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Guias e Dicas
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Assistência farmacêutica, Manuais, Projetos, Pesquisas de Farmácia

Este livro de assitência é muito didático.

Tipologia: Manuais, Projetos, Pesquisas

Antes de 2010

Compartilhado em 06/08/2009

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gabriela-gomes-5 🇧🇷

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Baixe Assistência farmacêutica e outras Manuais, Projetos, Pesquisas em PDF para Farmácia, somente na Docsity! Assistência Farmacêutica para gerentes municipais http://www.opas.org.br/medicamentos D Portal de Assistência Farmacêutica Autores ANDRÉ LUÍS DE ALMEIDA DOS REIS Farmacêutico, pesquisador do Núcleo de Assistência Farmacêutica/Escola Nacional de Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz (NAF/Ensp/Fiocruz) CARLOS CEZAR FLORES VIDOTTI Farmacêutico, mestre em farmacologia pela Universidade de Campinas (Unicamp), coordenador do Centro Brasileiro de Informação sobre Medicamentos do Conselho Federal de Farmácia (Cebrim/CFF) CLAUDIA GARCIA SERPA OSORIO-DE-CASTRO (Organizadora) Farmacêutica, doutora em saúde da criança pelo Instituto Fernandes Figueira da Fundação Oswaldo Cruz (IFF/Fiocruz), pesquisadora do Núcleo de Assistência Farmacêutica/Escola Nacional de Saúde Pública (NAF/Ensp/Fiocruz) e do Instituto Fernandes Figueira da Fundação Oswaldo Cruz ELISA BRUST RIECK Farmacêutica sanitarista, especialista em gestão de saúde pela Escola de Administração da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), chefe da Divisão de Assistência Farmacêutica/Fundação de Produção e Pesquisa em Saúde (Fepps)/Secretaria de Estado da Saúde do Rio Grande do Sul GABRIELA BITTENCOURT GONZALES MOSEGUI Farmacêutica, doutora em saúde coletiva pelo Instituto de Medicina Social da Universi- dade do Estado do Rio de Janeiro (IMS/Uerj), coordenadora do curso de farmácia da Universidade Estácio de Sá e pesquisadora do Programa de Estudos em Economia da Saúde do Instituto de Medicina Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (IMS/Uerj) LÚCIA DE FÁTIMA SALES COSTA Farmacêutica, especialista em gerência em saúde pelo Ministério da Saúde/Organização Pan- Americana de Saúde (MS/Opas), gerente da Célula de Avaliação e Auditoria dos Serviços da Atenção Primária e Secundária da Coordenadoria de Controle e Avaliação da Secretaria de Saúde do Estado do Ceará LUCIENE ALICE DA SILVA Farmacêutica, consultora técnica da Gerência Geral de Medicamentos e Genéricos da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (GGMEG/Anvisa) MAURO SILVEIRA DE CASTRO Farmacêutico, professor de farmácia hospitalar da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) NELLY MARIN JARAMILLO (Organizadora) Química-farmacêutica pela Universidade de Antioquia da Colômbia (U.de.A) e administradora de empresas pela Universidade Cooperativa da Colômbia, coordenadora de Medicamentos e Tecnologias da Organização Pan-Americana de Saúde (Opas) ORLANDO MÁRIO SOEIRO Farmacêutico, mestre em química de produtos naturais pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), professor da Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC-Campinas) PAULO MAYORGA Farmacêutico, doutor em ciências farmacêuticas pela Universidade de Paris XI, professor da Faculdade de Farmácia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) PAULO SÉRGIO DOURADO ARRAIS Farmacêutico, mestre em farmacoepidemiologia pela Universidade Autônoma de Barcelona, pesquisador no Grupo de Prevenção ao Uso Indevido de Medicamentos (GPUIM), Departamento de Farmácia, Universidade Federal do Ceará (UFCe) RICARDO ANTÔNIO BARCELOS Farmacêutico, consultor técnico na área de Assistência Farmacêutica da Secretaria de Políticas do Ministério da Saúde (MS) SILVIO CÉSAR MACHADO-DOS-SANTOS (Organizador) Farmacêutico, economista, mestre em saúde pública pela Escola Nacional de Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz (Ensp/Fiocruz), gerente geral da Assistência Farmacêutica de Vitória, professor do curso de Farmácia da Faculdade Brasileira UNIVIX, da Escola Superior de Ciências da Santa Casa de Misericórdia de Vitória (Emescam) e da Escola Superior do Educandário Seráfico São Francisco de Assis (Esesfa) TARCÍSIO JOSÉ PALHANO Farmacêutico, especialista em farmácia clínica pela Universidade do Chile, professor do curso de farmácia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), diretor de farmácia do Hospital Universitário Onofre Lopes VERA LUCIA LUIZA (Organizadora) Farmacêutica, pesquisadora do Núcleo de Assistência Farmacêutica/Escola Nacional de Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz (NAF/Ensp/Fiocruz) e do Instituto de Pesquisa Evandro Chagas da Fundação Oswaldo Cruz (Ipec/Fiocruz) Colaboradores: ADRIANA MENDOZA RUIZ Farmacêutica, pesquisadora do Núcleo de Assistência Farmacêutica/Escola Nacional de Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz (NAF/Ensp/Fiocruz) EMÍLIA VITÓRIA SILVA Farmacêutica, mestre em ciências da saúde pela Universidade de Brasília (UNB), técnica do Centro Brasileiro de Informação sobre Medicamentos do Conselho Federal de Farmácia (Cebrim/CFF) FLÁVIA NUNES DA ROSA FRAGA Farmacêutica, bioquímica, coordenadora da política de Assistência Farmacêutica da Secretaria Municipal de Saúde de Porto Alegre FRANCISCO JOSÉ PACHECO DOS SANTOS Farmacêutico, mestre em saúde comunitária e técnico pelo Instituto de Saúde. Coletiva da Universidade Federal da Bahia (ISC/UFBA) HERICKSON RUBIM RANGEL Administrador, mestre em administração pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), professor do curso de administração da Uniserra e da Faculdade Novo Milênio, responsável pelo Setor de Contratos e Convênios da Secretaria Municipal de Saúde de Vitória ISABEL CRISTINA CAVALCANTI CARLOS Farmacêutica, bioquímica, especialista em administração de Sistemas de ‘Suministro’ de Medicamentos Essenciales da Faculdade Nacional de Saúde Pública Abad Gómez/Universidad de Antioquia, coordenadora de Apoio ao Desenvolvimento da Atenção a Macro e Microrregional de Saúde do Ceará (Codamms/Sesa) LOURDES ALMEIDA Pedagoga, especialista em saúde pública pela Universidade Nacional de Brasília (UNB) MARLY APARECIDA ELIAS COSENDEY Farmacêutica, doutora em saúde pública pela Escola Nacional de Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz (Ensp/Fiocruz), farmacêutica do Hospital Universitário Pedro Ernesto da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Hupe/Uerj), pesquisadora do Núcleo de Assistência Farmacêutica/Escola Nacional de Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz (NAF/Ensp/Fiocruz) RICARDO CARVALHO DE AZEVEDO E SÁ Farmacêutico, especialista em administração de sistema integral de medicamentos e professor da Escola de Saúde Pública do Ceará (ESP/CE) ROGÉRIO HOEFLER Farmacêutico, especialista em farmácia hospitalar pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, pesquisador do Centro Brasileiro de Informação sobre Medicamentos do Conselho Federal de Farmácia (Cebrim/CFF) 10 11 Apresentação A adequação da Assistência Farmacêutica ao modelo descentralizado de gestão em saúde atualmente vigente no país tem como marcos a extinção da Central de Medicamentos (Ceme), em 1997, e a publicação da Política Nacional de Medicamentos (Portaria 3916/ 98), que dentre várias outras questões define a competência de cada esfera de governo neste tema. Um outro instrumento legal que pretende auxiliar a organização desse novo modelo é a Portaria 176/99, que: define o Piso da Assistência Farmacêutica Básica (PAFB), classifica modalidades de fornecimento de medicamentos quanto à fonte de financiamento, define as competências de cada nível de governo quanto a esse aspecto específico além de fornecer orientação quanto à organização da AFB nos moldes dos instrumentos dispostos na Norma Operacional Básica 96 (NOB 96) – Plano de Saúde e Programação Anual. Ainda, conjuntamente à definição do PAFB, são definidas condições para qualificação dos estados e municípios para o recebimento dos recursos. Estes dois documentos marcam a redefinição da Assistência Farmacêutica no âmbito do Sistema Único de Saúde do Brasil. A partir disso, o nível local recebeu uma nova série de responsabilidades que exigem mobilização de conhecimento e habilidades técnicas, gerenciais e políticas em relação à Assistência Farmacêutica. Com vistas a capacitar gerentes da Assistência Farmacêutica no nível municipal para o manejo do modelo proposto, à época, a Assessoria de Assistência Farmacêutica, o Departamento de Atenção Básica e a Secretaria de Políticas de Saúde (Assfarm/DAB/SPS/MS), juntamente com a Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) (cujo apoios técnico e financeiros foram fundamentais), realizou uma série de ‘Oficinas Técnicas de Assistência Farmacêutica’, em articulação com as gerências estaduais. A estrutura de trabalho durante as oficinas envolvia atividades diversas, priorizando sempre a problemática encontrada no nível local. Seu tempo médio de duração era de cerca de 40 horas, distribuídas ao longo de uma semana. O grupo de palestrantes e facilitadores incluía vários especialistas na área de Assistência Farmacêutica, identificados pelo Ministério da Saúde e pela Opas. As Oficinas realizadas tiveram avaliação bastante positiva tanto por parte dos participantes quanto dos instrutores como modelo para a capacitação de RH no nível local. A despeito disso, foram apontadas algumas limitações, onde se destacam, a relativamente baixa cobertura em termos numéricos e, na avaliação feita pelos alunos/ profissionais, a grande quantidade de informações fornecida em curto espaço de tempo, apesar do interesse despertado. Dentro da proposta de aprimoramento continuado de gerentes locais da Assistência Farmacêutica, a Assfarm e a Opas terminaram por organizar o “Encontro de facilitadores e elaboradores de material instrucional” que, ocorrido em Brasília, de 29/11 a 03/12/99, reuniu 14 especialistas do grupo que vinha participando nas oficinas. Dentre as várias propostas geradas pelo grupo, houve o amadurecimento em relação à elaboração de um material didático para apoio às oficinas, retomando um projeto do grupo da Assfarm/DAB/SPS/MS, naquele momento sob a coordenação da Dra. Suzana Machado de Ávila. Tal projeto contou, novamente, como apoio técnico e financeiro da Opas. 12 Essa experiência foi muito produtiva. O material produzido foi organizado sob a forma de capítulos ou módulos por tema. Hoje, constituem a estrutura desse livro, e encontram-se distribuídos na seguinte seqüência: o sistema único de saúde, o emprego da epidemiologia na Assistência Farmacêutica, o gerenciamento da Assistência Farmacêutica, a Assistência Farmacêutica no SUS, seleção de medicamentos, programação de medicamentos, aquisição de medicamentos, armazenamento e distribuição de medicamentos, dispensação de medicamentos e uso racional de medicamentos. No capítulo inicial, faz-se uma explanação sobre o Sistema Único de Saúde e suas interfaces com a Assistência Farmacêutica. A seguir, é abordada a questão da Epidemiologia, levando-se em conta sua importância no planejamento e avaliação das ações de Assistência Farmacêutica. Na seqüência, são destacadas noções de Gerenciamento, de modo a oferecer ao leitor instrumentos para a compreensão holística dos capítulos seguintes. A partir desse ponto, são abordados especificamente a Assistência Farmacêutica no âmbito do SUS; à continuação, amplia-se cada tópico das etapas citadas no ciclo da Assistência Farmacêutica: seleção, programação, aquisição, armazenamento, distribuição e dispensação. Para fechar o livro, faz-se uma reflexão sobre o uso racional dos medicamentos (URM) e algumas estratégias importantes são destacadas. Muitos dos capítulos vêm acompanhados por anexos, constituídos por itens de legislação na íntegra, tabelas ou quadros explicativos, cartilhas, partes do Formulário Terapêutico da Rename 2000, entre outros. O objetivo é fornecer ao leitor subsídio para entendimento completo do texto e informação complementar. Os conhecimentos técnicos e científicos para o desenvolvimento de cada etapa desta visão organizacional da Assistência Farmacêutica são fundamentais para uma feliz condução da estratégia proposta, qual seja, fornecer aos gerentes, em especial ao gerente farmacêutico, elementos para seu processo de educação/formação/atualização no campo da Assistência Farmacêutica. A organização do texto está estruturada para dar uma seqüência lógica ao processo. Há que se ressaltar que este material foi produzido em um curto espaço de tempo, envolvendo muitos autores, de forma a privilegiar a experiência prática de uma série de profissionais diretamente ligados às atividades da Assistência Farmacêutica no Brasil. A despeito da extensa revisão, na qual procurou-se homogeneizar o texto, alguma heterogeneidade provavelmente permaneceu. Também, quanto aos exemplos mencionados de experiências realizadas no Brasil, nos diversos temas, não foi possível realizar uma revisão mais extensa, até porque é sabido que muitas experiências, apesar de terem obtido êxito, não estão publicadas, constando apenas de anais de congressos e outras fontes de difícil recuperação. Por essas razões, a maioria dos exemplos mencionados atém-se à experiência dos autores. No entanto, consideramos que esta primeira edição constitui-se em uma versão de prova e agradecemos todas as sugestões, contribuições e críticas, que serão consideradas para uma próxima edição. Os Organizadores 15 O Sistema Único de Saúde Quadro 1 – Algumas características das instâncias colegiadas do SUS. Brasil – 1996 • CONFERÊNCIA DE SAÚDE • Deve reunir-se a cada quatro anos, nas três esferas de governo (municipal, estadual e federal), com a representação dos vários segmentos sociais, para avaliar a situação da saúde e propor as diretrizes para a formulação da política de saúde nos níveis correspondentes, convocada pelo Poder Executivo ou, extraordinariamente, por esta ou pelo Conselho de Saúde • A representação dos usuários é paritária1 • COMISSÃO INTERGESTORA TRIPARTITE (CIT) • Integrada por: cinco representantes do MS, cinco do Conselho Nacional de Saúde (CONASS) e cinco do Conselho Nacional de Secretários Municipais de Saúde (CONASEMS) • Coordenador indicado pelo MS • Funciona com regularidade desde 1994 • COMISSÃO INTERGESTORA BIPARTITE (CIB) • Composição também paritária, sendo integrada por representação da Secretaria Estadual de Saúde (SES) e do Conselho Estadual de Secretários Municipais de Saúde (Cosems) ou órgão equivalente • O Secretário da capital é membro nato • Pode funcionar com comissões regionais • CONSELHO DE SAÚDE (NACIONAL, ESTADUAL E MUNICIPAL) • Tem caráter permanente e deliberativo, composto por representantes do governo, prestadores de serviço, profissionais de saúde e usuários • Atua na formulação de estratégias e no controle da execução da política de saúde na instância correspondente, inclusive nos aspectos econômicos e financeiros, cujas decisões serão homologadas pelo chefe do poder legalmente constituído em cada esfera do governo • Representação dos usuários é paritária: 50% usuários e 50% outros (25% de trabalhadores de saúde e 25% prestadores públicos e privados) Fonte: adaptado da NOB/96 (Brasil, 1996). As esferas gestoras do SUS ficaram assim organizadas: • no âmbito federal – Ministério da Saúde (MS), Conselho Nacional de Saúde (CNS) e Comissão Intergestores Tripartite (CIT); • no âmbito estadual – Secretaria Estadual de Saúde (SES), Conselho Estadual de Saúde (CES) e Comissão Intergestores Bipartite (CIB); • no âmbito municipal – Secretaria Municipal de Saúde (SMS) e Conselho Municipal de Saúde (CMS). 1 Paritário: caráter atribuído aos Conselhos de Saúde pela Lei no 8.142/90; significa que metade dos membros são representantes dos usuários e que a outra metade se divide entre governo, prestadores de serviços (contratados e conveniados) e trabalhadores de saúde. 16 Assistência Farmacêutica... O Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass) é uma entidade de direito privado que congrega os Secretários e seus substitutos legais – gestores oficiais das Secretarias de Estado da Saúde e do Distrito Federal. São finalidades do Conass: • funcionar como órgão permanente de intercâmbio de experiências e informações entre seus membros; • implementar os princípios e diretrizes constitucionais e da legislação complementar no desenvolvimento das ações e serviços de saúde; • promover o pleno exercício das responsabilidades das Secretarias de Saúde, na política de saúde, junto aos órgãos do governo federal e municipal, do poder legislativo e das entidades da sociedade; • diligenciar para que as Secretarias de Saúde dos estados e Distrito Federal participem da formulação e tomada de decisões que digam respeito ao desenvolvimento dos sistemas de saúde nas unidades federadas, em conjunto com os órgãos federados correspondentes; • assegurar às secretarias municipais de saúde ou órgãos municipais equivalentes, por meio da direção do Conselho ou Associação de Secretários Municipais de Saúde de cada unidade federada, a participação em todas as decisões que digam respeito ao desenvolvimento dos sistemas municipais ou intermunicipais de saúde; • encaminhar aos órgãos competentes propostas para equacionar os problemas da área da saúde em todo o território nacional; • estimular e intercambiar experiências quanto ao funcionamento dos conselhos de saúde; • promover estudos e propor soluções aos problemas relativos ao desenvolvimento da área da saúde; • orientar e promover a realização de congressos, conferências, seminários e outros encontros tendentes ao aperfeiçoamento das atividades do setor saúde; • manter intercâmbio com órgãos e entidades nacionais e estrangeiras de interesse para o setor saúde. O Conass conta com as seguintes instâncias deliberativas: • ASSEMBLÉIA – é o órgão máximo do Conass, com os poderes deliberativos e normativos. Compõem a Assembléia todos os membros quites com suas obrigações sociais. • PRESIDÊNCIA – é o órgão executivo, competindo-lhe a representação política, a supervisão e a administração do Conass. • CONSELHOS REGIONAIS DE SECRETÁRIOS DE SAÚDE – são órgãos diretivos do Conass, competindo-lhes deliberar, em nível regional, sobre assuntos de interesse do setor saúde. Estão integrados pelos secretários de saúde dos estados das respectivas regiões. O Conass conta com uma Secretaria Técnica designada pelo Presidente, tendo por competência: • Elaborar, anualmente, proposta orçamentária e do programa de trabalho a serem submetidos pelo Presidente à Assembléia. • Executar as atividades inerentes ao desenvolvimento das ações técnicas e administrativas do Conass. 