria dessas mutações que levam à perda de função são recessivas, já que o heterozigoto portará uma versão não mutada do gene que codifica para uma proteína funcional. Desta forma, a versão normal do gene compensa o efeito da mutação. Existem, no entanto, exceções nas quais a mutação de perda de função pode agir como dominante se o produto do gene for realmente necessário em dose dupla. b) Mutações de ganho de função são menos comuns: Elas podem residir em regiões reguladoras do gene e não necessariamente em regiões codificantes. Neste caso, a mutação poderia levar à expressão de um ou mais genes em tecidos onde eles normalmente não se expressam. Alternativamente, a mutação poderia levar à expressão exagerada de um gene, ou ainda à expressão de um produto gênico com funções distintas do produto original. 47 A SÍNTESE DE PROTEÍNAS Regina Célia Mingroni Netto, Eliana Maria Beluzzo Dessen, José Mariano Amabis (apostila disciplina Bio-211 Biologia Molecular) O RNA e a síntese de proteínas As proteínas constituem mais da metade da massa seca total de uma célula e sua síntese tem uma importância fundamental para a manutenção e o crescimento celulares. A síntese de proteínas ocorre nos ribossomos e envolve vários tipos de moléculas de RNA que atuam nas diversas etapas do processo. Inicialmente, uma molécula de RNA mensageiro deve ser sintetizada a partir de uma das cadeias do DNA que codifica para a proteína. No citoplasma, moléculas de cada um dos 20 aminoácidos que entram na composição das proteínas devem se unir a seus respectivos RNA transportadores. As subunidades ribossômicas que promoverão a síntese devem se associar com proteínas auxiliadoras no processo. A síntese de proteínas tem início quando todos os componentes mencionados acima, ou seja, um RNA mensageiro, um dos RNA transportadores e as subunidades de um ribossomo se reúnem para formar um ribossomo funcional. Cada ribossomo percorre, então, a molécula de RNAm traduzindo a seqüência de códons em uma seqüência de aminoácidos. Vejamos agora, em detalhe, cada uma dessas etapas. O papel do RNAt As moléculas de RNAt atuam como adaptadores no processo de síntese de proteínas, uma vez que elas definem a posição dos aminoácidos de acordo com a seqüência de bases do RNA mensageiro. Essa característica dos RNAt se deve ao fato deles terem duas regiões de ligação em sua molécula, uma onde se liga covalentemente um aminoácido específico e outra, o anticódon, por meio da qual se ligam ao códon do RNAm, por meio de pontes de hidrogênio. A ligação de um RNAt com seu aminoácido específico é catalisada por uma enzima chamada sintetase do aminoacil-RNAt. A atuação dessa enzima se dá em duas etapas. Primeiramente, os aminoácidos reagem com ATP para formar um aminoacil-adenilato. A energia para essa reação é fornecida pela clivagem da ligação altamente energética do ATP, com liberação de pirofosfato. Essa etapa é conhecida como ativação do aminoácido. Em uma segunda etapa, o aminoácido ativado reage com o RNAt, liberando uma molécula de AMP. A ligação do aminoácido com o RNAt se dá entre o grupo carboxila do aminoácido e um carbono 2' ou 3' da ribose do último ribonucleotídeo da extremidade 3' do RNAt, o qual contém sempre a base adenina (Fig. 9). Existem pelo menos vinte tipos diferentes de aminoacil-sintetases, uma para cada tipo de aminoácido. Cada uma reconhece um único aminoácido e catalisa sua união a um dos RNAts correspondente a esse aminoácido. Lembre-se que pode existir mais de um tipo de RNAt para um mesmo aminoácido. Um RNAt é denominado de acordo com o aminoácido ao qual ele se liga. Por exemplo, o RNAt que se liga ao aminoácido alanina é chamado RNAt Ala. Um aminoacil-RNAt carregando um aminoácido específico é designado pela abreviatura do aminoácido colocada antes de sua sigla; por exemplo, o RNAt Ala ligado a seu aminoácido é chamado Ala-RNAt. 50 A iniciação da tradução em procariontes Em E. coli, o processo de iniciação da tradução requer a presença de uma subunidade menor do ribossomo (30S), um RNAt especial iniciador da tradução, uma molécula de RNAm e três fatores protéicos de iniciação. Inicialmente uma subunidade ribossomal 30S livre associa-se a um RNA mensageiro. A formação desse complexo depende da interação de bases entre uma seqüência do RNAr 16S e uma região especial do RNAm, conhecida como seqüência de Shine-Dalgarno. Essa seqüência corresponde a um consenso de 6 bases localizado sete nucleotídeos acima do códon de iniciação AUG. A região do RNAm que compreende a seqüência de Shine-Dalgarno e que interage com o ribossomo no processo de iniciação é denominada sítio de ligação do ribossomo e compreende cerca de 40 nucleotídeos. Em seguida, um RNAt especial, o RNAt-fMet A adição da subunidade maior do ribossomo posiciona o RNAt- (da N-formilmetionina, associado a um fator de tradução, combina-se ao complexo formado pela subunidade do ribossomo 30S e pelo RNAm. O passo final da iniciação é a associação da subunidade maior do ribossomo para construir um ribossomo completo. fMet no sítio P do ribossomo completo. Este é o único RNAt bacteriano capaz de entrar no sítio P diretamente, sem ter que passar pelo sítio A, como acontece com os demais RNA transportadores. Com o RNAt inciador no sítio P, o sítio A fica posicionado no segundo códon do mensageiro e irá determinar qual aminoacil-RNAt será incorporado nessa posição. A iniciação da tradução em eucariontes A iniciação da tradução em eucariontes é mais complexa que nos procariontes e envolve diversos fatores de iniciação e não será tratada aqui. A elongação da cadeia polipeptídica O processo da elongação da cadeia polipeptídica é basicamente o mesmo em procariontes e eucariontes. A adição de um aminoácido novo à cadeia em crescimento ocorre em três etapas: (1) ligação de um aminoacil-RNAt ao sítio A do ribossomo; (2) transferência da cadeia polipeptídica em crescimento do sítio P para o sítio A através da ligação peptídica com o aminoácido recém-chegado e (3) translocação do ribossomo ao longo do RNAm, transferindo o novo peptidil-RNAt do sítio A para o sítio P, com posicionamento do próximo códon a ser traduzido no sítio A. Durante a terceira etapa, o RNAt descarregado é translocado para o sítio E. Esses três passos são repetidos de maneira cíclica e vários fatores são importantes nesses processos. Na primeira etapa, o aminoacil RNAt se liga ao sítio A e sua especificidade é determinada pelo códon do RNAm ali posicionado. Os três nucleotídeos do anticódon devem emparelhar com os três nucleotídeos do códon. A formação de uma ligação peptídica no ribossomo consome pelo menos 3 ligações fosfato de alta energia: uma para carrregar o RNAt com seu aminoácido específico (aminoacil- sintetase), outra para ligar o aminoacil-RNAt ao sítio A do ribossomo na primeira etapa e a terceira é gasta no movimentos de translocação do ribossomo. O processo de elongação de um peptídeo é muito rápido. Na E. coli, as três etapas que culminam com a adição de um único aminoácido leva cerca de 0,05 segundos. Logo, a síntese de um peptídeo contendo 300 aminoácidos leva apenas 15 segundos. Considerando a sua complexidade e especificidade, a rapidez do processo de tradução é surpreendente. O término da tradução Como já vimos, existem três códons do código genético que não codificam aminoácidos (UAG, UAA e UGA), sendo usados como sinais de término da síntese da cadeia polipeptídica. Em bactérias, o códon UAA é o códon de terminação mais utilizado, e UGA é mais usado que UAG. Nenhum dos códons de terminação tem um RNAt correspondente, eles são reconhecidos diretamente por fatores protéicos. Em E. coli, os fatores que catalisam a terminação são denominados RFs (do inglês release factors). RF-1 reconhece o códon UAA e 51 UAG, e RF-2 reconhece os códons UGA e UAA. Esses fatores entram no sítio A do ribossomo, quando este sítio se posiciona sobre um códon de terminação. Eles também requerem a presença de um peptídil-RNAt no sítio P para agir. Nos eucariontes, existe apenas um fator de terminação, o chamado eRF. Para o eRF se ligar ao ribossomo é necessário GTP, que provavelmente é clivado após a conclusão da etapa de terminação. A reação de terminação consiste na liberação do polipeptídeo pronto do RNAt, expulsão do último RNAt do ribossomo e dissociação do ribossomo do RNAm. QUADROS DE LEITURA DO RNA MENSAGEIRO Dada uma seqüência de bases do DNA ela pode ser lida teoricamente em três quadros de leitura, um começando na primeira base, outro na segunda base e outro na terceira base; uma leitura a partir da quarta base repete o primeiro quadro e assim por diante. Um quadro de leitura formado exclusivamente por trincas que significam aminoácidos é chamado de quadro de leitura aberto ou ORF (do inglês open reading frame). Um quadro de leitura que não pode ser traduzido, porque é interrompido por um códon de terminação, é dito bloqueado. Se uma certa seqüência de DNA está bloqueada nos seus três quadros de leitura possíveis, ela não pode ter função de codificar proteína. Uma seqüência que é traduzida em proteína tem um quadro de leitura que começa sempre com um códon de iniciação e se extende por uma série de códons sucessivos que significam aminoácidos, até atingir um códon de terminação. A identificação de um quadro de leitura aberto em uma seqüência de DNA não significa obrigatoriamente que tal seqüência seja traduzida em proteína até que tal fato seja efetivamente demonstrado pela identificação do seu produto protéico (Fig. 11). Figura 11. Resumo da organização da informação genética na molécula de DNA. Uma molécula de DNA é uma dupla hélice formada por duas cadeias polinucleotídicas. A informação encontra-se na seqüência de bases ao longo de uma das cadeias (cadeia com sentido). A expressão de um gene se dá pela transcrição de uma seqüência de bases do DNA em uma molécula de RNAm. A transcrição da informação genética em RNA e a tradução em proteínas são reguladas por seqüências especiais de bases presentes no DNA e no RNA. Uma dessas seqüências no DNA forma o sítio de ligação da polimerase do RNA. Esse sítio de ligação localiza-se antes do sítio de início de tradução presente no RNAm. No DNA localiza-se também o sítio de término da transcrição, o qual fica além do sítio de término da tradução localizado no RNAm. 52 TÉCNICAS QUE PERMITEM A MANIPULAÇÃO DO DNA Bio-211 Biologia Molecular – Apostila Prática DIGESTÃO DE ÁCIDOS NUCLÉICOS Existem várias enzimas que atuam sobre os ácidos nucléicos, algumas sem especificidade em relação às bases, como a DNase que degrada moléculas de DNA e a RNase que degrada moléculas de RNA. Há também enzimas, como as enzimas de restrição, que atuam de modo específico, isto é, cortam as moléculas de DNA em locais com seqüências de bases específicas. Essas enzimas diferem entre si quanto à seqüência de bases do DNA que reconhecem e cortam. As seqüências de reconhecimento são em geral palindromicas, isto é, possuem a mesma seqüência de 4 ou mais nucleotídeos, quando lida na direção 5’- 3’, em ambas as fitas. As enzimas de restrição cortam ambas as fitas o DNA sempre entre o mesmo par de nucleotídeos (Figura 12). Figura 12. Exemplos de seqüências de nucleotídeos que são reconhecidas e cortadas por enzmas de restrição. As seqüências são palindômicas, isto é, a seqüência de nucleotídeos é a mesma se a hélice for girada 180 graus ao redor do centro do segmento. As enzimas cortam as duas fitas do DNA dentro do sítio de reconhecimento. Para algumas enzimas como HpaI, o corte produz extremidade em fundo cego, para outras, como EcoRI, HindIII e PstI, o corte produz extremidade assimétricas e que são coesivas, ou seja, podem ser reunidas novamente e recompor a dupla-hélice por ação da enzima ligase. Os fragmentos gerados pela digestão de uma amostra de DNA com uma determinada enzima de restrição podem ser separados e identificados por eletroforese. ELETROFORESE Eletroforese é um termo geral que se refere à técnica de separação ou caracterização de moléculas carregadas eletricamente com base em suas taxas específicas de migração em um campo elétrico. O processo é geralmente realizado em uma matriz porosa de modo que as macromoléculas possam migrar diferencialmente de acordo com sua propriedades físicas. 