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Guias e Dicas
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2428489, Notas de estudo de Administração Empresarial

http://migre.me/8gP7F

Tipologia: Notas de estudo

2012

Compartilhado em 18/03/2012

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nelson-martins-2 🇧🇷

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Baixe 2428489 e outras Notas de estudo em PDF para Administração Empresarial, somente na Docsity! Fiscalização a serviço da sociedade RevistadotCU Revista do Tribunal de Contas da União • Brasil • ano 43 • número 122 • Setembro/Dezembro 2011 Revista do Tribunal de C ontas da U nião • Brasil • ano 43 • núm ero 122 • Setem bro/D ezem bro 2011 Negócio Controle externo da Administração Pública e da gestão dos recursos públicos federais Missão Controlar a Administração Pública para promover seu aperfeiçoamento em benefício da sociedade Visão Ser reconhecido como instituição de excelência no controle e no aperfeiçoamento da Administração Pública www.tcu.gov.br Conhecendo o TRIBUNAL 5ª edição Conheça as publicações do Tribunal de Contas da União Compromisso com a Administração e a Gestão Pública www.tcu.gov.br revista@tcu.gov.br Entrevista com a Ministra Ana Arraes Ministro Emérito Ubiratan Aguiar discorre sobre os desafios da gestão pública contemporânea Ministros Benjamin Zymler, Presidente Augusto Nardes, Vice-Presidente Valmir Campelo Walton Alencar Aroldo Cedraz Raimundo Carreiro José Jorge José Múcio Ana Arraes Ministros-substitutos Augusto Sherman Cavalcanti Marcos Bemquerer Costa André Luís de Carvalho Weder de Oliveira Ministério Público Lucas Rocha Furtado, Procurador-Geral Paulo Soares Bugarin, Subprocurador-Geral Cristina Machado da Costa e Silva, Subprocuradora-Geral Marinus Eduardo de Vries Marsico, Procurador Júlio Marcelo de Oliveira, Procurador Sérgio Ricardo Costa Caribé, Procurador Missão Controlar a Administração Pública para promover seu aperfeiçoamento em benefício da sociedade. Visão Ser reconhecido como instituição de excelência no controle e no aperfeiçoamento da Administração Pública. Negócio Controle externo da administração pública e da gestão dos recursos públicos federais. Carta ao Leitor Carta ao Leitor C aro leitor, chegamos ao final do ano de 2011 e temos a honra de oferecer mais uma edição de nossa revista. Nossa entrevistada é Ana Arraes, a nova ministra do TCU, eleita pela Câmara dos Deputados este ano. Em exercício desde outubro, a ministra fala sobre sua carreira, sobre as expectativas em re- lação ao tribunal e sobre a importância do papel das mulheres no exercício da democracia. Na seção Destaques, apresentamos artigos que abordam temas de grande relevância e em discussão cada vez mais constante no país, como a acessibilidade de cidadãos com li- mitação de mobilidade, a vulnerabilidade da elevada ocorrên- cia de queimadas e incêndios florestais, e o combate à febre aftosa no Mercosul. Com a iminência da realização da Copa do Mundo e dos Jo- gos Olímpicos, o tribunal trouxe os temas à tona nos seminários “Infraestrutura Turística, Megaeventos Esportivos e Promoção da Imagem do Brasil no Exterior” e “Desenvolvimento de infra- estrutura no pós-crise”. Outra discussão apresentada é sobre a Segurança Nuclear e Radiológica no Brasil. Dentre os artigos, destacamos o de autoria do Ministro Emé- rito Ubiratan Aguiar, que discorre sobre os desafios da gestão pública atualmente. Outros autores abordam questões como a importância do amparo constitucional na realização de licita- ções sustentáveis, a transparência governamental e as audito- rias dos programas de governo. Esperamos que o leitor aprecie a publicação, destinada a di- vulgar as ações de fiscalização e controle dos recursos públicos e a possibilitar a interação com o TCU. Boa leitura ! Augusto Nardes é Ministro do Tribunal de Contas da União e Supervisor do Conselho Editorial da Revista do TCU Sumário Entrevista 6 Ministra Ana Arraes 6 A serviço do país Destaques 10Entrevista 6 Destaques 10 10 Ações de fiscalização auxiliam melhoria da segurança nuclear e radiológica no país 16 Megaeventos esportivos: o desafio vai além dos estádios 26 O desafio do investimento em infraestrutura no pós-crise 29 Auditoria conjunta avaliará Programa Mercosul Livre da Febre Aftosa 31 Falhas nas ações públicas dificultam combate a queimadas e incêndios florestais no país 33 Controle externo com foco na acessibilidade 35 Fiscalização de obras em 2011 mostra evolução no sistema de controle Sumário Artigos 38 38 Artigos 38 38 Desafios e demandas enfrentados por gerentes públicos nos dias de hoje 44 Instituto de Fiscalização e Controle - Regime Diferenciado de Contratações - Parecer 50 A atuação da Secretaria do Tesouro Nacional (STN) e da Secretaria de Orçamento Federal (SOF) na formulação e na execução da política fiscal 56 Princípio de Eficiência: parâmetro para uma nova gestão 64 O TCU e a cooperação internacional 78 Accountability no Setor Público: uma reflexão sobre transparência governamental no combate à corrupção 88 Processo de Tomada de Contas Especial (TCE): Instaura-se o processo para apurar os pressupostos ou apuram-se os pressupostos para instaurar o processo? 102 Licitações sustentáveis: a importância e o amparo constitucional e legal 120 Governança no Setor Público – origem, teorias, modalidades e aplicações 132 Do enfraquecimento à extinção do anexo de prioridades e metas da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO): elimina-se o problema, mas não as causas 142 Auditoria Operacional e Avaliação de Programas: instrumentos diferentes com propósitos comuns – identificando as similaridades em busca do elo perdido Índice de Asssunto 152 Índice de autor 158 Endereços 160 Entrevista 8 Revista do TCU 122 Aristóteles ensina que, as- sim como é impossível con- ceber a mão sem o corpo, é impossível conceber o indiví- duo sem o Estado. O homem é um animal social e político por natureza. E, se o homem é um animal político, ele tem neces- sidade natural de conviver em sociedade, de promover o bem comum e a felicidade. O fato de a atuação do TCU possuir um caráter mais técni- co não significa que ela deva ignorar a política. Aliás, é pre- ciso rechaçar a ideia de que a técnica e a política são anta- gônicas. Na realidade, elas são complementares. A política é a arte que possibilita mudan- ças, que dita os rumos a serem seguidos. Cabe à técnica ofe- recer subsídios para a tomada de decisões e, posteriormente, para viabilização dos objetivos pactuados pela coletividade. Por esse motivo, é impor- tante fazer o Tribunal atuar ainda mais próximo do Con- gresso Nacional. Considero fundamental para o País que o TCU ofereça trabalhos téc- nicos para subsidiar o exame, pelo Parlamento, de propostas de políticas públicas e de pro- gramas de governo. Da mesma forma, as Casas Legislativas devem ser informadas sobre os resultados da ação estatal, de modo a possibilitar sua ava- liação e a correção de rumos. Esse entrosamento da técnica e da política permitirá o cres- cimento do Brasil, com impac- tos positivos sobre a qualidade de vida do povo brasileiro. A senhora também afirmou que vai ser implacável no combate à improbidade e ao crime. Na sua opinião, o Brasil já possui ferramentas efetivas de combate à corrupção? Foi a política, como repre- sentação maior da sociedade e com a legitimação que de- riva da investidura popular, que construiu a democracia e promoveu o fortalecimen- to institucional dos órgãos de controle, como os Tribunais de Contas, o Ministério Públi- co e o Poder Judiciário. Quan- do faltou a política, avultaram os surtos autoritários, que fe- charam o Congresso Nacional, amordaçaram as instituições, perseguiram o pensamento li- vre e permitiram a adminis- tração dos negócios públicos ao arrepio das leis. Quando se fez presente a política, a voz da sociedade se fez ouvir com altivez e cons- truiu a democracia plena, que faz do Brasil um País respei- tado, com as instituições em pleno funcionamento. Estamos vivendo o maior período democrático da nossa história. Nossa democracia tem se aperfeiçoado, com políticas sociais de inclusão de grande parte de brasileiras e brasilei- ros. Graças a esses avanços, “ O fato de a atuação do TCU possuir um caráter mais técnico não significa que ela deva ignorar a política. Aliás, é preciso rechaçar a ideia de que a técnica e a política são antagônicas. Na realidade, elas são complementares.” Entrevista Set/Dez 2011 9 as ferramentas de fiscalização têm sido aprimoradas. Mas ainda é preciso avan- çar muito. Entre outros as- pectos, é importante tornar mais transparente a gestão estatal e incentivar a cobran- ça de resultados das políticas públicas implementadas. O TCU já foi muito criticado por sua atuação, principalmente em relação à fiscalização de obras públicas. Como a senhora avalia a atuação do tribunal nessa área? Acho-a extremamente po- sitiva para o País, pois permi- tiu reduzir custos das obras, aperfeiçoar a gestão pública e aumentar a eficiência da atu- ação do Estado. Considero, também, que grandes avanços ainda podem ser feitos, princi- palmente a partir da premissa de que o controle deve induzir a melhoria da gestão. Assim, é preciso aparelhar o Tribunal para atuar de for- ma preventiva e pedagógica, que estimule a administração pública a desenvolver bons procedimentos de trabalho. O TCU também deve procu- rar examinar os projetos an- tes do início de sua execução e acompanhar concomitan- temente sua implementação. Considero fundamental, tam- bém, uma adequada avaliação dos impactos econômicos e sociais das decisões do contro- le externo sobre o andamento das obras, de forma a mitigar prejuízos para a administra- ção e para a coletividade. Nesse sentido, de que forma o TCU e os demais órgãos de controle poderiam aprimorar sua atuação? Acho que o primeiro passo já foi dado, com a criação, du- rante a gestão do Presidente Ubiratan Aguiar, da Rede de Controle, que reúne diversos entes de fiscalização. Agora, é preciso estimular o intercâm- bio de informações entre os integrantes da Rede, ampliar o uso de recursos de informá- tica e desenvolver ações con- juntas de fiscalização. Com isso, conseguiremos uma si- nergia que nos permita obter melhores resultados para a so- ciedade brasileira. “ ...é preciso aparelhar o Tribunal para atuar de forma preventiva e pedagógica, que estimule a administração pública a desenvolver bons procedimentos de trabalho. ” 10 Revista do TCU 122 Destaques A tecnologia nuclear está cada dia mais presente na vida das pessoas. Seja na geração de energia elétri- ca, na produção industrial, na agricultura ou na medi- cina. Com isso cresce tam- bém a preocupação sobre as consequências de uma emer- gência radiológica ou um aci- dente nuclear sobre os seres humanos e o meio-ambien- te. Além disso, há um grande volume de recursos públicos envolvidos nos projetos, prin- cipalmente na realização de pesquisas e na construção de usinas termonucleares. Por isso, é constante o debate sobre a segurança no uso da energia nuclear, as ações pre- ventivas e a necessidade de es- truturar um sistema eficaz de controle de danos. Para fortalecer as discus- sões sobre o tema, o Tribunal de Contas da União realizou no dia 4 de outubro, no pa- lácio do Itamaraty, Rio de Janeiro, o Seminário Segu- rança Nuclear e Radiológica. O evento reuniu dirigentes das entidades que integram o Programa Nacional de Ati- vidades Nucleares. O tema da segurança nu- clear e radiológica voltou a ter projeção mundial após o acidente ocorrido em março de 2011 na usina de Fukushi- ma, no Japão. As explosões na usina japonesa reacenderam as preocupações geradas no passado pelos acidentes nas Ações de fiscalização auxiliam melhoria da segurança nuclear e radiológica no país Set/Dez 2011 13 Ações de fiscalização auxiliam melhoria da segurança nuclear e radiológica no país // Destaques aumento do deficit de pesso- al que agora chega a 796 ser- vidores. O quadro ainda deve ser agravado pela previsão de aumento das atribuições de- correntes da retomada do Pro- grama Nuclear Brasileiro. “O concurso público atenuou o problema, mas ele continua a se agravar. Vejam que esse dado é bastante preocupan- te. Até 2014, 43% do quadro da comissão estará apto a se aposentar e a formação de um técnico é lenta. É necessário que ele ingresse, receba os co- nhecimentos das pessoas que lá trabalham. Se essas pesso- as saírem sem transferir o co- nhecimento, podem colocar em risco o trabalho da comis- são”, alertou. o pRogRama nUCleaR bRaSileiRo As atividades brasileiras na área nuclear começaram no início dos anos 50, quan- do o Governo brasileiro pas- sou a controlar as exportações de minérios nucleares, esta- beleceu reservas e estoques estratégicos e estimulou o de- senvolvimento da tecnologia nacional no setor. Foi criada então a Comissão Nacional de Energia Nuclear (Cnen). Atualmente, as principais ações do setor nuclear bra- sileiro estão distribuídas em três ministérios. O Ministé- rio da Ciência Tecnologia e Inovação (MCTI), por meio da Cnen e unidades vincu- ladas, licencia e controla as atividades nucleares, fornece produtos e serviços e promo- ve pesquisas do setor. Tam- bém integram o MCTI a INB, que é responsável pelo ciclo do combustível nuclear e a Nuclep, fabricante de equi- pamentos pesados para usi- nas nucleares. No Ministério das Minas e Energia (MME) está a Eletro- nuclear, que opera as usinas nucleares Angra1 e Angra2 e conduz a construção de An- gra3. O Ministério da Defesa, por meio da Marinha Brasi- leira, pesquisa e desenvolve Vista aérea das Usinas de Angra 1 e 2 - RJ 14 Revista do TCU 122 Destaques o uso de energia nuclear para propulsão naval, tendo como principal projeto um subma- rino nuclear. SegURança e RegUlação O monopólio da União so- bre a mineração de elementos radioativos, a produção e o co- mércio de materiais nuclea- res é exercido pela Comissão Nacional de Energia Nuclear (Cnen). A Cnen foi criada em 1956 como órgão superior de planejamento, orientação, su- pervisão e fiscalização, esta- belece normas e regulamentos em radioproteção e licencia, fiscaliza e controla a ativida- de nuclear no Brasil. A comis- são também desenvolve ainda pesquisas na utilização de téc- nicas nucleares. Em 1987, o acidente com o Césio 137 em Goiânia gerou uma grande revisão do siste- ma brasileiro de regulação. De acordo com Ângelo Padilha, Presidente da Cnen, na época foi realizado um levantamen- to exaustivo das fontes radio- ativas artificiais existentes no Brasil, com o recolhimento das que não tinham uso defini- do. Também foi aperfeiçoado o processo de cadastramento de fontes e de responsáveis. Atualmente, estão em ope- ração no mundo 440 reatores de potência. Após o aciden- te de Fukushima, vários gru- pos de discussão e análise de acidentes foram constituí- dos, buscando tirar lições do ocorrido no Japão. A Agência Internacional de Energia Atô- mica (AIEA) tem sido o prin- cipal veículo em termos de propagação das boas práticas e princípios de segurança des- de a criação e também lidera as discussões sobre segurança nos diversos usos da energia nuclear. O Brasil desenvolve as normas regulatórias com base nas recomendações da AIEA e do ICRP. De acordo com Leonam dos Santos Guimarães, Assis- tente da Presidência da Ele- trobras Eletronuclear, após o acidente ocorrido na central de Fukushima, o Brasil passou a investir mais na segurança nuclear e criou um plano de investimentos para os pró- ximos cinco anos. Cerca de R$ 300 milhões serão destina- dos ao programa de melhoria contínua das usinas de Angra. Segundo o representante da Eletronuclear, o aciden- te no Japão trouxe inúmeras lições que a indústria nucle- ar precisa absorver, como a verificação das bases de pro- jeto para eventos externos, buscando assegurar a dispo- nibilidade dos sistemas de se- gurança diante de cenários de eventos externos extremos, além da necessidade de defi- nição de medidas para miti- gação de acidentes severos, com o objetivo de dotar as Atualmente, estão em operação no mundo 440 reatores de potência. Após o acidente de Fukushima, vários grupos de discussão e análise de acidentes foram constituídos, buscando tirar lições do ocorrido no Japão. Set/Dez 2011 15 Ações de fiscalização auxiliam melhoria da segurança nuclear e radiológica no país // Destaques usinas de recursos para con- trolar acidentes que excedam as condições postuladas. “Foi o caso de Fukushima, que não estava projetada para suportar um tsunami daquela altura”, afirmou. A segurança do Programa Nuclear Brasileiro está arti- culada dentro do Sistema de Proteção ao Programa Nuclear Brasileiro (Sipron), vincula- do ao Gabinete de Segurança Institucional (GSI) da Pre- sidência da República. De acordo com Carlos Alberto Matias, Secretário de Acom- panhamento e Estudos Insti- tucionais do GSI o sistema foi criado em 1980, com o objeti- vo de assegurar o planejamen- to integrado, coordenar a ação conjunta e a execução conti- nuada de providências que vi- sem a atender às necessidades de segurança do Programa Nu- clear Brasileiro, incluindo o pessoal envolvido, a popula- ção, as instalações e materiais e o meio ambiente. Nas situações graves são executados os planos de emergência, que envolvem entre outras ações, a evacu- ação das áreas e o socorro à população. Nos anos ím- pares são realizados exercí- cios gerais de simulação de emergência e nos anos