17 O Sistema Único de Saúde Conta também com ‘Câmaras Técnicas’ de estudos, de intercâmbio de experiências e de proposições de normas com a finalidade de subsidiar a formulação de políticas e estratégias específicas relativas à gestão dos serviços e às ações inerentes ao setor saúde, nos âmbitos regional e nacional. Entre elas, existe a ‘Câmara Técnica de Assistência Farmacêutica’, criada em 1998, que tem prestado importante contribuição ao desenvolvimento da política de medicamentos e da Assistência Farmacêutica no SUS. O Conselho Nacional de Secretários Municipais de Saúde (Conasems) é um órgão colegiado de representação do coletivo de secretários municipais em todo país, congregando todos os municípios brasileiros, atualmente cerca de 5.500; deve atuar em defesa do SUS nos termos constitucionais. Seus componentes fazem parte de todas as instâncias deliberativas e de negociação do setor saúde, como: Conselho Nacional de Saúde, Comissões Bipartite e Tripartite, Comitê de Gestores Públicos, Comitê do Mercosul etc. Os objetivos são: • defender uma política de saúde que assegure acesso universal equânime e integral a todos cidadãos brasileiros; • defender o fortalecimento da autonomia dos municípios no setor saúde e promover a verdadeira descentralização político-administrativa, facilitando o poder decisório local; • estimular a troca de experiências e informações entre os municípios, conjuntamente com instituições acadêmicas, agências internacionais de cooperação técnica e órgãos governamentais; • participar ativamente na definição da política de saúde, assim como de todas as instâncias de negociação do setor. O Conasems conta com as seguintes instâncias deliberativas: • ASSEMBLÉIA GERAL – instância máxima de deliberação, constituída por todos os secretários ou representantes municipais de saúde; reúnem-se anualmente. • CONSELHO NACIONAL DE REPRESENTANTES ESTADUAIS (Conares) – é composto por três representantes de cada Estado (indicados pelos respectivos Cosems, sendo membro nato o secretário municipal da capital e o presidente do Cosems) e pela Diretoria Executiva Nacional do Conasems. É competência do Conares aprovar o Regimento Interno; definir as prioridades de ação; encaminhar as diretrizes e propostas na Assembléia Geral; elaborar o programa de trabalho; atuar como orientador e ponto de apoio às atividades da Diretoria Executiva Nacional implementando, através dos respectivos representantes, as propostas do Conasems em cada Estado; aprovar o Relatório Anual e as respectivas contas da Diretoria Executiva Nacional, encaminhando-os à Assembléia Geral, e eleger, em caso de vacância do cargo, o presidente do Conasems. • DIRETORIA EXECUTIVA NACIONAL – é eleita pela Assembléia Geral, pelo voto direto e secreto com mandato de dois anos e direito a uma reeleição. É composta por: presidente, diretor administrativo, diretor de comunicação, diretor financeiro, diretor institucional e cinco vice-presidentes regionais, sendo um de cada região administrativa do país. À Diretoria Executiva Nacional compete executar as deliberações da Assembléia Geral e do Conares; acompanhar os eventos de interesse do setor saúde, mobilizando os membros do Conasems; estimular e auxiliar a 20 Assistência Farmacêutica... 5. vacinação; 6. atividades educativas a grupos da comunidade; 7. assistência pré-natal; 8. atividades de planejamento familiar; 9. pequenas cirurgias; 10. atendimentos básicos por profissional de nível médio; 11. atividades dos agentes comunitários de saúde; 12. orientação nutricional e alimentar ambulatorial e comunitária; 13. assistência ao parto domiciliar por médico do Programa de Saúde da Família; 14. pronto-atendimento. Na GPSM, a administração municipal assume a responsabilidade de organizar e desenvolver o sistema municipal de saúde, prestando os serviços à população sob sua gestão, assim como contratando, controlando, auditorando e pagando aos prestadores de serviços nos três níveis de atenção. Segundo a lógica da regionalização, proposta pela Noas, os municípios são agrupados em microrregiões, cada uma sendo composta por um ou mais módulos de saúde. Em cada módulo haverá um município-sede, que deverá estar habilitado em GPSM e oferecerá atendimentos no primeiro nível de referência, em média complexidade, para a população de todos os outros municípios do módulo, por meio da assinatura de um Termo de Compromisso de Acesso. Assim, a atenção básica ampliada será oferecida em todos os municípios e os procedimentos mais importantes de média complexidade deverão ser oferecidos no município-sede, que receberá os recursos para esse atendimento fundo a fundo, calculados em termos per capita, de acordo com a população de todos os municípios incluídos no respectivo módulo. Os demais procedimentos, com maior complexidade, serão referenciados para outros locais no próprio estado ou em outros estados, sendo financiados com recursos estaduais ou do Fundo de Ações Estratégicas e Compensação (Faec). São identificados cinco papéis básicos para o estado, que permitem o entendimento da sua função estratégica como gestor neste nível de governo: 1) exercer a gestão do SUS no âmbito estadual; 2) promover as condições e incentivar o poder municipal para que assuma a gestão da atenção à saúde de seus munícipes, sempre na perspectiva da atenção integral; 3) assumir, em caráter transitório, a gestão da atenção à saúde daquelas populações pertencentes a municípios que ainda não tomaram para si esta responsabilidade; 4) ser promotor da harmonização, da integração e da modernização dos sistemas municipais, compondo, assim, o SUS-Estadual; 5) participar do financiamento do SUS, juntamente com os outros gestores. Ao gestor federal cabe: 1) exercer a gestão do SUS no âmbito nacional; 2) promover as condições e incentivar o gestor estadual, com vistas ao desenvolvimento dos sistemas municipais, de modo a conformar o SUS-Estadual; 3) fomentar a harmonização, a integração e a modernização dos sistemas estaduais, compondo, assim, o SUS-Nacional; 21 O Sistema Único de Saúde 4) exercer as funções de normalização e de coordenação no que se refere à gestão nacional do SUS; 5) participar do financiamento do SUS, juntamente com os outros gestores. Por fim, é importante destacar que um dos princípios básicos do SUS e uma das formas de democratizar o acesso aos serviços de saúde é o controle social. O Conselho Municipal de Saúde é o órgão responsável pela fiscalização e pelo controle das políticas de saúde no município. Ele também promove a Conferência Municipal de Saúde, de onde emanam as diretrizes para implementação das políticas de saúde no município. Este órgão tem representação paritária, conforme a Lei Orgânica de Saúde, e deve deliberar a definição da alocação dos recursos do FMS. É importante que este conselho esteja organizado e exercendo sua função. É tarefa dos gerentes da Assistência Farmacêutica subsidiar a prestação de contas das ações da Assistência Farmacêutica neste fórum, sensibilizando os conselheiros para a importância destas ações. FINANCIAMENTO DO SUS O financiamento do SUS é competência das três esferas de governo, sendo custeado através de recursos financeiros provindos do Tesouro, nas três referidas esferas. As principais fontes de financiamento são: • Contribuição sobre Financiamento (Cofins); • Contribuição sobre lucro líquido; • Fontes fiscais destinadas à cobertura de despesas com pessoal e encargo social; • Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF). O conjunto dos recursos financeiros estabelece o Teto Financeiro Global (TFG), que se define para estados (TFGE) e municípios (TFGM) de acordo com Programação Pactuada Integrada (PPI). A PPI é um instrumento formalizador e de negociação entre os gestores, que integra as responsabilidades, objetivos, metas, recursos e tetos orçamentários e financeiros de todos os níveis de gestão e envolve todas as atividades do SUS, buscando a integralidade das ações. Os critérios para pactuação integrada são definidos nas comissões Intergestora Bipartite e Intergestora Tripartite, sendo aprovados nos respectivos conselhos. Os recursos financeiros são passados fundo a fundo, sendo necessário que cada estado e município crie seu ‘Fundo de Saúde’, que é um instrumento de agilização da execução financeira, sendo o ordenador de despesas o secretário municipal de saúde. A operacionalização do ‘Fundo’ deve ser direta e automática, devendo ocorrer sem interferência das secretarias de Planejamento e Fazenda e/ou Finanças. Segundo o que está estabelecido na Lei no 8.080, 50% do repasse do Fundo Nacional de Saúde (FNS) aos Fundos Estaduais de Saúde (FES) e Fundos Municipais de Saúde (FMS) deve ocorrer segundo critérios populacionais, e os outros 50% por critérios epidemiológicos e demográficos, estabelecendo, assim, as bases para a parte fixa e a parte variável do financiamento. Atualmente, o valor do PAB fixo varia de R$10,00 a R$18,00 per capita ao ano, que são transferidos em 12 parcelas mensais, fundo a fundo, para os municípios habilitados. A partir daí, por meio de adesão a programas incentivados, o município pode receber repasses maiores. Esses programas compõem o PAB variável, sendo também financiados por meio de repasses mensais automáticos, fundo a fundo. São 22 Assistência Farmacêutica... seis os programas incentivados na atenção básica: Saúde da Família/Agentes Comunitários de Saúde, Saúde Bucal, Assistência Farmacêutica Básica, Combate às Carências Nutricionais, Combate a Endemias e Vigilância Sanitária. A NOB/96 propõe um incentivo para a avaliação de resultados com o Índice de Valorização de Resultados (IVR), valor proporcional ao cumprimento de metas definidas e aprovadas pelas CIT e CIBs, no sentido do impacto das ações de saúde. Sugere-se que o FMS administre o Incentivo à Assistência Farmacêutica através de uma conta bancária específica, para facilitar o gerenciamento dos recursos disponíveis e sua prestação de contas no relatório de Gestão. ORÇAMENTO O orçamento público é a previsão do que vai ser arrecadado e as autorizações para gastar. Expressa a política econômica da despesa pública em determinado prazo de realização e prevê a capacidade potencial de arrecadar, isto é, abrange as receitas e as despesas (Rio de Janeiro, 1992). As normas que padronizam sua elaboração estão definidas na Lei no 4.320/64 (Brasil, 1964). O orçamento público também pode ser visto como um instrumento que reflete o planejamento socioeconômico, financeiro e administrativo a curto prazo e o controle na utilização dos recursos públicos, mas é, antes de mais nada, uma decisão de governo, um exercício de poder, uma questão política. Conforme a Lei no 4.320, tanto as receitas quanto as despesas se classificam em duas grandes categorias econômicas: as correntes e as de capital. Na despesa corrente, temos a despesa de custeio. Esta contém vários elementos e é no elemento de despesa ‘material de consumo’ que encontramos a previsão orçamentária da aquisição de medicamentos. O planejamento do orçamento possui dois instrumentos que devem ser elaborados previamente pelos governos: 1. ‘Plano Plurianual’: expressa em termos físicos as ações que serão executadas a médio e longo prazos, contendo as diretrizes, os objetivos e as metas da Administração Pública Municipal; deverá ser aprovado pela Câmara Municipal. O Plano contempla não só os investimentos (obras ou compras de equipamentos), mas também as despesas deles decorrentes. Assim, a construção de um almoxarifado de medicamentos, por exemplo, deverá obrigatoriamente constar do Plano, incluindo recursos para contratar RH, comprar materiais permanentes e de consumo, enfim, tudo que for necessário para o seu funcionamento. O Plano deve ser a materialização formal do programa do governo que assume. A partir dele, serão elaboradas as Leis de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e as Leis Orçamentárias Anuais (LOA). O Plano Plurianual passa a vigorar a partir de 1o de janeiro do 2o ano do mandato até 31 de dezembro do 1o ano do exercício seguinte. É uma carta de intenções e, portanto, um planejamento de longo prazo. 2. ‘Lei de Diretrizes Orçamentárias’ (LDO): constitui um conjunto de instruções para a concretização de um plano de ação governamental, destacando providências para a elaboração do orçamento; possibilita a concretização das ações governamentais a médio prazo. Portanto, a LDO define as metas e prioridades do ‘ano seguinte’, com base no estabelecido no Plano Plurianual, tendo vigência de um ano. 25 O Sistema Único de Saúde Esse modelo resultava, na prática, que as pessoas, não encontrando solução para seus problemas nos centros e postos de saúde, buscavam atendimento nos hospitais, geralmente localizados nos grandes centros urbanos, que ficavam sobrecarregados, sem capacidade de priorizar os usuários com problemas que realmente necessitavam de atenção hospitalar. O novo modelo proposto, legitimado pelo SUS – o ‘modelo integrado’ – implica, na prática, em mudanças organizacionais (descentralização, hierarquização etc.), em uma nova compreensão do processo saúde-doença e na redefinição do vínculo entre os serviços e os usuários. A saúde passa a ser vista não mais pela sua definição negativa, de ausência de doença, mas de uma forma positiva, como qualidade de vida. O novo modelo considera também a importância das intervenções sobre o meio ambiente, na tentativa de agir sobre fatores determinantes da situação sanitária do país. Nesse sentido, propõe-se a combinação de três grandes eixos de ação: • promoção da saúde; • prevenção de enfermidades e acidentes; • atenção curativa. Conforme consta da NOB 96, nesse momento, busca-se a consolidação de um novo modelo de saúde, na medida em que ela redefine (Brasil, 1997a): • os papéis de cada esfera de governo e, em especial, no tocante à direção única; • os instrumentos gerenciais para que municípios e estados superem o papel exclusivo de prestadores de serviços e assumam seus respectivos papéis de gestores do SUS; • os mecanismos e fluxos de financiamento, reduzindo progressiva e continuamente a remuneração por produção de serviços e ampliando as transferências de caráter global, fundo a fundo, com base em programações ascendentes, pactuadas e integradas; • a prática do acompanhamento, controle e avaliação no SUS, superando os mecanismos tradicionais, centrados no faturamento de serviços produzidos, e valorizando os resultados advindos de programações com critérios epidemiológicos e desempenho com qualidade; • os vínculos dos serviços com os seus usuários, privilegiando os núcleos familiares e comunitários, criando, assim, condições para uma efetiva participação e controle social. Algumas estratégias se destacam na conformação deste novo modelo. Uma delas é o novo modelo de financiamento, que procura conjugar o critério populacional com o epidemiológico, bem como o desempenho na obtenção de resultados expresso através dos indicadores. Outras estratégias dizem respeito às formas de prestação de cuidados e desenvolvimento dos eixos de ação citados anteriormente. Dentre estas, destacam-se o Programa de Agentes Comunitários de Saúde (Pacs) e o Programa de Saúde da Família (PSF). Por meio do Pacs, o MS dá incentivo à contratação de pessoas da comunidade como agentes que serão responsáveis pela identificação de problemas, orientação dos pacientes e seguimento dos mesmos, por meio de visitas domiciliares; o número de agentes vem aumentando, de 29 mil, no ano de 1994, para 111 mil, no final de dezembro de 1999, dando cobertura a 64 milhões de pessoas em 4.052 municípios (Negri, 1999). O PSF implica na proposta de definição de vínculos serviços-profissionais-usuários com base nos núcleos familiares. A composição das equipes de uma unidade de Saúde da Família recomendada pelo MS é de no mínimo um médico de família ou generalista, um 26 Assistência Farmacêutica... enfermeiro, um auxiliar de enfermagem, odontólogo (uma para cada duas equipes) e Agentes Comunitários de Saúde (ACS). Os profissionais devem residir no município onde atuam, trabalhando em regime de dedicação integral, a fim de garantir a vinculação e a identidade cultural com as famílias sob sua responsabilidade, cabendo igualmente aos ACS residir na sua respectiva área de atuação. Outros profissionais podem ser incorporados nas Unidades de Saúde da Família ou em equipes de supervisão, de acordo com as necessidades e possibilidades locais. Os parâmetros de cobertura são os seguintes (Brasil, 1998): I – cada equipe de saúde da família será responsável por no mínimo 2.400 e no máximo 4.500 pessoas; II – cada agente comunitário de saúde será responsável por no mínimo 400 e no máximo 750 pessoas. As ações de avaliação e acompanhamento são fundamentais para subsidiar estratégias que venham a garantir que a implantação e a implementação desses programas realmente signifiquem, na prática, a mudança do modelo assistencial e não somente a extensão de cobertura (Furniel et al., 1999). Outro aspecto a ser ressaltado é que esse novo modelo tem a atenção básica à saúde como pilar fundamental e procura organizar-se de forma que seja esta a porta de entrada para todo o resto do sistema. Define-se atenção básica à saúde como um conjunto de ações, de caráter individual ou coletivo, situadas no primeiro nível de atenção dos sistemas de saúde, voltadas para a promoção da saúde, a prevenção de agravos, os tratamentos e a reabilitação, tendo como fundamentos os princípios do SUS, conforme definido na Lei Orgânica da Saúde. Cabe, por fim, mencionar a existência do movimento que tem sido intitulado como Cidade Saudável que, em uma aproximação, pode ser definido como um modelo técnico ou como um movimento de caráter social e urbano voltado para a qualidade de vida; constitui-se como uma ‘rede de cidades’ trabalhando em conjunto e trocando informações sobre promoção da saúde. Xavier (2000), no entanto, prefere antes defini-la o como uma filosofia e uma idéia, tanto antiga quanto inovadora, ligada ao bem-estar do homem. CONTROLE E AVALIAÇÃO NO ÂMBITO DO SUS Todos os níveis de governo devem avaliar o funcionamento do sistema de saúde, no que diz respeito ao desempenho nos processos de gestão, formas de organização e modelo de atenção, tendo como eixo orientador a promoção da eqüidade no acesso e na alocação dos recursos e, como instrumento básico para o acompanhamento e avaliação dos sistemas de saúde, o Relatório de Gestão. O fortalecimento das funções de controle e avaliação dos gestores do SUS deve se dar, principalmente, nas seguintes dimensões: • avaliação da organização do sistema e do modelo de gestão; • relação com os prestadores de serviços; • qualidade da assistência e satisfação dos usuários; • resultados e impacto sobre a saúde da população. 