55 Figura 14. Esquema de utilização de uma sonda de DNA marcada com digoxigenina para a detecção de fragmentos complementares. A digoxigenina incorporada na sonda é reconhecida por um anticorpo anti-digoxigenina acoplado a fosfatase alcalina. Figura 15. Detecção da mutação no gene da anemia falciforme mediante o uso de enzimas de restrição e da técnica de Southern blotting. 56 A REAÇÃO EM CADEIA DA POLIMERASE (PCR) Paulo A Otto, Regina Célia Mingroni, Ângela Maria Vianna Morgante 2006 – Princípios de Genética Humana e Médica. Em: Tratado de Clínica Médica , Amato Carlos Lopes Editor. Editora Roca Ltda. Uma técnica cuja introdução acarretou uma avalanche de inovações na área da genética molecular foi a chamada reação em cadeia da polimerase (PCR – Polymerase Chain Reaction), desenvolvida na década de 1980. A PCR consiste em uma sucessão de reações de replicação de uma molécula de DNA, realizada em tubo de ensaio. Parte-se de uma amostra de DNA-alvo, por exemplo, uma certa amostra de DNAS genômico de um indivíduo. São fornecidos os reagentes necessários à replicação do DNA, que incluem os quatro tipos de nucleotídeos na forma trifosfatada, íons e um par de iniciadores de reação (primers), que são oligonucleotídeos cujas seqüências de bases são complementares às seqüências de bases que flanqueiam o segmento de DNA que se deseja amplificar por meio da PCR. A necessidade de um par de iniciadores da reação decorre de uma peculiaridade do próprio mecanismo de replicação do DNA in vivo: as polimerases que replicam o DNA são incapazes de iniciar a síntese de uma nova cadeia a partir da cadeia molde; só são capazes de alongar uma cadeia de ácido nucléico pré-existente, que lhe fornece uma extremidade 3’ livre na qual serão adicionados os novos nucleotídeos trifosfatados. Na célula viva, os iniciadores (primers) são adicionados, nucleotídeo a nucleotídeo, por uma RNA polimerase e constituídos por ribonucleotídeos. Na reação da PCR, os primers são sintetizados artificialmente e se constituem de curtos segmentos de 15 a 23 desoxirribonucleotídeos. As seqüências de bases dos primers são definidas em função de sua complementaridade com a seqüência de bases que flanqueia o segmento de DNA que se deseja amplificar. Após sucessivos ciclos de desnaturação do DNA (por aquecimento da amostra), hibridação dos primers (com o resfriamento da amostra) e extensão dos fragmentos pela DNA polimerase (a temperatura de cerca de 72o Nem todo o DNA genômico é amplificado, mas apenas o segmento de DNA compreendido entre o local de hibridação de ambos os primers é amplificado. De maneira análoga ao que ocorre na técnica de Southern blotting, a PCR permite evidenciar, dentre uma coleção de fragmentos de DNA do genoma de um indivíduo, apenas um pequeno trecho. As vantagens dessa técnica são numeras: pequenas quantidades de DNA podem ser analisadas e o resultado costuma ser obtido muito mais rapidamente do que na técnica de Southern. No entanto, o planejamento dos primers da PCR requer prévio da seqüência de bases do DNA- alvo que se deseja amplificar. A PCR, sem dúvida, revolucionou os diagnósticos laboratoriais com base no estudo do DNA e permitiu avançar muito também no que diz respeito ao diagnóstico pré-natal e à identificação individual, com ênfase em questões forenses. C, a alíquota de DNA inicial é amplificada milhares de vezes, como mostrado na Figura 16). Se um indivíduo for portador de uma substituição de bases em um certo gene que altera o local de corte de uma enzima de restrição, o produto obtido pela PCR de um segmento desse gene pode ser clivado com a enzima. A análise dos fragmentos obtidos pode mostrar a presença dessa substituição. De maneira análoga ao blotting, o tamanho do fragmento amplificado pode indicar uma deleção ou uma inserção de bases. A ausência completa de amplificação de um fragmento revela a deleção completa da região do gene que está contida entre os dois primers. 57 Figura 16. Esquema mostrando como funciona a técnica da PCR. 60 A Tabela 3 mostra os casamentos possíveis com as freqüências esperadas dos diversos tipos nas respectivas proles em relação a essas duas situações. Tabela 3 – Resultados possíveis em casamentos envolvendo locos ligados ao X bialélicos, com e sem dominância. No caso de genes do cromossomo X é importante lembrar-se que, dos dois cromossomos X de uma célula diplóide de uma mulher qualquer, apenas um está geneticamente ativo, com todos os seus genes funcionando normalmente; o outro encontra-se inativado, com apenas uns poucos locos ativos. Essa inativação do cromossomo X em células femininas tem início nas primeiras fases de segmentação do embrião, completando-se entre a segunda e a terceira semanas da vida embrionária em humanos (fase em que o blastocisto está se aninhando na mucosa uterina, ocasião em que conta com cerca de 1000 a 2000 células). Um dos dois cromossomos X da mulher (o de origem materna ou o de origem paterna), ao acaso, sofre um processo de condensação numa célula que até então apresentava os dois cromossomos X com todos os seus locos ativos; todas as células descendentes dessa célula, no entanto, terão sempre o mesmo X inativado. Esse processo ("teoria de Lyon") recebe o nome de lyonização em homenagem à sua descobridora, a cientista inglesa Mary Lyon. O resultado disso é um fenômeno conhecido como compensação de dose: inativando aleatoriamente um dos cromossomos X nas células femininas, em média a quantidade de produto do gene de cada loco do X será a mesmo tanto em machos como em fêmeas. Outra conseqüência disso é que, devido a pequenos desvios naturais da taxa esperada de inativação ao acaso (segundo a qual se espera que cerca de metade dos X inativados sejam os de origem materna), as mulheres apresentam uma maior variabilidade que os homens na expressão fenotípica dos genes ligados ao X. Na herança dita quantitativa, o fenótipo do indivíduo vai depender da interação de diversos pares de genes situados em locos que segregam independentemente nos diversos cromossomos. Existem vários modelos de herança quantitativa; no mais comumente citado, a característica depende da interação de um número relativamente grande de genes distribuídos nos vários cromossomos e cada um deles tendo efeito aditivo relativamente pequeno; num outro modelo, o fenótipo resultaria de interações complexas entre genes de efeito marcante localizados num número restrito de locos. Existem provavelmente ainda sistemas que se comportam como híbridos desses dois, albergando ao mesmo tempo genes de pequeno efeito aditivo, situados em vários locos, ao lado de outros (em quantidade restrita) com efeito mais marcante ("genes principais"). Todos os três modelos admitem, ainda, a intervenção de fatores ambientais na expressão fenotípica das características quantitativas, tanto assim que esses modelos comumente são referidos como multifatoriais, resultando da ação conjunto de sistemas poligênicos e de fatores ambientais (entendendo-se como tal todos os fatores que não são genéticos). A intervenção destes últimos em características como o peso e a altura é óbvia. Vários autores ainda se preocuparam em elaborar índices que medem a participação relativa de fatores ambientais e genéticos na determinação dessas características. Um desses índices é a taxa de herdabilidade, que tenta determinar a proporção de variabilidade fenotípica 61 de uma característica atribuível a fatores genéticos. Na verdade, a influência não se limita às características multifatoriais discutidas acima. Nosso fenótipo, de uma maneira geral, resulta da interação entre o genótipo e o ambiente. Isso é claramente exemplificado no caso da fenilcetonúria: para apresentar a doença, um indivíduo precisa, além do genótipo recessivo, ingerir fenilalanina em sua dieta. A maioria dos conceitos acima são diretamente aplicáveis a características fenotípicas normais, freqüentes na população. Quando essas características são condições patológicas (defeitos isolados, doenças, síndromes, seqüências, associações ou complexos malformativos), o primeiro problema que tem lugar é que elas são extremamente raras na população, tipicamente cada uma delas ocorrendo com freqüências da ordem de 1/10.000 ou menos; as exceções são dadas geralmente por uma ou outra condição excepcionalmente mais freqüente em alguns grupos étnicos, como é o caso da fibrose cística em populações de extração nórdica, da doença de Tay-Sachs em judeus de extração asquenazi e da anemia falciforme entre indivíduos de origem africana. Essa raridade é explicada pelo fato de que qualquer característica genética só pode ser difundido na população através de mutações, que ocorrem espontanemente com freqüências insolitamente baixas, ou através de portadores do gene mutante, que o transmitem a seus descendentes; como a característica é patológica, redunda direta ou indiretamente na diminuição da probabilidade de reprodução de seus portadores, de modo que se não fosse pelas mutações (que são capazes de manterem os genes mutantes patológicos apenas em freqüências muito baixas) os genes patológicos desapareceriam totalmente das populações, uma vez que os portadores de alelos normais desses genes possuem uma eficiência reprodutiva maior que os afetados, então submetidos aos efeitos da seleção natural. Apenas os genes autossômicos alterados que são totalmente recessivos podem se acumular na população em heterozigotos assintomáticos, que vão se tornando cada vez mais freqüentes; com isso, acaba ficando provável a formação de um casal de heterozigotos. Um filho homozigoto recessivo desses casais (que nasce com probabilidade de 25%) vai ser afetado e portanto objeto de seleção natural, o que vai impedir que o gene continue a aumentar de freqüência na população. 