pares, exercícios parciais. Assim, em 2011 ocorreu uma simu- lação geral entre os dias 31/8 e 1/9. Participaram membros A segurança do Programa Nuclear Brasileiro está articulada dentro do Sistema de Proteção ao Programa Nuclear Brasileiro – Sipron, vinculado ao Gabinete de Segurança Institucional (GSI) da Presidência da República. do sistema, observadores e avaliadores brasileiros, ob- servadores da Agência Inter- nacional de Energia Atômica e de entidades convidadas. Também participaram técni- cos do TCU e o ministro subs- tituto Augusto Sherman. Para a simulação realizada em 2011, foram introduzidas algumas inovações como o aumento na duração do exer- cício para dois dias, a ativa- ção simultânea e permanente dos quatro centros de emer- gência após o nível de “Aler- ta” e a retirada da população por via marítima. Também foi adicionada a complexidade de simular emergência nas duas usinas e pela primeira vez foi realizado o teste da distribuição das pastilhas de iodeto de potássio. Equipamento de raio-x 18 Revista do TCU 122 Destaques as áreas da saúde, educação e acessibilidade recebeu críticas do deputado federal Romário de Souza Faria (PSB-RJ). “Não há preocupação dos governan- tes com esses legados”, enfati- zou o parlamentar. Esta preocupação com a fal- ta de investimentos nas áreas da saúde, educação e acessi- bilidade ganha força quando comparada ao crescimento do número do turistas no Brasil. Segundo o presidente da Em- bratur, Flávio Dino de Castro e Costa, em 2020, o País deverá receber 10 milhões de turistas vindos do exterior. Para a Copa do Mundo de 2014, são espera- dos 3 milhões de turistas bra- sileiros e 600 mil estrangeiros. A necessidade de buscar soluções para a infraestrutu- ra do país, a fim de receber a Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos de 2016, levou o Tribunal de Contas da União a reunir representantes do governo e especialistas no se- minário “Infraestrutura Turís- tica, Megaeventos Esportivos e Promoção da Imagem do Bra- sil no Exterior”. O evento foi realizado em agosto de 2011, na sede do TCU em Brasília. De acordo com o coorde- nador do seminário e vice- -presidente do TCU, ministro Augusto Nardes, o legado dos megaeventos esportivos não pode se resumir à construção de novas arenas esportivas. “É necessária uma política de geração de empregos, com capacitação, treinamento e certificação profissional dos empregados”. O ministro re- força que esses eventos são uma oportunidade única para a consolidação do Brasil no cenário mundial e desenvol- vimento do turismo, funda- mental para o crescimento do país. No entanto, observa que, para tanto, são necessá- rios estímulo ao empreende- dorismo, incentivo aos micro e pequenos empresários em prol da geração de emprego e de renda e principalmente po- líticas públicas eficientes. “O país precisa de planejamento, mais investimentos em segu- rança, infraestrutura, mobi- lidade urbana, aeroportos e promoção da marca Brasil. É necessário vencer a Copa e as Olimpíadas da infraestrutu- ra, da segurança pública, do turismo, da mobilidade urba- na, da geração de emprego e da saúde. O país pode deixar a sua marca da convivência pacífica, da organização, da tolerância em função das ra- ças, condições sociais e pensa- mentos políticos. Além disso, deve-se firmar um legado para futuras gerações, consistente no planejamento e execução de programas e de projetos INFRAESTRUTURA TURÍSTICA, MEGAEVENTOS ESPORTIVOS E PROMOÇÃO DA IMAGEM DO BRASIL NO EXTERIOR inscrições: www.tcu.gov.br 16 e 17 de agosto de 2011 no Auditório Ministro Pereira Lira Edifício-sede TCU - Brasília-DF Ministério do Turismo Apoio Cartaz do Seminário Set/Dez 2011 19 eficientes, além de políticas públicas voltadas para o bem- -estar social” disse. O vice-presidente do TCU enfatiza que o turismo é a se- gunda maior indústria global, representando 8% de toda a economia mundial. Por isso, o Brasil precisa reforçar a in- fraestrutura para participar de uma fatia maior desse merca- do. “Brasil não é só samba e carnaval, devemos nos aperfei- çoar para mudar esta visão do exterior em relação ao País”. Para Antonio Henrique Borges Paula, gerente de Pro- jetos Estratégicos do Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (Senac), além de mostrar o que já tem, o país precisa ampliar as possibili- dades do turismo: “o Brasil tem muitas opções de turis- mo, é preciso investir nelas e ‘turistificar’ lugares que já têm grandes atrativos, mas ainda não possuem investi- mentos necessários”. Sobre os custos e benefí- cios dos megaeventos espor- tivos, o ministro do TCU José Múcio Monteiro enfatizou que, além da criação de espa- ços específicos para a prática esportiva ou de infraestrutura e serviços que atendam a um público exclusivo e em restri- to espaço físico-temporal, o le- gado desses eventos deve ser a perenização da prática de im- plantação de políticas públi- cas de urbanização. Com isso serão capazes de compatibili- zar, de forma economicamen- te viável a toda a população, o inevitável crescimento das cidades com a proteção am- biental e o incremento da qua- lidade de vida dos cidadãos. De acordo com a secretária Nacional de Políticas de Tu- rismo, Ana Isabel Mesquita de Oliveira, os eventos esportivos serão um momento de exposi- ção do Brasil, os quais enfren- tarão desafios como “receber turistas e delegações, desenvol- ver estratégias, mostrar uma economia estável, aumentar a inclusão social, além de traba- lhar pela unificação de setores privado e público”.  Ana acres- centou que a contribuição da Copa para o turismo deverá ser significante, pois poderá “con- solidar o destino brasileiro no imaginário do turista nacional e internacional”. SeToR hoTeleiRo e qUalifiCação De peSSoal Investir na qualificação profissional e na moderniza- ção de hotéis é o principal pas- so que o Brasil deve dar para obter êxito na Copa do Mundo de 2014 e nos Jogos Olímpicos de 2016. Segundo o vice-presi- dente para Meios de Hospeda- gem da Federação Brasileira de Hospedagem e Alimenta- ção, Ricardo Krüger, embora o País tenha uma boa infraes- trutura hoteleira, ainda há a “ O Brasil tem muitas opções de turismo, é preciso investir nelas e ‘turistificar’ lugares que já têm grandes atrativos, mas ainda não possuem investimentos necessários. ” Antonio Henrique Borges Paulat Megaeventos esportivos: o desafio vai além dos estádios // Destaques 20 Revista do TCU 122 Destaques necessidade de aperfeiçoar o atendimento para um público estrangeiro exigente. “O Bra- sil possui uma grande carên- cia de idioma. São poucas as pessoas que possuem conheci- mento de outras línguas, como o inglês, por exemplo, princi- pal idioma para a realização desses eventos”, afirmou. De acordo com ele, a in- fraestrutura hoteleira possui capacidade para receber os eventos, tendo em vista que, cada vez mais, as cidades-sede do mundial são palco de gran- des acontecimentos. No en- tanto, ainda faz-se necessário o aumento do número de leitos. Segundo Krüger, o País possui 343 mil leitos e deverá contar com mais 142 mil até 2014, o que representa 198 novos ho- téis em todo o Brasil. Dados da federação apontam que o País investirá R$ 7,4 bilhões na rede hoteleira, o que acarretará na criação de 32 mil novos em- pregos. Para Krüger, a oportu- nidade de sediar a Copa e as Olimpíadas tornará o Brasil um País capacitado para investir na captação de outros grandes eventos e a divulgação e pro- moção dos jogos no exterior contribuirão para um maior número de turistas no País. SegURança públiCa Com o lema “nosso esporte é a segurança”, a Secretaria Extraordinária de Segurança para Grandes Eventos preten- de transformar a imagem de pouco profissionalismo que, segundo o secretário José Ri- cardo Botelho de Queiroz, é frequentemente associada ao Brasil. Incumbida de co- ordenar os esforços de inves- timento em infraestrutura, capacitação e inteligência, a secretaria atuará checando as necessidades das institui- ções para definir a alocação de recursos para realização de grandes eventos. “A integração é a coluna cervical de tudo”, afirmou. O secretário considera que a aná- lise de risco é um dos instru- mentos mais importantes para garantir a integração e evitar a sobreposição de ações. “Pre- cisamos checar, por exemplo, o que foi repassado pelo fundo de segurança, pelo Pronasci, Viaturas da PM de São Paulo Investir na qualificação profissional e na modernização de hotéis é o principal passo que o Brasil deve dar para obter êxito na Copa do Mundo de 2014 e nos Jogos Olímpicos de 2016. Set/Dez 2011 23 mentos para estimular a mo- dernização das frotas. infRaeSTRUTURa aeRopoRTUáRia O ministro-chefe da Secre- taria de Aviação Civil da Presi- dência da República, Wagner Bittencourt, enfatizou que para uma realização exemplar da Copa do Mundo de 2014 e dos Jogos Olímpicos de 2016, o Brasil terá que superar sé- rios desafios. Segundo ele, o País tem crescido de forma expressiva e um planejamen- to do setor de aviação civil e uma melhora na gestão são imprescindíveis para atingir o objetivo de expandir a ca- pacidade de infraestrutura dos aeroportos. “A criação de uma política pública voltada para o desenvolvimento econômi- co e para a ampliação de voos domésticos, ligando cidades distantes, é uma das nossas prioridades”, afirmou. Bittencourt elencou as ações que estão sendo imple- mentadas para que os eventos sejam realizados com êxito: melhoria na gestão de órgãos ligados à administração dos aeroportos, investimentos da ordem de R$ 7,2 bilhões na reconstrução e modernização dos aeroportos, concessões aéreas e controle do tráfego aéreo. “Devemos investir na reestruturação da Infraero e no fortalecimento da entidade para que a atuação seja mais eficaz”, opinou. Outro ponto levantado pelo ministro foi a concessão dos aeroportos de Guarulhos e Vi- racopos, em São Paulo e do ae- roporto de Brasília. Segundo ele, a concessão proporciona- rá ampliação da capacidade de operação dos aeroportos e estimulará a concorrência entre as concessionárias e as companhias aéreas. “Essa competição será positiva para o usuário, já que a concorrên- cia poderá baratear o custo fi- nal das passagens”, disse. Para controlar o crescente tráfego aéreo, o ministro garantiu que haverá aumento do efetivo de controladores. “ A criação de uma política pública voltada para o desenvolvimento econômico e para a ampliação de voos domésticos, ligando cidades distantes, é uma das nossas prioridades. ”Wagner Bittencourt Megaeventos esportivos: o desafio vai além dos estádios // Destaques Destaques 24 Revista do TCU 122 O crescimento histórico da demanda de voos foi des- tacado pelo presidente da In- fraero, Gustavo do Vale. Ele atribuiu o fato ao aumento do poder aquisitivo de famílias de baixa renda e da concorrência de empresas aéreas. O presi- dente garantiu que as medidas para ampliação dos terminais, aumento da capacidade e re- forma dos aeroportos serão cumpridas para a Copa. Num tom menos otimista, o coordenador de Infraestrutu- ra Econômica do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Carlos Campos, indicou dificuldades que o País poderá enfrentar na implementação das ações previstas. “As obras continuam apenas em forma de projetos, o que causa dúvida quanto à conclusão”, pontuou. Segundo Campos, a demanda nos aeroportos teve um consi- derável crescimento nos últi- mos anos e os terminais ainda não absorveram esse aumento. Ele apontou dificuldades para que os terminais fiquem pron- tos em tempo hábil, já que o prazo médio de execução de obras de infraestrutura é de sete anos e meio. “Se manti- vermos o prazo que está esta- belecido, dez aeroportos não estarão concluídos para os jo- gos e atuarão acima da capa- cidade”. Apesar das recentes medidas adotadas para agilizar o processo, como o Regime Di- ferenciado para Contratação (RDC) e as concessões aero- portuárias, ele avaliou como remota a possibilidade de con- clusão das obras. TRanSpaRênCia O presidente do Tribunal de Contas da União (TCU), ministro Benjamin Zymler, destacou a importância da transparência nas execuções das obras de infraestrutura para a Copa do Mundo de 2014 e para os Jogos Olímpicos de 2016. O ministro-substitu- to do TCU Marcos Bemque- rer Costa também alertou que não basta que os gastos do governo estejam na inter- net, sendo necessário que o cidadão comum entenda as informações publicadas. “O desafio é qualificar a popula- ção para exercer a cidadania, instrumento de expressão da democracia previsto na Cons- tituição”, afirmou. O espírito cooperativo entre o TCU e os organizadores da Copa foi abordado pelo minis- tro Valmir Campelo. Responsá- vel pela relatoria dos trabalhos do TCU relacionados à Copa, o ministro chamou a atenção para a postura educativa e pre- ventiva do tribunal. “Acredito nesse modelo. Temos adotado o diálogo como principal meio de evitar irregularidades. No entanto, não hesitaremos em tomar as providências previs- tas em lei caso haja abuso.” O ministro explicou que, em razão das diferentes fon- tes de recursos necessárias à viabilização do evento desta envergadura, o TCU tem atu- ado em conjunto com os ou- tros órgãos de controle, numa ação coordenada de todos os agentes nas três esferas de governo, cada qual com a sua responsabilidade devidamen- te identificada. Para isso foi criada a Rede de Fiscalização da Copa de 2014, com a participação de todos os tribunais de contas dos estados e dos municípios que sediarão o evento. Valmir Campelo destacou, ainda, que, para favorecer o controle das operações, foi criado o Portal de Fiscalização da Copa de 2014: www.fiscalizacopa2014. gov.br. O ministro enfatizou, po- rém, a necessidade de apri- moramento da matriz de responsabilidade, instrumen- to criado para dimensionar e consolidar as previsões de gas- tos nas três esferas de governo e que possibilita uma visão ge- ral das fontes de financiamen- tos utilizadas na execução de todos os projetos para os jogos. a iMageM Do bRaSil no exTeRioR O presidente da Câmara de Políticas de Gestão, Desempe- nho e Competitividade, Jorge Gerdau Johannpeter, foi taxa- Set/Dez 2011 25 tivo ao afirmar que o sucesso ou o fracasso na realização da Copa do Mundo, em 2014 e dos Jogos Olímpicos, em 2016, deve ser dividido pela socieda- de brasileira. Para ele, os bra- sileiros ainda não conseguiram entender o alcance dessas competições para o futuro da economia e da imagem do país no exterior. Gerdau enfatizou que o empresariado ainda não percebeu a oportunidade de fortalecimento das marcas bra- sileiras no mercado globaliza- do, o que permitirá a expansão de novos negócios por todos os continentes e crescimento da economia do País. Ao tratar do assunto, a co- ordenadora-geral de Intercâm- bio e Cooperação Esportiva do Ministério das Relações Exte- riores, Vera Cintia Alvarez, reforçou a importância do pla- nejamento, do gerenciamento e da fiscalização como formas de combater o desperdício de recursos públicos. Segundo ela, enquanto Chi- le, México e Argentina tiveram crescimento do PIB em 5%, de- pois da realização dos jogos, pa- íses como o Canadá e a Grécia apresentaram como legado o deficit nas contas. Citou, além desses dois casos, o exemplo negativo da Índia, alvo de sus- peitas de corrupção e críticas por erros que teria cometido na organização dos Jogos da Co- munidade Britânica, realizados em Nova Déli, no ano passado. A seu ver, os megaeventos também devem servir de ala- vanca para a modificação da imagem que a população tem de si mesma e como os demais países veem a nação organiza- dora. Ela explicou que os paí- ses que realizaram as últimas edições da Copa do Mundo – Coreia do Sul, Alemanha e África do Sul – desenvolveram ações para fechar cicatrizes sociais internas e obtiveram ganhos de imagem perante a sociedade mundial. A reconstrução da identi- dade de cada país-sede foi fei- ta por meio de campanhas de conscientização. No Brasil, o governo quer reforçar a ima- gem vencedora, construída ao longo dos últimos anos, como meio de aproximar a popula- ção dos eventos que o país vai realizar. A intenção é reforçar a imagem da diversidade cultural brasileira para os outros países. “Nós somos a nação de todas as nações”, reforçou Alvarez. Megaeventos esportivos: o desafio vai além dos estádios // Destaques 28 Revista do TCU 122 Destaques // O desafio do investimento em infraestrutura no pós-crise contas português, que busca a correção dos possíveis erros ainda na origem dos contra- tos. Informou também que o TCP abarca duas instâncias próprias, em que os parceiros privados ainda podem recor- rer de suas decisões – a partir daí, as decisões da Corte de Contas só poderão ser ques- tionadas pelas entidades da administração ou pelo Minis- tério Público. O delegado alemão, Werner Pelzer alertou sobre a necessi- dade de ser observada a natu- reza dos negócios tratados em PPPs. Segundo o representan- te, tais ações não podem ser estratégicas – como no caso da Alemanha, que terceiri- zou trabalhos na área de de- fesa nos projetos Fürst Wrede e Herkules. O perigo, naque- las parcerias, foi que o conhe- cimento adquirido em TI e a acomodação de staff militar seriam absorvidos pela empre- sa privada, e não pelo Estado. No México pós-crise, tanto o PIB como os investimentos privados diminuíram. O re- presentante do país, Ricardo Miranda explicou que, a par- tir desse momento, “o desafio é atrair investimentos priva- dos com sustentabilidade e solvência em