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Curtimento de Peles no Nordeste: Origens dos Tanantes e Uso da Vegetação da Caatinga, Manuais, Projetos, Pesquisas de Engenharia Florestal

Uma síntese de informações sobre sistemas de curtimento de peles no nordeste do brasil, identificando a origem dos tanantes empregados e as formas de uso da vegetação nativa da caatinga para essa finalidade. O texto aborda as diferentes fontes de taninos vegetais, as práticas tradicionais e as implicações ambientais e econômicas da exploração destes recursos.

Tipologia: Manuais, Projetos, Pesquisas

2015

Compartilhado em 08/10/2015

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isabelle-meunier-9 🇧🇷

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Baixe Curtimento de Peles no Nordeste: Origens dos Tanantes e Uso da Vegetação da Caatinga e outras Manuais, Projetos, Pesquisas em PDF para Engenharia Florestal, somente na Docsity! Biodiversidade - V.14, N1, 2015 - pág. 98 USO DE ESPECIES PRODUTORAS DE TANINOS PARA CURTIMENTO DE PELES NO NORDESTE DO BRASIL Isabelle Maria Jacqueline Meunier1 Rinaldo Luiz Caraciolo Ferreira2 RESUMO: Este trabalho sintetiza informações sobre sistemas de curtimento de peles no Nordeste do Brasil, identificando origem dos tanantes empregados e formas de usos da vegetação nativa da caatinga para essa finalidade. Dados secundários foram obtidos da literatura especializada e informações de campo originaram- se de observações e entrevistas em curtumes tradicionais e empresariais em Pernambuco e Bahia. A produção dos tanantes vegetais dá-se em dois ambientes distintos: o da silvicultura moderna e tecnificada, representada por empresas do sul do Brasil, fornecedoras de taninos industrializados, e o do extrativismo local, de baixa tecnologia, descapitalizado e com baixa produtividade. Diferentes espécies conhecidas popularmente como angicos e juremas são apontadas com produtoras de taninos mas esse produto é apenas empregado no curtimento tradicional, não raro associado ao corte clandestino de madeira. Curtumes empresariais utilizam principalmente cromo para curtimento, enquanto o produto de origem vegetal industrializado é empregado no recurtimento. Não se encontraram parâmetros técnicos e econômicos que possibilitem a regulamentação da exploração e o fomento da produção sustentável do tanino como produto não madeireiro da Caatinga. Palavras-chaves: Caatinga; extrativismo; tanino. USE OF TANNIFEROUS SPECIES IN TANNING OF LEATHER IN NORTHEAST REGION SEMIARID, BRAZIL This article summarizes the information about tanniferous species and describes the leather tanning system in the northeastern of Brazil, identifying the source of tanning in different production systems and describing the uses of native caatinga vegetation for this purpose. Secondary data were obtained from a review of literature and field information was originated from observations and interviews in Pernambuco and Bahia. The exploitation of vegetable tannin occurs in two very distinct environments: the modern and technological forestry, represented by companies of the southern of Brazil, suppliers of industrial tannins; and the local and de-capitalized forest extraction of low technology and low productivity. Different species known popularly as angicos and juremas are pointed as the best producers of tannin, but this product is only used in traditional tanning, often associated with illegal logging. Companies use mainly chromium for tanning, and the vegetal tannin industrialized is employed in retannage. No technical and economic parameters to enable the regulation of the exploitation and the promotion of the sustainable production of tannin as a non-timber product are found. Key- words: Caatinga; tannin; extraction. 1. Professora do Departamento de Ciência Florestal – UFRPE - Universidade Federal Rural de Pernambuco – email: imjmeunier@gmail.com 2. UFRPE - Universidade Federal Rural de Pernambuco – email: rinaldo@dcfl.ufrpe.br Biodiversidade - V.14, N1, 2015 - pág. 99 INTRODUÇÃO O uso de tanantes vegetais na região Nordeste do Brasil é uma prática tradicional, adotada para preparação do couro usado na confecção da indumentária típica dos vaqueiros. Os curtumes tradicionais utilizam esses produtos vegetais cujo suprimento é, em parte, produto de atividade extrativista informal, praticamente clandestina, podendo se constituir em vetor de degradação da caatinga, formação xerofítica típica da região semiárida nordestina. Por outro lado, o uso de tanantes