62 Principais características das doenças condicionadas por mecanismo autossômico dominante Em relação a doenças condicionadas por genes autossômicos dominantes, os afetados são heterozigotos; apenas em duas (das cerca de três mil com esse mecanismo confirmado ou provável) dessas doenças conhece-se o fenótipo dos homozigotos quanto ao alelo que causa a doença, os quais ocorreram devido a circunstâncias excepcionais: na acondroplasia, onde o fenótipo (nanismo) favoreceu a formação de casais de afetados heterozigotos, e na hipercolesterolemia familial, onde afetados heterozigotos (tipicamente com história de acidentes vasculares na terceira ou quarta décadas de vida) ocorrem com freqüência relativamente alta na população (da ordem de 1/500); do casamento ao acaso entre alguns desses heterozigotos (com chance de 1/500 x 1/500 = 1/250.000) nasceram alguns afetados homozigotos (com 1/4 da chance anterior, ou seja 1/1.000.000), portadores de quadros gravíssimos de ateroesclerose generalizada e acidentes vasculares ocorrendo em média já antes da puberdade. De certa forma, é como se a forma grave fosse determinada por mecanismo autossômico recessivo, se se considerar que os afetados heterozigotos estão praticamente isentos de seleção natural, uma vez que a doença neles se manifesta tardiamente. Fora essas exceções, no entanto, não se conhece o fenótipo correspondente aos homozigotos e a dominância foi definida condicionalmente ("dominância condicional"), baseada no fato de que os heterozigotos Aa manifestam uma doença e no fato de que de casamentos entre pessoas afetadas e normais em média nascem crianças normais e afetadas em proporções aproximadamente iguais, o que coincide com o esperado teórico de cruzamentos Aa x aa = 1/2 Aa: 1/2 aa. No entanto é provável, como foi verificado nos casos da acondroplasia e da hipercolesterolemia familial, que o fenótipo correspondente aos homozigotos seja sempre diferente e muito mais grave (provavelmente letal) que o dos heterozigotos. Quatro fenômenos importantes observados na herança autossômica dominante de caracteres patológicos são a ocorrência natural de casos devidos a mutação nova, a penetrância incompleta, a expressividade variável e a antecipação clínica. Devido ao fato de ocorrerem na população com freqüência insolitamente baixa (geralmente da ordem de 1/10.000 ou menos) freqüentemente os casos de doença autossômica dominante são isolados, resultando de mutações novas (quando se tiver certeza de que isso realmente ocorreu, o termo mais adequado para tais casos é o de esporádicos). Por isso não causa estranheza o fato de uma parte considerável dos casos dessas doenças serem esporádicos e o fato de, mesmo entre casos familiais, geralmente se poder localizar o primeiro afetado resultante de mutação nova. Outra característica freqüente nas característica patológicas autossômicas dominantes é a penetrância incompleta: tipicamente uma fração dos heterozigotos quanto a esses genes não apresenta manifestações fenotípicas detectáveis. Quando isso acontece, diz-se que a característica não penetrou. Entendendo-se por taxa de penetrância a probabilidade de um genótipo manifestar-se fenotipicamente. Em muitas doenças autossômicas dominantes a taxa de penetrância é alta, porém incompleta. Isso significa na prática que apenas uma percentagem dos heterozigotos (representada pela taxa de penetrância K) manifesta sinais e sintomas característicos da doença ou defeito. Por exemplo, no retinoblastoma bilateral, onde o genótipo dos afetados é Rr, a probabilidade de um indivíduo que herdou o gene mutante apresentar o tumor da retina entre o nascimento e no máximo seis anos de idade (cerca de 80 a 90%) depende de haver acontecido um segundo evento mutacional inativando o alelo normal r, um gene supressor de tumor, em pelo menos um dos cerca de um milhão de retinoblastos do embrião. Nesse caso, a falta de penetrância tem lugar quando não ocorre esse segundo evento mutacional em estágio embrionário, o que acontece com probabilidade de 10 a 20%. Outro conceito importante em genética médica é a expressividade, que pode ser definida no caso das doenças autossômicas dominantes como o grau de manifestação fenotípica determinado pelo genótipo heterozigoto. A expressividade é tipicamente muito variável na maioria das doenças determinadas por mecanismo autossômico dominante. Isso explica porque o diagnóstico clínico de patologias desse grupo é geralmente difícil, pois alguns afetados apresentam com certa freqüência sinais e sintomas insuficientes (às vezes ausentes, 65 alterações neurológicas, atrofia óptica, diabetes e surdez. Acredita-se que esses sinais e sintomas ocorram nas doenças de herança mitocondrial porque a maioria das mutações já descrita afeta a eficácia do mecanismo de fosforilação oxidativa e, portanto, a produção de ATP. Tecidos com elevadas demandas de ATP ou que são submetidos a alterações muito rápidas da demanda de ATP seriam os primordialmente afetados pelas mutações que alteram o DNA mitocondrial. O fenômeno da expressividade variável dos quadros clínicos é notável nas genealogias onde segregam as mutações mitocondriais. Geralmente, o grau de variabilidade dessa expressividade é muito maior do que o observado em distúrbios semelhantes de herança autossômica dominante. Por exemplo, a surdez hereditária de herança mitocondrial tem um grau de expressividade clínica variável muito maior do que a surdez de herança autossômica dominante. Parte da expressividade variável observada nas doenças de herança mitocondrial tem sido explicada pela observação de, no mesmo indivíduo, e às vezes até mesmo dentro de um mesmo tecido, poderem ocorrer moléculas de DNA mitocondrial com alelos normais apenas, coexistindo com moléculas de DNA mitocondrial mutadas. Esse fenômeno, chamado de heteroplasmia, é freqüente na herança mitocondrial e explica em parte porque órgãos, tecidos, ou mesmo indivíduos da mesma família podem exibir graus da afecção tão distintos. No entanto, mesmo nas famílias onde segregam doenças mitocondriais para as quais a heteroplasmia é rara ou excepcional, ocorre também expressividade variável dos sinais e sintomas. Fatores ambientais, como por exemplo, a história de estresse oxidativo, o uso de medicamentos e o estilo de vida do indivíduo podem influenciar a gravidade das manifestações. Outro fator também capaz de influenciar o quadro clínico seria a variabilidade genética presente em diversos outros locos do genoma nuclear, cuja função também é codificar produtos gênicos que atuam nas mitocôndrias. Principais características das doenças condicionadas por mecanismo multifatorial No mecanismo conhecido como multifatorial, o fenótipo dos indivíduos resulta da ação integrada de genes situados em vários locos espalhados pelos diversos cromossomos (mecanismo poligênico) e de sua interação com fatores não-genéticos comumente referidos como ambientais. A maioria dos defeitos e malformações presentes ao nascimento é determinada por esse tipo de mecanismo. São exemplos típicos o lábio leporino (com ou sem palato fendido), os defeitos de fechamento de tubo neural (as espinhas bífidas, as meningomieloceles e a anencefalias), os diversos tipos de pé torto congênito, a estenose hipertrófica do piloro e a luxação congênita do quadril. Apenas esses defeitos contribuem com um total de afetados ao nascimento de quase 1%. Também são condicionadas por esse tipo de mecanismo doenças comuns na população, geralmente nos grupos etários um pouco mais avançados, como a úlcera péptica gastro-duodenal, a epilepsia, a hipertensão arterial, muitos casos de diabetes mellitus do adulto e os transtornos do humor. Contrariamente aos defeitos deteminados por mecanismo monogênico, que tipicamente são raros na população e possuem risco de repetição elevado quando de ocorrência familial, os defeitos multifatoriais são relativamente freqüentes na população (taxas da ordem de 1/1000 ou mais) e possuem risco de repetição pequeno ou desprezível (tipicamente da ordem de 5% ou menos). Outra diferença sutil é o limiar de manifestação, aqui representado por uma carga de alelos deletérios no sistema poligênico, como mostrado no esquema da Figura 9, que mostra a distribuição hipotética, numa população, de todos os genótipos possíveis quanto ao sistema poligênico associado a um determinado defeito multifatorial. A freqüência populacional da doença está indicada pela área escurecida: se essa área corresponder, por exemplo, a 1/1000 da área total da função distribuição dos genótipos, isso significa que a freqüência do defeito é 1/1000. ANÁLISE DE HEREDOGRAMAS Os heredogramas representados nas Figuras 17, 18, 19, 21 e 22 são típicos dos quatro possíveis mecanismos de herança monogênica: autossômico dominante (com penetrância completa ou incompleta), autossômico recessivo, ligado ao X recessivo ou dominante. Na 66 figura 16, apresentamos o mecanismo de herança mitocondrial. Em todos esses heredogramas, os símbolos escurecidos representam indivíduos afetados por uma doença hereditária; a exceção é dada pelos símbolos escurecidos de tamanho menor, que indicam insucessos reprodutivos (abortos ou óbitos fetais). Os quadrados representam indivíduos de sexo masculino e os círculos indivíduos de sexo feminino; indivíduos com sexo desconhecido ou não pertinente ao problema são representados por losangos. As gerações são denotadas por algarismos romanos (I, II, III, IV etc., da mais antiga à mais recente) e os indivíduos de cada geração por algarismos arábicos. Com finalidade apenas de facilitar a leitura do texto, inserimos nos símbolos que representam os diferentes indivíduos os genótipos a eles correspondentes. É preciso ter sempre presente o fato de que as doenças hereditárias, com raras exceções, ocorrem na população com freqüências insolitamente baixas, geralmente da ordem de grandeza de 1/10.000 ou menos. Disso resulta que os afetados por doenças autossômicas dominantes são via de regra heterozigotos. No caso de doenças ligadas ao cromossomo X, tanto recessivas quanto dominantes, as mulheres que transmitem o gene são sempre heterozigotas; os poucos casos de mulheres homozigotas quanto a genes recessivos deletérios ligados ao cromossomo X surgiram de casamentos consangüíneos entre heterozigotas e primos afetados hemizigotos, tendo ambos recebido o gene responsável pelo defeito de sua avó comum heterozigota. No caso de doenças autossômicas recessivas os afetados são homozigotos com genitores heterozigotos; apesar de a freqüência de heterozigotos para esses genes ser relativamente alta na população (freqüência de 2% no caso de doenças que ocorrem na população na freqüência de 1/10.000), para nascer um afetado é preciso que os dois genitores sejam heterozigotos (probabilidade 2% x 2% = 4/10.000) e que ambos transmitam o gene deletério para a prole (probabilidade 1/2 x 1/2 = 1/4), o que resulta na freqüência populacional de afetados 4/10.000 x 1/4 = 1/10.000); vê-se assim que numa família qualquer com afetados deve ocorrer somente um casamento entre dois heterozigotos (os genitores do afetado) e que dificilmente ocorrerão heterozigotos fora do ramo da família que contém os afetados (que também, pelo raciocínio desenvolvido mais acima, ocorrerão em apenas uma irmandade); violações a essas regras somente são encontradas em casos de famílias com casamentos consangüíneos (que tipicamente são encontrados com maior freqüência entre os progenitores de afetados, por favorecerem o encontro de duas pessoas heterozigotas quanto a um mesmo gene patológico herdado de um ascendente comum delas) ou no caso de algumas doenças sabidamente freqüentes em alguns grupos populacionais, como é o caso da anemia falciforme na África equatorial e da fibrose cística entre nórdicos. Heredograma 1: herança autossômica dominante No heredograma da Figura 17, I-1 é afetado e casado com I-2. Os filhos do casal são cinco (II-1 a II-5), sendo que II-2, II-4 e II-5 são afetados. II-5 (afetado) casou-se com II-6 (pertencente a uma irmandade de 6 indivíduos, dois dos quais constituem um par de gêmeos dizigóticos (II-10 e II-11); nessa irmandade uma gestação terminou em aborto de sexo não determinado (provavelmente porque foi muito precoce, de cerca de dois meses de idade gestacional). Do casal II-5/II-6 nasceram cinco crianças, duas das quais (III-3 e III-5) são afetadas. A menina III-3 é a propósita (ou caso índice); o propósito é o primeiro indivíduo estudado da família, geralmente afetado, que motiva o levantamento do heredograma; sempre é assinalado por uma seta. Figura 17 - Heredograma típico de uma doença, rara na população, determinada por mecanismo autossômico dominante com penetrância completa. 