finanças públi- cas em médio e longo prazos”. Ele ressaltou a importância de uma avaliação rigorosa de as- pectos técnicos, econômicos, financeiros e ambientais. Kate Siggerud, repre- sentante do Government Accountability Office (GAO) explicou que nos Estados Unidos a maior parte dos in- vestimentos de infraestrutura é de responsabilidade dos go- vernos estaduais. Além disso, “há um controle do setor pri- vado sobre o transporte, a co- municação e a eletricidade”. Para o GAO, os Estados Uni- dos ainda não saíram da crise. Exemplo disso são os inves- timentos em transporte que caíram em todos os níveis de governo. Ela detalhou, ainda, como é a auditoria preventi- va, que reporta os aconteci- mentos e gastos à medida que ocorrem. Ao explicar a expe- riência de PPPs no EUA, ob- servou que os custos e riscos devem ser bem ponderados e que a incerteza financeira diminui o interesse da inicia- tiva privada. EfETividadE No Japão, mesmo após o país passar por duas crises nos anos 90, o governo con- tinuou investindo no setor de infraestrutura. Masaaki Tami- no explicou que as auditorias realizadas pelo órgão fiscali- zador do Japão focam na qua- lidade das obras. Segundo o representante do Japão, isso ocorre porque construções de baixa qualidade não contri- buem para o desenvolvimento do país. Ele citou o terremoto que o país enfrentou, em mar- ço deste ano, como exemplo de que obras públicas cons- truídas com qualidade podem enfrentar eventos catastró- ficos. Relatório feito após o terremoto demonstrou que a maioria das pontes não foi significativamente danifica- da, pois o impacto do tremor foi amenizado com um bom planejamento das obras. Por esse motivo, após as recen- tes catástrofes, as auditorias focadas na efetividade se tor- naram fundamentais. “Em al- gumas auditorias percebeu-se mudanças nos planos iniciais. Nós percebemos que não ha- via normas específicas para calcular o valor das análises. Sendo assim, recomendamos que o trabalho fosse revisado e trabalhado em cima de nor- mas”, exemplificou. Segun- do o representante do país, as auditorias em obras públicas focadas na efetividade deve- rão crescer e a qualidade das obras será a prioridade. Para a representante da Índia, Meenakshi Gupta, o setor de infraestrutura é um dos mais importantes devido à magnitude dos investimen- tos e, por esse motivo, merece mais atenção das auditorias. “Esse setor é o principal mo- tivador do crescimento da economia. Além disso, ofere- ce serviços que interferem na vida de cada cidadão”. Destaques O Brasil é o segun- do maior expor- tador de carne bovina do mun- do, atrás apenas dos Estados Unidos. Atualmente, o reba- nho brasileiro soma mais de 200 milhões de cabeças de gado. Por isso, o país tem-se empenhado em evitar a febre aftosa no território – uma do- ença extremamente conta- Auditoria conjunta avaliará Programa Mercosul Livre da Febre Aftosa giosa que ataca animais como bois, porcos e cabras. A aftosa é uma das doen- ças que mais causa prejuízos aos criadores de gado em todo o mundo. Quando a doença atinge um rebanho, os ani- mais costumam perder peso, diminuem a produção de leite, param de crescer e têm dificul- dades para se reproduzirem. Todo o país é afetado pela que- da na produção e exportação de carne. Os rebanhos conta- minados costumam ser abati- dos, para evitar a transmissão do vírus a outras criações. As propriedades com animais doentes são interditadas e as exportações de carnes e mate- riais derivados são suspensas. Foi o que ocorreu com o Pa- raguai em setembro de 2011. Segundo dados da associação Set/Dez 2011 29 30 Revista do TCU 122 rural do país vizinho, após a confirmação do foco de aftosa, foram abatidas 819 cabeças de gado em uma fazenda no De- partamento de San Pedro. No entanto, a doença foi detecta- da em apenas 13 animais. Logo quando surgiu o foco, o Brasil suspendeu a importação de carne do país, que era de apro- ximadamente 1,8 mil tonela- das por mês. A estimativa de prejuízos para o país gira em torno de R$ 350 a 450 milhões. Em 2012, os números podem chegar a R$ 600 milhões. O último registro da do- ença no Brasil foi em 2006, justamente na divisa com o Paraguai, em Mato Grosso do Sul. Os prejuízos na época ul- trapassaram R$ 1 bilhão. Des- de então, o combate à doença foi intensificado no território brasileiro. E, em 2007, foi ar- ticulado um programa para er- radicar a febre aftosa de todos os países do Mercosul: o Pro- grama de ação Mercosul livre de febre aftosa (Pama). O Pama é financiado pelo Fundo de Convergência Estru- tural do Mercosul (Focem). O programa pluriestatal preten- de apoiar a erradicação da fe- bre aftosa, além de contribuir para a reestruturação e fun- cionamento de um sólido sis- tema de atenção veterinária sub-regional. Outros objetivos do programa são contribuir para o desenvolvimento da pe- cuária regional para sua inser- ção no mercado internacional e fortalecer as estruturas sa- nitárias para prevenir outras enfermidades que causem si- milar impacto econômico. Para verificar o funcio- namento do programa, será realizada uma auditoria con- junta, coordenada pelo TCU, com a participação das EFSs da Argentina, Bolívia, Para- guai e Uruguai. De acordo com o secretário-executivo da Organização das Entida- des Fiscalizadoras Superio- res dos Países do Mercosul e Associados (EFSul), ministro do TCU Augusto Nardes, a au- ditoria será importante por- que o Brasil entra com grande parte dos recursos destinados ao Pama: “é necessário que a gente avalie se os recursos que estão sendo liberados pelo executivo estão sendo bem aplicados. Esse é o ponto fun- damental dessa fiscalização”. Em setembro de 2011, foi realizado na sede do TCU, em Brasília, o Seminário Inter- nacional Mercosul, Fundos Comunitários e Controle Re- gional para planejar e reunir subsídios para a realização da auditoria. Na oportunidade, a auditora-geral da Nação da Ar- gentina e presidente da EFSul, Vilma Castillo, destacou a ne- cessidade de fiscalização das ações do Pama, iniciado em 2007. De acordo com o regu- lamento do Focem, o progra- ma deveria ser fiscalizado por auditorias internas e exter- nas, anualmente e ao final de cada projeto. Entretanto verifi- cou-se que as auditorias ainda não foram executadas. Vilma Castillo apontou que a necessidade de controle so- bre os programas financiados é evidente, pois além do gran- de aporte financeiro, as ações impactam a realidade de mui- tas pessoas que, mesmo indi- retamente, contribuem para a realização dos projetos. “Nos- sos cidadãos que contribuem, muitas vezes, para outro esta- do parte, precisam ter a tran- quilidade de que o controle será realizado”, disse. Destaques // Auditoria conjunta avaliará Programa Mercosul Livre da Febre Aftosa Set/Dez 2011 33 Destaques A falta de estrutura física adequada em prédios públi- cos tem sido um entrave ao exercício da cida- dania para milhões de pesso- as em todo o país. O Instituto Brasileiro de geografia e Es- tatística (IBGE) identificou que no ano 2000, quase 25 milhões de brasileiros decla- ravam possuir algum tipo de deficiência. Isso sem contar Controle externo com foco na acessibilidade A incluSão DAS regrAS De AceSSibiliDADe como temA A Ser obServADo por equipeS De AuDitoriA poDe repreSentAr AvAnço pArA o pAíS. as pessoas que embora não sejam portadoras de deficiên- cia, possuem algum tipo de li- mitação na mobilidade, como por exemplo pessoas idosas ou obesas. Para propor melhorias re- ferentes a esse quadro, o Tri- bunal de Contas da União realizará uma auditoria ope- racional para verificar as con- dições de acessibilidade nos órgãos e entidades da adminis- tração pública federal. Além disso, o tribunal pretende in- cluir a acessibilidade entre os itens a serem observados nas próximas matrizes de audito- rias em obras públicas. Dessa forma, espera-se que a acessi- bilidade passe a ser tema co- mum à análise dos processos licitatórios e no acompanha- mento das obras públicas. No dia 21 de setembro, Dia Nacional de Luta da Pessoa 34 revista do tcu 122 com Deficiência, o tribunal também anunciou apoio à campanha nacional “Minis- tério Público de Contas pela Acessibilidade Total”, lança- da pela Associação Nacional do Ministério Público de Con- tas (Ampcon). Um dos obje- tivos principais da campanha da Ampcon é inserir o item “cumprimento das regras da ABNT quanto à acessibilida- de” na agenda permanente de verificação das equipes de fis- calização dos diversos tribu- nais de contas do País. Tanto na análise dos procedimentos licitatórios, quanto no acom- panhamento da execução das reformas, ampliações ou construções de prédios públi- cos, considerando os reflexos no exame da legalidade, le- gitimidade e economicidade dos empreendimentos. Segundo Sérgio Caribé, procurador do Ministério Pú- blico junto ao TCU, o objetivo inicial da campanha é verifi- car se todas as construções civis, custeadas com recur- sos públicos, estão de acor- do com as regras da ABNT quanto à acessibilidade. “Os espaços públicos deverão ser adequados, na maior veloci- dade possível, para alcançar o atendimento necessário que essas pessoas precisam. Es- sas mudanças interferem no exercício da plena cidadania daqueles que não possuem acesso e igualdade de condi- ções”, destacou. A campanha prevê ainda, em um segundo momento, verificar se há atendimento especial às pessoas portado- ras de deficiência. “O aten- dimento deve ser condizente com a necessidade de cada um. Os deficientes visuais e auditivos, por exemplo, de- verão ter equipamentos es- peciais”, ponderou. Outro ponto destacado pelo procu- rador é o de que, por meio de decreto, cabe ao Poder Executivo assegurar, com base em estudos e pesqui- sas, a viabilidade da redução ou isenção de tributo para importação de equipamen- tos que não existem no país, necessários para adequação dos portadores de deficiên- cia. “Essa previsão normati- va posta em termos abstratos deve ser cobrada pelos tri- bunais de contas”, afirmou o procurador. Destaques // Controle externo com foco na acessibilidade Set/Dez 2011 35 Destaques O Tribunal de Con- tas da União en- tregou em no- vembro ao Con- gresso Nacional o relatório de consolidação das fiscalizações de obras de 2011. O documen- to subsidiará a aprovação da Lei Orçamentária Anual de 2012. As correções propos- tas pelo TCU podem gerar be- nefícios de até R$ 2,6 bilhões aos cofres públicos. Entre os 230 empreendi- mentos fiscalizados, o TCU identificou 26 obras com in- dícios de irregularidades gra- Fiscalização de obras em 2011 mostra evolução no sistema de controle Artigos 38 Revista do TCU 122 Desafios e demandas enfrentados por gerentes públicos nos dias de hoje Ubiratan Aguiar é Ministro Emérito do Tribunal de Contas da União 1. InTRodUção Este trabalho tem por objetivo tecer con- siderações acerca do Subtema 1-A do VIII Congresso da Organização Europeia das Ins- tituições de Fiscalização Superior (Eurosai), intitulado “Desafios e demandas enfrentados por gerentes públicos nos dias de hoje”. À guisa de esclarecimento, registra-se que o Tribunal de Contas da União, do Brasil, par- ticipa do evento na condição de observador, atendendo a honroso convite formulado pelo Tribunal de Contas de Portugal. Buscou-se, no delineamento do escopo do assunto, focalizar e contrapor os aspectos cen- trais desenvolvidos no Documento Principal elaborado por representantes das Institui- ções de Fiscalização Superior da Holanda e da Eslovênia, previamente disponibilizado pela Eurosai no sítio eletrônico mantido na rede mundial de computadores, e que deverá nor- tear as discussões. Apesar da amplitude do tema, não se dis- correu sobre questões outras que não aquelas destacadas no referido Documento. Set/dez 2011 39 retranca imagem ctrl + Shift + click para liberar retranca Desafios e demandas enfrentados por gerentes públicos nos dias de hoje // Artigos 2. ConTexTUalIzação: o ConflITo As questões trazidas na justificativa cons- tante do Documento Principal, elaborado com o intuito de provocar reflexões e susci- tar o debate, sinalizam para a existência de uma possível incompatibilidade existente entre o mundo real e a normatização sobre ele aplicável, sob o argumento de que o pri- meiro sofreria mudanças em um ritmo bem mais acelerado que a legislação que busca a ele regular. Esse distanciamento poderia justificar a adoção de práticas, pelos agentes públicos, não amparadas ou mesmo contrá- rias às leis existentes, por serem as normas obsoletas e anacrônicas. Na mesma linha, as Instituições de Fiscalização Superior se de- parariam com o dilema de, em tais situações, terem que optar entre exigir o cumprimento estrito das leis ou buscar paradigmas princi- piológicos que pudessem socorrer às decisões adotadas pelos administradores. Esse é o cerne da discussão sobre o qual desenvolveremos nosso raciocínio. 3. deSenvolvImenTo da qUeSTão As Instituições de Fiscalização Superior agem nos limites do cenário jurídico-institu- cional no qual se encontram inseridas. Nesse contexto, os países praticantes da tradição ju- rídica do direito civil romano valorizam a lei escrita, previamente estabelecida pelos legis- ladores para resolução de possíveis conflitos, como fonte principal do direito. De forma di- versa, o costume e as decisões judiciais for- mam precedentes que são aceitos quase que obrigatoriamente, com força de lei, nos países que adotam a tradição do direito anglo-saxão. A questão posta em discussão é mais difícil de ser aceita em países que, como o Brasil, adotam o legalismo como fonte da lei, ou seja, adotam a norma positivada como sinônimo de direito. Em países de direito prevalentemente con- suetudinário, valoriza-se o direito não escrito, em que os costumes transformam-se em leis, em seu sentido mais amplo. É de se supor ser aceitável, em tais países, que a transformação nos costumes acarrete a alteração dos paradig- mas legais aplicáveis às diversas situações e que Artigos 40 Revista do TCU 122 as Instituições de Fiscalização Superior adotem como paradigmas os mesmos standards utili- zados pelos aplicadores do direito. A Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada no ano de 1988, expressa- mente estabelece que a Administração Públi- ca obedecerá, dentre outros, ao princípio da legalidade. Não pode o administrador público, portanto, relegar a aplicação das leis, sob ne- nhum pretexto. É de se observar, no caso brasileiro, que o mesmo texto constitucional também atribuiu ao administrador o dever da eficiência. Isso não significa dizer, contudo, que aqueles que lidam com a coisa pública possam optar pela aplica- ção de um ou outro princípio. Ambos devem ser empregados de forma simultânea e não ex- cludente. Isso significa dizer que não basta ao administrador público simplesmente aplicar a lei, mas que deve aplicá-la de forma a obter os melhores resultados. Como corolário, não pode o gestor público, sob a pretensão de obter melhores resultados, esquivar-se da observância dos textos legais. Não há, nesse caso, que se falar em conflito de princípios constitucionais, mas na comple- mentaridade dos princípios. Ao tratar de tema tão complexo e contro- verso, é importante distinguir as causas que poderiam levar os gestores públicos a trilha- rem opções administrativas não autorizadas por lei, porquanto causas diferentes podem ensejar abordagens distintas por parte dos ór- gãos de controle. A primeira das causas é a avaliação de que as leis existentes não mais seriam adequadas à re- solução dos problemas com que se defrontam, por serem ultrapassadas. A segunda das causas é a existência de lacuna normativa impossibi- litando a aplicação de solução positivada para a situação a ser resolvida pelo gestor. Principiando pela segunda das causas, é le- gítimo aceitar que o gestor público, ante a ine- xistência de disciplinamento para questões que necessitem ser solucionadas, utilize-se da apli- cação de princípios para oferecer a resposta aos problemas os quais lhes são apresentados. Mesmo em tais casos, contudo, a discricionari- dade não é absoluta, devendo pautar-se regras de conduta de razoável aceitação, sob o risco de transmutar-se em arbitrariedade. Em tais situações, cabe aos administradores públicos justificarem, previamente à prática dos atos que praticarão, os motivos que os levam a optar pela adoção de determinado caminho. Essa prévia motivação constituirá o elemento principal sob o qual serão realizadas as análises feitas pelas Instituições de Fiscalização Superior, devendo dela constar a descrição do problema enfrentado pelo administrador público, as opções que lhes eram disponíveis, com as respectivas vantagens e desvantagens, bem como as razões de decidir. O afastamento da aplicação da lei em decor- rência de possível obsoletismo e a aceitação Set/dez 2011 43 dos interesses populares, possuindo, portanto, inegável legitimidade. Não é aceitável que as Instituições de Fiscalização Superior corrobo- rem pretensões de indivíduos que, arguindo supostas suspeições dos parlamentos, rejeitem a aplicação das leis e se considerem mais isen- tos para decidir acerca de quais seriam reais interesses públicos. Sobretudo porque se sabe que os indivíduos são igualmente suscetíveis às abordagens daqueles grupos pressão ou de interesse e as manifestações individuais são mais suscetíveis de serem subjugadas e venci- das pela corrupção do que aquelas emanadas de corpos coletivos. Retornando ao raciocínio principal, os in- teresses