27 O Sistema Único de Saúde Os principais instrumentos de controle e avaliação introduzidos a partir da NOB 96 são o ‘Plano de Saúde’, a ‘Programação Anual’, o ‘Relatório de Gestão’ e a ‘PPI’, constituindo-se em requisito para a habilitação. Esses instrumentos devem permitir a prática do controle social e viabilizar a utilização transparente dos recursos públicos – devem ser acessíveis a lideranças da comunidade, formadores de opinião, dirigentes de ONG da área da saúde e colegiados intergestores. Os objetivos e período de abrangência desses instrumentos estão sumarizados no Quadro 2. Quadro 2 – Principais instrumentos de controle e avaliação do SUS. Brasil – 1996 Detalhamento operacional do plano – contém as ações, metas e recursos, mediante os quais os objetivos estabelecidos serão alcançados Planejamento das ações de saúde necessárias a uma comunidade – define, a partir da análise da situação de saúde e princípios orientadores, o modelo gestão, prioridades e estratégias; o Plano Municipal de Saúde deve conter: metas, integração e articulação do município na rede estadual e responsabilidades na programação integrada do estado (incluindo detalhamento da programação de ações e serviços que compõem o sistema municipal, bem como os indicadores mediante os quais será efetuado o acompanhamento) AnualPROGRAMAÇÃO ANUAL PLANO DE SAÚDE Plurianual Instrumento de gestão Objetivo Período de abrangência Consolidado estadual: sistematização do resultado de todo o processo de elaboração da programação, envolvendo a composição orçamentária, o modelo de gestão, o modelo de atenção e os recursos estratégicos no que tange especificamente ao modelo de atenção; contém o resultado da programação acordada entre os municípios quanto à assistência, vigilância sanitária e epidemiologia/controle de doenças Análise do desenvolvimento das ações previstas, em função de metas programadas Mais próximo possível daquele previsto para o desenvolvimento da programação anual RELATÓRIO DE GESTÃO PROGRAMAÇÃO PACTUADA E INTEGRADA (PPI) Anual Fonte: Brasil (1996). O Plano de Saúde deve ser plurianual, correspondendo a um período de governo, sendo suas proposições detalhadas em Programações Anuais. Para a formulação do Plano, é importante a disponibilidade de bases de dados globais e permanentemente atualizadas, ainda que a inexistência dessas bases não deva constituir impedimento para a realização do planejamento. O Plano deve explicitar os objetivos, as prioridades e as estratégias – elementos essenciais do plano de saúde – e definir as metas, as ações e os recursos – 30 Assistência Farmacêutica... Quadro 5 – Indicadores para avaliação da atenção básica. Pacto de indicadores da atenção básica. Brasil – 2001 NOME DO INDICADOR Taxa de mortalidade infantil Taxa de mortalidade infantil por causas evitáveis Proporção de óbitos infantis sem assistência médica Taxa de mortalidade materna Proporção de óbitos de mulheres em idade fértil investigados Proporção de recém-nascidos de mães com quatro ou mais consultas de pré-natal Proporção de partos e abortamentos em adolescentes Cobertura vacinal de rotina por DPT em menores de 1 ano de idade Cobertura vacinal contra influenza em idosos Proporção de casos de sarampo investigados em 48 horas, após a notificação Número de casos confirmados de tétano neonatal Número de casos confirmados de sífilis congênita Taxa de incidência de tuberculose Taxa de prevalência de hanseníase Taxa de internação por acidente vascular cerebral na população de 30 a 59 anos de idade Visita domiciliar por família/mês Proporção da população coberta pelo Programa de Saúde da Família Consultas médicas nas especialidades básicas por habitante/ano Concentração de procedimentos odontológicos coletivos na faixa etária de 0 a 14 anos Fonte: Brasil (2001b). OBS: São evidenciados aqueles mais sensíveis ao acesso e uso racional de medicamentos. SUBSISTEMA PRIVADO DE SAÚDE NO BRASIL: assistência médica suplementar A proteção social à saúde no Brasil foi, historicamente, conformada com base em um modelo Bismarkiano corporativo, tipo seguro social. Com a consagração do direito à saúde na Constituição Brasileira de 1988, buscou-se a implantação de um modelo Beveridgiano universalista, através da criação do SUS. Entretanto, na década de 90, o que se observa é a consolidação de um terceiro modelo – segmentado – com dois subsistemas de acesso à atenção à saúde: o SUS e a Assistência Médica Suplementar, caracterizando uma dicotomia entre o público e o privado. As fontes de informação disponíveis sobre o Subsistema Privado de Saúde no Brasil não são homogêneas, sendo produzidas pelas próprias empresas ou por firmas de consultoria por elas contratadas. Com isso, ocorrem discordâncias entre os dados das diversas fontes, comprometendo a comparabilidade e a possibilidade de afirmações conclusivas. Entretanto, permite, ainda assim, avaliar tendências e magnitudes desse mercado. 31 O Sistema Único de Saúde Conceitualmente, poderíamos afirmar que o Subsistema Privado de Saúde é caracterizado pela natureza mercantil-contratual das relações entre atores, o que, por sua vez, confere à demanda caráter seletivo. Esse mercado privado de saúde apresenta alguns tipos de segmentos, que podem ser classificados e agrupados como: • Serviços providos por profissionais liberais: contratados diretamente por famílias e/ou indivíduos. • Suplementar: envolve a intermediação de operadoras de planos e seguros de saúde. A prática liberal representa, entretanto, apenas uma minoria desse universo, no qual as principais formas de compra e venda dos serviços privados de assistência à saúde referem- se ao tipo suplementar, que envolve a intermediação de terceiros – operadoras de planos e seguros de saúde. Estes, por sua vez, podem ser classificados da seguinte maneira: a) Medicina de Grupo: são predominantemente contratadoras de serviços, constituindo-se em empresas médicas que administram planos de saúde para empresas, famílias ou indivíduos. b) Cooperativas Médicas: os médicos são simultaneamente sócios e prestadores de serviços e recebem pagamento de forma proporcional à produção de cada um, valorizada pela tabela da Associação Médica Brasileira (AMB), além de participarem do rateio do lucro final obtido pelas unidades municipais, como o caso das Unimed. c) Planos Próprios das Empresas: são aqueles em que as empresas ou administram programas de assistência à saúde para seus funcionários – autogestão – ou contratam terceiros para administrá-los – co-gestão. d) Seguros-Saúde: são mais recentes no mercado, havendo intermediação financeira de uma entidade seguradora que garante a cobertura de assistência médico- hospitalar e outros tipos de assistência à saúde, mediante livre escolha do prestador pelo segurado, com reembolso das despesas. CARACTERIZAÇÃO DESSE MERCADO Historicamente, os esquemas próprios de assistência médico-hospitalar tiveram início na década de 40 com a Caixa de Assistência do Banco do Brasil e, posteriormente, com a implantação das grandes empresas estatais e multinacionais, principalmente na região do ABC paulista. Nos anos 60, surgiram as empresas médicas – medicina de grupo e cooperativas – já com incentivos fiscais. Segundo Santos & Gama (1999: 3), sobre a regulamentação do setor suplementar de saúde no Brasil, até a década de 80 os planos de saúde eram quase que exclusivamente para empresas, sendo acessíveis através do mercado formal de trabalho. A partir da segunda metade dos anos 80, as operadoras de planos de saúde captaram as demandas de clientes individuais (…) bem como a de clientes-empresa ainda não envolvidos (…). Nessa fase ainda, muitos funcionários públicos ingressaram na assistência médica suplementar através da adesão de várias instituições governamentais. Também é o momento em que ocorre a entrada das seguradoras nesse mercado. Mas, o grande crescimento ocorre mesmo a partir do final da década de 80 e nos anos 90, conforme demonstram as Tabelas 1 e 2 e o Gráfico 1. 32 Assistência Farmacêutica... 0 10 20 30 40 50 1987 1994 1996 Nº. estimado de clientes (milhões) Faturamento estimado (US$ bilhões) Tabela 1 – Evolução da População Coberta no Mercado de Assistência Médica Suplementar. Brasil – 1987-1996 Tabela 2 – Número de Empresas e % no Mercado, por modalidade de Assistência Médica Suplementar. Brasil – 1995-1996 Tipos de Operadoras Número de Empresas % no Mercado 1995 1996 1995 1996 Medicina de Grupo 555 670 44,0 42,2 Cooperativas Médicas 332 320 23,6 24,4 Próprios das Empresas 150 150 23,6 21,9 Seguradoras 20 40 8,8 11,5 Total 1029 1180 100 100 Fonte: Almeida (1998). Medicina de Grupo 15,1 16,0 0,85 17,3 4,06 14,57 Cooperativas Médicas 3,6 8,5 19,44 10,0 8,82 177,77 Próprios das Empresas 5,0 8,0 8,57 9,0 6,25 80,00 Seguradoras 0,7 5,0 87,75 6,0 10,0 757,14 Total 24,4 37,5 7,67 42,3 6,4 73,36 Fonte: Almeida (1998). ∆ Total(%) ∆ Média Anual (%) No Clientes (milhões) 1996 No Clientes (milhões) 1987 Tipos de Operadoras No Clientes (milhões) 1994 ∆ Média Anual (%) Gráfico 1 – Número de clientes e faturamento estimado para a Assistência Médica Suplementar. Brasil – 1987-1996 Fonte: Almeida (1998). OBS: O faturamento nesse mesmo período (1987-1996) cresceu 700%. 35 Princípios de Epidemiologia e sua Aplicação... INTRODUÇÃO Já desde a Antigüidade, muitos grupos humanos, entre eles os hebreus, chineses, muçulmanos, hindus, egípcios, gregos e povos pré-colombianos, desenvolveram e adota- ram normas alimentares, sexuais e de higiene, com o propósito de defender a saúde da coletividade. O ‘tabu’, para culturas e religiões antigas, simbolizava antes o mal que uma determinada prática poderia trazer ao grupo social. Por exemplo, a proibição, pelos hebreus (e alguns ramos do islamismo), do consumo de carne de animais mortos por sufocamento e de carne de porco e de crustáceos, tradição que ainda hoje se mantém pelos religiosos mais ortodoxos, era uma forma de mantê-los a distância de carnes facilmente deterioráveis. O leite, na China, era considerado um alimento impuro por ser uma secreção. Ainda, os povos pré-colombianos, incas, maias e astecas possuíam, além de avançados conhecimentos sobre a prevenção e o tratamento de doenças, normas sociais orientadoras da saúde coletiva. Durante as Idades Média e Moderna, com o progressivo domínio da cultura européia, perderam-se muitos dos conceitos de higiene e saúde coletiva das civilizações da Antigüida- de. A crescente urbanização, as migrações internas, a expansão populacional contribuíram para a eclosão de grandes epidemias, como a Peste Negra (peste bubônica), que assolou a Europa nos séculos XIII e XIV, a varíola, a partir do século XI e a febre tifóide e o cólera, cujos registros oficiais de ocorrência se iniciam em fins do século XVIII. O cólera, em especial, tornou-se um grave problema no Velho Continente, já na segunda década do século XIX. Junto à relativa ignorância das populações sobre as causas e fatores predisponentes das doenças, havia uma série de outros fatores que tornavam as cidades sujeitas ao surto de cólera: a inexistência de esgotos urbanos; os hábitos de higiene pouco recomendáveis, mesmo entre pessoas abastadas; as péssimas condições de higiene dos aglomerados urbanos ao nascimento da Revolução Industrial; as migrações internas resultantes das Guerras Napoleônicas e a intensidade do transporte marítimo, que possibilitava, além das rápidas, para a época, ligações comerciais, a disseminação, igualmente rápida, das doenças (Almeida Filho, 1993). JOHN SNOW E O NASCIMENTO DA EPIDEMIOLOGIA MODERNA De 1848 a 1854, Londres já experimentara pelo menos três grandes surtos (Snow, 1855), sendo que os primeiros registros do chamado surto de ‘cólera asiático’ na Inglaterra acontece- ram em 1832. A doença era assim chamada, pois foi primeiramente descrita por volta de 1769, na Índia, pelos ingleses. Princípios de Epidemiologia e sua Aplicação na Assistência Farmacêutica Capítulo 2 36 Assistência Farmacêutica... Um médico, John Snow, intrigado pelo modo com que o cólera ‘caminhava’ pelas regiões inglesas, acometendo principalmente as grandes cidades, passou a estudar detalhadamente os casos, seguindo o avanço da epidemia até sua chegada em Londres no outono de 1848. Nesse estudo, Snow, cumprindo um método de trabalho extremamente minucioso, mapeou, nas sucessivas manifestações de cólera em um período de quatro anos, as áreas da cidade acometidas em maior ou menor grau pela doença. Na tarefa a que se impôs, visitou casa a casa, entrevistando os ocupantes. Teve ainda a possibilidade de contar também com os dados compilados do General Register Office que, desde aquela época, na Inglaterra e País de Gales, mantinha os registros de todos os óbitos, assim como a causa dos mesmos. Movido por uma suspeita, Snow mapeou também as fontes de água potável que abasteciam essas mesmas áreas. Ele descobriu que aquelas partes da cidade abastecidas pela água do Rio Tâmisa – colhida abaixo de pontos de derrame de esgotos – eram muito mais sujeitas aos surtos da enfermidade que aquelas regiões abastecidas por águas mais limpas, em pontos mais altos do rio, longe e acima do desaguadouro de esgotos. Por essa época a ciência supunha que tanto o cólera quanto a malária seriam causados por ‘miasmas’, isto é, exalações vaporosas oriundas de matéria putrefata (Pease Jr., 1993). O trabalho de Snow refutou essa teoria quanto ao cólera, indicando que a água seria o veículo de transmissão da doença e recomendando maior critério das autoridades quanto às linhas de abastecimento. Snow não descobriu o agente etiológico, o vibrião do cólera. Por isso mesmo é maior seu gênio, pois propôs a possibilidade de controle da enfermidade sem a determinação prévia de sua causa. Além disso, Snow foi o primeiro a reconhecer e a discutir a ação de fatores intervenientes, não causais, mas que poderiam intensificar ou amenizar os resultados da exposição. Uma modesta nota de rodapé de seu livro On the Mode of Communication of Cholera – ‘Sobre a Maneira de Transmissão do Cólera’ –, publicado em 1855, diz: “Várias são as condições necessárias à produção de uma doença, como o são para produzir uma safra de trigo ou nabos, entretanto, não é preciso honrá-las com a denominação de causas” (Snow, 1855: 128). Apesar de pouco valorizado à época, reconhecemos hoje em Snow a paternidade da moderna epidemiologia. Ele lançou as bases de formulação e comprovação de hipóteses através do ‘método epidemiológico’, propondo tanto medidas de intervenção quanto o modo de resolução. DEFINIÇÃO E ASPECTOS FUNDAMENTAIS A epidemiologia pode ser definida hoje como “O estudo dos determinantes e da distribuição de freqüência das doenças nas populações humanas” (Hennekens & Buring, 1987: 3). Como ciência, alicerça-se em quatro premissas fundamentais (Hennekens & Buring, 1987; Gordis, 1996). 1. Que as doenças não ocorrem por força do acaso. 2. Que as doenças possuem fatores causais e preventivos. 3. Que esses fatores podem ser identificados por meio de investigação sistemática, aquilo que chamamos ‘método epidemiológico’. 4. Que as ações sanitárias legítimas devem estar baseadas nos resultados obtidos dessa investigação. 37 Princípios de Epidemiologia e sua Aplicação... O MÉTODO EPIDEMIOLÓGICO O método epidemiológico apresenta-se como um conjunto de técnicas de investigação, cujo propósito é conhecer, o mais completamente possível, uma dada situação que se apre- senta no contexto das enfermidades nas populações; corresponde a uma seqüência lógica de ações levadas a termo pelos investigadores da área da saúde com a finalidade de determinar a probabilidade de ocorrência de um dado fenômeno. Esse método parte de fatos palpáveis, concretos e observáveis. Passa de uma fase prática e dedutiva para assumir uma natureza criativa, que corresponde à formulação e à testagem de hipóteses. Finalmente, da geração construtiva de hipóteses, nascem as intervenções (Osorio-de-Castro, 1996). De uma suspeita, vinda da simples observação ou mesmo da prática, podem nascer especulações a respeito das relações de causa e efeito. Snow, por exemplo, suspeitava da água como meio de transmissão da doença. No entanto, ele precisava, comprovar sua suspeita; para isso, empregou o método epidemiológico. Inicialmente, ele levantou criteriosamente todos os óbitos suspeitos e comprovados de cólera na cidade de Londres desde o início da epidemia. A seguir, investigou a proce- dência dos dados, que era bastante confiável, haja vista a existência de um banco de dados no qual se compilavam os registros de mortes, e mapeou as regiões onde haviam ocorrido os casos, casa a casa. Em uma segunda etapa, Snow ligou essas informações àquelas das companhias de abastecimento de água de Londres. Ele tinha agora a freqüência de ocorrência dos casos por região abastecida por cada companhia. FORMULAÇÃO DE HIPÓTESES De posse dos dados, que trabalhou em tabelas, de modo a melhor visualizá-los, o médico se perguntou: a. O maior número de casos não estaria concentrado nas regiões onde a água fornecida provinha de pontos abaixo de desaguadouros de esgotos? b. Uma vez satisfeita esta primeira condição, não seria possível que a água fosse o veículo de transmissão da doença? TESTAGEM DE HIPÓTESES Snow precisava comprovar se o que havia hipotetizado era procedente. Tabulou a popu- lação, o número total de mortes e a taxa por 100.000, por distrito servido por cada companhia (Tabela 1). Uma delas, a Companhia Lambeth, havia trocado progressivamente seu ponto de captação de água para um ponto acima das canalizações de esgoto, enquanto outra, Compa- nhia Southwark & Vauxhall, manteve seu ponto de captação de água abaixo das mesmas. 40 Assistência Farmacêutica... Essa fração é uma proporção, pois os óbitos por tuberculose fazem parte do total de óbitos. Razão de sexos no de mulheres em uma localidade no momento X no de homens em uma localidade no momento X Nesse caso, temos uma razão, por motivos óbvios: o número de mulheres não está contido no número de homens. PREVALÊNCIA E INCIDÊNCIA Tanto a prevalência quanto a incidência são consideradas medidas de morbidade (Gordis, 1996). A ‘prevalência’ diz respeito à força com que subsiste uma determinada doença na população. no de casos de verminose entre crianças menores de 1 ano na região Nordeste do Brasil (num dado período) Se dizemos que a doença D é prevalente naquela população, estamos afirmando que ela está presente e com constância. A prevalência é uma proporção; na prática isto quer dizer que qualquer pessoa que contemos no numerador estará necessariamente presente também no denominador.1 A medida de prevalência pode ser considerada como um ‘retrato’. Para medir a prevalência da doença D em uma comunidade, por exemplo, podemos visitar todas as residências e contar quantas pessoas acometidas pela doença X (casos novos e casos antigos) existem naquele dia. Este será nosso numerador. No denominador, teremos todas as pessoas da mes- ma comunidade nesse dia. no de casos da doença D presentes na população em um ponto no tempo total de indivíduos na população no mesmo ponto no tempo Esse tipo de prevalência, na qual examinamos a situação em um ponto no tempo (um determinado dia, por exemplo) é chamada de ‘prevalência de ponto’. O outro tipo é a chamada ‘prevalência de período’, na qual relatamos a presença da doença por um período mais longo, como seis meses, um ano. Todas as pessoas que tiveram a doença nesse período serão contadas no numerador. Como vimos, a prevalência dá um diagnóstico focal da situação desta ou daquela enfermida- de na população. Ela é importante para estimar a morbidade de doenças crônicas (de curso longo) em uma população, e é absolutamente essencial para planejamento em saúde, pois proporciona estimativas para alocação de recursos físicos e financeiros em serviços e insumos, entre os quais os medicamentos. No entanto, essa medida de morbidade não se preocupa com a duração da doença ou com seu início. 1 Como a prevalência não é uma razão, não poderia ser, teoricamente, denominada ‘taxa’. Acontece, no entanto, que encontraremos a expressão ‘taxa de prevalência’ em muitas fontes de consulta. Isso quer dizer, apenas, prevalência. 