67 O padrão de transmissão da doença nessa família representada na figura é claramente autossômico dominante, pois existem afetados em todas as gerações e os afetados pertencem aos dois sexos. Fica claro também, como detalharemos mais abaixo, que os afetados são heterozigotos, pois aqueles que se reproduziram tiveram crianças normais e afetadas. O mecanismo de herança ligado ao X é excluído com certeza absoluta devido ao fato de ocorrerem duas transmissões da doença de pai afetado para filho de sexo masculino. A herança autossômica recessiva é afastada, pois as mulheres I-2 e II-6, nessa hipótese, precisariam ser ambas heterozigotas; não sendo aparentadas biologicamente de seus maridos (homozigotos recessivos na hipótese de herança autossômica recessiva), a chance disso ocorrer é muito baixa, uma vez que todas as doenças aqui apresentadas são raras na população. Todos os indivíduos representados por símbolos escurecidos são heterozigotos Aa (em que A é o gene que determina a doença e a o seu alelo normal), pois homozigotos AA ocorrem em situações muito excepcionais: por exemplo, na acondroplasia, resultantes de casamentos entre dois heterozigotos afetados; conhecem-se menos de 10 casos de prole afetada AA desses casamentos e os defeitos ósseos são gravíssimos, com a maioria dos afetados falecendo durante os dois ou três primeiros anos de vida; em outras doenças a chance do casamento dependeria do encontro casual de dois afetados, cada um deles ocorrendo numa freqüência da ordem de 1/10.000 ou menos. Se se trata de doença determinada por gene autossômico dominante de penetrância completa (indicando que todos os seus portadores apresentam o fenótipo completo ou incompleto que caracteriza a doença), todos os indivíduos da genealogia representados por símbolos claros são aa. Em heredogramas como esse, típicos de doença autossômica dominante, é comum a doença aparecer pela primeira vez num indivíduo que é filho de genitores normais, por efeito de mutação nova. No heredograma que estamos analisando, por exemplo, o indivíduo I-1 tinha genitores normais e é com probabilidade alta (com certeza caso a penetrância seja completa) o primeiro indivíduo portador do gene mutante A na família. O risco de repetição da doença numa criança que tanto o casal I-1/I-2 como o casal II- 5/II-6 venham a ter é estimado em 50% ou 1/2, pois para a doença se manifestar num indivíduo qualquer, basta que ele receba de seu progenitor afetado heterozigoto o gene A. Este também será o risco de recorrência da doença na prole dos afetados II-2, II-4, II-5, III-3 e III-5, caso eles venham a se casar (como acontece geralmente) com pessoas normais não aparentadas. O risco para a prole de todos os indivíduos normais da genealogia (incluindo o casal já constituído I-3/I-4) é desprezível, da ordem de grandeza de zero. Heredograma 2: herança autossômica dominante com penetrância O heredograma da figura 18 abaixo mostra a segregação de uma doença autossômica dominante de penetrância incompleta, pois um dos membros do casal I-1/I-2 e o indivíduo II-5, todos fenotipicamente normais, são na verdade heterozigotos Aa, uma vez que tiveram filhos normais e afetados. O casal I-3/I-4 e todos os seus filhos são aa, da mesma maneira que um dos membros do casal I-1/I-2; todos os filhos normais dos casais I-1/I-2 e II-5/II-6, no entanto, podem ser aa ou Aa não penetrantes. Figura 18 - Heredograma típico de uma doença, rara na população, determinada por mecanismo autossômico dominante com penetrância incompleta. 70 O heredograma ilustra um caso típico de herança recessiva ligada ao cromossomo X, como é o caso da distrofia muscular progressiva tipo Duchenne. O mecanismo autossômico recessivo pode ser afastado usando-se a mesma argumentação do caso da primeira genealogia. A herança dominante com penetrância incompleta não pode ser afastada, mas é muito pouco provável, pois para explicar-se a configuração da genealogia baseando-se nesse mecanismo seria preciso que os dois heterozigotos não penetrantes fossem mulheres (I-4 e II-6) e que os quatro afetados fossem homens; a chance combinada disso vale (1-K)2.(1/2)6 < 1/1.000 para um valor da taxa de penetrância K = 0,8. Como na hipótese de mecanismo recessivo ligado ao cromossomo X a probabilidade da configuração é 1 (ou seja, tem que acontecer exatamente o que aconteceu, ou seja, os quatro afetados têm que ser homens e todos eles aparentados entre si através das duas mulheres heterozigotas), chega-se a conclusão que o mecanismo recessivo ligado ao X é pelo menos 1.000 vezes mais provável que o autossômico dominante com penetrância incompleta. Como se nota da análise do heredograma, apenas indivíduos de sexo masculino são afetados. Excepcionalmente, mulheres heterozigotas podem apresentar manifestações da doença, geralmente sob forma bem mais branda que a apresentada em média pelos homens hemizigotos afetados, como já se observou inúmeras vezes na hemofilia por deficiência do fator VIII ou mais raramente na própria distrofia muscular de Duchenne. Evidentemente isso é possível desde que exista um desvio significativo no processo de lyonização e a mulher tenha inativado na maioria de suas células o cromossomo X contendo o alelo normal. A análise do heredograma mostra ainda que todos os afetados são aparentados entre si através das mulheres I-4 e II-6, que são heterozigotas obrigatórias quanto ao gene que produz a doença. Outro detalhe interessante notado na genealogia e que não deixa dúvidas quanto ao mecanismo de transmissão do traço patológico é o fato de que a mulher II-6 casou-se em duas ocasiões com indivíduos não aparentados, e de ambos os casamentos originaram-se afetados. Outra característica importante, que não se aplica ao caso da distrofia muscular de Duchenne e a outras condições letais ligadas ao cromossomo X, em que os afetados não conseguem reproduzir-se, é que a prole dos afetados é normal. Um ponto importante a se considerar é que se ocorrer transmissão de homem afetado para filho de sexo masculino afetado, fica excluída a possibilidade do mecanismo ligado ao X, tanto dominante como recessivo. Chamando-se Xc o gene que em hemizigose determina a doença recessiva ligada ao X, vem que o genótipo dos afetados II-7, III-2, III-4 e III-6 é Xc. O casal I-1/I-2 e todos os seus filhos (II-1 a II-5) são hemizigotos XC (se homens) ou homozigotas XCXC (se mulheres). As mulheres heterozigotas certas (genótipo XCXc) são, conforme já mencionado, I-4 e II-6. A afirmação quanto a esta última não deixa dúvidas e no caso de I-4, apesar de ela ter tido apenas um filho afetado, teve, através de II-6, três netos igualmente acometidos. As demais mulheres que ocorrem na genealogia (II-8, III-1 e III-3) são heterozigotas prováveis, uma vez que são todas filhas de heterozigotas certas, cada uma com probabilidade de 50% favorecendo a hipótese de heterozigose. Todos os homens assinalados por símbolos claros, sejam parentes em primeiro grau de afetados ou não, são hemizigotos quanto ao gene normal (genótipo XC). Da mesma maneira que na situação anterior, calcularemos em seguida o risco de repetição da doença na prole de todos os indivíduos da genealogia representada na Figura 14. Os riscos de criança afetada na prole dos casais I-3/I-4, II-5/II-6 e II-6/II-10 são de 25% ou 1/4, uma vez que nessas situações as genitoras são heterozigotas e para nascer uma criança afetada é preciso que herde o cromossomo Y do pai (probabilidade 1/2) e o cromossomo X com o alelo responsável pela doença da genitora heterozigota (também com probabilidade 1/2). O risco final é obtido multiplicando-se essas duas probabilidades: R = 1/2 x 1/2 = 1/4 ou 25%. O risco de criança afetada na prole de todos os afetados, desde que eles não venham a se casar com mulheres aparentadas ou pertencentes a famílias com casos da mesma doença, é da ordem de grandeza de zero (ou seja, para nascer um menino afetado seria necessário que ocorresse mutação nova no cromossomo X recebido da mãe). É importante lembrar que, embore o afetado não transmita o gene deletério a nenhum dos filhos homens que tiver, todas as suas filhas serão heterozigotas certas, com risco de afecção para a sua futura prole estimado em 1/4 ou 25%. O risco de descendência afetada é nulo para o casal I-1/I-2, para os seus filhos II-1 a II-4 e para todos os demais indivíduos de sexo masculino assinalados por símbolos claros ainda não mencionados (II-9 e III-5). Quanto ao risco de prole afetada para as mulheres heterozigotas prováveis II-8, III-1 e III-3, é estimado em R = 1/2 x 1/4 = 1/8 ou 12,5%, 71 uma vez que cada uma delas tem probabilidade de ser heterozigota igual a 1/2 ou 50%. Heredograma 5: herança dominante ligada ao cromossomo X A figura 22 ilustra um caso típico de transmissão de uma doença dominante ligada ao X, mecanismo relativamente raro no conjunto das doenças genéticas monogênicas. Como no modo de transmissão autossômico correspondente, ocorrem afetados em todas as gerações. Nota-se que mulheres heterozigotas XDXd afetadas têm filhos XD e filhas XDXd afetados com probabilidades iguais (25%), enquanto os homens hemizigotos afetados XD não transmitem o defeito para nenhum de seus filhos, enquanto todas as suas filhas são necessariamente heterozigotas XDXd afetadas. Nota-se também que a configuração do heredograma poderia acontecer sob hipótese de doença autossômica dominante. Sob essa hipótese, a probabilidade de ocorrência de 5 afetados de sexo feminino e de 5 meninos normais na prole de II-6, na ordem mostrada, toma valor (1/2)10 = 1/1024; sob hipótese de mecanismo ligado ao X dominante, no entanto, essa ocorrência seria a única possível (com probabilidade 1). A probabilidade favorecendo esta última hipótese é, portanto, no caso, cerca de 1.000 vezes maior que a outra. Inversamente, caso tivesse sido observado apenas um caso de transmissão do defeito de pai para filho ou se pelo