do parlamento nem sempre se coa- dunam, então, com os interesses do governo, sobretudo nos momentos em que aquele não detém a maioria nas casas legislativas. Em tais situações, por diversas vezes o governo vê frus- tradas suas expectativas de alterações legisla- tivas, no tempo pretendido. A partir dessa constatação, os agentes go- vernamentais podem ser tentados a, sob a alegação da necessidade de mais agilidade e eficiência, buscar alternativas para relativizar ou mesmo afastar a aplicação de preceitos le- gais, em nome do suposto “alcance do interes- se público”. Ao consentir com tais práticas, as Instituições de Fiscalização Superior estariam como que validando normas não aprovadas pelo parlamento, usurpando sua função legis- lativa, e se prestando à captura por interesses governamentais, alterando o sistema de pesos e contrapesos que norteia o relacionamento entre os Poderes. ConClUSão Nos estados democráticos de direito o inte- resse público reside no cumprimento das leis, não cabendo às Instituições de Fiscalização Superior desobrigar os gestores públicos do cumprimento nem aquiescer aos atos prati- cados em confronto com as normas vigentes. A perspectiva formalista pode ser relativiza- da quando for constatado o descumprimento de dispositivo legal que afete apenas a forma do ato praticado, sem interferência em seu mérito. Na ausência de normatização específica, é esperado que os gestores públicos ajam nas lacunas da lei movidos pela aplicação de princípios. A prática de tais atos deve ser pre- viamente justificada, com explicitação dos motivos que levaram o administrador públi- co a adotar aquela decisão em detrimento de outras que seriam possíveis. As Instituições de Fiscalização Superior possuem relevante papel no esclarecimen- to, aos gestores públicos, das irregularidades mais frequentemente detectadas no exercício do controle que exercem e das soluções pos- síveis de serem adotadas nos problemas com eles se deparam. Desafios e demandas enfrentados por gerentes públicos nos dias de hoje // Artigos Artigos 44 Revista do TCU 122 Instituto de Fiscalização e Controle - Regime Diferenciado de Contratações - Parecer André Luiz Francisco da Silva Vital e colaboradores: André Vital é servidor do Tribunal de Contas da União e membro do Instituto de Fiscalização e Controle. Graduado em Engenharia Civil, especializado em Matemática pela Universidade de Brasília e bacharel em Direito pelo Instituto de Ensino Superior de Brasília. A Lei nº 12.462/2011, resultante da con- versão da Medida Provisória nº 527, estabe- lece o Regime Diferenciado de Contratações (RDC) para todos os empreendimentos rela- tivos à realização da Copa das Confederações FIFA 2013, da Copa do Mundo; FIFA 2014, das Olimpíadas de 2016 e das obras de infraestru- tura e de contratação de serviços para os ae- roportos das capitais dos Estados distantes até 350 quilômetros das cidades sedes dos eventos mencionados. Os objetivos gerais do RDC, definidos no texto da Lei, são de ampliar a eficiência nas contratações públicas, a competitividade entre os licitantes, promover a troca de experiências e tecnologias, incentivar a inovação, assegurar tratamento isonômico entre licitantes e sele- cionar a proposta mais vantajosa para a Admi- nistração Pública. O quadro 1 faz a comparação entre algumas inovações trazidas pelo RDC e os dispositivos vigentes no rito de contratações de obras pú- blicas previstos na Lei 8.666/1993. Jogando um pouco para escanteio os reais motivos que levaram ao RDC, é certo que te- Set/Dez 2011 45 retranca imagem ctrl + Shift + click para liberar retranca Instituto de Fiscalização e Controle - Regime Diferenciado de Contratações - Parecer // Artigos Lei nº 8.666/1993 RDC As obras e os serviços somente poderão ser licitados quan- do houver projeto básico de engenharia. Abre a possibilidade de obras e serviços serem licitados apenas com an- teprojeto de engenharia. Deve existir orçamento detalhado em planilhas que expressem a composição de todos os custos uni- tários. Disponível aos interessados. Os valores poderão ser estimados com base no mercado, nos valores pa- gos pela Administração Pública em serviços e obras similares ou na ava- liação do custo global da obra, aferida mediante orçamento sintético ou metodologia expedita ou paramétrica. A estimativa de custos poderá permanecer oculta. As obras são divididas em tantas parcelas quantas se com- provarem técnica e economicamente viáveis, com vistas ao melhor aproveitamento dos recursos disponíveis no mercado e à ampliação da competitividade sem perda da economia de escala. Prevê o uso da contratação integrada, licitando a entrega final do produ- to, obra ou serviço. O parcelamento do objeto poderá ser feito por opção do gestor público. Há possibilidade de ajustes nos valores dos contratos para atender às exigências da Administração, com acréscimos ou supressões nas obras de até 25% (vinte e cinco por cento) do valor inicial atualizado do contrato, ou de até 50%, no caso de reformas. Também há possibilidade de ajustes nos valores dos contratos para atender às exigências da Administração. Os limites previstos na Lei nº 8.666/1993 passaram a ser observados na Lei nº 12.462/2011, sendo que na Medida Provisória não havia tal limitação. Verifica-se a habilitação dos interessados na contratação e, em seguida, realiza-se o julgamento das propostas. Possibilidade de inversão das fases, julgando as propostas para depois verificar a habilitação. Quando o primeiro convocado não assinar o termo de contrato, a Administração pode convocar os licitantes re- manescentes, para fazê-lo nas mesmas condições propos- tas pelo primeiro classificado. No caso de ser necessário contratar outra empresa para terminar o remanescente de obra, também devem ser mantidas as mesmas condições ofertadas pelo antecedente. Será facultado à Administração Pública, quando o convocado não assinar o termo de contrato, convocar os licitantes remanescentes, na ordem de classificação, para a celebração do contrato nas condições ofertadas pelo licitante vencedor. Se nenhum aceitar a contratação nesses termos, a Admi- nistração poderá convocar os licitantes remanescentes, na ordem de clas- sificação, para a celebração do contrato nas condições ofertadas por estes. No caso de necessidade de contratar o remanescente de obra, em conse- quência de rescisão do contrato anterior, não será obrigatória a manuten- ção dos preços anteriores, podendo a obra continuar com novos preços, ofertados pelo licitante subsequente. Quadro 1 Artigos 48 Revista do TCU 122 b) Licitação baseada em anteprojeto O projeto básico é uma fase perfeitamente definida de um conjunto mais abrangente de estudos e projetos, precedido por estudos pre- liminares, anteprojeto, estudos de viabilidade técnica, econômica e avaliação de impacto am- biental e sucedido pela fase de projeto executivo ou detalhamento. A existência de projeto bási- co, em conformidade com os parâmetros legais, favorece a isonomia e diminui os riscos para as partes na contratação de obras públicas. A etapa definida pelo anteprojeto destina-se à concepção e à representação provisória de detalhamentos da obra e de seus elementos, instalações e componentes, suficientes à ela- boração de estimativas aproximadas de custos e de prazos dos serviços. Uma licitação basea- da no anteprojeto associa-se à imprecisão e à falta de parâmetros técnicos para a presciên- cia dos custos finais de cada empreendimento, fatores agravantes das tensões já existentes nos certames públicos. Conforme o RDC, o contratado para a exe- cução da obra poderá, ele próprio, elaborar o projeto básico. Nesse ponto, pode ser observada nítida se- melhança com o modelo de concessão de ser- viços públicos, no qual se admite deixar para o contratado o encargo da elaboração do pro- jeto básico. A expectativa em uma concessão é a de conseguir projetos otimizados e obras eficientes, na medida da conveniência do con- cessionário, já que ele assume a obrigação de manter por longo tempo tais suportes físicos para a realização dos serviços. Todavia, na prática, o modelo brasileiro de contratação de concessões de serviços públicos impõe, em primeiro momento, dúvidas quanto à definição de um teto para as tarifas, por falta- rem elementos de convicção acerca dos custos dos investimentos, e, posteriormente, incer- tezas no controle do desempenho contratual. No caso do RDC, cabe ressaltar, haverá ris- co significativamente maior de existirem maus projetos e obras ruins, pois esse regime não impõe a permanência do vencedor do certa- me na operação dos serviços, como ocorre nas concessões em geral. No RDC, o controle do projeto pelo contra- tado, assim como no caso das concessões, di- ficulta a avaliação do poder público quanto à qualidade do objeto construído e da sua van- tagem relativa. Tal regime demonstra a preocupação com as “especificações excessivas, irrelevantes ou desnecessárias”, contudo, tal apreensão não deve ser traduzida, nos casos concretos, em indefinições dos editais quanto ao essencial, em muitos casos relacionados aos materiais de acabamento das obras. A solução para coibir projetos falhos e obras malfeitas novamente passa pela definição pré- via, clara e segura, de um rol de itens essen- ciais, sob a ótica do valor, a partir do que se diminuiria o aspecto contingencial para a al- teração do objeto licitado. O projeto será mais adequado ao interesse público se a concepção essencial, considerando a qualidade dos mate- riais e os custos envolvidos, for definida pela própria Administração, que poderá, simples- mente, utilizar-se de um concurso para tal fi- nalidade, nos termos do §1º, do art. 13, da Lei nº 8.666/1993. c) Contratação integrada No que tange à contratação de forma inte- grada, destaca-se o risco de haver restrição à concorrência e o banimento das empresas de menor porte. Por outro lado, há que se reco- nhecer, ela facilita a gestão do empreendimen- to por parte da Administração Pública. Grande atenção deve ser conferida aos editais, para que os administradores neles não tratem de matéria reservada à lei, em sentido estrito. Set/Dez 2011 49 d) Aditivos sem limitação Motivo de grande perplexidade, a Medida Pro- visória trazia a possibilidade da prática ilimita- da de realizar ajustes nos valores dos contratos, para atender às exigências do Comitê Olímpico Internacional (COI). Tal falta de limites não sub- sistiu com a conversão da MP em Lei. Ainda serão possíveis ajustes nos valores dos contratos, para atender às exigências da Admi- nistração, todavia, há o dever de se observar limites, correspondentes a acréscimos de até 50% para o caso das reformas de edifícios ou de equipamentos. Do mesmo modo, vem à tona a necessida- de de bons projetos, que assimilem definições prévias e reduzam as incertezas executivas, de modo a evitar a proliferação de aditivos. e) Convocação do segundo colocado Por derradeiro, destaca-se a prudência ne- cessária quanto à possibilidade de convocação do segundo colocado no certame, para assumir o contrato na desistência do primeiro. Pelo RDC, não há obrigatoriedade de manutenção das mesmas condições da proposta vencedora, abrindo a possibilidade de serem feitos acordos deploráveis na fase de licitação, com eventual abandono da primeira proposta para o favore- cimento da segunda. Por tal motivo, fazem-se necessários crité- rios de aceitação dos custos para as propostas subsequentes, com o estabelecimento de per- centuais máximos de acréscimo em relação à proposta primeira colocada. CONCLUSÃO O RDC trouxe à tona o debate acerca dos possíveis avanços nas contratações públicas. Manifestamente, a Lei 8.666/1993 necessita de aperfeiçoamentos em face do princípio da eficiência e demais preceitos fundamentais do artigo 37 da Carta Magna. Cabe, contudo, ponderar que o regime diferenciado de con- tratações acentua riscos intrínsecos à atual estrutura administrativa e a sua implantação representa um grande desafio para o país. Das respostas advindas do controle interno, externo e social em relação aos problemas práticos que, certamente, serão enfrentados poderá emergir a experiência necessária para aprimorar os procedimentos de contra- tação e incrementar ferramentas de controle sistemáticas e eficientes. RefeRênCias BRASIL. Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993. Regulamenta o art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal, institui normas para licitações e contratos da Administração Pública e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 22 jun. 1993. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8666cons. htm>. Acesso em: 21 nov. 2011. ______. Lei nº 12.462, de 4 de agosto de 2011. Institui o Regime Diferenciado de Contratações Públicas – RDC... Diário Oficial da União, Brasília, DF, 5 ago. 2011. Edição extra e retificada em 10 ago. 2011. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/CCIVIL_03/_Ato2011- 2014/2011/Lei/L12462.htm>. Acesso em 21 nov. 2011. Instituto de Fiscalização e Controle - Regime Diferenciado de Contratações - Parecer // Artigos Artigos 50 Revista do TCU 122 A atuação da Secretaria do Tesouro Nacional (STN) e da Secretaria de Orçamento Federal (SOF) na formulação e na execução da política fiscal Carlos Frederico Alverga é servidor do Tesouro Nacional do Ministério da Fazenda, graduado em Economia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e Mestre em Ciência Política pela Universidade de Brasília (UnB). 1. InTRodUção A atividade financeira do Estado (AFE) é crucial para a determinação da magnitude das principais variáveis macroeconômicas, tais como a renda, o emprego, a demanda, a massa salarial, as taxas de juros, o investi- mento, entre outras. A AFE é estudada tanto sob o aspecto jurídico quanto sob o aspecto econômico: no primeiro caso há a abordagem do Direito Financeiro e, no segundo, das Fi- nanças Públicas. O presente artigo se valerá das duas abordagens para tentar explicitar de que forma duas importantes instituições do Governo Federal brasileiro, a STN e a SOF, atuam na execução da política fiscal, que seria a política por meio da qual o Estado nacional desempenharia a atividade financeira. 2. defInIção de PolíTICa fIsCal A política fiscal é o componente da políti- ca econômica que se refere, por um lado, às receitas públicas, ou seja, à arrecadação dos tributos do Estado sobre a renda, o patrimônio set/dez 2011 53 tam do Decreto de programação orçamentária e financeira, previsto no art. 8º da LRF, também conhecido como Decreto de contingenciamen- to do orçamento. O mesmo normativo determi- na quais os limites financeiros de pagamento, instituídos pela STN, que os órgãos e entidades da administração pública direta e indireta do Poder Executivo da União terão que observar, o que engloba os dispêndios pertinentes ao exer- cício que estiver em curso e, também, os gastos com restos a pagar. É relevante frisar que o re- ferido Decreto contingencia dotações situadas no orçamento fiscal e da seguridade social no âmbito federal. 