41 Princípios de Epidemiologia e sua Aplicação... A ‘incidência’, ao contrário, expressa, como bem seu nome diz, a força com que uma doença incide sobre uma dada população. Ela se restringe apenas aos novos casos da doença, os casos ‘incidentes’. Traz a idéia de dinamismo, de velocidade do curso da enfermidade naquele grupo humano. no de casos incidentes de meningite entre escolares de 5 a 2 anos em São Paulo, no ano de 1999. A incidência pode ser expressa como uma razão ou como uma proporção. Ao primeiro caso, chamamos de taxa de incidência ou de densidade de incidência. No denominador, expressamos o tempo de seguimento de cada indivíduo sob risco de adoecer ou morrer (dependendo do que o investigador esteja interessado em medir). Acompanha-se o indivíduo a partir de um tempo X, seguindo-o por um período, durante o qual ele pode vir a morrer ou a adoecer ou não apresentar intercorrência. O somatório dos tempos de todos os indiví- duos (chamado de somatório ‘pessoa-tempo’) é o denominador. Portanto, o numerador não está incluído no denominador. Fornece uma idéia de velocidade, pois temos ‘o caminho percorrido’ (novos casos) sobre o tempo decorrido. Veja o exemplo: Curso da doença ‘Y’ na localidade de Cacimbinhas nos anos de 1975 a 1977. * início da doença; ——— curso da doença + morte somatório (Σ) do tempo (em dias) = 4.800 número de mortes (nos três anos) = 9 9/4.800 = 0,001875 (taxa de incidência de morte pela doença Y, entre 1975 e 1977 na localidade de Cacimbinhas) no de casos de morte ocorrendo na pop. em determinado período Σ tempo de seguimento de cada indivíduo durante o período Paciente 1975 1976 1977 no de meses Total de dias 1 *—— ——— —+ 21 630 2 ——— ——+ 16 480 3 *—— —+ 12 360 4 ——+ 9 270 5 *—— ——— ——+ 20 600 6 *——+ 8 240 7 *—— ——— 21 630 8 *————+ 7 210 9 ——— ——+ 19 570 10 *—— ——— ——+ 27 810 42 Assistência Farmacêutica... Se fizermos o cálculo usando o número de novos casos da doença Y no período, teremos: somatório (Σ) do tempo (em dias) = 4.800 número de casos novos (nos três anos) = 7 7/4.800 = 0,001458 (taxa de incidência da doença Y, entre 1975 e 1977 na localidade de Cacimbinhas) no de casos novos da doença ocorrendo na pop. em determinado período Σ tempo de seguimento de cada indivíduo durante o período Podemos também chamar incidência de proporção, caso da chamada ‘incidência acu- mulada’. No numerador, estão os novos casos, e no denominador, aqueles sob risco de adoecer no início do período. Observemos que poderão ser as mesmas pessoas incluídas: novos doentes (numerador) e aqueles sob risco de adoecer e que, portanto, ainda não estão doentes, mas que poderão ficar (denominador). Pode-se expressá-la da seguinte maneira: no de casos novos da doença ocorrendo na pop. em determinado período total de indivíduos na pop., sob risco de adoecer, no início do período A ‘incidência acumulada’ exprime todos os casos novos naquele período (os casos ‘acumulam’ no decorrer do período). A cidade de Vale Florido tinha uma população de 5.842 pessoas no início do ano 1. A doença Z acometeu a cidade nos seis anos seguintes. Qual a incidência acumulada? ano 1 ano 2 ano 3 ano 4 ano 5 ano 6 Total Número de novos casos 9 34 56 23 12 5 139 Incidência acumulada da doença Z no período = 139/5.842 = 0,02379. A incidência é importante se estamos desejando investigar causas ou etiologias e os riscos a que estará submetida uma população. A incidência se preocupa com o início da doença. É uma medida de morbidade excelente para estudar casos agudos, doenças emer- gentes, epidemias e endemias (Gordis, 1996). Snow, por exemplo, ao colher os dados de mortes por cólera, coletou dados de inci- dência. A mortalidade é um tipo especial de incidência. Se a doença é muito rápida e fatal, praticamente não há tempo de registrar os doentes. Registram-se, assim, as mortes. O avanço da Aids sobre as populações era, no início dos anos oitenta, medido por meio da incidência apenas. Os casos eram de evolução rápida e fatal. Hoje, no entanto, podemos também medir, pela prevalência, a força de permanência da Aids nas populações, pois já existe tratamento eficaz que retarda as complicações da doença que levavam tão rapidamente à morte. Vemos, assim, que parece existir uma relação entre prevalência e incidência, uma relação dependente do tempo. Na verdade, grosso modo, podemos dizer que (Gordis, 1996): Prevalência = Incidência x duração da doença 45 Princípios de Epidemiologia e sua Aplicação... Um indicador variante da mortalidade infantil é a mortalidade neonatal. Indica as mortes ocorridas nas quatro primeiras semanas de vida, sendo calculado da mesma forma que o primeiro, substituindo-se os valores de número de óbitos nos primeiros 12 meses de vida pelo número de óbitos nas primeiras quatro semanas de vida (Vaughan, 1992). Por sua vez, calculamos a mortalidade materna utilizando um fator múltiplo de 1.000. no de óbitos maternos relacionados com a gravidez em um ano X fator total de nascimentos no mesmo ano O fator mais apropriado a usar depende da região estudada. Os países subdesenvolvidos, como, por exemplo, a África Equatorial, podem apresentar taxas de mortalidade materna 5 por 1.000, ao passo que na Europa, a taxa é de 5 por 100.000. Em países ou regiões onde é muito alta a taxa de natalidade, a relevância dos valores obtidos pode ficar comprometida e ser subestimada (Vaughan, 1992). Por exemplo, em um município onde tenham nascido 100 crianças em 1 ano, 2 mortes maternas resultarão em uma taxa de mortalidade materna de 20 por 1.000. Em outro município, onde tenham nascido 10 crianças em 1 ano, 1 morte materna resultará em uma taxa de mortalidade materna de 100 por 1.000. Nas regiões que apresentam altas taxas de mortalidade infantil, neonatal e de morta- lidade materna, podemos suspeitar de um déficit importante na atenção primária, notadamente nas áreas de saúde da criança e da mulher. • Letalidade – o chamado ‘coeficiente de letalidade’ exprime o quanto uma doença é capaz de matar, em um dado período de tempo. O coeficiente de letalidade é uma proporção; os óbitos pela doença D devem ser necessariamente oriundos do contin- gente de doentes por D no período. Pode acontecer da morte de um doente de D ser provocada por uma outra causa interveniente (por exemplo, um acidente, não rela- cionado à doença). Nesses casos, é difícil separar as causas. A letalidade é geralmente expressa por 100. no de óbitos pela doença D no período X 100 no de doentes da doença D no período Por meio da evolução do coeficiente de letalidade, podemos acompanhar as modifica- ções no curso das doenças, trazidas, por exemplo, pelo avanço do conhecimento na área da saúde. No século XIX, quando muito pouco se conhecia sobre a prevenção e o tratamento de cólera, grandes contingentes eram vitimados pela doença. Hoje em dia, apenas uma peque- na parte dos que adoecem morrem, desde que adequadamente tratados. Contudo, diferenças no coeficiente de letalidade de uma doença em diferentes regiões nos fazem refletir sobre a qualidade da assistência que está sendo prestada e todas as implicações decorrentes. 46 Assistência Farmacêutica... Em uma população de 200.000 pessoas, 36 apresentam a doença Z. Dessas, no primeiro ano, 28 morrem da doença. a) Qual a taxa de mortalidade (por 100.000) b) Qual o coeficiente de letalidade? a) 28 ________ 200.000 X _________ 100.000 X = (28 x 100.000)/200.000 = 14 em cada 100.000 habitantes. (baixa) b) (28/36) x 100 = 77,77% (alta) Grande parte das doenças com alto grau de letalidade apresenta uma taxa reduzida de mortalidade, pois essas doenças normalmente são raras. • Mortalidade proporcional – este indicador é uma proporção que apresenta a mesma unidade no numerador e no denominador, sendo que o numerador está contido no denominador. Ele exprime o número proporcional de óbitos de uma dada doença em relação ao número total de óbitos em uma população em períodos determinados, sendo usualmente expressa por 100. no de óbitos da doença X no período X 100 no total de óbitos no período No município de Brilhantinho, onde a principal atividade econômica é a indústria do amianto, o número de óbitos por câncer de pulmão foi de 35 por ano (no ano de 1998), entre homens de 40 a 60 anos, enquanto o número total de óbitos para a mesma faixa etária no mesmo período foi de 102. Qual foi a mortalidade proporci- onal para câncer de pulmão na comunidade? 35/102 = 0,34 (34%) • Esperança de Vida (ou ‘expectativa de vida’) – as condições de vida de uma população acabam determinando, entre outras coisas, o período de vida médio dos indivíduos que fazem parte dela. Em geral, por exemplo, a expectativa de vida nas regiões mais desenvolvidas é maior que naquelas menos desenvolvidas, pois a habitação, a alimen- tação, a educação, os cuidados de saúde, entre outros, nessas regiões, são melhores. No Brasil, em 2001, a expectativa de vida ao nascer variava de 71,0 anos, na região Sul, a 65,8 anos, no Nordeste, em média (Brasil, 2002b). Desse modo, o indicador representa um valor sujeito às influências do meio e, em razão disto, tem sofrido mudanças sensíveis ao longo do tempo. Basta dizer que a vida média de um homem na Grécia antiga era de 18 a 30 anos, modificando-se pouco até a Idade Média, atingindo 78,6 anos em 2001. Com o passar do tempo e os avanços da ciência e da tecnologia, as condições gerais de vida do homem foram melhorando. Assim, a esperança de vida ao nascer de um brasileiro passou de 34,5 anos, em 1910, para 60,5 anos, na década de 70, e 68,6 anos em 2001 (Cia, 2001; Brasil, 2002b). 47 Princípios de Epidemiologia e sua Aplicação... • Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) – o IDH é uma ferramenta necessária e tem sido bastante empregada para a formulação de políticas públicas interessadas em promover o desenvolvimento humano sustentável. A criação deste indicador foi patrocinada pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) na década de 90. A idéia da aplicação deste índice é que o desenvolvimento fosse medido não somente pelo crescimento econômico de uma população, mas também por fatores que expandissem as oportunidades dos indivíduos. Por isso, ele possui três dimensões: educação, escolaridade e expectativa de vida. A dimensão renda é medida pelo Produto Interno Bruto (PIB) per capita; a dimensão educação é avaliada pela taxa de analfabetismo em adultos, com peso de 2/3, em combina- ção com a taxa combinada de matrícula nos três níveis de ensino, com peso (1/3) e a longevidade é medida pela expectativa de vida. Para que esses indicadores sejam reunidos no IDH, precisam ser transformados em índices parciais, cujos valores variam de 0 a 1. A análise do IDH é simples. Como seus valores variam de 0 a 1, quanto mais o IDH de um país ou estado estiver próximo de 0, menor será seu índice de desenvolvimento humano. O PNUD estabeleceu as seguintes faixas de classificação: 0 <= IDH< 0,5 Baixo Desenvolvimento Humano 0,5 <= IDH< 0,8 Médio Desenvolvimento Humano 0,8 <= IDH<= 1 Alto Desenvolvimento Humano Assim, países com renda per capita alta, podem apresentar um baixo IDH, pois nem sempre o aumento da riqueza significa melhor qualidade de vida para a população (Brasil, 1998). COMO UTILIZAR EPIDEMIOLOGIA NA SELEÇÃO, NA PROGRAMAÇÃO E NA AVALIAÇÃO DO USO DE MEDICAMENTOS Não podemos pensar em ações pertinentes à Assistência Farmacêutica desvinculadas de dados epidemiológicos fornecidos por, entre outros, essas ‘famílias’ de indicadores. Por exemplo, imaginemos uma situação hipotética, na qual um farmacêutico, em uma certa comunidade, precisa selecionar os medicamentos e programar sua aquisição e distri- buição. Como o fará, caso não tenha, em primeiro lugar, uma estimativa razoável do perfil da população (distribuição por faixa etária, sexo, atividade econômica etc.) e, em segundo, os indicadores de morbidade e de mortalidade dessa comunidade? Como poderá saber o quê, o quanto e quando precisa dispor em medicamentos para atender às suas demandas sanitárias? Seria impossível planejar os serviços de saúde para um município, estado, região, país, e mesmo para uma unidade de saúde, sem uma idéia do perfil de morbidade e morta- lidade da população a quem planejamos servir. Notadamente, a Assistência Farmacêutica não é exceção. Precisamos da epidemiologia, portanto, em todas as fases do ciclo da Assistência Farmacêutica, principalmente na seleção, na programação e, ainda, na avali- ação da utilização dos medicamentos. Diz-se, assim, que, para executar uma adequada seleção de medicamentos, é essencial conhecer primeiro a população: número de habitantes, distribuição etária, aspectos relacio- nados às atividades econômicas (parcela economicamente ativa, atividades econômicas mais importantes, níveis de renda), ao saneamento, à moradia, à escolaridade e aos padrões socioculturais mais importantes. 50 Assistência Farmacêutica... f. Que medidas de promoção à saúde poderíamos propor? Em primeiro lugar, tería- mos de procurar sensibilizar as autoridades para cuidar das reservas municipais de água e da rede de saneamento do município. Ainda, deveríamos propor campa- nhas educativas com relação às medidas de higiene pessoal e doméstica, cuidados com alimentos e água potável. Mesmo que todos os procedimentos corretos estejam sendo seguidos nas fases relativas ao Ciclo da Assistência Farmacêutica (ver capítulo específico), falhas podem ocorrer com a sua utilização. É ainda importante que se acompanhe essa utilização, não só para detectar possíveis falhas, mas para também aperfeiçoar os mecanismos de controle. As informações coletadas devem retornar e ‘retroalimentar’ o Ciclo da Assis- tência, possibilitando mudanças ou ajustes. É essencial que utilizemos os estudos farmacoepidemiológicos, que veremos com mais detalhes no Capítulo 10, a informação sobre os medicamentos e noções de farmacoeconomia para nos auxiliar nessa tarefa. Imaginemos agora que, nesse mesmo município, começaram a acontecer mais casos de complicações decorrentes dessa doença do que seria esperado, já que ela, apesar de grave, tem evolução benigna desde que tratada adequadamente. As complicações ocorriam em pacientes que não evoluíam de forma grave (ou seja, não nos pacientes que eram internados na fase aguda), mas causavam transtornos, em médio prazo, às famílias, e sobrecarregavam o sistema de saúde do município. O interessante era que os casos eram muito mais freqüentes em famílias de melhor poder aquisitivo. O farmacêutico averiguou o processo de armazenamento dos medicamentos para ver se poderia estar ocorrendo algum problema devido à guarda inadequada. Visitou as famílias para ver se estavam preparando o soro adequadamente. Buscou também se certificar de que a rede de distribuição de medicamentos estivesse a contento e de que não havia faltas. Já que nada encontrou, modificou sua abordagem. Buscou, então, informações nas prescrições médicas para saber se o protocolo de tratamento firmado pelas autoridades sanitárias (reposição eletrolítica oral, para os casos mais brandos, e parenteral, com remoção, para os casos mais graves) estava sendo seguido. Surpreen- deu-se ao constatar que estava sendo prescrito também o fármaco T, um medicamento ‘antidiarréico’, sabidamente de eficácia mal comprovada e com falhas de segurança para os pacientes, principalmente pediátricos (Fuchs & Wannmacher, 1998). Ao buscar informações sobre como os pacientes haviam tido acesso ao medicamento, pois não constava da lista de padronizados do seu município, nem estava disponível nas unidades de saúde, descobriu que alguns pacientes estavam comprando o remé- dio. Por isso, entendeu que, apenas os de melhores condições econômicas apresen- tavam os problemas. De modo a quantificar e padronizar as informações que colheu para apresentá-las ao Secretário de Saúde, ‘tratou’ seus dados: a. Quantificou por cada 100 pacientes (por faixa etária) e classificou as compli- cações apresentadas e o fármaco implicado (suspeito), relacionando os dois; buscou informações em fontes idôneas (livros, revistas científicas, bases de dados) e trocou idéias com colegas de municípios vizinhos. b. Calculou a dose média prescrita por kg/dia. c. Quantificou o número de unidades prescritas e calculou o número médio de unidades por cada 100 prescrições; aproveitou seus cálculos anteriores de dose média por kg/dia e, por regra de três, calculou o número de doses prescritas em cada 100 prescrições. 51 Princípios de Epidemiologia e sua Aplicação... d. Quantificou as despesas extras em medicamentos para o município daqueles pacien- tes que apresentaram complicações (pôde comprovar as despesas nos sistema de saúde do município, buscando as prescrições complementares dos mesmos pacientes), comparando-as por cada 100 pacientes às despesas de 100 outros que não tiveram complicações. Apresentou às autoridades sanitárias seu ‘caso’: a suspeita de que as complicações apresentadas tivessem como fator contribuinte, ou mesmo causa, o uso indevido do fármaco T, pelo volume do consumo e pelas informações relativas ao seu mau perfil de segurança. Na oportunidade, destacou também o ônus financeiro causado por aquela prática prescritiva aos cofres municipais. EPIDEMIOLOGIA NA AVALIAÇÃO DE SERVIÇOS E PROGRAMAS DE SAÚDE Por meio da avaliação, podemos verificar a necessidade de intervenções capazes de modificar quadros sanitários ou mesmo observar as dificuldades enfrentadas por essas práti- cas para alterarem indicadores de morbi-mortalidade em certas circunstâncias. A avaliação acaba auxiliando no planejamento e na elaboração de uma intervenção ou na determinação de qual a intervenção será mais adequada em uma realidade específica (Silver, 1992; Contandriopoulos et al., 1997). Assim, podemos comparar a taxa de cura de tuberculose entre pacientes que rece- bem medicamentos pela dispensação convencional com aquela obtida por pacientes que recebem pela dispensação orientada. Estaríamos, assim, usando um método epidemiológico clássico – o estudo de coorte para comparar desfechos ou resultados entre grupos de pacientes submetidos a diferentes intervenções. Por exemplo, se o chefe do posto de saúde ZUM tem informações fidedignas sobre os hipertensos inscritos no programa desenvolvido na unidade, fica bem mais fácil planejar a quantidade de medicamentos anti-hipertensivos que deverão estar disponíveis na farmácia e determinar quais e quantos profissionais participarão de grupos de discussão sobre ali- mentação e importância do exercício físico com este grupo de risco. O processo avaliativo fornece informações capazes de melhorar uma intervenção no seu decorrer ou na tomada de decisões. Avaliar é também uma forma de determinar os efeitos de uma intervenção para decidir se ela deve continuar, ser modificada ou interrompida. CONSIDERAÇÕES FINAIS A epidemiologia é um instrumental importante no trabalho de qualquer profissional de saúde. Pelo que vimos de seus fundamentos, da construção, do emprego e da utilidade dos indicadores e dos exemplos relacionados à Assistência Farmacêutica, podemos estimar também a importância que essa disciplina tem na formação e no dia-a-dia do farmacêutico. O objeto da nossa profissão é o paciente. Para ele é voltado o esforço de desenvol- ver e aprimorar os serviços farmacêuticos. O medicamento é nossa ferramenta de trabalho e requer conhecimento para aplicá-lo a contento. Aos farmacêuticos não se exige que sejam epidemiologistas, mas que saibam utilizar a epidemiologia de maneira proveitosa para seu trabalho com o binômio paciente-medicamento dentro do sistema de saúde em que estão inseridos. 52 Assistência Farmacêutica... REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALMEIDA FILHO, N. Anotações sobre a história da epidemiologia. In: ROUQUAYROL, M. Z. (Org.) Epidemiologia e Saúde. Rio de Janeiro: Medsi, 1993. BRASIL. PNUD/Ipea/Fundação João Pinheiro/IBGE. Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil. 1998. (CD ROM) BRASIL. MS. Portaria no 507, 23 abr. 1999. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília: MS, 1999. BRASIL. MS. Secretaria Executiva/Datasus. Informações de saúde. Indicadores de saúde. Mortalidade infantil – período 1998. Disponível em: <http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/mortinf/mibr.htm>. Acesso em: 19 mar. 2002a. BRASIL. MS. Secretaria Executiva/Datasus. Informações de saúde. Indicadores de saúde. Indicadores e dados básicos. Indicadores demográficos. Esperança de vida ao nascer – período 2001. Disponível em: <http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/idb2001/a11.htm>. Acesso em: 19 mar. 2002b. CENTRAL INTELLIGENCE AGENCY (CIA). The World Factbook. 