menos uma das filhas do afetado fosse normal, a hipótese de mecanismo dominante ligado ao X seria afastada. Determinemos agora os genótipos de todas as pessoas representadas no heredograma, sob a hipótese de herança dominante ligada ao X, agora bem fundamentada. Todos os indivíduos representados por símbolos claros são hemizigotos Xd ou homozigotas XdXd normais, enquanto os hemizigotos afetados (símbolos escurecidos) possuem genótipo XD e as heterozigotas afetadas (representadas por círculos negros) são XDXd. Os riscos para a prole dos indivíduos II-1 a II-4 do casal I-1/I-2 e de todos os indivíduos normais das proles de I-3/I-4, II-5/II-6 e II-6/II-10 são desprezíveis, da ordem de grandeza de zero. O risco de doença na prole de I-3/I-4 (homem Xd x mulher XDXd) é de 1/2 ou 50%, pois esse casal pode ter quatro tipos diferentes de filhos, cada um deles com probabilidade de 25%: XD, Xd, XdXd, XDXd. O risco para as proles de II-5/II-6 e II-6/II-10 também é de 1/2 ou 50%, com a diferença que agora todas as meninas (que vão ocorrer com probabilidade de 50%) serão heterozigotas afetadas XDXd enquanto todos os meninos (que também ocorrerão com probabilidade de 50%) serão hemizigotos Xd normais, uma vez que o cruzamento parental é do tipo homem XD x mulher XdXd. Figura22 - Heredograma típico de uma doença, rara na população, determinada por mecanismo dominante ligado ao cromossomo X. 72 Heredograma 6: herança mitocondrial Nesse mecanismo, exemplificado através do heredograma mostrado na Figura 23, o defeito é condicionado por gene mutante localizado no DNA das mitocôndrias, organelas que provêm do óvulo, sendo portanto transmitidas às crianças de ambos os sexos pela mãe. A inspeção do heredograma mostra claramente que as crianças (meninos e meninas) de mulheres afetadas são igualmente afetadas, contrariamente ao que acontece com a prole de homens afetados, que é sempre normal. A situação é complicada geralmente pela penetrância incompleta e expressividade muito variável do gene que determina a doença ou defeito na prole de mulheres portadoras do DNA mitocondrial mutante, geralmente afetadas. Desse modo, nem todas as crianças dessas mulheres são necessariamente afetadas, como é o caso do indivíduo III-10 da genealogia acima; a distinção importante em relação à herança autossômica dominante é que não ocorrem crianças afetadas na prole de homens afetados. A heteroplasmia (presença de cópias de DNA mutante mitocondrial ao lado de cópias normais, em proporções variadas nos diferentes indivíduos) contribui para a expressividade do quadro clínico, que costuma ser muito mais variável do que na herança autossômica dominante. Esse tipo de transmissão vem ganhando importância crescente em genética médica desde que se descobriu que uma fração considerável dos casos de surdez não sindrômica são devidas a mutações de DNA mitocondrial. Outras doenças e síndromes com manifestações metabólicas, neurológicas, musculares e visuais também podem ser causadas por mutações no DNA mitocondrial. Figur23 - Heredograma típico de uma doença, rara na população, determinada por gene mutante localizado no DNA das mitocôndrias. 75 AS BASES CROMOSSÔMICAS DAS DOENÇAS GENÉTICAS Paulo A Otto, Regina Célia Mingroni, Ângela Maria Vianna Morgante 2006 – Princípios de Genética Humana e Médica. Em: Tratado de Clínica Médica , Amato Carlos Lopes Editor. Editora Roca Ltda. A Citogenética estuda a estrutura, a função e a evolução dos cromossomos. A Citogenética Clínica focaliza especialmente as alterações cromossômicas, os mecanismos que as originam e seus efeitos fenotípicos. Seis a sete em cada mil recém-nascidos têm uma alteração cromossômica. Essas alterações constituem a causa genética principal de malformações congênitas e retardo mental e podem estar relacionadas também com esterilidade e infertilidade. Entre os abortamentos espontâneos de primeiro trimestre, 50% têm anormalidades cromossômicas como causa. A comparação entre as freqüências das anormalidades cromossômicas nos abortos e ao nascimento mostra o efeito deletério que elas têm sobre o desenvolvimento, chegando a termo apenas uma pequena fração dos conceptos afetados. Como estudar os cromossomos humanos As células somáticas humanas têm 46 cromossomos, 23 herdados de cada genitor. Vinte e dois pares cromossômicos são semelhantes no homem e na mulher e se denominam autossomos. O par de cromossomos sexuais é formado por dois cromossomos X na mulher e por um cromossomo X e um Y no homem. Quando uma célula se divide, seus cromossomos progressivamente aumentam a condensação e encurtam, o que permite visualizá-los e analisar sua morfologia ao microscópio óptico. Já na célula que não está em divisão, os cromossomos estão muito distendidos e, apesar de cada um manter sua integridade, não permitem a análise morfológica. Assim, para analisar cromossomos são necessárias células em divisão, obtidas a partir de tecidos vivos. Os cromossomos são analisados nas fases de metáfase ou prometáfase da divisão mitótica que dará origem a duas células com número de cromossomos igual ao da célula-mãe. O cromossomo, nessas fases, já está duplicado, consistindo de duas cromátides, unidas pelo centrômero (Figura 25). Cada cromátide é formada por uma molécula de DNA associada a proteínas e esse material é chamado de cromatina. Os exames cromossômicos pós-natais, para diagnóstico de alterações cromossômicas constitutivas, são rotineiramente realizados nos linfócitos do sangue periférico, diante da facilidade de obtenção do material e da relativa simplicidade da técnica de cultivo. Outros tipos de células podem também ser usados, quando a pesquisa de uma determinada alteração exige a extensão da análise, como por exemplo os fibroblastos obtidos de biópsias de pele. No diagnóstico pré-natal, a análise cromossômica é realizada em amniócitos ou em células das vilosidades coriônicas. Para o estudo dos cromossomo dos linfócitos, o sangue é colhido com um anticoagulante, a heparina, e após a sedimentação das hemácias, uma alíquota de plasma com os leucócitos em suspensão é inoculada no meio de cultivo, que contém a fito- hemaglutinina, o agente mitogênico que estimula os linfócitos a dividirem-se. Após cerca de 70 Figura 25 – Os cromossomos metafásicos estão duplicados, formados por duas cromátides unidas no centrômero. De acordo com a posição do centrômero, os cromossomos são classificados em metacêntricos, submetacêntricos e acrocêntricos. Nos braços curtos dos cromossomos acrocêntricos humanos observam-se constrições secundárias (onde estão situados os genes que codificam RNA ribossômico) e, em sua extremidade, massas de cromatina mais condensada, os satélites 76 horas de incubação a 37º C, é grande o número de células em divisão. Para se obterem as metáfase ou prometáfases necessárias à análise, o processo de divisão deve ser interrompido nessas fases. Esse bloqueio é feito utilizando-se substâncias, como a colchicina, que impedem a formação do fuso mitótico, necessário para a separação das cromátides dos cromossomos e sua migração para as células-filhas. Após esse passo, as células são separadas do meio de cultura por centrifugação e tratadas com uma solução hipotônica, para que os cromossomos se espalhem e, assim, possam ser claramente vistos, sem estarem emaranhados uns com os outros. O material é, então, fixado com uma solução de metanol e ácido acético. Pingam-se algumas gotas da suspensão de células em fixador sobre lâminas de microscopia e, após secagem, as preparações estão prontas para serem submetidas aos diversos métodos de coloração dos cromossomos que permitem sua análise ao microscópio. O método de coloração cromossômica rotineiramente utilizado nos exames diagnósticos é o que produz faixas claras e escuras (bandas) ao longo dos cromossomos, permitindo identificar todos os pares: as preparações cromossômicas são tratadas com uma solução de tripsina e coradas com o corante de Giemsa – bandamento G. Para a classificação dos cromossomos levam-se em conta seus tamanhos, posição do centrômero e o padrão das bandas. O conjunto de cromossomos arranjados aos pares é o cariótipo da célula. O termo cariótipo é utilizado também para designar a constituição cromosômica de um indivíduo. Por exemplo, o cariótipo de um homem normal é 46, XY e o de uma mulher, 46, XX. Existem normas que são seguidas internacionalmente para se descreverem os cariótipos normais e alterados (ISCN, An International System for Human Cytogenetics Nomenclature, 1995). Na análise dos cromossomos deve-se cuidar para que o nível de distensão dos cromossomos seja o adequado para se obterem pelo menos 550 bandas no lote haplóide. Cromossomos mais compactados impedem o diagnóstico de muitas alterações estruturais identificáveis pela análise do padrão de bandas G. O poder de resolução da técnica, entretanto, não permite a detecção de alterações que comprometam menos de 5 milhões de pares de bases do DNA e alterações maiores podem passar despercebidas, caso não produzam mudanças no padrão das bandas. Hoje é possível a detecção de alterações menores, utilizando a técnica de hibridação in situ fluorescente (FISH, Fluorescent In Situ Hybridization) na análise cromossômica. Por exemplo, na pesquisa de uma determinada deleção cromossômica, usa-se um segmento de DNA, a sonda, que contém a seqüência de bases do segmento que se supõe deletado. Cópias da sonda são colocadas em contato com as preparações cromossômicas, em condições apropriadas, de modo a que ocorra sua ligação (hibridação) com o segmento exatamente correspondente (homólogo). As sondas são previamente marcadas com um fluorocromo. Pode- se, assim, verificar se o segmento está ou não presente no cromossomo, na análise ao microscópio de fluorescência (Figura 26). Existem sondas disponíveis comercialmente que permitem detectar microdeleções cromossômicas já descritas em associação a quadros clínicos específicos (Figura 27). Outras são homólogas às porções terminais dos cromossomos, sendo utilizadas para detectar diminutas translocações e deleções situadas nas extremidades dos cromossomos. As regiões dos centrômeros de cada cromossomo também são identificáveis e, assim, é possível contar o número de cromossomos de um tipo num núcleo interfásico, portanto na célula que não está em divisão (Figura 28). Conjuntos de sondas correspondentes a toda a extensão de um cromossomo – bibliotecas cromossômicas - podem ser hibridadas simultaneamente, o que permite, por exemplo, identificar segmentos cromossômicos adicionais num cariótipo, cujo padrão de bandas não seja característico. As técnicas de hibridação in situ tornam-se progressivamente mais sofisticadas. O uso de fluorocromos de cores diferentes para marcar as sondas permite analisar vários cromossomos ao mesmo tempo e até mesmo todos os cromossomos podem agora ser analisados simultaneamente, associando-se as combinações de fluorocromos diversos a sistemas de filtros especiais e recursos computacionais (cariotipagem espectral e M-FISH). Uma outra técnica, CGH (Comparatice Genomic Hybridization) evidencia perdas e ganhos de segmentos cromossômicos hibridando, com metáfases