4. ConsIdeRações sobRe o PaPel da sTn e da sof na exeCUção da PolíTICa fIsCal: As receitas dos tributos arrecadados pela União são recolhidas à conta única do Te- souro Nacional, órgão que tem participação estratégica na execução da política fiscal do Governo Federal, pois é o órgão que deter- mina a programação financeira da execução do orçamento geral da União, em obediência ao artigo 8º da Lei de Responsabilidade Fis- cal (LRF), que preconiza que o Poder Execu- tivo estabelecerá a programação financeira e o cronograma de execução mensal de de- sembolso, o que é feito mediante a edição do Decreto de Programação Orçamentária e Financeira, o qual enuncia os limites de em- penho e pagamento, ou seja, os parâmetros que presidirão a execução orçamentária e financeira do Governo Federal, a serem obe- decidos pela administração direta e indireta do Poder Executivo da União no exercício fi- nanceiro. A STN é, pela Lei nº 10.180/2.001, o órgão central do sistema federal de admi- nistração financeira, pelo qual ela desempe- nha a função de “ditar” o ritmo da execução financeira do orçamento, com a finalidade de propiciar o alcance da meta de resultado pri- mário estipulada pelo Governo Federal para o exercício, a qual consta do AMF/LDO, e é o mais relevante parâmetro para a execução da política fiscal. É importante assinalar que o referido Decreto abrange apenas o Poder Executivo Federal. Já a participação da SOF no processo de formulação/execução da política fiscal se dá, principalmente, pelo lado da política orça- mentária, que é o fundamento da execução da despesa pública. A SOF elabora a proposta orçamentária da União, enviada pelo Presi- dente da República ao Congresso Nacional até 31/8 de cada exercício. Além disso, conforme já comentado, a SOF atua na instituição dos limites de empenho. Outra função de suma importância desempenhada pela SOF é a da previsão da arrecadação das receitas públicas, obedecendo ao artigo 12 da LRF, o qual tem o seguinte conteúdo: Art. 12. As previsões de receita ob- servarão as normas técnicas e legais, considerarão os efeitos das alterações na legislação, da variação do índice de preços, do crescimento econômico ou de qualquer outro fator relevante e serão acompanhadas de demonstrativo de sua evolução nos últimos três anos, da pro- jeção para os dois seguintes àquele a que se referirem, e da metodologia de cálculo e premissas utilizadas. A LRF também dispõe no sentido de que a receita deve ser desdobrada em previsões bimestrais de arrecadação. Após fazer isso, o Poder Executivo Federal, por intermédio da STN e da SOF, acompanha e monitora, ao longo do exercício financeiro, a evolução da arrecadação tributária, de modo a asse- gurar o cumprimento da meta estipulada no AMF/LDO. Caso a arrecadação apresente um A atuação da Secretaria do Tesouro Nacional (STN) e da Secretaria de Orçamento Federal (SOF) na formulação e na execução da política fiscal // Artigos Artigos 54 Revista do TCU 122 comportamento deficitário relativamente ao previsto, certamente haverá limitação de em- penho, para garantir o alcance da meta fiscal. A mencionada lei, na redação original, pre- via que o poder Executivo poderia intervir na execução orçamentária dos demais Poderes e do Ministério Público, caso estes não realizas- sem a limitação de empenho nos montantes devidos. Entretanto, uma ação direta de in- constitucionalidade questionou a constitucio- nalidade desse dispositivo e o STF suspendeu liminarmente a eficácia do citado dispositivo em sede de medida cautelar de ADIN. Caso contrário, ou seja, se a arrecadação tributária do Governo Federal for superior à previsão, ou seja, caso haja excesso de arrecadação, haverá a possibilidade de ocorrer a situação oposta à limitação de empenho, ou seja, poderá ocorrer a abertura de créditos adicionais, tendo em vista que o excesso de arrecadação é uma das fontes de créditos adicionais suplementares e especiais, de acordo com dispositivo contido na Lei nº 4.320/64, artigo 43, § 1º, II. 5. ConsIdeRações fInaIs: Pode-se depreender da argumentação ex- posta, que a STN e a SOF desempenham papéis fundamentais na elaboração e na exe- cução da política fiscal, a qual abrange tanto a receita pública quanto a despesa pública. As participações das mencionadas instituições no processo de operacionalização da política fis- cal brasileira se dá tanto pelo lado da receita quanto pelo lado da despesa. A SOF atua na previsão da receita orçamentária e na fixação da despesa, na fase de elaboração da propos- ta da Lei orçamentária anual; já a STN de- sempenha funções com mais intensidade no processo da execução orçamentária e finan- ceira, do qual a SOF também participa, embo- ra exerça os principais papéis na elaboração da lei de meios. Na execução orçamentária e set/dez 2011 55 financeira, ambas as organizações atuam, em conjunto, mormente na edição do Decreto de Programação Orçamentária e Financeira, no contingenciamento do orçamento, por meio do estabelecimento dos limites de empenho e pagamento, no monitoramento da arrecada- ção da receita tributária da União e nas outras atividades pertinentes ao alcance da meta de resultado fiscal constante do Anexo de Metas Fiscais da Lei de diretrizes orçamentárias. RefeRências BRASIL. Lei nº 4.320, de 17 de março de 1964. Estatui normas gerais de Direito Financeiro para elaboração e controle dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L4320.htm. Acesso em: 16 nov. 2011. ______. Lei nº 10.180, de 6 de fevereiro de 2001. Organiza e disciplina os Sistemas de Planejamento e de Orçamento Federal, de Administração Financeira Federal, de Contabilidade Federal e de Controle Interno do Poder Executivo Federal, e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/LEIS_2001/L10180. htm. Acesso em: 16 nov. 2011. ______. Lei complementar nº 101, de 4 de maio de 2000. Estabelece normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/ Leis/LCP/Lcp101.htm. Acesso em: 16 nov. 2011. ______. Decreto nº 7.063, de 13 de janeiro de 2010. Dispõe sobre a estrutura regimental do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2010/ Decreto/D7063.htm. Acesso em: 16 nov. 2011. ______. Decreto nº 7.386, de 8 de dezembro de 2010. Dispõe sobre a estrutura regimental do Ministério da Fazenda. Revogado pelo Decreto nº 7.482, de 2011. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ Ato2007-2010/2010/Decreto/D7386.htm. Acesso em: 16 nov. 2011. A atuação da Secretaria do Tesouro Nacional (STN) e da Secretaria de Orçamento Federal (SOF) na formulação e na execução da política fiscal // Artigos Artigos 58 Revista do TCU 122 ções fáticas, principalmente nos casos em que se faz necessário temperar a aplicação do Prin- cípio da Legalidade em prol do atendimento pragmático de alguma necessidade real. Pou- co se recorre ao Princípio de Eficiência com a finalidade de utilizá-lo na perspectiva de uma diretriz de atuação intrinsecamente orientada para a finalidade que seu conteúdo expressa: a ação administrativa eficiente do Estado. Não é sem motivo que doutrinador do por- te de Celso Antônio Bandeira de Melo5, ao referir-se ao Princípio da Eficiência, assim se pronunciou: Quanto ao princípio da eficiência, não há nada a dizer sobre ele. Trata-se, eviden- temente, de algo mais do que desejável. Contudo, é juridicamente tão fluido e de tão difícil controle ao lume do Direito, que mais parece um simples adorno agregado ao art. 37 ou o extravasamento de uma as- piração dos que burilam no texto. De toda sorte, o fato é que tal princípio não pode ser concebido (entre nós nunca é demais fazer ressalvas obvias) senão na intimida- de do princípio da legalidade, pois jamais uma suposta busca de eficiência justificaria postergação daquele que é o dever adminis- trativo por excelência. Finalmente, anote- -se que este princípio da eficiência é uma faceta de um princípio mais amplo já supe- riormente tratado, de há muito, no Direito italiano: o princípio da boa administração. Todavia, com a devida vênia do mestre, a eficiência, enquanto princípio ou finalidade, possui alcance bem maior, pois em sua (não) aplicação concreta reside a diferença entre, de um lado, uma ação estatal errática, confusa, perdulária e inefetiva, e, de outro, uma ação planejada, consciente, sóbria, respeitosa e fo- cada na efetiva produção de resultados úteis à sociedade. suficientemente debatidas. Não refletimos de forma adequada, por exemplo, sobre as exigên- cias práticas e consequências legais que o Prin- cípio de Eficiência trouxe para a gestão pública. Ao analisarmos o arcabouço legal que regula a atividade estatal – estrutura, funcionamento e limites – veremos que é possível identificar, com relativa facilidade, normas infraconstitu- cionais axiologicamente vinculadas aos princí- pios tradicionais do artigo 37 da Constituição4 (legalidade, impessoalidade e publicidade). Exemplos sobram: a legalidade é da própria essência da atuação estatal, prescindindo de demonstração; a impessoalidade e a publici- dade revelam-se, por exemplo, na exigência de licitação nas compras públicas e de concurso público para acesso aos cargos. Mas onde se corporifica o Princípio de Efici- ência? Onde encontramos disposições capazes de concretizar esta diretriz constitucional? O fato é que o Princípio da Eficiência tem sido utilizado, quase que unicamente, como recurso hermenêutico para a análise de situa- set/dez 2011 59 Se, por um lado, não há controvérsia em ad- mitirmos que o mau uso dos recursos públicos, por quem quer que seja, pode e deve implicar a devida responsabilização, por desatendimento a princípios tais como a economicidade, legali- dade e probidade, parece que ainda não conse- guimos – nós, os agentes públicos – vislumbrar a mesma necessidade de enfrentar, no mínimo pela via da exigência gerencial, as práticas ad- ministrativas ineficientes que frustram os mais fundamentais objetivos estatais. A insistência de determinados setores da Administração Pública em empreender estra- tégias de atuação de efetividade duvidosa ou já comprovadamente - pela lógica e pela expe- riência - ineficientes e ineficazes, fere as mais comezinhas noções de respeito à coisa pública, arrastando recursos, esforços e tempo em dire- ção a um sumidouro implacável e incondizente com o esforço de financiamento que a socieda- de empreende em prol do Estado. 2. A efiCiênCiA AfeRidA pelA pRopoRCionAlidAde. O Princípio de Eficiência não é, ao contrá- rio do que se diz, um conceito etéreo, de difícil aplicação, pois há parâmetros disponíveis para que façamos, no mínimo, uma análise lógica, uma checagem prática e um exame crítico dos fatos, com o fim de verificar se determinada atuação, projeto ou estratégia administrativa é ou não eficiente. Neste mister, auxilia-nos bastante, por exemplo, a aplicação do Princípio da Propor- cionalidade na análise de determinada estra- tégia de ação estatal, pois embora o referido princípio seja mais comumente aplicado como critério de ponderação nos conflitos entre di- reitos fundamentais, a lógica interna também pode ser utilizada na análise de alternativas de atuação administrativa. O professor J Juarez Freitas6 leciona que “o princípio da proporcio- nalidade quer significar que o Estado não deve agir com demasia, tampouco de modo insufi- ciente na consecução dos seus objetivos”. Este comedimento, prescrito pelo Princípio da Proporcionalidade e que possui estreita cor- relação axiológica com a diretriz da eficiência, impõe, segundo teoria constitucionalista ale- mã, que determinada medida ou ação estatal seja testada, basicamente, segundo dois parâ- metros fundamentais, que podem ser conside- rados como subprincípios, quais sejam: o da necessidade (Erforderlichkeit) e o da adequa- ção (Geeignetheit). O subprincípio da necessidade, moldado à administração pública, impõe ao administra- dor que adote as medidas tendentes a produzir o resultado necessário por meio do uso racio- nal dos recursos, ou seja, impondo o menor ônus possível à sociedade. No dizer da Canoti- lho8, “exigir-se-ia sempre a prova de que, para a obtenção de determinados fins, não era pos- sível adotar outro meio menos oneroso para o cidadão”, ou para o erário, complementamos. Não está em sintonia com o critério da neces- sidade o administrador que, podendo alcan- çar um determinado resultado, lançando mão de, por exemplo, 100 unidades de insumos, resolve aplicar 1000 unidades para chegar ao mesmo objetivo. Parece claro, portanto, que a aplicação do subprincípio da necessidade age em prol do alcance da eficiência, pois se é possível atin- gir determinado resultado, requerido da ação estatal por meio da alocação de recursos de forma mais racional (menos gravosa a quem paga). Assim, não há sentido em se aplicar insumos excessivos e, de modo mais oneroso, realizar o mesmo, ou, o que é pior, realizar menos. O cidadão almeja da ação estatal fun- damentalmente duas coisas: o bem ou serviço adequadamente prestado, e a melhor aplica- ção dos meios públicos para o atingimento desse objetivo. Princípio de Eficiência: parâmetro para uma nova gestão // Artigos Artigos 60 Revista do TCU 122 O segundo subprincípio a considerar é o da adequação, que se expressa de forma simples, completa e objetiva na seguinte assertiva de Humberto Ávila10: “o meio é adequado se pro- move o fim”. Portanto, se a finalidade de ação estatal é o atingimento de um determinado objetivo pos- to, em regra, na lei, não pode o administrador adotar estratégia de ação inapta ao cumprimen- to da demanda, nem empreender experiên- cias executórias sem as cautelas necessárias e prognóstico bastante razoável de êxito, ou seja, de atingimento do fim colimado. Exemplo de desatendimento ao critério da adequação é o caso do administrador que, por despreparo ou intenção, insiste em adotar o método X para a execução de determinada ação, quando todas as evidências estão a demonstrar que a execu- ção pelo método Y traria um melhor resultado. A adoção de métodos de atuação sabidamen- te ineficazes, de antecedentes desastrosos ou O doutrinador José Afonso da Silva9, ao tra- tar sobre o Princípio da Eficiência, enfatiza o valor da racionalidade administrativa, nos se- guintes termos: Numa ideia muito geral, eficiência sig- nifica fazer acontecer com racionalidade, o que implica medir os custos que a satis- fação das necessidades públicas importam em relação ao grau de utilidade alcançado. Assim, o princípio da eficiência introdu- zido agora no art. 37 da Constituição pela EC-19/98, orienta a atividade administra- tiva no sentido de conseguir os melhores resultados com os meios escassos de que se dispõe e a menor custo. Rege-se, pois, pela regra da consecução do maior benefí- cio com o menor custo possível. Portanto, o princípio da eficiência administrati- va tem como conteúdo a relação meios e resultados. set/dez 2011 63 de produzir o melhor possível com os insumos postos à disposição. Maria Sylvia Zanella Di Pietro12 estabelece a seguinte relação entre o Princípio da Eficiência e as condutas dos agen- tes públicos e administradores: O princípio da eficiência (...) pode ser considerado em relação ao modo de atu- ação do agente público, do qual se espera o melhor desempenho possível de suas atribuições, para lograr os melhores resul- tados; e em relação ao modo de organizar, estruturar, disciplinar a administração pú- blica, também com o mesmo objetivo de alcançar os melhores resultados na pres- tação do serviço público. Por fim, não é demais lembrar que a inefi- ciência, em alguns casos, pode ser tão nefasta quanto à improbidade, pois, como assevera Posner13, “en un mundo de recursos escasos, el desperdício debe considerar-se inmoral”. Princípio de Eficiência: parâmetro para uma nova gestão // Artigos RefeRências 1 CHIAVENATO, Idalberto. Introdução à teoria geral da administração: uma visão abrangente da moderna administração das organizações. 7. ed. Rio de Janeiro: Campus, 2004. p. 155. 2 VASCONCELLOS, Marco Antônio Sandoval de. Economia: micro e macro. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2002. p. 119. 3 HALL, Robert E.; LIEBERMAN, Marc. Microeconomia: princípios e aplicações. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2003. p. 191-192. 4 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituiçao.htm>. Acesso em: 18 nov. 2010. 5 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 12. ed. São Paulo: Malheiros, 1999. p. 92. 6 FREITAS, Juarez. O controle dos atos administrativos e os princípios fundamentais. São Paulo: Malheiros, 1997. p. 56. 7 CANOTILHO, J.J. GOMES. Direito constitucional. 6. ed. Coimbra: Almedina, 1993. p. 617-618. 8 ______. Direito constitucional e teoria da constituição, 3. ed. Coimbra: Almedina, 1999. p. 264. 9 SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 23 ed. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 652. 10 ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 4. ed. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 97. 11 BOBBIO, Norberto. Teoría general del derecho. Bogotá: Editorial Temis, 1999. p. 239. 12 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 18 ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 84. 13 POSNER, Richard A. El análisis económico del derecho. México, DF: Fondo de Cultura Económica, 1997. p.32. Artigos 64 Revista do TCU 122 O TCU e a cooperação internacional Luciano dos Santos Danni é graduado em Engenharia Mecânica e mestre em Economia pela Universidade de Brasília (UnB). Macleuler Costa Lima é graduado e mestre em Relações Internacionais pela Universidade de Brasília (UnB). Sylvia Regina Caldas Ferreira Pinto é graduada em Relações Internacionais pela Universidade de Brasília (UnB) e em Psicologia pelo Centro de Ensino Unificado de Brasília (Ceub) e pós-graduada em Gestão de Pessoas pela FIA/USP. 1. CoopeRação inTeRnaCional1 1.1 Breve síntese teórica A cooperação internacional, seja entre Es- tados, seja entre organizações – e aí se situam as Instituições Superiores de Controle (ISC)2 – ocorre como resultado da necessidade de se responder a desafios e a demandas com o má- ximo de celeridade e eficiência. Diante dessa premência, diversas ações são levadas adiante pelos titulares das ISC com o objetivo maior de tornar constante o intercâmbio técnico, cientí- fico e cultural entre esses entes, como um dos caminhos de aprimoramento institucional. Tais atividades ocorrem com base nos princípios e metas das partes e na prática do dia a dia, ten- do como pano de fundo os debates teóricos a respeito da cooperação. A literatura de Relações Internacionais, des- de os enfoques mais realistas, passando por uma visão mais liberal do mundo, até a ado- ção de novas perspectivas reflexivistas, tem discutido, com maior ou menor nível de deta- lhamento, o tema da cooperação. Num ambien-* Os autores são servidores do Tribunal de Contas da União Set/Dez 2011 65 retranca imagem ctrl + Shift + click para liberar retranca O TCU e a cooperação internacional // Artigos te predominantemente anárquico, diriam os realistas clássicos grosso modo que os atores relevantes no processo, i.e. os Estados, atuam de maneira racional, egoísta, de modo a ma- ximizar os ganhos e reduzir eventuais perdas. Evidentemente, nesse ambiente competitivo pode ocorrer cooperação, embora a motiva- ção esteja normalmente correlacionada à forte noção de interesse nacional, do aumento dos ganhos relativos, do incremento do poder real ou aparente e da ideia de que os laços entre esses entes são tênues e instáveis. Disso de- corre a potencial existência de desconfianças mútuas capazes de dificultar todo o processo de cooperação. Não obstante, a existência e a influência des- se enfoque mais realista, as bases do sistema in- ternacional contemporâneo, especialmente no que diz respeito à cooperação, passam necessa- riamente pelos desdobramentos das reflexões