2001. 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Baltimore: Williams & Wilkins, 1992. OSORIO-DE-CASTRO, C. G. S. Estudo de Utilização de Medicamentos em Unidade Neonatal, 1996. Dissertação de Mestrado, Rio de Janeiro: UFRJ. PEASE JR., R. W. (Ed.) Merriam-Webster’s Medical Desk Dictionary. Springfield: Merriam-Webster, 1993. ROUQUAYROL, M. Z. & KERR-PONTES, L. R. A medida da saúde coletiva. In: ROUQUAYROL, M. Z. (Org.) Epidemiologia e Saúde. Rio de Janeiro: Medsi, 1993. SILVER, L. Aspectos metodológicos da avaliação dos serviços de saúde. In: GALLO, E.; RIVERA, F. J. U. & MACHADO, M. H. (Orgs.) Planejamento Criativo: novos desafios em políticas de saúde. Rio de Janeiro: Relumé-Dumará, 1992. SNOW, J. On the Mode of Communication of Cholera. Londres: John Churchill, 1855. SNOW, J. Sobre a Maneira de Transmissão do Cólera. Rio de Janeiro: Usaid, 1967. VAUGHAN, J. P. & MORROW, R. H. Epidemiologia para os Municípios: manual para gerenciamento dos distritos sanitários. São Paulo: Hucitec, 1992. WORLD HEALTH ORGANIZATION (WHO). The Selection of Essential Drugs: first report of the WHO expert committee. Geneva: WHO, 1977. (Technical Report Series 615) 55 Gerenciamento da Assistência Farmacêutica Portanto, uma estrutura mais enxuta ou o predomínio de serviços menos complexos não elimina a necessidade de organização e de um gerenciamento eficiente. Pelo contrário, esses serviços devem ser preparados para ampliar sua atuação por meio de projetos técnicos e administrativos para que a equipe de saúde e os usuários possam perceber a importância do mesmo na melhoria da qualidade da atenção à saúde e assim ganhar apoio técnico e político para o seu desenvolvimento. Buscamos, neste livro, oferecer alternativas de organização para desenvolver atividades, em diferentes níveis de complexidade, quer sejam técnicas ou políticas. Consideramos que os instrumentos a seguir apresentados aliados ao entendimento do profissional quanto à sua importância no processo de mudança constituem ferramentas importantes no processo de reestruturação da Assistência Farmacêutica no Brasil. O PLANEJAMENTO: um instrumento gerencial na assistência farmacêutica Considerando os conceitos estabelecidos anteriormente, podemos concluir que a formulação e a implantação da política de Assistência Farmacêutica dependem do processo de gestão, o qual deverá contar com uma gerência efetiva, capaz de garantir a articulação das várias etapas envolvidas, assegurando, dessa maneira, a racionalidade, a eficiência, a eficácia e a qualidade dos serviços prestados. Em última análise, podemos afirmar que o acesso e o uso racional de medicamentos são os principais objetivos do processo de gerência da Assistência Farmacêutica. Partimos do pressuposto de que a Assistência Farmacêutica tem um caráter sistêmico e multiprofissional, não estando restrita ao simples abastecimento de medicamentos. Assim, os resultados obtidos nesse processo dependerão, essencialmente, da elaboração de diretrizes claras por parte do gestor envolvido e da capacidade de gerenciamento existente na sua equipe. Nesse sentido, o gerente ou o responsável pela Assistência Farmacêutica irá representar o elo entre diferentes níveis dentro do sistema, na medida em que será um dos responsáveis pela tradução das diretrizes em ações concretas. Entretanto, ‘transformar’ diretrizes em ações não é uma tarefa tão simples quanto pode parecer. Se tomarmos como exemplo a Política Nacional de Medicamentos, podemos verificar que a reorientação da Assistência Farmacêutica é uma de suas diretrizes prioritárias. O modelo adotado está fundamentado na descentralização da gestão da Assistência Farmacêutica, na promoção do uso racional de medicamentos, na otimização e na eficácia do sistema de abastecimento no setor público. Buscar a consolidação desse novo modelo acarreta uma série de necessidades, dentre as quais podemos destacar: • identificação da situação epidemiológica do município; • identificação dos pacientes em situação de esquemas terapêuticos continuados; • identificação de pacientes de alto risco e as respectivas terapias prescritas; • definição do perfil de consumo de medicamentos no município; • análise do perfil de consumo de medicamentos perante o perfil epidemiológico; • identificação de pacientes com baixa adesão a terapias prescritas a fim de atuar no sentido de melhorar a efetividade dos tratamentos; 56 Assistência Farmacêutica... • formulação, em função dos dados anteriores, de estratégias técnicas, políticas, educacionais, regulatórias e gerenciais junto aos profissionais de saúde e população em geral; • programação adequada ao fluxo de abastecimento necessário, visando à otimização de recursos e ao incremento da disponibilidade de produtos; • qualificação dos procedimentos técnicos referentes aos medicamentos (aquisição, distribuição, armazenamento etc.); • organização de um sistema de informação; • capacitação de recursos humanos. Dessa forma, cada um desses pontos significará um objetivo a ser alcançado. Para poder atingi-los, devemos desdobrá-los em operações a serem implementadas, que serão compostas de ações a serem executadas. Para que uma determinada diretriz possa ter o seu desdobramento natural, é preciso desencadear um processo permanente de análise, que resulte na definição de ações específicas a serem realizadas. Parte-se de uma imagem a ser alcançada (o ‘deve ser’) e da definição dos possíveis obstáculos a serem superados para construir a nova realidade. ‘O conhecimento dos problemas auxilia na definição das prioridades e dos mecanismos de intervenção’. Mas, como fazê-lo? Por onde começar e com quem? A resposta é simples: O QUE É PLANEJAMENTO? O planejamento é um instrumento gerencial que deve estar apoiado no conhecimento exato da nossa realidade, das nossas condições e das nossas dificuldades. Planejar significa, portanto, orientar a ação do presente para que possamos organizar e estruturar um conjunto de atividades, conforme critérios previamente estabelecidos, visando a modificar uma dada realidade. Por isso, todas as operações que compõem um plano representam uma opção de ‘organização global’, uma ‘distribuição de funções’, ‘responsabilidades’, ‘coordenação’ e uma ‘ordem de alocação de recursos’. Podemos dizer ainda que o planejamento é parte integrante do processo de gestão e gerência e, por esta razão, exige o domínio da concepção do nosso papel político. Muito mais que uma técnica, planejar é uma opção perante outras formas de ação, opondo-se à pura improvisação. No mesmo sentido, planejar não é prever o futuro. Aquela velha rotina do apagar de incêndios deve ceder espaço a um gerenciamento racional e participativo, fundamentado no planejamento e na valorização de habilidades (Matus, 1996). O planejamento permite: • identificar com clareza os objetivos esperados a longo prazo (a construção da ‘imagem’ que buscamos); • avaliar as necessidades e problemas mais relevantes; • garantir a otimização dos recursos disponíveis; • buscar e orientar investimentos de recursos adicionais; • constituir uma base de dados que nos permita avaliar a efetividade do sistema. Planejar é preciso! Planejamento é uma forma de organização para a ação 57 Gerenciamento da Assistência Farmacêutica O planejar implica em um conhecimento profundo da realidade que se procura melhorar. Quem mais conhece a realidade é quem dela participa. Logo, o planejamento deve ser feito pela equipe de trabalho, privilegiando a composição multiprofissional. Cada um possui um capital intelectual acumulado ao longo de sua experiência. Valorizar habilidades significa envolver as pessoas e criar caminhos para que as diversas competências existentes sejam devidamente usufruídas. O que se pretende aqui é justamente romper com a antiga visão tecnocrática, determinista e elitizada do planejamento. Devemos ter a consciência de que quem planeja deve ser o executor do plano a ser elaborado e conhecedor da realidade que se pretende transformar. É nesse sentido que buscaremos desmistificar o planejamento, fornecendo elementos que permitam assimilar sua lógica e estruturação. OS TIPOS DE PLANEJAMENTO Basicamente existem duas concepções de planejamento. De um lado, o planejamento tradicional ou normativo e, de outro, o chamado planejamento estratégico. PLANEJAMENTO TRADICIONAL Compreende os seguintes passos: 1) Diagnóstico: retrato atualizado da situação presente. 2) Prognóstico: conjunto de ações possíveis, tendo em vista os recursos e as restrições, com finalidade de fixar objetivos e metas. 3) Fixação de objetivos e metas: são estabelecidos por comparação entre a projeção do diagnóstico e os desejos da sociedade. 4) Seleção: proceder escolha bastante criteriosa das metas que se pretende alcançar, bem como dos meios apropriados. É a base para a elaboração do plano. 5) Formulação do plano: estabelecidos metas e objetivos, completa-se o plano gerando projetos e fixando prazos e recursos necessários. 6) Programação dos recursos: a) financeiros; b) humanos; c) físicos. 7) Execução: consiste na implantação do projeto específico. 8) Avaliação e controle: em todas as fases do planejamento deve estar presente um sistema simples e eficaz de avaliação e controle para permitir uma decisão quanto ao prosseguimento ou abandono do mesmo. Considera-se, no planejamento tradicional, uma atitude correta e inteligente o abandono de um plano, em qualquer fase, sempre que ele se tornar inviável técnica, econômica ou financeiramente. PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO É um método de raciocínio capaz de verificar a coerência das proposições possíveis em relação ao objetivo perseguido. Esse método busca definir um conjunto de operações que devem ser realizadas com a finalidade de mudar a realidade, permitindo: • apostar em um futuro que se deseja, considerando outros atores e variáveis em jogo; • minimizar o efeito surpresa por meio de ações planejadas; 60 Assistência Farmacêutica... c. Ação • preparação do programa, projeto ou plano operacional; • implementação do plano; • monitoração do plano. Embora o planejamento seja algo indispensável, existe um certo desprestígio dessa atividade, o que está intimamente relacionado ao caráter determinístico do método tradicional. Em contrapartida, o planejamento estratégico apresenta duas vertentes, uma voltada para a estratégia empresarial e outra que contempla a questão pública (Dataminas, 1998). Neste último caso, o planejamento estratégico situacional (PES) constitui a ferramenta desenvolvida para trabalhar o conceito de situação, ou seja, a realidade explicada por um ator dentro da situação. Partindo desse princípio, podemos então deduzir que: Planeja quem governa Mas quem é o governante? O governante é aquele que detém controle de alguma etapa-chave do processo em questão e/ou do todo. Todavia, governar deve ser compreendido como um ato coletivo no qual o ator social que governa não é um indivíduo, mas sim uma composição dinâmica entre diversos atores. Governar ou conduzir é algo muito complexo, que não pode ser reduzido inteiramente a uma simples teoria. É uma arte, mas não é pura arte. Para governar, é indispensável um certo domínio teórico sobre os sistemas sociais. O governante ou condutor dirige um processo para alcançar objetivos que escolhe e altera segundo circunstâncias (seu projeto), superando os obstáculos de maneira ativa, ou seja, buscando controlar certas variáveis e articular com os demais atores que controlam outras variáveis importantes. Para vencer as resistências existentes com a sua força limitada, o condutor deve demonstrar uma certa capacidade de governo, resultando na obtenção da governabilidade do sistema. Os três aspectos (‘projeto de governo’, ‘governabilidade’ e ‘capacidade de governo’) deverão estar constantemente articulados para viabilizar o governar, constituindo um sistema triangular (Figura 3) em que cada um depende dos outros (Matus, 1994). Figura 3 – O triângulo de governo Fonte: Matus (1994). Projeto de Governo Governabilidade Capacidade de Governo 61 Gerenciamento da Assistência Farmacêutica Essa caracterização nos leva a identificar sistemas de naturezas distintas: o sistema propositivo de ações (projeto de governo), o sistema social (governabilidade do sistema) e o sistema de direção e planejamento (capacidade de governo). O ‘projeto de governo’ refere-se ao conteúdo das ações que se pretende realizar para alcançar determinados objetivos. A discussão sobre projeto de governo versa sobre as reformas políticas, o estilo de desenvolvimento, a política econômica etc., que parecem pertinentes ao caso e ao grau de governabilidade do sistema. Esse conteúdo propositivo é produto das circunstâncias e interesses do ator que governa e de sua capacidade de governo, incluindo sua capacidade de aprofundar a explicação da realidade e propor soluções de forma imaginativa e eficaz. Em última análise, o projeto de governo representa a soma do capital político e do capital intelectual aplicada no desenho de uma proposta de ação, traduzida pela vontade política. A ‘governabilidade’ expressa a relação entre as variáveis controladas e as não controladas pelo ator no processo de governo. Essas variáveis são ponderadas pelo valor ou peso que representam nas ações do ator. A governabilidade do sistema refere-se, então, à possibilidade de ação e ao controle de seus efeitos. Quanto maior o número de variáveis decisivas controladas pelo ator, maior será a sua governabilidade, ou seja, maior será a sua liberdade de ação e o seu potencial resolutivo no enfrentamento de obstáculos. Exemplo: recursos financeiros e técnicos, postos de gerências e supervisão etc. A ‘capacidade de governo’ diz respeito ao conjunto de habilidades, experiências, métodos e técnicas dominados por um ator, visando à garantia de uma boa governabilidade do sistema na execução do conteúdo propositivo expresso no projeto de governo. Podemos, dessa forma, definir capacidade de governo como sendo a capacidade de gerar e controlar ações. A interação e o condicionamento mútuo entre esses aspectos permitem relativizar cada um deles. Por exemplo, em relação à governabilidade, podemos estabelecer que: a) Atores diferentes implicam em governabilidades diferentes – atores sociais são forças sociais e/ou agentes sociais que controlam recursos. Por isso, é fundamental a definição do ator que planeja, de seus oponentes e aliados. Devemos compreender que o ator não é representado por um gestor, um dirigente ou um gerente. O planejamento deve ser realizado por aqueles que integram o objeto a ser planejado; é a soma das experiências e a contraposição de idéias que alimentam a criatividade e outras habilidades na transformação de uma realidade. Somente o domínio da concepção do nosso papel político e social nos permitirá afastar os obstáculos que dificultam o nivelamento dos indivíduos que compõem um ator social. Nesse sentido, devemos banir o corporativismo, o individualismo, o paternalismo e a apatia que pairam sobre nossas instituições. b) Um projeto é mais governável para objetivos modestos e menos governável para os objetivos ambiciosos – isto não significa que devemos necessariamente começar por aquilo que nos parece mais fácil. É preciso saber estabelecer prioridades, avaliando o impacto de cada ação, o que podemos ganhar com a sua implementação ou o que podemos perder caso não ocorra. c) Quanto maior a capacidade de governo, maior será a governabilidade do sistema – talvez, o meio mais eficaz para a elaboração de projetos de qualidade e busca de aumento de governabilidade seja o aprimoramento de nossa capacidade de governo, o qual depende do capital intelectual, político ou financeiro acumulado pelas equipes de trabalho. 62 Assistência Farmacêutica... Dessa forma, as técnicas de governo, entre elas o planejamento, devem ser exploradas a fundo, buscando suas potencialidades e limitações. Por esse motivo procuraremos, daqui por diante, apresentar o planejamento estratégico situacional, detalhando os momentos que o compõem e alguns aspectos de sua operacionalização. Quando se diz que um tipo de planejamento é situacional, infere-se que devemos ter claramente definidos o objeto que se quer planejar e as circunstâncias existentes (poder político, recursos disponíveis, nível de organização, atores envolvidos etc.). O planejamento situacional é um modelo no qual o sujeito que planeja está dentro do objeto a ser planejado (faz parte do problema, da situação). Este sujeito tem consciência da existência do outro que participa com ele do sistema. No planejamento situacional, existe uma relação entre sujeitos. Da mesma forma, devemos considerar que toda explicação é dada por alguém a partir de uma situação específica, sendo que existe mais de uma explicação ‘verdadeira’ sobre a mesma realidade. Deve-se explicar e apreciar uma situação estando consciente da explicação do outro. Esta explicação da realidade refere-se à identificação de oportunidades e problemas existentes no contexto estudado. Temos de ter presente, ainda, que o que pode ser problema para um, pode ser ‘oportunidade’ para o outro. No decorrer desta análise, verifica-se que o planejamento é essencialmente político. O político, no planejamento estratégico situacional, não é um componente externo, mas sim uma variável do plano. Se não encararmos o componente político desse modo, não haverá uma interação positiva entre a eficácia política e a eficácia econômica, impedindo que o planejamento seja totalizante e dificultando sua identificação com o processo de governo. Finalmente, cabe ressaltar que o plano resultante do processo de planejamento situacional é modular. Ele é composto por unidades que podem ser agregadas, dimensionadas e combinadas conforme os objetivos estabelecidos e a estratégia elaborada. O planejamento deve ser entendido como uma dinâmica de análise e cálculo que possibilita ajustar uma determinada ação, permitindo reorientá-la para obtenção de um resultado de maior desempenho. A noção de continuidade é igualmente fundamental, pois acompanha a realidade que é mutável. Se temos esse entendimento, torna-se necessário realizar o cálculo do plano a uma velocidade maior que a mudança dos fatos na situação. Caso contrário, estaremos sempre atrás dos fatos e nosso cálculo nem precederá nem presidirá a ação. O aspecto central do planejamento é o acompanhamento permanente da realidade com avaliação das decisões tomadas. O objetivo é o de verificar se os resultados produzidos convergem na direção dos resultados esperados. Assim, o planejamento deve ser entendido como um processo de aprendizagem/correção/ aprendizagem. Isto nos obriga a fazer a correção permanente da trajetória de nossas operações (Morais, 1992). Essas colocações são importantes para uma melhor compreensão dos quatro momentos do planejamento estratégico situacional: ‘o explicativo’, ‘o normativo’, ‘o estratégico’ e ‘o tático-operacional’. Esses momentos são dinâmicos e se repetem constantemente em um permanente fazer, embora mudem de conteúdo, contexto, lugar e tempo. Devem ser visualizados como uma espécie de espiral, nunca como uma seqüência ou algo gradual. O conhecimento desses quatro momentos permite compreender melhor a lógica do planejamento estratégico situacional, cabendo a cada equipe a tarefa de encontrar a sua forma de conduzir e organizar o trabalho de elaboração do plano. 