normais, o DNA obtido da amostra que se quer testar (marcado para fluorescer em vermelho) juntamente com o DNA de uma amostra de tecido normal (marcado para fluorescer em verde). A análise da fluorescência dos cromossomos é feita por computador: um segmento com 77 Figura 27 – Identificação por FISH de uma microdeleção de um cromossomo do par 17 num paciente com suspeita diagnóstica de neurofibromatose tipo 1: a sonda, correspondente ao segmento deletado, marcou um único cromossomo 17 (fluorescência verde). Nos dois cromossomos 17 também observa-se os sinais de uma outra sonda hibridada ao mesmo tempo, que serviu de controle para a sensibilidade do teste (fluorescência vermelha). Figura 28– Trissomia do cromossomo 18 evidenciada num núcleo interfásico pela hibridação de uma sonda do centrômero desse cromossomo excesso de verde está deletado na amostra teste e aquele com excesso de vermelho está duplicado nela. O estudo de tumores, que costumam apresentar alterações cromosômicas extremamente complexas, é especialmente beneficiado por essas técnicas. Figura 26 – Na hibridação in situ fluorescente (FISH), a sonda marcada com um fluorocromo liga-se ao segmento homólogo no cromossomo metafásico, que assim é evidenciado. No processo, o DNA da sonda e dos cromossomos é desnaturado (separação das cadeias da hélice dupla) e posto em contato, oferecendo-se as condições para que volte à condição de cadeia dupla (renaturação). Quando a cadeia dupla é refeita entre o DNA da sonda e o do cromossomo (hibridação), o segmento do cromossomo pode ser visualizado fluorescente ao microscópio de luz UV. 80 Figura 29– Comportamento dos cromossomos na meiose: a formação de células haplóides – os gametas - a partir de uma célula germinativa diplóide (A). Formação de gametas aneuplóides, devido a não disjunção dos cromossomos X e Y na primeira (B) e na segunda divisão da meiose masculina (C). Figura 30 – Não-disjunção cromossômica pós- zigótica, numa divisão mitótica no início do desenvolvimento, originando um indivíduo com três linhagens celulares: 45,X/47,XXX/46,XX (mosaicismo cromossômico). 81 Um rearranjo cromossômico pode não alterar a informação genética, estando equilibrado sem produzir efeitos clínicos. Quando há perda ou ganho de segmentos, o rearranjo está não-equilibrado e o portador apresenta um quadro clínico caracterizado geralmente por malformações congênitas e retardo mental de graus variáveis. É interessante que rearranjos cromossômicos que se apresentam equilibrados na análise do padrão de bandas G podem estar associados a sinais clínicos. O fato de esses rearranjos serem mais freqüentes entre pessoas afetadas do que na população geral indica que não se trata sempre de simples coincidência. Na verdade, já se demonstrou, em análises mais refinadas por hibridação in situ e do DNA, que as quebras em rearranjos aparentemente equilibrados podem danificar genes, levando a um fenótipo alterado. Esse tipo de alteração está abaixo do poder de resolução da análise cromossômica por bandamento. A Figura 31 mostra alguns tipos de alterações estruturais dos cromossomos humanos. Figura 31 – Alterações cromossômicas estruturais As translocações são rearranjos que consistem em trocas de segmentos entre cromossomos. Entre as crianças com síndrome de Down, por exemplo, uma fração de aproximadamente 4% tem uma trissomia 21 por translocação: possuem dois cromossomos 21 livres e um terceiro translocado para um outro cromossomo (Figura 32). Essas translocações geralmente ocorrem na formação de um dos gametas que originou a criança e não tendem a repetir na irmandade do afetado. Entretanto, um dos genitores pode ser portador da translocação em estado equilibrado e, se este for o caso, há risco aumentado de repetição da síndrome de Down na família. A Figura 32 mostra o que pode ocorrer na meiose de um portador de translocação equilibrada entre os cromossomos 14 e 21: na meiose ocorre normalmente o emparelhamento dos cromossomos homólogos, o que assegura que cada gameta formado receba um representante de cada par. No portador da translocação equilibrada os cromossomos 21 e 14 se emparelham com os homólogos que formam o cromossomo translocado. Quando esses cromossomos vão para os gametas, podem fazê-lo em seis diferentes combinações. Dois tipos de gametas podem originar crianças normais, com cromossomos normais ou com a translocação equilibrada. Os demais gametas vão formar zigotos com alterações cromossômicas, monossomias e trissomias do cromossomo 14 ou do 21. Dessas alterações, a única compatível com o desenvolvimento até o nascimento é a trissomia do 21. Assim, teoricamente, o risco de criança com síndrome de Down na prole do portador é de 1/3. O risco empírico, entretanto, é bem diferente: quando a mãe é a portadora da translocação, o risco é de cerca de 15% e é de menos de 5%, quando o pai é portador. Esse risco menor do que o esperado é em parte explicado pelo abortamento espontâneo de fetos com trissomia 21. A diferença entre os riscos para homens e mulheres portadores pode decorrer de seleção contra os espermatozóides com alterações cromossômicas ou de peculiariedades meióticas que possam estar favorecendo o tipo de segregação dos cromossomos que origina gametas normais. 82 Figura 32 – Os dois cromossomos 21 livres e um terceiro translocado para um cromossomo 14, em uma criança com síndrome de Down. O esquema mostra como o cromossomo translocado se formou. Houve no processo a perda de pequenos segmentos dos dois cromossomos, compreendendo basicamente genes que produzem RNA ribossômico. Como esses genes estão repetidos muitas vezes nos outros cromossomos acrocêntricos, essa perda não traz efeitos clínicos. O fato de a síndrome de Down poder ser causada por uma translocação herdada torna a realização do exame cromossômico dos afetados ou de seus pais necessária, mesmo quando o diagnóstico pode ser firmado com base nos sinais clínicos. O que apresentamos sobre as translocações na síndrome de Down, aplica-se aos rearranjos estruturais em geral. Quando uma alteração estrutural é detectada numa criança, os genitores devem ter seus cromossomos analisados. Se um dos genitores é portador da alteração cromossômica equilibrada, outras pessoas de sua família também podem ser portadoras, com risco aumentado de ter criança com alteração cromossômica. Esses possíveis portadores devem ser identificados e alertados sobre essa possibilidade, estando indicado que se submetam ao exame cromossômico. Uma das indicações indiscutíveis de diagnóstico pré- natal é justamente quando um dos membros do casal tem uma alteração cromossômica equilibrada (Figura 33). Figura 33 – Um portador de translocação equilibrada entre os cromossomos 14 e 21 (A) tem fenótipo normal, possuindo toda a informação genética desses cromossomos necessárias para o desenvolvimento normal. Pode formar, entretanto, gametas com alterações cromossômicas: na meiose, o emparelhamento do cromossomo translocado com os cromossomos 14 e 21 normais (B) leva à formação de seis diferentes tipos de gametas (C). 85 advento das técnicas de PCR, era comum hibridar o DNA dos afetados com sondas de cDNA do gene da distrofina, procurando-se detectar deleções. Uma sonda de cDNA hibrida com vários exons do gene simultaneamente, e a ausência de um sinal de hibridação pode significar uma deleção (Fig. 35). Um tipo muito especial de mutação responsável por doenças foi identificado a partir de 1991. Algumas doenças como a síndrome do cromossomo X frágil, a distrofia miotônica de Steinert e a doença de Huntington são causadas por um mecanismo mutacional peculiar: a expansão anormal de trinucleotídeos repetidos polimórficos. Em outras palavras, uma seqüência de trinucleotídeos (por exemplo, CGG na síndrome do X frágil) pode variar normalmente na população até um certo número de cópias. Acima de um certo número de cópias, podem surgir os sinais clínicos da doença. O mais curioso sobre essas síndromes é que o número de cópias dos trinucleotídeos pode ir aumentando a cada geração, o que acarreta maior gravidade do quadro clínico ou maior risco de prole afetada para os portadores das expansões maiores. No caso da distrofia miotônica e da síndrome do X frágil, em que as expansões acarretam um aumento apreciável no tamanho de um dado fragmento de restrição que abrange as repetições, o diagnóstico das expansões é feito por Southern-blotting seguido de hibridação com sondas radioativas, como apresentado na figura 36. USO DE MARCADORES MOLECULARES EM ESTUDOS DE LIGAÇÃO: GENE DA DOENÇA AINDA NÃO IDENTIFICADO Em muitas das doenças hereditárias atualmente em investigação, ainda não foi possível identificar o gene responsável. Em outras, o gene já foi identificado, mas existe uma enorme variedade de tipos de mutações diferentes que afetam o mesmo gene, tornando a análise da mutação inviável através de um único método de diagnóstico. Nesses casos, somente métodos sofisticados de detecção de mutação ou o seqüenciamento dos éxons do gene da doença nos afetados poderiam ser usados para identificar cada tipo de mutação. Nesses casos e nos casos das doenças com genes ainda não identificados, é possível usar os RFLPs (restriction fragment length polymorphisms) como ferramenta indireta de aconselhamento genético. Como já dissemos, os RFLPs representam diferenças em sítios de restrição que ocorrem como polimorfismos na população em geral. Essas pequenas variações na seqüência de bases do DNA responsáveis pelos RFLPs não acarretam efeitos fenotípicos e não são responsáveis pela doença em si. Contudo, se localizados muito próximos ao gene da doença em estudo, servem como indicadores indiretos da segregação da mutação que causa a doença. Portanto, para usar um RFLP em aconselhamento genético, é necessário saber previamente que o marcador escolhido localiza-se próximo ao gene da doença, existindo uma baixa probabilidade de ocorrer permutação entre eles. Essa informação é obtida através de estudos de ligação prévios entre o marcador e o gene da doença, realizados a partir de várias famílias. Na figura 4, podemos observar como um RFLP permite concluir quais são os prováveis indivíduos portadores de um gene mutado na genealogia, em que segrega uma doença de herança ligada ao cromossomo X. Convém lembrar, porém, que este método não representa um método de detecção direta da mutação e que tem suas limitações. Primeiramente, devem ser estudados vários indivíduos da mesma família para que se obtenham resultados conclusivos. Ainda, os indivíduos portadores certos da mutação devem ser informativos, ou seja, heterozigotos em relação aos marcadores selecionados. Se isto não ocorrer, deve se procurar um outro marcador molecular para o qual a família seja informativa. Leva-se em conta também no aconselhamento genético a probabilidade, ainda que pequena, de que ocorra um evento de recombinação entre os marcadores e o gene da doença, levando a uma interpretação errada dos resultados. Mesmo com estas limitações, esta metodologia é muito usada e resultados com confiabilidade de 95% ou mais podem ser oferecidos às famílias que buscam aconselhamento genético. 