da escola liberal das Relações Internacionais. Neste sentido, as organizações internacionais possuem papel de destaque no fortalecimento do intercâmbio entre os atores envolvidos, de modo que, mesmo considerando-se uma visão mais pessimista acerca das intenções e interes- ses dos agentes, é possível identificar condições em que esses atores consideram a cooperação não somente algo possível de acontecer, mas também que lhes trará benefícios. Tais organi- zações não se situam acima dos Estados, mas atuam por delegação destes com vistas a de- senvolver determinadas agendas de interesses convergentes, de modo a estabelecer regimes internacionais consistentes e que potenciali- zem o spillover effect da cooperação entre di- versos atores. De outra parte, a discussão teórica atual, particularmente na abordagem construtivis- ta (que é reflexivista) mais recente, baseia-se na premissa básica de que o mundo é uma construção social em permanente evolução. Nesse contexto, alguns teóricos vão analisar a fundo os arranjos institucionais existentes nas organizações internacionais para definir, com base na experiência passada ou na expec- tativa da eficiência futura, como a cooperação pode se desenvolver nesse cenário de incer- tezas. O fato é que , assim como na escola li- beral, as percepções corretas ou equivocadas Artigos 68 Revista do TCU 122 capacitação, especialização, assessoria e as- sistência técnica, informação e coordenação – tudo isso com o objetivo de fomentar o de- senvolvimento e o aperfeiçoamento das ISC membros. Atualmente, a Olacefs conta com 22 membros plenos. O Tribunal de Contas da União é membro da Olacefs desde a fundação. Atualmente, o Tribu- nal compõe do Conselho Diretivo da Organiza- ção e atua no Comitê de Capacitação Regional, na Comissão Técnica Especial de Meio Ambien- te (Comtema), na Comissão Técnica Especial de Ética Pública, Probidade Administrativa e Transparência, e na Comissão de Avaliação de Desempenho e Indicadores de Rendimento. De destacar que, na Comtema, o TCU – que presidiu a Comissão por cerca de 10 anos – coordena os trabalhos de auditoria conjunta sobre mudanças climáticas que estão sendo desenvolvidos por ISC(s) da região. Os resul- tados desse trabalho devem ser apresentados na próxima Assembleia Geral da Olacefs, em outubro de 2011. Outro ponto de relevo é a participação do Tribunal no Comitê de Capacitação Regional (CCR), grupo em que, entre outros assuntos, tem-se discutido o aperfeiçoamento da coope- ração Olacefs / Agência de Cooperação Alemã (GIZ). Na última reunião, realizada em Lima, Peru, nos dias 31 de março e 1º de abril de 2011, o CCR aprovou o plano operacional de capacitação regional para os dois próximos anos, em que foram exploradas sinergias entre as Entidades Fiscalizadoras Superiores à luz do Projeto OLACEFS-GIZ para a construção de novos cenários para o comitê dentro do Plane- jamento Estratégico da Entidade. 2.1.3. Organização das Entidades Fiscalizadoras Superiores do Mercosul e Associados (EFSUL) A EFSUL tem como missão “fomentar a me- lhoria das instituições membros e contribuir para a gestão regular e efetiva dos recursos co- munitários do Mercosul mediante ações de coo- peração”, e como visão “constituir-se em órgão capaz de exercer o controle externo do Merco- sul” (Plano Estratégico 2009-2011). A EFSUL reúne as ISC da Argentina, do Bra- sil, do Paraguai e do Uruguai, além da Vene- zuela, país em vias de adesão ao Mercosul, e da Bolívia e do Chile, membros associados do bloco. Desde a criação em 1999, a EFSUL tem atuado em ações de intercâmbio técnico en- tre as instituições membros e com outras en- tidades, como o Tribunal de Contas Europeu (TCE), órgão responsável pelo controle exter- no do orçamento da União Europeia há mais de trinta anos. Em novembro de 2008, a Organização apro- vou um Plano de Ação para o período de 2009 a 2011 que estabeleceu como objetivo, entre outros, a harmonização de métodos e proce- dimentos de controle para a realização de au- ditorias coordenadas, identificando o Fundo para a Convergência Estrutural do Mercosul (Focem) como objeto prioritário para a atua- ção fiscalizadora. A primeira auditoria no Fo- cem ocorreu em 2010 e já está em andamento a fiscalização de 2011. Atualmente, a Secretaria Executiva da EFSUL está sediada no Tribunal de Contas da União. 2.1.4. Organização das Instituições Superiores de Controle da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (OISC/CPLP) A OISC/CPLP congrega os Tribunais de Contas de Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné- -Bissau, Moçambique, São Tomé e Príncipe e Portugal. O TCU é membro fundador da Or- ganização, cujas atividades tiveram início em 1995, antes mesmo da criação da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, em 1996. Até hoje, foram realizados cinco Encontros e seis Assembleias Gerais da Organização, ocasiões Set/Dez 2011 69 em que são debatidos temas técnicos de inte- resse das ISC(s) e discutidos assuntos relacio- nados à cooperação. O Estatuto foi aprovado em 2001, durante a realização da I Assembleia Geral, nos Açores. Ressalte-se que, anualmente, a OISC/CPLP aprova a designação de dois Tribunais membros para comporem a equipe de auditoria às con- tas do Secretariado Executivo da Comunidade, com sede em Lisboa. Os relatórios advindos da fiscalização são posteriormente submetidos à aprovação do Conselho de Ministros de Estados das Relações Exteriores da CPLP. Desde 1995, o Tribunal de Contas da União tem sido eleito pelos membros da OISC/CPLP para sediar a Secretaria-Geral da Organização, enquanto o TC de Portugal vem sendo escolhi- do para sede do Centro de Estudos e Formação. Com o objetivo de apoiar a capacitação dos Tribunais lusófonos, o TCU criou, em 1996, o Programa de Treinamento e Aperfeiçoamento de Técnicos dos Tribunais de Contas da CPLP, que sucedeu o Termo de Referência do Progra- ma de Integração do TCU no Projeto PALOPs (Países Africanos de Língua Oficial Portugue- sa), de 1994. Em decorrência desse Programa, o TCU já realizou diversos cursos e estágios em áreas relacionadas ao controle externo e à modernização institucional, que teve a par- ticipação de dezenas de técnicos de Tribunais membros da Organizção. Além disso, o Tribunal, sob a coordenação da Secretaria-Geral da OISC/CPLP, tem apoia- do a elaboração, execução e avaliação dos Pla- nos Estratégicos da Organização. 2.2. Programas internacionais de treinamento e caPacitação dos quais o tcu ParticiPa: 2.2.1. Programa Internacional para Auditores oferecido pelo Government Accountability Office – GAO (Estados Unidos) O Government Accountability Office (GAO), Entidade Fiscalizadora dos Estados Unidos, oferece anualmente a Entidades Fisca- lizadoras de outros países o Programa Interna- cional para Auditores. O programa compreende dezesseis semanas de treinamento em sala de O TCU e a cooperação internacional // Artigos Artigos 70 Revista do TCU 122 aula e participação em atividades práticas com foco em métodos e técnicas para a condução de auditorias de natureza operacional e o de- senvolvimento de uma estratégia para a intro- dução de novas políticas ou procedimentos na ISC do participante na área que tenha sido identificada pela própria Entidade como pas- sível de ser aperfeiçoada (projeto estratégico). Anteriormente, o Programa contava também com quatro a oito semanas de estágio opcional em uma das representações regionais do GAO . Os auditores do Tribunal que participam do Programa Internacional são escolhidos por meio de processo de seleção realizado pelo Ins- tituto Serzedello Corrêa. O TCU participou das edições de 1993, 1995, 1996, 1999, 2002, 2004, 2006 e 2010, e enviou representante para o programa de 2011. 2.2.2. Programa de Treinamento oferecido pelo National Audit Office (NAO) (Reino Unido) Desde 1993, o National Audit Office (NAO), Entidade Fiscalizadora Superior do Reino Unido, realiza em sua sede, em Londres, o Treinamento Internacional em Auditoria. O Treinamento é oferecido anualmente a Entida- des Fiscalizadoras de todo o mundo. O programa apresenta as metodologias do NAO para auditoria financeira e auditoria operacional, que são transmitidas aos parti- cipantes por meio de aulas expositivas e es- tudos de casos. Assim como no caso do programa do GAO, os representantes do TCU no Programa foram escolhidos por meio de processo de seleção realizado pelo Instituto Serzedello Corrêa, e participaram das ações implementadas nos seguintes períodos: 1994 a 1998, 2000 e 2003 a 2006. 2.2.3. Programa de Treinamento em auditoria da Fundação Canadense para Auditoria Integrada A Fundação Canadense para Auditoria In- tegrada (Canadian Comprehensive Audit Foundation - CCAF) é uma instituição que atua em educação e pesquisa, desenvolvendo práticas nas áreas de governabilidade, gestão, auditoria e controle. Representantes do TCU, escolhidos por meio de processo de seleção interna, participaram do Programa Internacional de Treinamento em Au- ditoria oferecido pela Fundação nas edições de 1984/1985, 1985/1986, 2000/2001, 2001/2002 e 2003/2004. O treinamento era realizado em Ottawa e tinha a duração de nove meses. O Pro- grama consistiu em treinamento prático (está- gios) aliado a aulas expositivas e conferências, e permitiu a transmissão aos países participantes de conhecimentos dirigidos ao desenvolvimento da auditoria no setor público, especialmente por meio da aplicação do que a Fundação conven- cionou chamar de comprehensive auditing (au- ditoria integrada ou auditoria abrangente). Essa expressão foi escolhida para conotar o controle que inclui tanto os controles gerenciais quanto os financeiros. Set/Dez 2011 73 2.2.7. Projeto de Aperfeiçoamento do Controle Externo com foco na Redução das Desigualdades Sociais (CERDS) (Cooperação TCU - Reino Unido) No tema cooperação internacional, é impor- tante dar relevo à capacitação que o TCU ofere- ceu aos auditores em decorrência da execução de projeto de cooperação técnica entre o TCU e o Reino Unido. A primeira fase do Projeto (1998 a 2001) foi denominada Projeto de Desenvolvimento de Técnicas de Auditoria de Desempenho e cen- trou-se em educação, saúde e meio ambiente, sendo que no último ano – 2001 – acrescen- taram-se as áreas de agricultura e assistência social. Setenta auditores foram treinados em técnicas e metodologias de auditoria de de- sempenho e realizaram vinte e quatro audi- torias nas referidas áreas, havendo também trabalhado no monitoramento da implemen- tação das recomendações do Tribunal decor- rentes das auditorias. Do grupo de setenta auditores treinados, nove realizaram viagens de estudos ao Reino Unido, durante as quais fi- zeram contato com instituições britânicas que executam auditorias de desempenho. Outros produtos dos primeiros anos do Projeto foram a elaboração de normas e guias técnicos, a for- mação de instrutores para disseminar para o corpo técnico os conhecimentos adquiridos e a elaboração de material de treinamento para essa disseminação. A segunda fase teve início em 2002 e foi en- cerrada em 2006. Denominou-se Projeto de Aperfeiçoamento do Controle Externo com foco na Redução das Desigualdades Sociais – CERDS. Pretendeu-se que programas gover- namentais e modelos regulatórios de serviços públicos fossem avaliados com foco na diminui- ção das desigualdades no Brasil e contribuíssem para uma maior transparência na prestação de contas do gasto público (accountability) e para o fortalecimento do controle social. Nos dois primeiros anos da segunda fase – 2002 e 2003 –, outros trinta auditores foram treinados e, juntamente com auditores mais experientes no Projeto, realizaram quatorze auditorias visando a questão da equidade. Enquanto na primeira etapa do Projeto, os auditores foram treinados por consultores da firma KPMG, contratada pelo Department for International Development (DFID - o minis- tério britânico para o desenvolvimento inter- nacional), na segunda etapa, instrutores do TCU formados no próprio Projeto ministra- ram os treinamentos. 2.2.8. Diálogos Setoriais Brasil - União Europeia O Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão está desenvolvendo o projeto Diálogos Setoriais Brasil – União Europeia, que inclui o intercâmbio com instituições e órgãos federais brasileiros responsáveis pelo acompanhamento e controle de políticas regionais e os congêne- res da União Europeia. Em vista disso, o Ministério convidou o TCU a enviar quatro técnicos para realizar missão de intercâmbio na Europa. Assim, em 2010, os servidores do TCU designados visitaram a Di- retoria Geral de Políticas Regionais da União Europeia, em Bruxelas, o TC Europeu, em Lu- xemburgo, e o TC de Portugal, em Lisboa, ci- dade em que também se encontraram com representantes de instituições de governo que executam programas e projetos financiados pela Comissão Europeia. Como continuação desse intercâmbio, realizou-se em Brasília, em abril de 2011, o Seminário Procedimentos e Técnicas do Sistema de Controle da Política Regional na União Europeia. O evento contou com a participação de instrutores da Comissão Eu- ropeia, das Autoridades de Auditoria, Cer- tificação e Gestão da União Europeia, e do Tribunal de Contas Europeu. O TCU e a cooperação internacional // Artigos Artigos 74 Revista do TCU 122 As perspectivas para o aprofundamento desse intercâmbio com a União Europeia são muito positivas, o que deve permitir a concre- tização de projetos de cooperação na área de controle externo. 2.3 colaBoração oferecida a outras instituições O Tribunal de Contas da União valoriza grandemente as oportunidades de treinamen- to oferecidas por organizações internacionais e instituições estrangeiras. Quando se trata de área técnica prioritária, auditores do Tri- bunal participam de cursos oferecidos pela Intosai, Olacefs, outras organizações interna- cionais e instituições estrangeiras, conforme se descreveu acima. Por outro lado, o Tribu- nal também oferta conhecimento e experi- ência em prol da formação do corpo técnico de outras instituições. Um excelente exemplo da atuação do TCU como propagador de técnicas e experiências foi o trabalho feito em relação aos conhecimentos na área de auditoria de desempenho adquiridos em decorrência do Projeto de Cooperação com o Reino Unido, o Projeto de Aperfeiçoamen- to do Controle Externo com foco na Redução das Desigualdades Sociais (CERDS). Auditores capacitados nos primeiros anos desse Projeto trabalharam como instrutores, disseminando metodologias e técnicas não apenas entre servi- dores do Tribunal, mas também entre técnicos de Tribunais Estaduais e órgãos de controle in- terno. Tais treinamentos ocorreram no próprio Instituto Serzedello Corrêa e em outros estados brasileiros. Demonstrando o alcance de tais ações de disseminação, tivemos como resul- tado um significativo número de profissionais do TCU e de outras instituições, treinados nas metodologias e técnicas de auditoria de natu- reza operacional desenvolvidas no âmbito do Projeto TCU/Reino Unido. Observe-se também que, desde 1995, as ISC(s) da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) enviam representantes para cursos no Instituto Serzedello Corrêa e estágios na Secretaria de Controle Exter- no do Tribunal, com apoio do Programa de Treinamento e Aperfeiçoamento de Técnicos dos Tribunais de Contas da CPLP, do TCU. Outras contribuições para a CPLP se deram sob a forma de consultorias prestadas por auditores do TCU nos países recebedores da assistência. Ao Tribunal de Cabo Verde foi prestada consultoria na área de Contas do Governo e ao Tribunal Administrativo de Mo- çambique, na área de auditoria e informática. Ademais, é de destacar que a estruturação do Tribunal santomense deu-se com apoio técnico do TCU. Igualmente no âmbito da OLACEFS, o TCU vem tendo esse papel de disseminar conheci- mentos. O Tribunal atuou como subsede na área de capacitação daquela Organização, ofe- recendo cursos de Auditoria de Sistemas In- formatizados e de Auditoria Ambiental. Além disso, o Tribunal, em várias oportunidades, re- cebeu técnicos da OLACEFS para estágios na Secretaria-Geral de Controle Externo. Por último, ressalte-se a contribuição que o TCU ofertou a programas de capaci- tação promovidos no âmbito da INTOSAI e da OLACEFS, mediante a designação de au- ditores para integrar equipes internacionais responsáveis por elaborar cursos e ministrá- -los, como ocorreu nos programas sobre au- ditoria de dívida pública, auditoria ambiental e Tecnologia da Informação acima citados. O TCU designou um auditor como especialista para cada um desses Programas. Eles parti- ciparam de todas as etapas previstas, como o debate e aprofundamento dos temas, capa- citação de instrutores, elaboração de cursos- -piloto e a realização desses cursos, dos quais participaram como instrutores. Set/Dez 2011 75 2.3.1. Treinamentos oferecidos pelo TCU a técnicos estrangeiros Podemos citar vários treinamentos ofereci- dos pelo TCU nos últimos anos. Inicialmente, devem ser citados os Programas de Formação de novos Analistas do TCU, de 1995 e 1996, dos quais participaram técnicos de Tribunais da CPLP. Na área de Meio Ambiente, o Tribunal reali- zou, em 1996, dois cursos de auditoria ambien- tal para técnicos da Olacefs, e, em 2006, o Ciclo de Estudos em Controle da Gestão Ambiental (aulas expositivas, estudos de caso, visitas de estudos a unidades técnicas do TCU e a outros órgãos federais da área), para técnicos da