65 Gerenciamento da Assistência Farmacêutica sua profundidade. Neste caso, estaremos mais interessados nas causas e conseqüências mais imediatas em relação a cada problema, o que nos permite ter uma visão global da realidade, auxiliando em uma identificação mais objetiva das prioridades de intervenção. Nosso interesse deve estar voltado à identificação de nós críticos. Em um segundo momento, a equipe será capaz de aprofundar as questões referentes a esses pontos críticos, quando a construção da chamada nuvem de problemas pode ser uma tarefa mais fácil para aqueles que começam a descobrir o planejamento. A lógica de ordenamento ou classificação dos problemas acompanha o estabelecimento das prioridades de intervenção. Após a explicação do problema (árvore explicativa), o planejador passa a formular a ‘situação objetivo’, que é uma situação desejada e imaginada, devendo ser o resultado da mudança produzida pela execução do plano elaborado. A situação objetiva não é uma meta fixa e pode ser modificada conforme a evolução dos acontecimentos. Uma maneira prática de formular a situação objetivo, que pode ser realizada positivando os problemas, suas causas e conseqüências, consiste na árvore explicativa, gerando o que iremos chamar de ‘árvore dos objetivos’ (Figura 5). A árvore dos objetivos pode ser modificada, ampliada ou mesmo suprimida daqueles objetivos considerados de pequeno impacto na resolução do problema. Fonte: figura elaborada pelos autores. Melhoria na qualidade da atenção à saúde Redução da demanda não atendida de medicamentosQualidade de atendimento ao usuário Redução da falta medicamentos Redução de perdas Regularização dos recursos financeiros Lista de medicamentos essenciais padronizados Realização de programação Normatização técnica da aquisição Implantação de boas práticas de armazenamento Capacitação de RH Figura 5 – Árvore dos objetivos Do confronto entre a árvore explicativa e a árvore dos objetivos, resulta a identificação de causas ou atividades que têm impacto mais significativo na geração do problema e que são denominadas de ‘nós críticos’ (neste caso, a capacitação de RH e o aumento de recursos financeiros). Essas atividades podem ser escolhidas para abordagem prioritária na implementação do plano. 66 Assistência Farmacêutica... Uma outra alternativa interessante é a definição da ‘situação objetivo’ antes da identificação dos problemas. Ou seja, após a definição daquilo que deve ser transformado ou mantido, buscamos identificar os problemas ou obstáculos a serem transpostos para construir a imagem desejada. O Momento Normativo É o momento do desenho do plano, o momento do ‘deve ser’, ou seja, como deve ser a situação ideal a partir do momento explicativo. É quando apresentamos o ‘conteúdo propositivo’ do plano. Trabalhamos basicamente com os nós críticos, identificados anteriormente, por meio de uma ‘operação’, que é o meio de intervenção do planejador sobre a realidade para alcançar os objetivos do plano. Portanto, a operação é uma declaração de compromisso com a modificação ou manutenção de uma determinada situação. Uma operação se caracteriza por: • utilizar e combinar variáveis sob controle do ator; • gerar um produto que provoque um resultado; • empregar uma variedade de recursos (humanos, econômicos, cognitivos, políticos, capacidade organizativa etc.). Na prática, observamos que uma operação é aquilo que devemos fazer para atacar um nó crítico e caminhar em direção ao nosso objetivo. Surge então a pergunta: como fazer esta operação? A resposta é: as ações, encaradas como sendo o desdobramento de uma operação. Uma ação refere-se ao como fazer, expressando uma atividade precisa. Assim, uma operação pode ser composta de várias ações. Entretanto, dizer o que fazer e como fazer não é suficiente para a elaboração de um plano. É necessário responder ainda com que recursos, em que prazo, com que eficácia e eficiência e, principalmente, quem faz e com o auxílio de quem. O conjunto desses dados corresponde à matriz normativa ou operacional. Ao desenhar uma operação, é necessário: 1. O compromisso de executá-la. 2. A definição do responsável sobre os recursos necessários e disponíveis e que deverá manter, conduzir e prestar contas desta operação. 3. A definição dos recursos necessários, o produto da operação e os resultados esperados. 4. A definição do prazo de execução da operação e com que eficiência e eficácia, sendo que o conjunto desses dados corresponde à matriz normativa ou operacional. 5. A identificação de possíveis grupos apoios (parcerias, colaboradores etc.) são fundamentais para o sucesso do planejamento. Quando falamos em eficiência, relacionamos recursos/produtos, ou seja, avaliamos se os recursos necessários à realização de uma dada operação são suficientes ou não. A análise de eficácia avalia a relação produto/resultado, isto é, verifica o nível de influência da execução de uma determinada operação na resolução de um problema. É importante detalhar o máximo possível os recursos necessários para avaliarmos se a operação é viável e eficiente. Isso pode ser feito com o uso da matriz operacional, exemplificada no Quadro 2. 67 Gerenciamento da Assistência Farmacêutica Quadro 2 – Exemplo de matriz operacional Problema ou nó crítico: falta de capacitação de Recursos Humanos. Gerente: Produto: profissionais capacitados na implementação da Assistência Farmacêutica Resultado esperado: melhoria no acesso da população aos medicamentos essenciais Operação: Capacitação de profissional de nível superior Fonte: quadro elaborado pelos autores. Após elencarmos as operações e as ações a serem executadas, obtemos o esqueleto do plano operacional e este pode apontar para a necessidade de elaboração de projetos específicos para objetivos pontuais, encerrando o momento normativo. O Momento Estratégico Após termos selecionado os problemas, elaborado a situação objetivo e as operações, surgem as seguintes perguntas: O que é possível fazer? O que é preciso para viabilizar o plano? O momento estratégico visa a construir a viabilidade do ‘deve ser’, que deve ter mais peso que o ‘pode ser’. Para melhor compreensão, precisamos definir alguns conceitos aplicados no momento estratégico: • Tática: é o uso de recursos (escassos) na produção de mudança situacional imediata. • Estratégia: é o uso da mudança situacional imediata para alcançar a situação objetivo do plano. • Plano: é a proposta de ação fundamentada na tática e na estratégia. É a maneira de tornar o desenho normativo (o desejo) em uma realidade viável, mediante: Ações Prazo Responsável Grupos de apoio Recursos Análise de eficiência e eficácia Cursos Boas Práticas de Armazenamento e Distribuição 90 dias Flávia Universidade MS Materiais Financeiros Cognitivos No profissionais treinados Mudanças de prática de trabalho Palestras Lei de Licitação e Aquisição de Medicamentos 30 dias Paulo Universidade Materiais Cognitivos Redução de erros nos processos de aquisição Sistema de Informação de Medicamentos 180 dias Vera CFF Materiais Cognitivos Melhoria da qualidade das informações 70 Assistência Farmacêutica... O descumprimento desses passos pode comprometer o nosso plano, condenando nosso trabalho a um plano normativo e determinista. Esse é o momento de construir a aposta e, sobretudo, as alternativas e opções perante a realidade. A este conjunto de alternativas e opções chamamos de ‘estratégia do plano’. O Momento Tático-Operacional O último momento do planejamento é a execução propriamente dita do plano. O momento tático-operacional transforma a análise acumulada nos três momentos anteriores em ações concretas. Quatro submomentos podem então ser identificados (Matus, 1994): 1. Análise da situação conjuntural: é a capacidade de analisar a realidade, observar o desenvolvimento de novos problemas e avaliar a direção do processo de planejamento. 2. Pré-avaliação das decisões possíveis: avalia quais os meios que se deve utilizar para selecionar as operações e ações mais eficazes para alcançar os objetivos do plano. É o momento de definir a ação. 3. Tomada de decisões e execução: a partir do conjunto do plano, define os critérios econômicos e políticos para a execução. Devemos ter presente, neste momento, os critérios de curto, médio e longo prazo. 4. Pós-avaliação das decisões tomadas e apreciação da nova situação: compara os efeitos reais aos efeitos esperados no plano de ações. A ação concreta, que nasce do momento tático-operacional, exige uma organização estável. Essa estrutura deve cumprir duas funções básicas: estabelecer um sistema de direção das atividades e avaliação dos resultados e estabelecer um sistema de coordenação por projetos ou ações a serem igualmente avaliadas. Não existe um modelo ideal de como se organizar para executar o plano, mas, com certeza, algumas condições mínimas são indispensáveis. Essas condições são: ter grupo responsável e de apoio em cada operação; ter coordenação permanente do plano; garantir avaliações periódicas nos espaços da direção e a agilidade no contingenciamento de situações. Na prática, observa-se que um encaminhamento adequado pode ser a divisão em grupos de trabalho responsáveis por determinadas operações. Os apoios e responsáveis por um conjunto de operações deverão discutir como vão operacionalizar a tarefa, escrevendo suas idéias em um plano de trabalho a ser entregue ao coordenador, o que lhe permitirá dirigir as atividades. A seguir, apresentamos, no Quadro 5, um modelo de plano de trabalho destinado a detalhar as operações previstas. Quadro 5 – Detalhamento de operações Operação: Capacitaçãode pessoal de nível superior Resultados: Implementar estratégia gerencial da Assistência Farmacêutica Responsável: Fulano Indicadores: % de profissionais treinado Apoio: Universidade, SES, MS Data: primeiro semestre/Ano 71 Gerenciamento da Assistência Farmacêutica Fonte: quadro elaborado pelos autores. Uma vez concluída a montagem do plano, torna-se necessário contemplar mais dois elementos: acompanhamento e avaliação. ACOMPANHAMENTO E AVALIAÇÃO Para completar o processo de gestão, além do planejamento e da execução propriamente dita do plano elaborado, torna-se necessário estabelecer critérios de acompanhamento e avaliação do plano. O método não tem um sistema de avaliação pre-definido, sendo as abordagens gerais discutidas no tópico “Avaliação e Garantia da Qualidade em Saúde”, mais adiante, mas é possível apontar alguns elementos indispensáveis (Matus, 1994): • definição de um calendário de avaliação; • definição de responsabilidades (quem cobra de quem). Isto está relacionado à forma de gerenciamento (coordenação geral, coordenação por projetos, responsável por operações etc.); • definição dos procedimentos para as avaliações; • avaliação da eficiência e eficácia; • estabelecimento de tempo limite para o planejamento. Além da avaliação, é importante estabelecer uma forma de acompanhamento externo ao plano para participar das avaliações e das correções a serem feitas. Essa recomendação deve ser discutida caso a caso a partir de alguns elementos, como a amplitude do plano, a capacidade do ator, o volume e a complexidade das operações, os recursos econômicos etc. RECURSOS Segundo Chiavenato (1998), o recurso é todo meio direta ou indiretamente envolvido no planejamento, organização, direção e controle das atividades organizacionais. É por meio dos recursos, quer sejam financeiros, humanos, cognitivos ou materiais, e só por meio deles, que produzimos bens e serviços. A administração pública gerencia os recursos de nossa sociedade. Temos de ter sempre em mente que a carência dos recursos existentes é constante em todas as organizações, sejam elas públicas ou privadas, em relação às necessidades reais, ainda mais no setor saúde. A alocação de recursos existentes é uma ‘decisão política’ do gestor da organização de acordo com seu plano e sua capacidade de governo. Ações (detalhamento) Cronograma Responsável Apoio Fonte de comprovação Orçamento/ investimento Curso de planejamento e gerenciamento 12-15/ maio SMS Universidade Freqüência Curso de Internet 15-17/ junho SES Universidade Freqüência Quadro 5 – Detalhamento de operações (continuação) PLANO DE TRABALHO 72 Assistência Farmacêutica... Nesse contexto, a despeito da importância de todos os recursos disponíveis, o recurso mais importante é o ‘conhecimento’. A pergunta-chave é: ‘como usar e aplicar o conhecimento de maneira eficaz na otimização da aplicação dos recursos financeiros, humanos ou materiais?’(Chiavenato, 1998). RECURSOS FINANCEIROS A falta de hábito no planejamento e a falta de conhecimentos na área financeira muitas vezes dificultam as práticas do dia-a-dia dos profissionais que atuam na área da saúde. Conceitos como orçamento, prestação de contas, Fundo Municipal de Saúde e controle social permeiam todo o texto sobre recursos financeiros. Conhecê-los auxilia o gerente a entender e participar efetivamente dos processos de planejamento da Assistência Farmacêutica. De modo a tornar mais prático este texto, a explanação estará direcionada para o nível municipal. PROGRAMAÇÃO DOS RECURSOS FINANCEIROS ANUAIS Os diversos setores das Secretarias Municipais devem fazer uma estimativa anual de seus gastos para compor o orçamento do município, subsidiando as Secretarias da Fazenda e Planejamento, responsáveis pela elaboração do orçamento. No planejamento das ações, o gerente da Assistência Farmacêutica deve fazer uma previsão detalhada de gastos, conforme as necessidades ou exigências de cada município. Essa previsão pode ser composta de: estimativa de recursos necessários ou disponíveis, fontes de financiamento existentes já previstos e justificativas para cada uma das ações, conforme o exemplo apresentado no Quadro 6. Quadro 6 – Exemplo fictício de programação orçamentária anual* PROPOSTA DE ESTIMATIVA ANUAL DE RECURSOS FINANCEIROS NECESSÁRIOS PARA A ASSISTÊNCIA FARMACÊUTICA Estimativa Anual de Recursos necessários ou disponíveis Fonte de Financiamento Justificativa MATERIAL DE CONSUMO Aquisição de medicamentos básicos a serem disponibilizados à população R$ 20.000,00 Recurso Federal ao Incentivo à Assistência Farmacêutica Básica Resolutividade das ações de saúde R$ 10.000,00 R$ 10.000,00 Acesso da população aos medicamentos Recurso Estadual ao Incentivo à Assistência Farmacêutica Básica Recurso Municipal ao Incentivo à Assistência Farmacêutica Básica R$ 3.600,00 Incentivo a Medicamentos de Saúde Mental Aquisição de medicamentos de Saúde Mental para atendimento no Núcleo de atenção psiquiátrica a serem disponibilizados à população Resolubilidade das ações de saúde mental no município Acesso da população aos medicamentos 75 Gerenciamento da Assistência Farmacêutica DESENVOLVIMENTO ORGANIZACIONAL (DO) Desenvolvimento Organizacional (DO) é um processo de mudança planejada, envolvendo coleta e análise de dados, diagnóstico organizacional, ação de intervenção e avaliação (Chiavenato, 1999). Na literatura clássica, a definição do futuro desejado pelas organizações e a decisão sobre os caminhos para realizá-la, cabia à cúpula da organização. Nessa visão, a função dos recursos humanos era a de pôr em prática as estratégias definidas e moldar seu comportamento às diretrizes estabelecidas. Atualmente, como já falamos no planejamento, há outro entendimento sobre o assunto, no qual os recursos humanos são os formuladores de estratégias em todos os níveis. Ao desempenhar seu papel, cada indivíduo contribui no processo de identificação e formulação das estratégias, assumindo uma visão crítica de suas ações, identificando os ajustes necessários em bases mais adequadas (Carvalho, 1995). Portanto, para o desempenho dessa nova visão, é necessário que a organização se preocupe com o desenvolvimento de seus profissionais, o que envolve conceitos de mudança e de capacidade de adaptação à mudança, tanto da organização como dos profissionais. Quando falamos de treinamento e desenvolvimento, temos em vista o indivíduo, numa visão microscópica. Já o processo de desenvolvimento da organização possui uma visão sistêmica e macroscópica, sendo planejado continuamente e não mero resultado de oportunidades (Chiavenato, 1998). O desenvolvimento organizacional parte do princípio de que o ser humano tem aptidões que permanecem inativas em ambiente restrito e hostil, impedindo seu crescimento. Essa condição pode e deve ser modificada, promovendo o desenvolvimento pessoal e participativo dos indivíduos na organização. Dessa forma, aumentamos o seu nível de confiança, o apoio entre seus membros e a resolubilidade dos problemas. Precisamos aqui diferenciar dois conceitos: • ‘treinamento’: prepara pessoas para o desempenho de tarefas para os cargos atuais (Werther & Davis, 1983); • ‘desenvolvimento’: procura orientar as pessoas para melhor aproveitamento de suas experiências e potenciais, promovendo aperfeiçoamento de suas qualidades (Bergamini, 1980). Além do treinamento técnico, o profissional passa a ser motivado a modificar sua postura em relação a ‘qualquer’ tarefa, ampliando seus horizontes. Quadro 7 – Treinamento x Desenvolvimento de RH TREINAMENTO DESENVOLVIMENTO Preparação para cargos atuais. Preparação para cargos atuais e futuros. Transmite habilidades e técnicas particulares de trabalho. Aperfeiçoa as capacidades, atitudes e traços de personalidade. Ensina a ‘fazer’ as tarefas. Promove o ‘saber ser’. Mais usado em cargos operacionais. Mais usado em cargos gerenciais. Resultados em curto prazo. Resultados em médio e longo prazos. Fonte: quadro elaborado pelos autores. 76 Assistência Farmacêutica... Tudo na vida é dinâmico. As organizações e as pessoas que delas fazem parte estão em constante processo de mudança. Antigos objetivos são revistos enquanto novos são estabelecidos, estruturas são modificadas, tecnologias são assimiladas, pessoas são admitidas, produtos são modificados. Os padrões, nas organizações, são mais complexos e mais sutis dos que os apresentados nos organogramas. Cada organização tem a sua cultura, que, para Chiavenato (1998), significa seu modo de vida, seu sistema de crenças, expectativas e valores, sua forma de interação e seus relacionamentos típicos. Devemos estar atentos a essa realidade, procurando conhecer da organização onde atuamos, seu universo sociocultural, como se estrutura formal e informalmente, seu poder político, as formas de recompensas materiais e sociais, a característica da sua liderança e sua importância na disseminação da cultura da organização. O gerenciamento de recursos humanos tem como objetivo as pessoas, isto é, trata ‘com pessoas e de pessoas’. As relações interpessoais baseiam-se em sensações e percepções na maioria das vezes pouco objetivas, tornando muito complicada a gestão dos recursos humanos (Malik et al., 1998). Mas, afinal, quais as suas necessidades e os fatores, sejam internos ou externos da organização, que influenciam essas pessoas? As pessoas As pessoas que fazem parte de uma organização são sua maior riqueza. Elas são dotadas de características próprias de personalidade e de habilidades, capacidades e conhecimentos. Dessa forma, não são meros meios de produção. Cada pessoa age e se comporta conforme sua própria motivação. Segundo Chiavenato (1998), as necessidades humanas estão arranjadas em uma pirâmide hierárquica, que podemos dividir em primárias e secundárias. Necessidades primárias: 1. ‘necessidades fisiológicas’: sãos as básicas ou biológicas, que necessitam de satisfação cíclica e reiterada, como alimentação, sono e repouso, abrigo, desejo sexual; 2. ‘necessidades de segurança’: é a procura de proteção contra ameaça ou privação, perda de estabilidade; busca a previsibilidade. Necessidades secundárias: 1. ‘necessidades sociais’: interação, aceitação por parte dos companheiros, amizade, afeto e amor; 2. ‘necessidades de estima’: é a forma como o indivíduo se auto-avalia e auto-estima. Envolve conceitos de autoconfiança, necessidade de aprovação, status, influência, reputação, estima, utilidade. Quando não satisfeita, pode levar a sentimentos de inferioridade, fraqueza, dependência e desânimo; 3. ‘necessidades de auto-realização’: necessidade de desenvolver seu próprio potencial ao longo de sua vida. Estão relacionadas à autonomia, à independência, ao autocontrole, à competência e à realização. Todas as necessidades anteriores podem ser satisfeitas por recompensas externas, mas a necessidade de auto- realização só pode ser satisfeita por recompensas dadas intrinsecamente pelas pessoas a si próprias. 