86 Figura 34. Detecção direta da mutação da cadeia β da hemoglobina através de digestão com enzima de restrição e Southern blotting. (a) A troca de bases (A por T) destrói o sítio de reconhecimento de várias enzimas de restrição, incluindo Mst II. (b) Esta enzima corta o gene da globina normal, originando um fragmento de 1,1kb e outro de 0,2 kb, detectáveis através da hibridação com uma sonda da região 5’ do gene da β-globina. c) Diagnóstico pré-natal da anemia falciforme utilizando o polimorfismo de Mst II. A mãe (M) e o pai (F) são portadores do alelo que causa a siclemia pois têm dois fragmentos, 1,1kb e 1,3kb. O filho normal (C) é homozigoto em relação ao alelo normal de 1,1kb. O feto herdou um alelo mutado de cada um dos pais e será afetado pela siclemia. Figura 35. Identificação de deleções na distrofia muscular Duchenne utilizando sondas de cDNA. O DNA de meninos com DMD (pistas de 1 a 4A) e seus irmãos normais (pistas de 1 a 4B) foi digerido com a enzima Taq I e hibridado com uma sonda de cDNA que detecta sete exons no DNA dos indivíduos normais (i a vii). Os meninos afetados têm diversas deleções e o paciente 4A apresenta um fragmento de tamanho anormal, além de outros exons deletados. A primeira pista indica o marcador de peso molecular. 87 Da mesma forma que os RFLPs, existem outros tipos de seqüências polimórficas dispersas no genoma humano, igualmente úteis no mapeamento de genes que causam doenças e no aconselhamento genético. São os chamados VNTRs (variable number of tandem repeats) ou minissatélites. Esses polimorfismos consistem em repetições presentes em número Figura 36. Detecção da mutação do loco FMR-1 causadora da síndrome do cromossomo X frágil. (N) é um homem normal, sem nenhuma expansão de trinucleotídeos no loco FMR-1; (TN) é um homem portador de uma pequena expansão naquele loco, a qual não tem efeitos fenotípicos; nesse caso, diz-se que o indivíduo é portador da pré-mutação. (A) é um homem afetado pela síndrome, apresentando retardo mental; ele é portador de uma enorme expansão no loco FMR-1, ou seja, da mutação completa. Figura 37. Herança codominante de um RFLP mapeado no cromossomo X humano. Os alelos 1 e 2 diferem pela presença de um sítio de restrição para a enzima Eco RI (E). Note que, nesta família, o alelo 2 segrega com a mutação que causa doença, enquanto que o alelo 1 aparece no indivíduo do sexo masculino que não herdou a doença da mãe. Note também que a presença do alelo 2 nas irmãs dos afetados permitiu a conclusão de que estas mulheres são heterozigotas quanto ao gene da doença. 90 A segunda vantagem é que a detecção dos produ-tos da amplificação é muito mais simples do que os procedimentos baseados no Southern-blotting, pois a análise dos resultados dispensa, na maioria dos casos, o uso de sondas. Quando consideramos que muitos dos diagnósticos de doenças são feitos com base em sondas marcadas radioativamente, dispensar a radiação do processo é altamente desejável em termos práticos. Os produtos da amplificação podem ser analisados diretamente após eletroforese em gel de agarose, ou, dependendo do tamanho dos produtos amplificados, após eletroforese em gel de acrilamida. A terceira vantagem reside no tempo gasto pelos exames baseados na PCR: algumas horas de amplificação são seguidas por mais algumas horas de eletroforese e os produtos já são analisados. É possível fornecer um resultado em menos de 48 horas, o que é altamente desejável, principalmente em casos de diagnóstico pré-natal. Em contrapartida, um método baseado em Southern-blotting requer no mínimo uma semana até o resultado final. Em último lugar, a especificidade da reação permite que várias seqüências possam ser amplificadas simultaneamente desde que os produtos tenham tamanho diferente e possam ser diferenciados após eletroforese em gel. Um exemplo importante desta análise, chamada de multiplex, é a aplicação na análise simultânea de deleções em vários exons do gene que causam a distrofia muscular de Duchenne. Na reação representada na figura 40, nove regiões do gene são analisadas no mesmo teste. A ausência de amplificação significa deleção da região que seria amplificada. Um outro exemplo interessante da aplicação rotineira da PCR no estudo de doenças é o caso da fibrose cística, a doença autossômica recessiva mais freqüente nas populações de origem européia. Descobriu-se, após a clonagem do gene, que o tipo de mutação mais freqüente em caucasóides é uma deleção de três nucleotídeos (TTC) no éxon 10 do gene, localizado no cromossomo 7. Esta mutação, conhecida como deleção ∆F508, pode ser estudada através da PCR pois os afetados apresentam um certo produto de amplificação que fica três pares de bases menor do que o das pessoas normais. A diferença pode ser observada Figura 40. Diagnóstico de distrofia muscular Duchenne pela análise de exons deletados por PCR múltiplo. A barra representa os 2000 kb do gene da distrofina. Foram construídos pares de primers para amplificar as nove regiões do gene da distrofina mais freqüentemente deletadas nos afetados.representadas (barras negras). Amostras de DNA de cada paciente são amplificadas na presença dos nove pares de primers simultaneamente e os produtos da PCR são analisados diretamente em gel de agarose corado com brometo de etídeo. O paciente 1 não tem deleção de nenhum fragmento enquanto que o paciente 4 tem uma grande deleção. Os outros pacientes têm deleções diversas. A pista “branco” é um controle da amplificação realizada sem nenhum DNA, e serve para verificar se os reagentes da PCR não estão contaminados. 91 por eletroforese em gel de poliacrilamida. O resultado obtido em uma família com fibrose cística está mostrado na figura 8. Assim, do ponto de vista cronológico, é muito comum que uma doença seja primeiramente estudada indiretamente com o uso de RFLPs, micro ou minissatélites, enquanto o gene responsável ainda não foi identificado. Depois da identificação do gene, pode ser comum o emprego de sondas marcadas. Quando o gene já está muito bem caracterizado, as porções críticas já estão seqüenciadas a as principais mutações causadoras da doença são conhecidas, é comum a substituição dos métodos de diagnóstico baseados em Southern- blotting por métodos baseados na PCR, que visam a identificação das mutações específicas. Figura 41. Resultados da reação da PCR, revelando a mutação tipo deleção ∆F508 que causa a fibrose cística. O afetado (em preto) é homozigoto para a mutação e apresenta duas bandas de 47pb; os indivíduos heterozigotos para a mutação, indicados por um ponto preto, apresentam duas bandas de tamanho distinto, 47 e 50pb. 92 O ACONSELHAMENTO GENÉTICO Priscila Guimarães Otto, Paulo A Otto, Oswaldo Frota-Pessoa 1998 – Genética Humana e Clínica. Editora Roca Ltds. São Paulo, pg 307-312. Os casos de Aconselhamento Genético, sejam enviados por clínicos, sejam vindos por iniciativa das próprias famílias, podem ser organizados, do ponto de vista prático, nas categorias que comentaremos a seguir: A - Casal normal, com história reprodutiva insatisfatória por qualquer das razões abaixo: 1. Esterilidade (aberração dos cromossomos sexuais?). 2. Abortos numerosos, com ou sem alguns filhos normais ou afetados (translocação equilibrada em um dos cônjuges, talvez detectável apenas pelas técnicas de bandeamento dos cromossomos?). 3. Uma ou mais crianças com anormalidades (distúrbios ambientais durante a gestação, o parto ou a primeira infância? Translocação equilibrada em um dos cônjuges? Gene recessivo patogênico em heterozigose nos dois?). B - Casal normal, sem filhos ou com filhos normais, que temem que sua prole venha a ser afetada por uma das seguintes razões: 4. Os cônjuges são consangüíneos (risco global de 13% para primos em 1º grau, ou mais que isso se houver precedentes na família com afecções autossômicas recessivas). 5. Os cônjuges são relativamente idosos (riso de cerca de 2% após os 40 anos quanto ao nascimento de criança mongolóide, ligeiro aumento no risco de outras anomalias cromossômicas devido à elevação na taxa de não-disjunção na mulher; ligeiro aumento do risco de doenças dominantes, por mutação nova, devido ao acúmulo de mutações na estirpe germinativa do homem). 6. A mulher é Rh-negativa e o homem Rh-positivo (se a mulher não recebeu transfusão de sangue Rh-positivo, o risco só existe para crianças Rh-positivas nascidas após o primeiro produto Rh-positivo; e, mesmo assim, uma assistência médica adequada poderá evitar a eritroblastose fetal). 7. Um dos cônjuges recebeu radiação ionizante ou drogas mutagênicas, por exemplo, para tratamento de câncer, ou fez uso de drogas possivelmente teratogênicas, ou ainda, sofreu certas infecções (sífilis, rubéola, tuberculose), que considera transmissíveis ao feto (exceto em casos de altas doses de radiação ionizante ou drogas mutagênicas, o risco fica pouco aumentado se o agente em questão cessar de atuar antes que se inicie a gravidez). 8. Há precedente, na família de um dos cônjuges ou de ambos, de anomalias que parecem hereditárias. C - Casal normal, com um ou mais filhos afetados (decidir com base em anamnese e dados clínicos e laboratoriais se a afecção é genética, ambiental ou multifatorial para estimar o risco de recorrência). São especialmente importantes as seguintes categorias: 9. Retardo mental (drogas ou infecções durante a gravidez? Trauma de parto? Infecção na primeira infância? Mutação dominante nova? Genes recessivos. Anomalia cromossômica?. 10. Defeito físico congênito, simples ou múltiplo, com ou sem retardo mental (mesmas possibilidades do item 9). 11. Síndrome de herança mendeliana clara (com base em diagnóstico firme, estimar o risco de recorrência que é, em geral, alto; conforme o caso, estender o aconselhamento a outros membros da família, tentando a detecção de heterozigotos, quando indicado). 12. Síndrome multifatorial (recorrer a riscos empíricos; os riscos, em geral, são baixos). A) Pessoa afetada, solteira ou já casada, cuja anomalia possa passar à prole. Há a distinguir várias categorias, conforme risco para a prole: 13. Risco nulo ou quase: caso das síndromes sexuais esterilizantes (Turner, Klinefelter, feminização testicular, etc.) ou que exigem confinamento com impedimento reprodutivo (retardo mental e psicoses graves). 14. Risco moderado: caso de defeitos multifatoriais, como lábio leporino; de doenças ligadas ao sexo, como hemofilia, já que os afetados são homens cujas crianças são normais, embora as filhas sejam transmissoras; de doenças recessivas de gravidade média ou grande, desde que o afetado não se case com parente consangüíneo. 95 8. Exame dos membros da família aparentemente normais, quando for o caso, para detectar transmissores do gene ou de aberrações cromossômicas equilibradas. Isso pode consistir em aplicação de exames de DNA, testes de detecção de heterozigotos em casos de genes recessivos, como na fenilcetonúria e hemofilia, ou de genes co-dominantes como na siclemia; ou na investigação de sinais frustros ou subclínicos para reconhecimento de heterozigotos quanto a gene dominante de penetrância incompleta; ou ainda, em caso de aberrações cromossômicas estruturais, no estudo citogênico para detecção de portadores equilibrados de aberrações estruturais. B - Cálculo dos riscos 9. Estimativa dos riscos de recorrência da afecção em crianças que venham a nascer dos pais do propósito e de outros casais da família. No caso de causa poligênica ou multifatorial, recorrer aos riscos empíricos mais bem colhidos da literatura. 