CPLP. Juntamente com a EFS do Canadá, o TCU elaborou treinamento sobre auditoria de biodi- versidade. Esse treinamento foi ministrado em janeiro de 2009 para várias instituições por um instrutor do Canadá e um do Tribunal. Em 2011, o TCU enviou instrutores à Cos- ta Rica para ministrar curso patrocinado pela Fundação Canadense para Auditoria Integrada (CCAF) sobre auditoria ambiental para audi- tores da Olacefs. Na área de Modernização Institucional, o Tribunal recebeu dirigentes e técnicos para visitas de estudos e estágios. Em 2002, a Presi- dente do TC de Cabo Verde e mais dois repre- sentantes daquela instituição realizaram visita de estudos com foco na estrutura e o funcio- namento do TCU, assim como nas contas do governo. Em 2004, representante do Ministério Público de São Tomé e Príncipe, também reali- zou visita de estudos, com ênfase na observa- ção do funcionamento da Procuradoria-Geral junto ao TCU. Ainda em 2004, houve um estágio de dois técnicos da Controladoria Geral do Peru com foco no processo de modernização do TCU, in- cluindo a apresentação de projetos institucio- nais, do processo de planejamento estratégico e dos avanços em auditoria de desempenho e de obras públicas. No ano seguinte, foi reali- zada visita de cinco técnicos da Controladoria Geral do Chile durante a qual conheceram o Projeto de Modernização do TCU, as ativida- des de planejamento estratégico, os programas de treinamento e capacitação do TCU e os úl- timos avanços em auditoria de desempenho e obras públicas. Em 2007, duas técnicas do TC de Cabo Ver- de visitaram do TCU para conhecer o funcio- namento da Segedam e da Segecex e, com as informações colhidas, contribuíram para o pro- cesso de reorganização interna daquele Tri- bunal. Em 2009, três visitas de estudos foram realizadas. Uma de autoridades do TC de Cabo Verde à Secex Ceará e duas de autoridades e técnicos do Tribunal Administrativo e do Mi- nistério Público de Moçambique à sede do TCU. O TCU e a cooperação internacional // Artigos Artigos 78 Revista do TCU 122 Accountability no Setor Público: uma reflexão sobre transparência governamental no combate à corrupção 1. INTRODUÇÃO Para iniciarmos a presente exposição, toma- mos por base conceitos como os de Mafra Filho (2007), que afirma: a corrupção é um mal que assola não só o Brasil, mas nações do mundo inteiro. Todas as medidas que contribuam para a diminuição dos graus de corrupção na so- ciedade brasileira devem ser aplaudidos. Essa afirmativa trouxe uma inquietação, uma curiosidade, a que se referem Martins e Theóphilo (2007), capaz de originar um proble- ma de pesquisa e a busca por solução orientaria toda lógica do presente estudo. Tomando isso por base, a questão social de fundo seria: quais medidas tomadas contribui- riam para a diminuição dos graus de corrupção na sociedade brasileira? Por meio da leitura em Melo (2003), houve acesso ao conceito de que os níveis de corrup- ção estão intimamente ligados aos índices de accountability, de sorte que “a alta incidência Marx Chi Kong Siu é Analista Judiciário – Contador do Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro, Especialista em Gestão Tributária pela Universidade de Brasília (UnB). Set/Dez 2011 79 retranca imagem ctrl + Shift + click para liberar retranca Accountability no Setor Público: uma reflexão sobre transparência governamental no combate à corrupção // Artigos da primeira é resultado dos baixos níveis da se- gunda”. Destarte, a indicação de que esse autor traz é que se os índices de accountability forem mais altos, a tendência seria de que os níveis de corrupção se reduziriam. Utilizando-se de um método dedutivo bem simples, considerou-se que implementação de medidas que aumentam os índices de accountability, de alguma forma, contribuem para a diminuição dos graus de corrupção na sociedade brasileira. Pesquisas realizadas, por exemplo, Relly e Sabharwal (2009); Wong e Welch (2004); Tei- cher, Hughes e Dow (2002), trazem a ideia de que a transparência governamental possibilita o melhoramento da accountability. Dessa forma, o pesquisador decidiu por restringir esse problema amplo, por outro problema menor, que trataria do aspecto da mensuração da transparência governamental e como ela pode ser aplicada numa esfera es- tatal. Assim, o objetivo geral do estudo é fazer uma reflexão sobre a accountability e como a transparência governamental interage com ela e os objetivos específicos dele decorrente se- riam pormenorizar a accountability e a aplica- ção no setor público além de verificar a relação existente com a transparência governamental. Com base nos referenciais teóricos a seguir apresentados, defender-se-á que a transpa- rência governamental pode contribuir para o aperfeiçoamento da accountability, este com- preendendo, em linhas gerais, o dever de pres- tar contas, informar sobre o uso e a aplicação de recursos financeiros na consecução de ob- jetivos materiais. 2. ACCOUNTABILITY COMO UM CONCEITO GENÉRICO A accountability, como um conceito geral aplicável a qualquer entidade, pode ser apre- sentada a partir de definições elaboradas por alguns organismos internacionais, que serão mostrados. Na visão do International Federation of Accountants (IFAC) (2001) accountability é o processo pelo qual as entidades do setor pú- blico e os indivíduos dentro delas são respon- sáveis por decisões e ações, incluindo a forma Artigos 80 Revista do TCU 122 como são geridos os recursos públicos, bem como todos os aspectos relacionados ao desem- penho e aos resultados. A International Organization of Supreme Audit Institutions (INTOSAI) (1998) endossa esse consenso, pois considera accountability a obrigação imposta aos agentes e entidades públicos de responderem de forma fiscal, ge- rencial e programática quanto aos recursos que lhes foram conferidos a quem lhes acometeram tais recursos. No mesmo sentido, a Organisation for Economic Co-operation and Development (OECD) (2008) diz que accountability é man- ter alguém responsável, usado como sinônimo do dever prestação de contas, com o intuito de me- lhorar a possibilidade de as pessoas mais vulnerá- veis na sociedade expressarem as necessidades. Da leitura desses três conceitos, pode-se perceber accountability está ligada a ideia de que o gestor tem o compromisso de demons- trar o resultado obtido em relação ao recursos recebidos, a quem lhes ofereceu. Segundo O’Donnell (1998) a accountability também pode ser vista de maneira direcional: horizontal e vertical. Horizontal, quando as contas são prestadas de uma entidade para ou- tra, ambos autônomos, por razões de conexão de objeto. Na direção vertical, não diria que há uma subordinação hierárquica, mas, sim, a tal responsabilidade em função de quem recebe os recursos para quem os disponibilizam. Assim, na sequência será visto como essa epistemologia se desenvolveu no âmbito do setor público. 3. ACCOUNTABILITY NO SETOR PÚBLICO Ao buscar um pouco de história da accountability no setor público, encontramos que essa prática data da era da Antiguidade. Es- tudo de Barlev (2006) descobriu que a contabi- lidade da antiga Mesopotâmia e do antigo Egito alcançou um alto nível de sofisticação, o que nos faz refletir sobre o alcance dessa discussão. Esses sistemas de governo, altamente desenvol- vidos, levaram o ser humano a três dimensões de accountability: primeiro, de um indivíduo para o outro; segundo, de um indivíduo para o Estado; e terceiro, do Estado para a sociedade, bem como posteriormente mostrou O’Donnell (1998) em relação à accountability societá- ria. Avançando da Antiguidade para o fim da Idade Média, temos na Revolução Francesa a modernização do conceito de accountability, na companhia do fortalecimento do Estado De- mocrático do século XVIII (BESSETTE, 2004). O documento principal deste movimento revolucionista, a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (USP, 2011) garantiu no art. 15 o direito da sociedade pedir contas a todo agente público, o que até então não era prerrogativa. A norma jurídica só veio a materializar o que defendiam os renascentistas. Hobbes (2006) dizia que o ideário de Estado-nação que define o Governo, como pacto social, o qual atua na sociedade, regulando condutas, restringindo liberdades, promovendo o estado de bem-estar social, era um requisito necessário para a conti- nuidade da espécie humana, e por isso, deveriam contribuir equitativamente para a manutenção da máquina estatal, pagamento de impostos, mas por outro lado, o poder decisório não seria transferido ao governante, e sim delegado, ra- zão pela qual ele ficaria obrigado em dar contas à sociedade. Essa responsabilidade de respon- der pelos atos administrativos é adquirida pelos gestores no momento que aceitam o encargo de administrar a coisa pública, no latim res publi- ca, conceito próprio do regime democrático re- publicano, reforçando mais uma vez a ideia de accountability vertical. A direção horizontal também estava presen- te no setor público, afirma O’Donnell (1999), atrelado ao sistema de freios e contrapesos, Set/Dez 2011 83 República (BRASIL, 1988) contido no Art. 37, o qual elege cinco princípios basilares para a Ad- ministração Pública, com o objetivo de garantir a transparência na gestão administrativa, quais sejam: legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. Atendo-se um pouco mais no princípio da publicidade, vemos em Melo (2003) que o prin- cípio da publicidade vem em decorrência da necessidade de transparência nos atos da Ad- ministração Pública, como exigência inderro- gável da democracia e do Estado Democrático de Direito. Nesse mesmo sentido, Mattos (2001, p. 48) diz que a publicidade passou a ser um dos ele- mentos essenciais dos atos administrativos, tendo o condão de atribuir eficácia perante terceiros, além de manter o controle público pela comunidade. Isso embasa a opinião de Culau e Fortis (2006), de que os princípios da publicidade, transparência e do controle social encon- tram-se consagrados na Constituição Federal de 1988. Como visto no Brasil, o princípio da publicidade mereceu acolhida constitu- cional, sendo princípio assente no caput do art. 37 da CF, exatamente para permitir que a sociedade fiscalize a transparência e a reti- dão dos atos públicos, o que demonstra, em tese, um pendor de nossa constituinte pelo exercício ético. Posteriormente, a Constituição Federal foi complementada pela Lei de Responsabilidade Fiscal (BRASIL, 2000), dando maior impulso à questão da transparência, pois se previu de forma programática a publicidade de atos pú- blicos em meios eletrônicos de acesso públi- co. Além desse instrumento de visibilidade, outros indicativos de qualidade nos processos públicos foram reforçados: a ampla e objetiva divulgação dos atos administrativos, como for- ma de transparência; as prestações de contas à sociedade de modo efetivo e contínuo; implan- tação de custos nos setores governamentais; e a divulgação de resultados. Razão pela qual a presente pesquisa fixou seu escopo na transparência de atos públicos em meios eletrônicos de acesso público. 6. DIVULGAÇÃO DE ATOS PÚBLICOS EM MEIOS ELETRÔNICOS DE ACESSO PÚBLICO De acordo com Jesus (2008, p.25), a comple- xidade dos problemas sociais, a instabilidade do panorama internacional político e financei- ro e a escassez de recursos públicos aumentam o nível de incerteza na tomada de decisão polí- tica. Impondo às administrações públicas que o delineamento das políticas públicas seja, cada vez mais, baseado em informações e diagnós- ticos abrangentes dos diversos campos sociais. Já a condição de transparência do Estado relaciona-se com o dever democrático das ins- tituições públicas de conferir publicidade aos atos e decisões, seja provendo informações à sociedade sobre os processos e determinações políticas que ocorrem no âmbito interno por meio de veículos próprios de comunicação, como os diários oficiais, ou então, tornando-se disponível ao escrutínio público, da maneira como acontece nos Estados democráticos, em que a imprensa goza de considerável acesso e liberdade para vigiar as instâncias políticas de decisão. Para Armstrong (2011), a transparência go- vernamental é um requisito básico e impres- cindível para que os cidadãos possam exercer o controle das administrações públicas. Com o advento da internet o potencial de dissemina- ção da informação aumentou consideravelmen- te, acrescenta Armstrong que a interatividade entre esse meio de comunicação e o relaciona- mento entre governos e eleitores são objetos de estudos ao redor do globo. Sugere ainda que quanto mais informação os governos divulguem nos websites, de fontes confiáveis, mais posi- Accountability no Setor Público: uma reflexão sobre transparência governamental no combate à corrupção // Artigos Artigos 84 Revista do TCU 122 tiva é a imagem dos administradores perante a população. Interessante notar que há duas razões para isso: 1) melhoramento do diálogo entre governantes e governados; 2) mais pes- soas passam a monitorar as ações governamen- tais, como forma de prevenção de erros pelos administradores. Reddick e Frank (2007, p. 577) apresentam uma vantagem para a divulgação dos atos públi- cos pela internet em relação às outras mídias, que seria a disponibilidade de acesso, gratuitamente, vinte quatro horas por dia e sete dias por semana. A intensificação do uso da internet como ins- trumento de transparência de atos públicos e a mensuração do nível de informação tem des- pertado interesse de pesquisadores no assun- to, pode-se citar alguns exemplos de estudos já realizados: Tolbert e Mossberger (2006); Relly e Sabharwal (2009); Jaeger e Bertot (2010); Armstrong (2011). 7. MENSURAÇÃO DO NÍVEL DE TRANSPARÊNCIA DA GESTÃO PÚBLICA Segundo Cruz (2010), entende-se que a accountability governamental se materializa a partir da divulgação de informações claras e tempestivas acerca de resultado da atuação da gestão pública, bem como suas implicações para com a sociedade. Essa divulgação deve abranger informações quantitativas e qualitativas, disponibilizadas de forma acessível a todos os atores sociais, em meios de comunicação eficazes, com destaque para a internet. Gomes (2005) nos salienta que os Estados democráticos contemporâneos têm enfren- tado o desafio de desenvolver mecanismos que obriguem a transparência dos negócios públicos, de forma que a opinião pública pos- sa estar inteirada dos atos e das decisões dos representantes políticos. O exercício do con- trole e da crítica social depende de que os ci- dadãos estejam cientes das transações e dos debates ocorridos nos círculos do poder polí- tico. Nas sociedades de massa, a publicidade dos atos e das decisões estatais se realiza com o auxílio dos aparatos tecnológicos, que esten- dem a informação para amplas audiências. A mediação tecnológica nos processos de inte- ração entre a esfera política e a civil coloca o desafio de se alcançar um nível excelente de publicidade, que se traduz em: a) disponibili- dade do maior volume de informações produ- zidas pelas instituições políticas; b) acesso de um maior número de pessoas às informações políticas; c) participação de mais pessoas na produção da decisão política. A governança democrática a partir da vi- são de Guttman e Thompson (1996) se for- talece não somente quando as instituições políticas propiciam os meios para o exercício da vigilância social, mas, sobretudo, quan- do são desenvolvidos mecanismos que per- mitem a intervenção popular no curso das decisões políticas. Sob a ótica do modelo de democracia deliberativa, os agentes políticos para serem accountable devem submeter as decisões à discussão pública, possibilitando o engajamento dos agentes sociais no pro- cesso de crítica e de revisão dos argumentos apresentados. Para Culau e Fortis (2006), a criação de instrumentos de transparência de gestão fis- cal, consubstanciada na divulgação periódica de relatórios, na realização de audiências pú- blicas regulares, na prestação de contas dos chefes dos poderes fortalece o controle social e representa incentivo à participação popular. Complementarmente, e de forma a assegurar o cumprimento dos dispositivos e coibir vio- lações às regras de disciplina fiscal, a LRF es- tabeleceu sanções de caráter institucional e pessoal, medida que indica uma preocupação com todo esse processo de transparência das contas públicas. Set/Dez 2011 85 8. CONSIDERAÇÕES FINAIS Esta pesquisa procurou encontrar soluções para um objetivo lato que seria o combate à corrupção. Encontra-se que a accountability exerce um papel positivo na redução dessa mazela, doravante, foi possível estabelecer uma relação positiva entre a accountability aplicada ao setor público e a transparência governamental, diminuindo o escopo do trabalho para uma dimensão factível de ser analisada quantitativamente. A accountability foi estudada como um con- ceito genérico, abordando-se marcos teóricos elaborados por organismos internancionais, como IFAC, INTOSAI e OECD, a partir des- ses pontos de vistas abrangentes, a pesquisa se fechou para uma investigação especifica ao setor público, trazendo uma visão histórica da accountability, chegando à presença no país. No Brasil, tanto a accountability como a transparência estão presentes no normativo pátrio maior, a Constituição da República Fede- rativa, norma jurídica de observação obrigatória por todos, contudo, o estudo mostrou também que os governantes apresentam a tendência de Accountability no Setor Público: uma reflexão sobre transparência governamental no combate à corrupção // Artigos apresentar as contas por necessidade de cumpri- mento legal, e não porque pretendem apresen- tar contas à sociedade dos resultados da gestão. Assim, por tudo avaliado nessa pesquisa, pro- vou-se que a accountability é o dever de prestar contas. Esse dever aparece quando pessoa ou en- tidade assume a responsabilidade de gerir uma soma de recursos. Nem sempre esses recursos são financeiros, podem ser materiais, patrimo- niais, humanos, naturais, e muitos outros. O con- ceito de accountability é aplicável tanto ao poder público, quanto ao setor privado, basta existir a responsabilidade na gestão de recursos de tercei- ros que o dever de prestar contas aparece. Opinião do pesquisador é que a contabilida- de pública não pode se limitar a produzir con- tas com a finalidade de atender um requisito formal, ela deve prover informações úteis para o controle social, como também para assegu- rar a transparência nas organizações públicas. O GAO (2005) indica que ainda permanece uma discrepância entre o que os governos estão dispostos a prover, em termos de informação, e o que de informação o público espera, podendo essa indicação servir como parâmetro para fu- turas análises, já que esta pesquisa se restrin- giu a verificar a existência da informação, sem avaliar a qualidade. RefeRências ARMSTRONG, Cory L.. Providing a clearer view: an examination of transparency on local government websites. Government Information Quarterly. v.28, n.1, p. 11-16, jan. 2011. BARLEV, Benzion. A biblical statement of accountability. Accounting History, v.11, n.2, p.173-197, 2006. BESSETTE, J. M. Accountability: political. In: SMELSER, Neil J., BALTES, Paul B. (Ed.). International encyclopedia of the social & behavioral sciences. Amsterdam: Elsevier, 2001. p. 38-41 Artigos 88 Revista do TCU 122 Processo de Tomada de Contas Especial (TCE): Instaura-se o processo para apurar os pressupostos ou apuram-se os pressupostos para instaurar o processo? 