77 Gerenciamento da Assistência Farmacêutica Somente surgem necessidades de auto-realização quando os níveis mais baixos são atingidos e dominados. Nem todos conseguem alcançá-la, sendo considerada uma conquista individual. Existem muitos fatores e variáveis que influenciam no comportamento das pessoas na organização. Quadro 8 – Fatores influentes no comportamento de RH nas organizações Fatores internos Fatores externos Fonte: Chiavenato (1998). O comportamento humano é complexo, e o grau de satisfação pessoal e de motivação das pessoas tem enorme influência em seu desempenho na organização. Cabe ao gerente desenvolver condições de satisfação dos objetivos individuais e da organização. Capacidades gerenciais: o gerente O que é necessário para ser um bom gerente? Existem muitas variáveis que influenciam o resultado de um trabalho gerencial, tais como: as realidades políticas locais, econômicas e dos recursos humanos, bem como a infra-estrutura da organização. Entretanto, não podemos esquecer que além dos conhecimentos também são exigidas algumas habilidades do profissional. No passado, muitos se tornavam gerentes por ‘acidente’. Hoje, contudo, as atuais exigências nos levam a uma maior profissionalização em todas as áreas. Nesse sentido, um gerente de Assistência Farmacêutica precisa, além do conhecimento técnico, de conhecimento específico também de administração. Quais seriam esses conhecimentos e habilidades? Quadro 9 – Conhecimentos e habilidades do gerente • ambiente organizacional • regras e regulamentos • cultura • políticas • métodos e processos • recompensas e punições • grau de confiança • Personalidade • Aprendizagem • Motivação • Percepção • Valores Fonte: Motta (1994). Capacidade de: liderança, comunicação ser educador ser facilitador organizador de equipes participar, ser criativo ter flexibilidade tolerância às frustrações desejo de realização Ambiente: Interno Externo Políticas de Assistência Farmacêutica Políticas de Saúde Capacidade: analítica de julgamento de decisão de enfrentar riscos e incertezas Técnicos Gerenciais- administrativos Psicossociais Políticos Específicos 80 Assistência Farmacêutica... • cumprimentar pessoalmente o funcionário por uma tarefa ou trabalho bem executado, reconhecendo-o pelas suas realizações. Nesse sentido, é importante lembrar que ninguém quer sentir que seu trabalho é subalterno ou inútil, as pessoas precisam ter certeza de que agregam valor à organização; • procurar direcionar as tarefas para o interesse de cada funcionário, considerar as necessidades pessoais dos funcionários; • basear a promoção do funcionário em seu desempenho e não em privilégios. • Comunicação A comunicação é a base para qualquer atividade dentro da organização. Na reunião de duas pessoas ou mais já existe a necessidade de interação, de comunicação. Existem quatro funções básicas para a comunicação dentro da organização: • ‘controle’: esclarecendo obrigações, implantando normas, estabelecendo autoridade e responsabilidade; • ‘informação’: criando condições para a tomada de decisão e execução de ordens e instruções; • ‘motivação’: influenciando os outros e obtendo a cooperação e o compromisso para o cumprimento das diversas metas e objetivos; • ‘emoção’: expressando sentimentos. Utilizando a fala ou a escrita, comunicamos-nos verbalmente. Aparentemente, simples palavras podem ter significados diferentes para diferentes pessoas. Esteja atento aos significados das palavras, das perguntas e dos jargões. As outras comunicações, não verbais, também devem ser levadas em consideração para a transmissão de certas mensagens: nossos gestos, o modo como usamos o nosso corpo, nosso tom de voz, o modo como algo é dito e como o silêncio é utilizado. Devemos aproveitar a valiosa fonte de informação nos contatos face a face, prestando atenção em ‘como’ as coisas são ditas e não apenas no ‘que’ é dito. Cuidado para não bloquear as informações, especialmente quando entram em desacordo com o que acreditamos. Ter credibilidade evita que barreiras se interponham no que estamos comunicando, procurando sempre utilizar a linguagem certa para o público-alvo. Ao usarmos palavras técnicas para pessoas sem este conhecimento, certamente não seremos entendidos. A visão contemporânea de empresa pressupõe um sistema pluralista de poder. Entende- se, aqui, poder como a capacidade de influenciar outra pessoa ou grupo a aceitar idéias diferentes que existem em todas as relações sociais. Porém, na vida organizacional, o poder e seus componentes políticos adquirem maior importância, visto que são capazes de influenciar as ações coletivas. Nessa visão, os indivíduos lutam para que o efeito das decisões da empresa seja favorável e, quando isso não ocorre, temos grupos ou indivíduos descontentes, estabelecendo-se o conflito. Para Chiavenato (1999), conflito significa a existência de idéias, sentimentos, atitudes ou interesses antagônicos e colidentes. O conflito se refere a divergências com relação a: autoridade, metas, territórios ou recursos. O mesmo pode ocorrer em decorrência da disputa de papéis, na escassez de recursos, nos mal-entendidos, nas orientações divergentes, nas relações interpessoais, entre outros aspectos. 81 Gerenciamento da Assistência Farmacêutica Conflito e cooperação são partes integrantes de uma organização. O conflito não é sempre ruim ou disfuncional. A ausência de conflitos pode indicar, por exemplo, a filtragem das informações ou a existência de um pensamento de consenso (Chiaventao, 1998). Até certo ponto, os conflitos são inevitáveis. Se bem trabalhados, podem gerar o desenvolvimento organizacional. O conflito também pode se tornar negativo, pois viver constantemente em conflito gera desestímulo, levando as pessoas a se sentirem derrotadas, surgindo um clima de disputa e de desconfiança. As pessoas lidam de diversas maneiras com os conflitos: evitando-os, competindo, acomodando-se, comprometendo-se ou colaborando. A colaboração envolve a concordância de se enfrentar o conflito, identificando as preocupações de cada um dos grupos e solucionando os problemas no intuito de encontrar alternativas que satisfaçam a ambos. É função do gerente administrar conflitos, canalizando-os produtivamente As habilidades e os diferentes tipos de conhecimento, quando aplicados, formam o que podemos chamar de estilo de gerenciar, ou seja, a maneira como conduzimos o trabalho. Como gerente, você precisa conhecer e reavaliar seu estilo próprio em relação ao papel e exigências de seu cargo, mantendo sempre uma postura crítica à sua forma de atuação. Cada situação requer sua própria estratégia ou estilo gerencial, sendo que alguns são recomendados e outros não. A seguir, são identificadas as características do estilo gerencial e anti-gerencial no quadro a seguir. Quadro 10 – Estilos de gerente 1 ESTILO GERENCIAL ESTILO ANTI-GERENCIAL • Produtor: comprometido com a obtenção de resultados, empenhado com a realização do trabalho, apresentando a necessidade de fazer as coisas acontecerem • Solitário (produtor em excesso): excessivamente dedicado às tarefas, ocupa-se demais com a produção, não tem tempo disponível, não delega, não planeja, viciado no trabalho, procura fazer tudo ele mesmo, atua apenas em curto prazo e não se relaciona adequadamente 1 Não foi possível encontrar a fonte primária do quadro. Por isso, a utilização de uma fonte secundária. O quadro foi retirado da apostila elaborada pela professora Maria Elizabeth para o curos de pós-graduação lato sensu em saúde pública (curso de formação de sanitaristas). Aula do dia 4/11/2001. • Administrador: preocupado em fazer com que a sistemática funcione conforme projetada, gosta de controle, respeita e zela pelas normas e regulamentos, é organizado, executa planos e implanta decisões • Empreendedor: inovador e criativo, busca novos recursos de ação, assume riscos, modifica metas, ajusta sistemas e gera seu próprio plano de ação • Burocrata (administrador em excesso): gosta de ‘rotinizar’ tudo, não é orientado para resultados nem para produtividade, adora criar normas e controles, incha a organização, gasta muito tempo com pormenores, evita mudanças • Incendiário (empreendedor em excesso): disperso, ataca várias frentes ao mesmo tempo, tem muitas idéias, mas detesta detalhá-las e atingir resultados, necessita de platéia, tem aversão a metas fixas, gosta de ambientes frenéticos e sobrecarrega improdu- tivamente seus subordinados 82 Assistência Farmacêutica... ESTILO GERENCIAL ESTILO ANTI-GERENCIAL RECURSOS MATERIAIS Já foi bastante discutido anteriormente nesta obra o papel do farmacêutico no gerenciamento de materiais de consumo, em que se inserem os medicamentos. Outrossim, o gerente da Assistência Farmacêutica não deve esquecer que, ao formular um plano ou projeto, a previsão de materiais, com os respectivos custos inerentes, deve ser claramente ‘explicitada’ e ‘justificada’. As considerações para incorporação de materiais de consumo são semelhantes às considerações para aquisição de medicamentos. Cabem, no entanto, algumas rápidas considerações quanto à incorporação de materiais permanentes. Para incorporação de mobiliário, por exemplo, a aquisição de novas estantes para a Central de Abastecimento Farmacêutico (CAF), é interessante contar com o auxílio de um arquiteto. Nesse caso, devem ser minimamente informados: • as finalidades do objeto pretendido; • as dimensões da área física em questão; • uma descrição básica das atividades realizadas; • o número previsto de usuários. De forma geral, é interessante que o mobiliário tenha boa durabilidade e funcionalidade, e que permita o arranjo flexível de ocupação da área. Deve ainda permitir condições ergonômicas de trabalho. As especificações devem conter todos os detalhes relevantes. Os equipamentos eletro-eletrônicos, particularmente os de uso técnico, tais como balanças, geladeiras ou estufas, exigem alguns cuidados adicionais. As especificações, como no caso anterior, devem ser cuidadosas e conter todas as características técnicas relevantes, principalmente aquelas ligadas à precisão desejada para o aparelho. A despeito de geralmente não ser possível chegar à especificação perfeita, que previna todos os problemas, estes podem ser sensivelmente minimizados. O Quadro 11 apresenta um exemplo de especificação correta e um exemplo de especificação incorreta de um equipamento. É importante, através de pesquisa prévia, identificar e descrever corretamente o equipamento desejado. Essa pesquisa deve identificar as instalações requeridas (como tipo de bancada, espaço físico, voltagem ou necessidade de aterramento) e deve ser feita uma avaliação prévia da possibilidade de proporcionar as condições necessárias para a operação do equipamento. A pesquisa prévia também deve • Político (integrador em excesso): não assume riscos, não decide sozinho, não se preocupa com a performance da organização, é volúvel em suas posições, está sempre atento à roda de poder, não trabalha com metas e é extremamente dependente do grupo • Peso Morto: aquele que não se identifica com nenhum dos quatro papéis • Integrador: harmonizador das relações interpessoais, preocupa-se com as pessoas e o trabalho em equipe, busca consenso, transforma riscos individuais em grupais Quadro 10 – Estilos de gerente (continuação) 85 Gerenciamento da Assistência Farmacêutica O trabalho produtivo é realizado através de processos Em uma organização, cada pessoa faz parte de um ou mais processos de trabalho. Em cada etapa se recebe alguma coisa de alguém (fornecedor); isso é transformado em um processo de trabalho e enviado para alguém (cliente). Significa dizer que nosso trabalho geralmente depende de algum processo anterior e que algum processo seguinte vai depender do nosso trabalho. Se o processo anterior é bem realizado, facilita o nosso trabalho, e se fazemos bem o nosso trabalho, vamos aumentar a efetividade (agregar valor) ao processo seguinte. Figura 6 – Esquema geral do processo de trabalho Fonte: adaptado de Berwick; Godfrey & Roessner (1994). Podemos citar como exemplo: Exemplo 1 – o processo de trabalho exame de sangue é fornecedor para o processo de trabalho diagnóstico (se o exame de sangue não ocorrer de forma adequada, o diagnóstico será prejudicado). Ao mesmo tempo, é cliente do processo de trabalho coleta de material. Exemplo 2 – o processo dispensação é fornecedor para o processo de trabalho atenção médica ambulatorial (se a dispensação não ocorrer de forma adequada, o resultado da consulta ambulatorial (parte da atenção médica) será prejudicado). Ao mesmo tempo, o processo de dispensação é cliente do processo de trabalho aquisição de medicamentos, dentre outros. Muitas vezes, um processo de trabalho é composto de vários subprocessos. Por exemplo, o processo ‘aquisição de medicamentos’ geralmente envolve a requisição de compras, a pesquisa de preços, a solicitação de propostas, a análise das propostas etc. Boas relações entre clientes e fornecedores são absolutamente necessárias para a gestão de qualidade O sucesso dos processos de trabalho depende da boa relação cliente-fornecedor. A gestão da qualidade está fortemente baseada nas pessoas. Uma organização necessita de uma série de recursos para funcionar bem e alcançar seus objetivos, mas, o mais importantes deles se deve aos recursos humanos. Por isso, atualmente, valoriza-se tanto a capacidade de comunicação dos gerentes. Coordenar, liderar e motivar o trabalho da equipe é a chave da gestão de sucesso (MSH, 1997). Os processos podem ter clientes internos e clientes externos. Os clientes internos são aquelas pessoas que fazem parte da organização e os clientes externos ou clientes finais são os usuários ou beneficiários das ações e produtos da organização. A principal fonte de falhas de qualidade são os problemas de processo Cliente Processador Fornecedor Inputs Fornecedores Processo de trabalho Produtos/ serviços Clientes Outputs 86 Assistência Farmacêutica... A grande implicação desse princípio da qualidade é que, ao se identificar um problema, é mais eficiente identificar a falha no processo de trabalho do que “caçar e punir culpados”. Uma outra implicação é que o principal responsável pela melhoria da qualidade é o gerente, lembrando que, aqui, chamamos gerente cada responsável por cada etapa do processo de trabalho. Um dos pesquisadores clássicos da gestão da qualidade, o Dr. Joseph M. Juran (Sholtes, 1992), defende a chamada “regra dos 85/15”, que diz que 85% dos problemas só podem ser resolvidos mudando- se os sistemas (processos) e menos de 15% estão sob controle do trabalhador. A má qualidade sempre tem um custo A falta ou falha de qualidade sempre acarreta aumento de custos. Se uma organização identifica produtos defeituosos, tem de descartá-los. Os produtos descartados tornam-se refugo e novos produtos têm de ser feitos para substituir os descartados, o que é uma forma de ‘retrabalho’. Assim, um exemplo típico de um problema que pode ser corrigido por acerto de processos de trabalhos anteriores é quando somente identificamos que um produto está vencido no momento de dispensá-lo ao paciente. Isto gerará aumento de tempo do atendimento, perda do produto e falta de confiança do cliente na organização: “Além de tudo o mais, a consciência de falha na qualidade corrói o orgulho entre os trabalhadores, muitas vezes diminuindo sua motivação ou lealdade” (Berwick; Godfrey & Roessner, 1994: 39). A meta, portanto, é evitar os defeitos antes que eles precisem ser reparados. Inspecionar o produto final é necessário para garantir a segurança do bom atendimento dos clientes. Todavia, confiar na inspeção final para conseguir qualidade é algo custoso e inevitavelmente imperfeito. A meta da administração da qualidade é fazer corretamente já na primeira vez (Berwick; Godfrey & Roessner, 1994). Entender a variabilidade do processo é a chave para melhorar a qualidade Os processos de trabalho devem ser previsíveis. Quando imprevisíveis, tendem a ser falhos. A imprevisibilidade prejudica a obtenção de resultados homogêneos, e o treinamento dos funcionários. Ainda, “a imprevisibilidade dificulta tanto estudar como avaliar o desempenho de um processo e compará-lo com processos alternativos” (Berwick; Godfrey & Roessner, 1994: 296). Sholtes (1992) questiona de forma objetiva. Qual seria a opção de alguém, que estivesse participando de um processo de trabalho qualquer, trabalhar em um processo previsível, estável e com um mínimo de disperdício, ou naquele francamente errático, no qual houvesse variabilidade – alto desempenho em um dia e baixo em outro? Uma abordagem para redução das variações é a padronização. Para melhor organização do serviço, é recomendável a confecção de manuais de normas e procedimentos (procedimento operacional padrão). Esses documentos constituem-se em importantes ferramentas de organização e controle do serviço. No entanto, algumas vezes transformam-se em iniciativas fracassadas, geralmente por um ou mais dos erros descritos a seguir: • Impor um manual de forma autoritária – o manual deve ser constituído em um processo participativo, que envolva os clientes e os fornecedores internos dos processos de trabalho, sob pena de provocar sua rejeição pela equipe ou o manual não expressar a realidade. • O manual não é atualizado – o manual deve ser atualizado, no mínimo, anualmente ou sempre que houver qualquer alteração no processo de trabalho. Para isso, o documento 87 Gerenciamento da Assistência Farmacêutica deve ser organizado de forma a facilitar este processo, permitindo a alteração de apenas uma parte do documento, sem prejuízo do restante. • Os profissionais não conhecem o manual – além de ser construído a partir de um processo participativo, toda atividade de treinamento deve envolver a utilização do documento. • Os profissionais envolvidos não seguem o manual – além de ser construído a partir de um processo participativo, os processos de trabalho devem ser avaliados com base no manual, uma vez que este deve ser a expressão formal da missão e dos objetivos da organização. Caso sejam detectados problemas, estes devem ser discutidos pela equipe e o manual deve ser adequado para expressar a realidade. O controle da qualidade deve concentrar-se nos processos vitais A tentativa de controlar tudo geralmente leva a que se consiga intervir em muito pouco ou em aspectos não essenciais. O gerenciamento da qualidade tem desenvolvido ou se apropriado de uma série de ferramentas de outras áreas com a finalidade de objetivar a identificação de problemas, modelos explicativos, causas e direcionar estratégias de