10. Redação do relatório, que deve incluir referência aos dados clínicos e genéticos pertinentes, a análise do problema e a enunciação dos riscos. C - Entrevista de Aconselhamento 11. Avaliação, ao longo das entrevistas de exame e coleta de dados, das tensões emocionais presentes nos pais, irmãos e outros parentes dos afetados. 12. Explicação verbal dos termos do relatório à família, de maneira adaptada às suas condições culturais e sob forma que não precipite crises emocionais de importância. Em certos casos, omite-se esta etapa e remete-se o relatório, sob caráter confidencial, ao clínico. 13. Ajuda aos consulentes para que conscientizem os riscos e adotem atitude racional a respeito. 14. Assessoramento dos consulentes sobre métodos de garantir o êxito do planejamento familial que venham a adotar em face dos riscos. 15. Esclarecimento tranqüilizador aos membros da família que temam, sem razão, riscos altos de recorrência da afecção, quando for o caso. 16. Aconselhamento de outros membros da família, mesmo que não fossem de início consulentes, quando o estudo tenha demonstrado que sua prole corre alto risco. 17. Nos casos indicados, explicação aos solteiros da família sobre a importância de evitarem casamentos consangüíneos. D - Acompanhamento 18. Quando indicado, seguimento dos casos através de contatos a intervalos longos para aferir a eficácia do aconselhamento ou reforçá-lo. 96 DIAGNÓSTICO PRÉ-NATAL Paulo A Otto, Regina Célia Mingroni, Ângela Maria Vianna Morgante 2006 – Princípios de Genética Humana e Médica. Em: Tratado de Clínica Médica , Amato Carlos Lopes Editor. Editora Roca Ltda. O diagnóstico pré-natal consiste na aplicação de um conjunto de técnicas capazes de verificar a saúde e o desenvolvimento do concepto (embrião ou feto) e de nele detectar, quando presentes, defeitos e doenças. Alguns métodos permitem a visualização direta (amnioscopia, fetoscopia) ou indireta (ultrassonografia, raios-X) do concepto e a conseqüente detecção de anomalias anatômicas. Outros dependem da obtenção de fragmentos de tecido (biópsia de vilosidades coriônicas), de líquido amniótico (amniocentese) ou de alíquotas de sangue (cordocentese), material esse que é colhido para a aplicação direta ou indireta (após cultivo) de testes bioquímicos (para detecção de erros inatos de metabolismo), moleculares (testes de DNA para a detecção de genes mutantes) e citogenéticos (estudo dos cromossomos e determinação do cariótipo para verificar-se suspeita de aberração cromossômica). A verificação da evolução do ganho ponderal e do aumento da circunferência abdominal e a ausculta fetal já faziam parte de longa data da rotina do acompanhamento pré- natal das gestantes; alterações aí detectadas já constituíam evidência de defeito ou doença no concepto. Atualmente, mesmo em países subdesenvolvidos, já faz parte da rotina obstétrica o acompanhamento das condições de gestação pela ultra-sonografia, que já inclui um exame morfofuncional geral do feto. As demais técnicas referidas no parágrafo anterior aplicam-se a situações específicas, onde há risco aumentado de certos tipos de defeitos ou doenças para o concepto. Principais indicações do exame de diagnóstico pré-natal Idade materna avançada: mães idosas têm chance aumentada de gerar crianças portadoras de defeitos cromossômicos, em especial as trissomias autossômicas. O efeito está bem demonstrado na síndrome de Down, na qual a probabilidade de um afetado chegar a nascer é muito maior que nas demais trissomias (como as dos cromossomos 13 e 18, responsáveis respectivamente pelas síndromes de Patau e Edwards), onde o efeito é praticamente anulado pela alta taxa de abortamento espontâneo precoce. De fato, a principal aplicação do diagnóstico pré-natal ainda continua sendo a idade materna avançada com a finalidade específica de verificar-se se o concepto é portador ou não do defeito cromossômico responsável pela síndrome de Down (geralmente uma trissomia simples do cromossomo 21). Geralmente o exame é indicado para gestantes com 38 anos ou mais, pois este grupo de mulheres contribui com praticamente metade de todos os casos da síndrome de Down. Se todas essas mulheres se submetessem a esse exame e optassem pela interrupção da gravidez quando for constatada a trissomia, a incidência da síndrome de Down ao nascimento baixaria de cerca de 1/800 para 1/1600, ou seja, a freqüência de afetados na população seria reduzida à metade da taxa normal de ocorrência. Para se reduzir mais ainda essa freqüência seria necessário submeter ao exame, em condições de rotina, um número muito grande de mulheres, o que ainda é inviável economicamente. No entanto, mesmo no grupo de mulheres com maior risco, com idade entre 40 e 50 anos, o risco é por si só baixo, de 4% no máximo; apesar disso, encontra-se cerca de 40 vezes aumentado em relação ao risco de mães jovens, que é da ordem de 1/1000. Defeitos de fechamento do tubo neural: determinados por mecanismo multifatorial, eles apresentam um espectro de expressividade clínica que varia da espinha bífida oculta ou aberta e dos diversos tipos de meningomielocele até defeitos extremamente graves como as encefaloceles e a anencefalia, estas últimas resultantes de anomalias do desenvolvimento embrionário que comprometem a extremidade cranial do tubo neural. O risco de repetição desses defeitos na prole de casais que já tiveram uma criança afetada é baixo, da ordem de 4%. Como, no entanto, o defeito pode ser detectado com segurança através de técnicas simples e não-invasivas, como a ultrassonografia, comumente indica-se o exame para casais que já tiveram criança afetada. Como na vigência do defeito os níveis de alfa-feto-proteína encontram-se elevados no soro materno e no líquido amniótico, a dosagem dessa substância (associada à aplicação da técnica da ultrassonografia) está indicada. No caso da anencefalia, defeito incompatível com a sobrevivência do concepto, freqüentemente os casais têm solicitado à autoridade legal permissão para interrupção da gravidez, que geralmente é fornecida através de um alvará. Desta maneira, além das situações já previstas em lei que permitem a 97 interrupção da gravidez no Brasil, vai se abrindo pouco a pouco espaço para aí incluírem as condições de defeitos e malformações muito graves, que diminuem grandemente a qualidade de vida ou impedem totalmente a sobrevivência do concepto. Casais com prole afetada por doença recessiva: no caso de doenças autossômicas recessivas os genitores de afetados são heterozigotos, o que determina o risco alto de repetição (25%) do defeito ou doença numa criança qualquer que venham a ter. No caso de doenças ligadas ao X recessivas esse risco varia de 17 a 25% nos casos isolados, fixando-se em 25% na situação de casos com recorrência na irmandade ou na família. São conhecidas atualmente entre 3000 e 4000 doenças e defeitos diferentes condicionados por esses tipos de mecanismo, mas na prática existem testes moleculares que podem ser aplicados em diagnóstico pré-natal em menos de 10% dessas condições. A situação ainda é complicada atualmente pelo fato de a maioria dos laboratórios de biologia molecular capazes de processarem esses exames serem especializados em apenas um certo número deles. O número de doenças pesquisadas aumenta quando se considera a possibilidade da aplicação de estudos indiretos de ligação com marcadores mapeados nas vizinhanças do loco da doença. De qualquer maneira, existindo o exame, claramente está ele indicado nessa situação, talvez a mais importante pela grandeza do risco a ela associada. Portadores de alteração cromossômica equilibrada: numa fração pequena de casais com crianças afetadas por defeitos cromossômicos um dos genitores é portador da alteração cromossômica em estado dito equilibrado, ou seja, sem que redunde em manifestações fenotípicas para o seu portador. Outros parentes do afetado também podem ser portadores equilibrados. O tipo de defeito mais freqüentemente encontrado nesses casos são as translocações equilibradas, como as que podem ocorrer entre os braços longos dos cromossomos 21 e 14 na síndrome de Down. A verificação empírica das taxas de recorrência nesses casos mostrou que o risco é da ordem de 15 a 20%, quando a mãe é portadora da translocação equilibrada e menor que 5%, quando o portador é o pai. A ordem de grandeza dessas cifras seguramente indica a aplicação de técnicas de diagnóstico prá-natal. Outras indicações: a aplicação de técnicas de diagnóstico pré-natal também está indicada em casos de suspeita de infecção durante a gravidez capaz de produzir defeitos fetais (como é o caso da rubéola, sífilis, citomegalovirose etc), no caso de ingestão de drogas com capacidade teratogênica, como a talidomida, em doenças maternas de natureza sistêmica como o diabetes e ainda em casos de imunização materna. A maioria dos serviços de diagnóstico pré-natal ainda indica a aplicação do exame em casos de casais que tiveram crianças portadoras de defeitos cromossômicos; como esses defeitos geralmente são de natureza esporádica e o seu risco de repetição é pequeno ou desprezível, geralmente da ordem de 1% ou menos, o exame aqui se justifica para a tranqüilização psicológica que possa trazer aos casais nessa situação. Algumas outras situações, no entanto, não justificam a aplicação do exame, como é o caso da consangüinidade parental. Apesar de o risco de doença autossômica recessiva na prole de primos em primeiro grau estar aumentado cerca de dez vezes em relação ao risco correspondente para não-consangüíneos, o número enorme de doenças possíveis e a ausência de manifestações detectáveis em condições de rotina de muitas delas tornam inviável a aplicação do método, do mesmo modo que para a população geral. Principais técnicas utilizadas no diagnóstico pré-natal Muitos serviços de diagnóstico por imagem já se tornaram proficientes no diagnóstico de defeitos congênitos em exames de rotina durante o acompanhamento de gestantes, mas são os serviços de patologia fetal que congregam especialistas na detecção desses defeitos. Além da parte relativa ao dianóstico por imagem, os serviços de patologia fetal estão aparelhados para a aplicação das técnicas de que trataremos nesta seção. Nesses serviços os profissionais prestam esclarecimentos adequados aos consulentes sobre todos os aspectos, técnicos, médicos e éticos dos exames, mas é importante que, ao encaminhar suas consulentes para diagnóstico pré-natal, seu médico já lhes esclareça de maneira geral em que consiste o método e quais são suas limitações e riscos associados. Ultrassonografia Trata-se de um método não-invasivo e inócuo que consiste na emissão de ondas ultrassônicas de alta freqüência, cujo reflexo (eco) é captado por um transdutor e transformado
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