1. InTRodUção Prescreve o art. 1º da norma regulamenta- dora do processo de tomada de contas especial (TCE), no âmbito federal (IN TCU nº 56/2007): Diante da omissão no dever de prestar contas, da não comprovação da aplicação de recursos repassados pela União me- diante convênio, contrato de repasse ou instrumento congênere, da ocorrência de desfalque, alcance, desvio ou desapareci- mento de dinheiros, bens ou valores pú- blicos, ou de prática de ato ilegal, ilegítimo ou antieconômico de que resulte dano à administração pública federal, a autori- dade administrativa federal competente deve adotar providências para apuração dos fatos, identificação dos responsáveis, quantificação do dano e obtenção do res- sarcimento (grifou-se). Note-se que esse dispositivo exemplifica fa- tos geradores de prejuízos à Fazenda Públi- ca Federal1 e, por consequência, da tomada Mauro Rogério Oliveira Matias é servidor do Tribunal de Contas da União Set/dez 2011 89 retranca imagem ctrl + Shift + click para liberar retranca Processo de Tomada de Contas Especial – TCE: Instaura-se o processo para apurar os pressupostos ou apuram-se os pressupostos para instaurar o processo? // Artigos de contas especial, versa também das provi- dências a serem adotadas pela autoridade ad- ministrativa com vistas ao levantamento dos elementos fundamentais da TCE – os pressu- postos – e à recomposição do erário, mas não trata propriamente da instauração do processo de TCE para esse intento. Não há menção no aludido artigo da norma de que aquelas pro- vidências saneadoras das irregularidades que resultaram em dano ao patrimônio público, a cargo da Administração, sejam realizadas, imediatamente, por meio da deflagração do processo de tomada de contas especial. Já o art. 3º da IN TCU nº 56/2007 (BRA- SIL. TCU, 2007), que estabelece: “Tomada de contas especial é um processo devidamente formalizado, com rito próprio, para apurar responsabilidade por ocorrência de dano à administração pública federal e obtenção do respectivo ressarcimento”, não fixa propria- mente o conceito jurídico do processo de TCE, mas revela suas finalidades. Por princípio, e em razão de dispositivos ex- pressos na instrução normativa em foco (preâm- bulo, § 3º do art. 1º e § 3º do art. 3º), o processo de tomada de contas especial é uma medida de exceção do gestor público, ou seja, apenas deve ser deflagrado pela Administração depois de es- gotadas todas as medidas administrativas, num prazo de até 180 dias, visando à apuração e sa- neamento da irregularidade ou ressarcimento do prejuízo constatado contra o erário. Encerrada essa fase – que pode ser denomi- nada de período de exceção, apuração e sane- amento – impõe-se ao agente competente do órgão ou entidade lesada a imediata instaura- ção da TCE, prosseguindo-se com a instrução, organização e encaminhamentos às instâncias seguintes: contabilidade analítica, controle in- terno, ministro supervisor e Tribunal de Con- tas da União. A TCE, espécie de processo administrativo, requer, para o início e andamento, que estejam presentes elementos essenciais chamados de pressupostos (requisitos) de constituição e de desenvolvimento válidos, que não podem ser confundidos com fatos ensejadores da TCE (motivos geradores do processo). Esses pres- supostos, além da prévia adoção das medidas administrativas saneadoras e de outros mais a Artigos 90 Revista do TCU 122 frente citados, dizem respeito à ocorrência de fato irregular (ato ilícito); existência de dano ao erário efetivo ou presumido, quantificado ou quantificável, igual ou superior ao valor de alçada2; e responsabilização direta ou indireta de agente público ou de agente privado gestor de recursos públicos. No entanto, se para adotar medidas sanea- doras a cargo da Administração lesada durante o período de exceção, apuração e saneamento - fase anterior à TCE - é necessário que o ges- tor público tenha em mãos (identificados) os pressupostos da TCE, até mesmo para acionar o devedor, imputando-lhe a irregularidade e o quantum monetário devido, então vem à tona a seguinte questão: Instaura-se a TCE para apurar os pressupostos ou apuram-se os pres- supostos para instaurar a TCE? Diante do trâmite processual da TCE e das finalidades, é relevante esclarecer essa con- trovérsia, a fim de se evitar instaurações des- necessárias da TCE, considerando o caráter excepcional, ou de instaurá-la quando ausen- tes os pressupostos essenciais, prejudicando o regular desenvolvimento. Assim, o objetivo do presente estudo é responder a tal questiona- mento, a partir das análises a seguir expostas. 2. ConCeITo, naTUReza, aTRIbUToS e FInalIdadeS da TCe Primeiramente, cabe definir um conceito ampliado para o processo de TCE. Para isso, é necessário relacionar sua natureza, atributos e finalidades. Natureza • é um processo administrativo autôno- mo devidamente formalizado e com rito próprio; • possui natureza jurídica de reparação ci- vil indenizatória3. Atributos (características e pressupostos) • são instauradas, depois de esgotadas, as medidas administrativas internas sem a obtenção da prestação de contas recla- mada ou do ressarcimento do prejuízo verificado; • é um instrumento de controle adminis- trativo interno saneador e sancionador (reparar as irregularidades, ressarcir o prejuízo e imputar responsabilidade ao agente causador do dano); • é deflagrado diante da ocorrência de ir- regularidade de que resulte dano efetivo à Fazenda Pública; por perda, desvio ou má aplicação dos recursos financeiros ou Set/dez 2011 93 dualidade ou excepcionalidade da instauração da TCE. A Instrução Normativa TCU nº  13/96, que revogou a IN TCU nº 01/93, inovou ao posi- tivar tal princípio em seus dispositivos, o mes- mo ocorrendo na norma que a sucedeu: IN TCU nº 56/2007, atualmente em vigor. Nesta norma vários são os preceitos que dispõem, de forma enfática, sobre a excepcionalidade da tomada de contas especial: Preâmbulo: considerando, finalmente, que o TCU, na condição de órgão julgador das contas de administradores públicos federais e de responsáveis por danos à administração pública federal, somente deve ser acio- nado após esgotamento das providências administrativas internas... Art. 1º, § 3º Esgotadas as medidas administrativas internas sem obtenção do ressarcimento pretendido, a autoridade administrativa federal competente deve providenciar a imediata instauração de tomada de con- tas especial, observado o disposto nesta Instrução Normativa. Art. 3º, § 1º A tomada de contas especial só deve ser instaurada pela autoridade administra- tiva federal após esgotadas as providências administrativas internas sem obtenção do ressarcimento pretendido (BRASIL. TCU, 1996). A residualidade da TCE foi também utiliza- da na norma base de convênios e contratos de repasse, Portaria Interministerial MPOG/MF/ CGU nº 127/2008 (BRASIL. MPOG, 2008) que, no art. 63, § 1º, incisos I e II, dispõe de que a TCE somente deverá ser instaurada depois de esgotadas as providências administrativas internas com vistas a sanear as irregularida- des identificadas, como a não apresentação da prestação de contas da avença dentro do prazo regulamentar ou a não aprovação, pelo concedente dos recursos, da prestação de con- tas encaminhada. O legislador da Reforma Administrativa de 1967 retratou, naquela época, com proprieda- de, a fase apuratória e saneadora antecedente à TCE, ao estabelecer no art. 84 do Decreto nº 200/1967: Quando se verificar que determinada conta não foi prestada, ou que ocorreu desfalque, desvio ou outra irregularidade de que resulte prejuízo para a Fazenda Pública, as autoridades administrativas deverão tomar imediatas providências para assegurar o respectivo ressarci- mento e instaurar a tomada de contas, fazendo-se as comunicações a respeito ao Tribunal de Contas (grifo nosso) (BRA- SIL. Decreto, 1967). Uma correta interpretação desse dispositivo seria a instauração da TCE em momento pos- terior às medidas saneadoras, ou seja, no caso do insucesso das providências adotadas com vistas a obter o ressarcimento do dano. Assim, diante de fato gerador da TCE, a primeira me- dida da autoridade administrativa lesada não é a instauração da TCE, mas o levantamento dos pressupostos da TCE com vistas a buscar o saneamento administrativo da irregularidade ou o ressarcimento do dano constatado. No mesmo sentido deve ser a leitura do art. 8º da Lei nº 8.443/1992 (Lei Orgânica do TCU) (BRASIL. Lei, 1992), ao prescrever que diante de um motivo ensejador da TCE, a autoridade administrativa deve imediatamente adotar pro- Processo de Tomada de Contas Especial – TCE: Instaura-se o processo para apurar os pressupostos ou apuram-se os pressupostos para instaurar o processo? // Artigos Artigos 94 Revista do TCU 122 vidências com vistas à instauração da TCE para apuração dos fatos, identificação dos respon- sáveis e quantificação do dano; pois, na práti- ca e por orientação normativa infralegal, essas providências (levantamento dos pressupostos) são realizadas antes da existência propriamen- te dita do processo de TCE, mas já tendentes à sua deflagração. Para instaurar (formalizar) os autos da TCE (autônomo) é imprescindível ter previamente demonstrado, em outro processo ou mesmo em procedimentos administrativos específicos, o fato lesivo (irregularidade) ao patrimônio pú- blico, o valor pecuniário do prejuízo decorren- te e o agente público responsável. Apurados os fatos, identificados os responsáveis e quantifi- cado o dano, a autoridade administrativa com- petente, antes de providenciar a instauração da TCE, deverá, ainda, esgotar as medidas que lhe compete, com vistas à correção da irregulari- dade ou recomposição do dano ao erário. Sem êxito nessas providências, deflagra-se a TCE. Neste sentido, as peças exigidas para compo- sição do processo de TCE, notadamente o rela- tório do tomador/comissão de contas especiais (art. 4º, inciso IV, IN TCU nº 56/2007), devem refletir justamente a apuração dos pressupos- tos da TCE mesmo antes da autuação do pro- cesso e as medidas administrativas tendentes à recomposição do dano. 4.1 duração da fase de exceção, aPuração e saneamento Sendo a TCE uma medida de exceção da Ad- ministração, até quando poderia a autoridade competente do órgão ou entidade lesada adotar providências no sentido de sanear a omissão no dever de prestar contas ou as irregularida- des danosas ao erário ou mesmo tentar obter o ressarcimento do prejuízo? A resposta encontra-se no art. 1º, § 1º, IN TCU nº 56/2007 (BRASIL. TCU, 2007), que fixa em 180 dias o prazo para o gestor público competente adotar medidas com a finalidade de apurar as irregularidades com dano ao erá- rio, identificar os agentes responsáveis, quan- tificar o prejuízo e buscar sua reparação. Essa deve ser considerada a fase de apuração dos pressupostos da TCE e saneamento adminis- trativo do dano ou, ainda, simplesmente pe- ríodo de exceção da TCE, visto que somente no caso de insucesso daquelas medidas é que deverá ser deflagrada imediatamente a TCE. Portanto, não obtida, no prazo máximo de 180 dias, pelas vias administrativas tradi- cionais o saneamento da irregularidade ou a recomposição do dano, faz-se necessário con- tinuar a persecução do ressarcimento ao erá- rio e a responsabilização do agente público, desta feita em sede de processo de tomada de contas especial, imediatamente e devidamen- te instaurado. Esse prazo, segundo os incisos I e II, § 2º, art. 1º, da IN TCU nº 56/2007 (BRASIL. TCU, 2007) deve ser contado nos casos de omissão no dever de prestar contas e da não comprova- ção da aplicação dos recursos repassados, da data fixada para a apresentação da prestação de contas; e, nos demais casos, da data do evento (irregularidade), quando conhecida, ou da data da ciência do fato irregular pela Administração. Atualmente7, durante o período adminis- trativo de apuração e saneamento das irregu- laridades motivadoras de TCE, a realização de diligências e fiscalizações, a apresentação de documentos, justificativas e alegações de de- fesa pelo responsável não suspende nem inter- rompe o prazo de 180 dias para a instauração da TCE, no caso de subsistir a irregularidade (dano ao erário). Prevalece a regra geral do processo administrativo da não suspensão dos prazos (art. 67, Lei nº 9.784/1999) . De outro modo, o decurso do prazo de até 180 dias para a recomposição do dano pelas vias administrativas internas, sem a instaura- Set/dez 2011 95 ção da TCE, não resulta na aplicação dos ins- titutos processuais da perempção, prescrição ou decadência na instauração da TCE, tendo em vista os princípios da proteção ao patri- mônio público e da imprescritibilidade8 das ações de ressarcimento da União. Nesse caso, a Administração deverá deflagrar a tomada de contas especial mesmo ultrapassado aquele prazo, sem prejuízo da responsabilização do agente público que deu causa à intempesti- vidade de tal providência, visto caracterizar grave infração à norma legal e possibilitar a declaração de solidariedade com o responsá- vel pelo dano (art. 1º, § 1º, IN TCU nº 56/2007) (BRASIL. TCU, 2007). Em se tratando de dano presumido por omis- são no dever de prestar contas, obviamente aquele prazo de 180 dias merece ser encurtado ao máximo, visto que as medidas administrati- vas a serem aplicadas são mais céleres, a exem- plo da resposta às notificações apresentadas pelo responsável, que não deve ultrapassar 30 dias (art. 56, § 1º, Portaria Interministerial nº 127/2008) (BRASIL. Ministério, 2008). Em todo caso, em prol da celeridade do pro- cesso de TCE, é prudente compreender que o prazo de 180 dias para que a Administração adote providências com vistas ao saneamento da irregularidade ou recomposição do prejuízo, deve ser entendido como “até 180 dias”. Por- quanto verificado, antes desse prazo, o insuces- so nas medidas administrativas preliminares à TCE, deve a Administração declarar o encerra- mento da fase apuratória dos pressupostos da TCE e o insucesso no saneamento administra- tivo do dano saneadora, instaurando, ato con- tínuo, o processo de tomada de contas especial. Uma vez deflagrado o processo, o prazo re- gulamentar para a remessa da TCE ao TCU é de 30 dias, contados de sua elaboração (art. 153, § 2º, Decreto nº 93.872/1986) (BRASIL. Decre- to, 1986). Cabe aqui esclarecer que esse prazo deve ser entendido como “a partir da conclusão da TCE pelo controle interno”, dado tratar-se de um processo de rito complexo – após sua instrução pelo tomador/comissão de contas especiais – tramita por diferentes órgãos até chegar ao TCU: contabilidade analítica, con- trole interno e ministro supervisor do órgão ou entidade lesada; cada um com competências e prazos distintos sobre a TCE. Esclareça-se, nesse ponto, ser perfeitamen- te razoável que o prazo para remessa da TCE demande menor tempo do que para realizar o levantamento dos pressupostos antes de iniciar autuar o processo propriamente dito. De fato, a fase de apuração e saneamento é, e deve ser, mais demorada do que o prazo para as forma- lidades de instauração, instrução pelo toma- dor/comissão de contas especiais e remessa ao órgão julgador (fase de composição da TCE, Processo de Tomada de Contas Especial – TCE: Instaura-se o processo para apurar os pressupostos ou apuram-se os pressupostos para instaurar o processo? // Artigos
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