intervenção. Citamos aqui alguns dos principais erros cometidos nas iniciativas de controle (MSH, 1997). • Desvio dos objetivos principais ou desperdício de esforços, resolvendo o ‘problema errado’, por exemplo: • achar que o problema é a insuficiência de recursos financeiros para a aquisição de medicamentos, quando o problema principal é o desperdício de recursos por não ser seguida a lista de medicamentos essenciais; • realizar investimentos para a reorganização do almoxarifado, tentando resolver o problema da distribuição, quando o problema principal é que a equipe não está suficientemente treinada ou motivada. • Falha em identificar a causa do problema, por exemplo: será que o término do estoque de amoxicilina antes do prazo previsto se deu por falha da programação, na aquisição, atraso de entrega ou aumento inesperado do consumo? • Falha em identificar todas as alternativas relevantes: gerentes que tomam decisões muito apressadas podem alcançar resultados fracos por não terem considerado todas as opções. Entretanto, gerentes que retardam muito as decisões poderão ter o custo de lidar com problemas de dimensões maiores do que se tivessem sido resolvidos mais precocemente; • Falta de critérios claros para selecionar as melhores alternativas: os critérios, melhor discutidos na seção que trata de planejamento, devem considerar aspectos como governabilidade, custo, tempo de resposta; • Falha no controle, avaliação e correção de rumo. Cabe relembrar aqui a importância do uso de ferramentas apropriadas para localizar e descrever adequadamente o problema (problematização, folha de verificação, gráficos de acompanhamento e outros). A moderna abordagem à qualidade está cuidadosamente fundamentada no pensamento científico e estatístico 90 Assistência Farmacêutica... Outra abordagem é a relação entre qualidade e custo. É óbvio que qualidade custa dinheiro, relação que, no entanto, está longe de ser linear. Qualidade e custo estão relacionados de diversas maneiras. Assim, quando a atenção é ‘excessiva’, além de potenciais prejuízos diretos, resulta em gastos desnecessários, tornando-se mais cara. Outra situação de desperdício é quando a atenção ocorre de forma ineficaz, ou seja, utilizam-se recursos mais dispendiosos em situações que poderiam ser resolvidas com recursos mais baratos. O desafio colocado é encontrar o ponto ótimo do máximo de benefício que acarrete o mínimo de custos e de riscos em cada situação. A opção pelo uso de uma tecnologia de ponta para a solução de um caso individual poderá significar a opção de deixar desassistida uma parte da população. Mesmo em países desenvolvidos, este já é um drama evidente. A qualidade também depende de quem vê A avaliação de qualidade irá também variar segundo a ótica empregada (Donabedian, 1984). Assim, o profissional irá julgar a qualidade sobre critérios geralmente técnicos e valorizar situações que lhe tragam satisfação profissional. Será interessante dispor de e utilizar os melhores recursos que a ciência e a tecnologia possam oferecer. Já o paciente, numa ótica individual, estará interessado no máximo bem-estar que possa alcançar. Essa situação não será necessariamente compatível com a avaliação técnica, pois seu juízo estará fundamentado em valores pessoais e socioculturais. Seu julgamento sobre o uso de um medicamento ou tecnologia que lhe traga efeitos colaterais desagradáveis mais imediatos ou mais importantes, a seu juízo, que os possíveis benefícios, poderá variar substancialmente em relação ao julgamento do profissional. Uma terceira visão será o julgamento ‘social’ de qualidade. Exemplificando, a concentração de esforços e recursos no desenvolvimento de determinadas tecnologias em detrimento de outras que se apliquem na resolução de problemas que atingem um determinado grupo populacional, resultará em níveis absolutamente distintos de satisfação entre os grupos. Uma quarta visão é a dos gerentes e financiadores, que estarão, em geral, interessados em maximizar a eficiência. O dilema que permeia estas abordagens é o de como, sob a pressão de uma demanda sempre crescente, conciliar a eficiência do uso dos recursos, com a condição de prover aos indivíduos ou grupos o melhor que a ciência e a tecnologia já tenham condições de oferecer. ATRIBUTOS DA QUALIDADE EM SAÚDE Listamos abaixo alguns atributos da qualidade em saúde e suas definições (Donabedian, 1990): • Aceitabilidade – fornecimento de serviços de acordo com valores, normas culturais, sociais e outras e com as expectativas dos usuários em potencial; • Acessibilidade – facilidade (geográfica, financeira e outras) com que o paciente obtém os cuidados de que necessita e/ou deseja; • Adequação – suprimento de número suficiente de serviços em relação às necessidades e à demanda; • Confiabilidade – capacidade da organização ou serviço prestado fazerem-se confiáveis na percepção do cliente; 91 Gerenciamento da Assistência Farmacêutica • Continuidade – grau com que o cuidado necessário ao paciente é efetivamente oferecido pelos profissionais e no tempo requerido; • Desempenho – atuação compatível com os padrões aceitáveis para a profissão e com o ‘estado da arte’ do conhecimento técnico científico; • Efetividade – alcance do melhor resultado, em relação aos objetivos visados, em situação real; • Eficácia – alcance do melhor resultado, em relação aos objetivos visados, em situação ideal; • Eficiência – melhor relação possível entre o impacto real e o custo dos cuidados; • Eqüidade – distribuição dos serviços de acordo com as necessidades de saúde objetivas e percebidas da população; • Oportunidade – grau com que o cuidado é disponível quando o paciente necessita; • Participação do paciente e dos familiares no cuidado – envolvimento e conhecimento do paciente nas decisões que dizem respeito ao cuidado prestado; • Privacidade e confidencialidade – grau com que as informações sobre o paciente são protegidas, com acesso somente a quem tenha necessidade profissional e dentro do estipulado pela lei, ou mediante autorização do paciente; • Segurança – grau com que o cuidado oferecido é livre de riscos. ACOMPANHAMENTO E AVALIAÇÃO: QUAL A DIFERENÇA? O ‘acompanhamento’ se refere ao conjunto de ações desenvolvidas para identificar, de forma ‘continuada’, se as atividades estão transcorrendo conforme o planejado e se os objetivos e metas propostos estão sendo atingidos. Isso permite a intervenção, com ações corretivas durante a implementação ou curso do serviço ou do projeto. O acompanhamento não deixa de ser uma forma de avaliação, sendo chamado de avaliação normativa. A ‘avaliação’ se refere à realização de um julgamento de valor para identificar o quanto os resultados e impacto pretendidos estão sendo atingidos. Pode fornecer informação sobre os pontos de estrangulamento do plano, bem como as razões para o sucesso ou o fracasso. A avaliação pode, também, pretender estudar a situação anterior à implantação de um programa ou serviço, de modo a orientar a formulação e o detalhamento dos mesmos. Permite ainda a determinação de quais resultados foram realmente devidos ao programa ou serviço implantado. Por exemplo, digamos que implantemos um programa de redução de perdas devido ao mau armazenamento. Se não tivermos conhecimento da situação antes da implantação do programa, teremos muito mais dificuldade de estimar se realmente houve redução das perdas e se essa redução realmente pode ser atribuída ao nosso programa, pois outras fontes que não controlamos podem produzir o mesmo resultado. ACOMPANHAMENTO As atividades de acompanhamento devem fazer parte do dia-a-dia do gerente. O acompanhamento sistemático deve estar baseado em objetivos previamente definidos. É fundamental para identificar problemas e permitir a intervenção oportuna para a sua correção (MSH, 1997). No entanto, para que o acompanhamento ocorra de forma eficiente, deve focalizar os aspectos mais relevantes do programa ou do serviço. 92 Assistência Farmacêutica... Dessa forma, o acompanhamento tem os seguintes objetivos: • determinar se as atividades foram feitas conforme o planejado; • medir o grau de alcance das metas; • identificar problemas com objetivos de orientar ações corretivas; • identificar e incentivar o bom desempenho; • identificar e reorientar o mau desempenho; • permitir direcionar a supervisão para as áreas problemáticas; • estimar se as atividades estão tendo o efeito esperado; • acompanhar tendências de longo prazo; • auxiliar a revisão de prioridades; • auxiliar, a longo prazo, a melhoria do desempenho do programa e dos membros da equipe. Métodos de acompanhamento Os métodos apresentados a seguir podem e devem ser utilizados de forma combinada. • ‘Visitas de supervisão’: podem ter a finalidade de acompanhar o desempenho da equipe, das atividades desenvolvidas ou realizar treinamento em serviço. Poderão ser utilizados roteiros previamente estabelecidos para orientação dessas visitas. • ‘Relatórios de rotina’: tem a finalidade de comunicar informações de forma clara e continuada. Devem conter também breve descrição dos processos problemáticos e propostas de intervenções. Um erro freqüentemente cometido é o de formular relatórios muito extensos, carregados de informações pouco úteis, que irão dificultar a visualização das informações importantes e complicar o processo de decisão. Relatórios demasiadamente trabalhosos tendem a ser pouco confiáveis, além de sobrecarregar a rotina de trabalho. • ‘Sistemas de relatórios-sentinela’: em redes; uma forma de se ter relatórios mais detalhados consiste em definir ‘unidades-sentinela’, ou seja, determinar unidades de saúde representativas da situação que se deseja conhecer, por exemplo, um hospital, um centro de saúde, um posto de saúde. Segundo o MSH (1997), um bom sistema-sentinela deve incluir seis unidades de cada tipo, e a escolha deve ser definida com base em critérios determinados pelo gerente, de acordo com as características das unidades. Por exemplo, se o município possui dois hospitais com características muito diferentes e dez postos de saúde muito semelhantes, poderá ser interessante definir como sentinela os dois hospitais e apenas um centro de saúde. A definição das unidades-sentinela permite concentrar esforços de treinamento, capacitação e supervisão que venham a garantir a confiabilidade dos dados. Apresentaremos adiante uma proposta de informações a serem coletadas nas unidades-sentinela. • ‘Estudos especiais’: algumas vezes pode ser interessante obter informações mais detalhadas, não contempladas nos relatórios de rotina, para resolver situações específicas. Por exemplo, uma grande variabilidade do consumo médio mensal de um medicamento de uso crônico pode suscitar uma investigação para tentar determinar os motivos. O sistema de acompanhamento deve ser coerente com o planejamento e estar focado para os aspectos relevantes dos processos de trabalho ligados aos objetivos e metas definidos. 95 Gerenciamento da Assistência Farmacêutica seria a referência quantitativa do indicador. Assim, estabelecer que ‘deve haver uma quantidade específica de enfermeiras por leito que reflita a qualidade do cuidado’ é um critério; a razão enfermeiras/leito de um hospital é o indicador; o padrão é um número de referência para a razão. Outro exemplo: como critério, ‘não deve haver uso de antibióticos sem antibiograma’; o indicador é existência de antibioticoterpia feita ou prescrita sem antibiograma prévio (pode ser sim/não ou pode haver um número em um período de tempo que reflita a ocorrência); o padrão refere-se ao que é aceito, se apenas a resposta for ‘não’ ou um número. Nos casos citados, a especificação de pelo menos duas enfermeiras para cada leito, ou de que nenhum determinado tipo de antibiótico deve ser usado sem antibiograma são padrões. Donabedian (1989) fornece algumas características descritivas dos indicadores. Podem ser relativas à estrutura, ao processo ou ao resultado. • Quanto à fonte, podem ser: • normativos – quando baseados em fontes autorizadas; • empíricos – quando fundamentados na prática. • Quanto à preespecificação, classificados como: • explícitos – quando claramente preespecificados. Os indicadores explícitos têm sido mais utilizados por apresentarem menos variabilidade interpessoal e permitirem maior redução de custos, pela possibilidade de utilizar profissionais menos experientes; • implícitos – quando baseados no julgamento do profissional que os aplica. • Quanto à abordagem podem ser: • quantitativos – quando se expressam numericamente. Os indicadores quantitativos podem expressar-se como contagem (400 trabalhadores treinados); razão (dois em cada cem contra um em cada cem têm uma determinada doença = razão de dois); proporção (400 de 1.200 trabalhados foram treinados; treinados um terço dos trabalhadores) ou percentagem (400/1.200 = 33%); • qualitativos – quando se expressam como ‘sim’ ou ‘não’. Os indicadores são ferramentas importantes tanto para o acompanhamento quanto para a avaliação. Para que sejam úteis ao processo de decisão, precisarão respeitar alguns atributos importantes (MSH/USAID/USP, 1995): • clareza: o indicador deve ser fácil de entender e calcular; • utilidade: reflete uma importante dimensão do desempenho; • mensurabilidade: pode ser definido em termos quantitativos ou qualitativos e coletados com base em informações confiáveis e disponíveis; • confiabilidade: permite obter informações consistentes ao longo do tempo ou com diferentes observadores; • validade: o indicador deve ser capaz de medir o que se propõe; • importância: cada indicador deve refletir uma dimensão importante do desempenho; existem dados que podem ser fáceis de coletar de forma confiável, mas dizem muito pouco acerca do desempenho do sistema. 96 Assistência Farmacêutica... Um método interessante de avaliação da qualidade é o dos chamados ‘eventos traçadores’, conforme proposto por Kessner; Kalk & Singer (1973), em que são eleitos problemas de saúde específicos que podem servir como ‘traçadores’ para analisar a prestação de serviços e, ao mesmo tempo, gerar dados de fácil compreensão capazes de retroinformar o sistema de prestação de serviços de saúde. Esses eventos podem ser doenças representativas da assistência em geral, que permitam traçar o percurso do paciente através do processo de assistência. Numa adaptação desse método, podem-se eleger eventos representativos dos aspectos que se pretenda aferir. Uma aplicação desse conceito consiste na definição de um elenco de medicamentos para monitorar disponibilidade, preços ou precisão do controle de estoque. Aqueles selecionados como traçadores devem fazer parte da relação de medicamentos essenciais, ser terapeuticamente importantes, largamente usados, preferencial e comumente disponíveis para permitir comparação com outros países. O Anexo 1 apresenta, como exemplo, indicadores utilizados na avaliação do Programa Farmácia Básica. RETROALIMENTAÇÃO (FEEDBACK) O acompanhamento e a avaliação somente se completam com a retroalimentação, ou feedback, ou seja, com o retorno da informação para os atores envolvidos no processo de realização e formulação do programa ou serviço. O feedback faz com que as pessoas valorizem o envio da informação e representa um dos mais poderosos instrumentos de motivação da equipe. Ele tem duas finalidades principais: alertar quanto a situações relevantes identificadas (positivas) e permitir avaliação comparativa de desempenho. O feedback deve preocupar-se em destacar os pontos relevantes e o bom desempenho. As fragilidades e oportunidades de melhoria identificadas devem apontar para as possibilidades de correção de rumo. Além disso, o feedback deve ser feito rotineiramente e estar previsto no sistema de informação. FALHAS COMUNS NO PROCESSO DE ACOMPANHAMENTO OU AVALIAÇÃO Embora o acompanhamento e a avaliação sejam processos distintos, apresentam falhas em comum (MSH, 1997): • falha em identificar as questões básicas: devem ser identificadas ou definidas com clareza as questões iniciais que se pretende responder; • ambição desmedida: a coleta de informação em demasia aumenta os custos, diminui a precisão, aumenta o tempo envolvido com a coleta dos dados e a dificuldade de interpretação, problemas nem sempre compensados com a melhora do processo de decisão; • complexidade: os sistemas de acompanhamento devem ser o mais práticos possíveis; • falta de integração com o planejamento e implementação: o acompanhamento e a avaliação devem guardar estreita relação com o planejamento e a implementação; • recursos inadequados: interrupção das atividades de acompanhamento e avaliação por falta ou transferência de recursos humanos qualificados e/ou de recursos financeiros; 97 Gerenciamento da Assistência Farmacêutica • falta de objetividade: as informações objetivas facilitam o processo de avaliação; informações subjetivas são menos confiáveis e menos utilizáveis; • conclusões inadequadas: conclusões que não consideram nem contexto, nem relatórios individuais ou observações soltas; podem gerar interpretações inapropriadas; • falta de comparabilidade dos dados: as observações devem permitir a comparação ao longo do tempo ou comparar situações equivalentes; para isso, é aconselhável padronizar terminologias e metodologias de coleta de dados, em planejamento cuidadoso o suficiente para que um mesmo padrão possa ser mantido por um período de tempo razoavelmente longo. SISTEMA DE INFORMAÇÕES GERENCIAIS DE ASSISTÊNCIA FARMACÊUTICA (SIGAF) Um sistema de informações deve definir como as informações são coletadas, processadas, relatadas e utilizadas para otimizar o processo de decisão. O desenho do sistema deve levar em conta as necessidades de seus usuários em cada nível decisório do sistema gerencial (Figura 7). Quanto maior o nível gerencial usuário da informação, maior o grau de agregação e concisão que esta deve ter. A informação é um dado processado e normalmente agregado. Por exemplo, a informação de que o consumo mensal de um determinado antibiótico em um mês específico foi de 2.000 unidades, é pouco útil, se analisada isoladamente. Entretanto, se agregamos a esta informação o consumo médio mensal de 1.000 unidades do mesmo antibiótico, o valor observado passa a ter significado, representando um aumento de 100% no consumo. Nesse caso, poderemos ‘suspeitar’ de mau uso, contratação de especialistas (gerando uma perspectiva de aumento permanente do consumo) ou até de uma epidemia. O esclarecimento da situação deve vir em decorrência de mais informações agregadas, como o perfil epidemiológico, a capacidade da rede instalada, o perfil de atendimento etc. Muitos fatores devem ser considerados para assegurar o sucesso e a sustentabilidade de um Sistema de Informações Gerenciais de Assistência Farmacêutica: • envolver os usuários no desenho e no teste piloto; • ser seletivo ao escolher os indicadores; • preferir indicadores específicos em lugar de abrangentes; • escolher métodos apropriados de coleta de dados; • integrar o Sigaf com outros sistemas de coleta de dados (por exemplo, com o sistema de informações epidemiológicas); • Desenvolver métodos práticos de análise para facilitar a interpretação dos dados; • Informatizar, priorizando de forma apropriada (considerando a capacidade do local de suportar a instalação do sistema, de manter o treinamento para o software e para o hardware; o volume de dados a ser processado e a complexidade requerida para análise); • assegurar que a informação seja comunicada de forma efetiva.
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