comerciais, produzidos em escala e com alto nível tecnológico, parece ser cada vez mais comum em grandes curtumes. A utilização de cascas de árvores taníferas, prática comum em curtumes tradicionais, compromete a fisiologia da planta quando a casca é retirada de forma anelar, pois impede o fluxo da seiva na árvore, levando-a a morte (Rizzini e Mors, 1995). O manejo sustentado de plantas taníferas precisa ser realizado de forma que sejam adotadas algumas estratégias para conservação dos recursos pelas comunidades. Iniciativas como extração de tanino das folhas poderão ser muito menos impactantes nessas populações, já que se observam, em algumas espécies, diferenças não significativas entre os teores de tanino nas cascas e nas folhas (Monteiro et al., 2005). Esses mesmo autores, no entanto, lembram que a coleta preferencial das cascas deve-se a disponibilidade das mesmas durante todo ano, na região semiárida, ao contrário das folhas. No Brasil, a Lei Nº 12.651 de 12 de maio de 2012, que dispõe sobre a proteção da vegetação nativa (BRASIL, 2012), estabelece que é livre a coleta de produtos florestais não madeireiros (PFNM), incluindo cascas de espécies taníferas, remetendo a regulamentos específicos os aspectos referentes ao período de coleta e volumes explorados, dada a multiplicidade de PNFM, formas e locais de coleta, exigindo que se observem a época de maturação dos frutos e sementes e as técnicas que não coloquem em risco a sobrevivência de indivíduos e da espécie coletada no caso de coleta de flores, folhas, cascas, óleos, resinas, cipós, bulbos, bambus e raízes (Lei Nº 12.651/2012, Art. 21, Brasil, 2012). Garantir da observância dos aspectos citados na lei representa não só uma árdua tarefa para os órgãos de controle ambiental, mas um desafio para a ciência e a técnica, pois ainda são desconhecidos os parâmetros de produção e de dinâmica de populações que permitam avaliar os riscos à sobrevivência de indivíduos e espécies objetos do extrativismo. A escassez de informações sobre produção de tanino das espécies arbóreas nativas da caatinga, variáveis intervenientes, recuperação das árvores exploradas e limites para exploração impossibilitam prescrições seguras quanto aos parâmetros técnicos de coleta de cascas das espécies taníferas. O extrativismo de produtos tanantes precisa ser melhor conhecido para que se avaliar os impactos causados e as oportunidades que pode representar para a geração de renda às comunidades do semiárido nordestino. Assim, com esse trabalho se procurou traçar as linhas gerais do sistema de curtimento do couro no Nordeste do Brasil, identificar a origem dos tanantes empregados nos sistemas de produção e analisar as formas de usos da vegetação nativa da caatinga para essa finalidade, como forma de avaliar o potencial dessa atividade como estratégia de produção florestal sustentável para a região semiárida do Brasil. MATERIAL E MÉTODOS Buscaram-se informações na literatura especializada, para conhecer as principais espécies exploradas, os teores de taninos reportados em pesquisas e as características do Biodiversidade - V.14, N1, 2015 - pág. 102 chegando a 300 kg de casca ou mais2. Para alvejar o couro e conferir maior qualidade, adiciona-se pedra-ume na golda. Após retirar os couros da golda, eles são estendidos no varal por um dia, para secar, e em seguida são amaciados “pisando com o pé para dar qualidade e ficar bem macio”, e também para clarear. Segundo o informante, as cascas vêm “da serra lá de cima”, aparentemente local de difícil acesso (“só se chega em lombo de burro”), afetado por queimada recente que fez diminuir a população de angico. A época melhor para extração da casca é quando não está florando (de outubro a novembro). Cascas extraídas na época da floração “fofam” o couro. A extração é feita de “uma banda” da árvore para que ela não morra, a uma altura de cerca de 2,0m até 30 cm da base. A justificativa de não tirar a porção basal da casca é “não acabar a sustança da terra, que vem de baixo”. Com cerca de um ano observa-se casca nova, mas não ainda no ponto de explorar (casca em formação). O corte da casca pode ser feito a partir de dois anos, quando a árvore apresenta cerca de 3,0 m de altura. O artesão informou extrair as cascas necessárias e também comprá-las por encomenda, pagando R$ 15,00 a carga, estimada em 60 kg3, correspondentes à produção de cascas de uma ou duas árvores. O instrumento empregado para extração é a faca-peixeira e apenas as cascas do angico são aproveitadas. A jurema-preta não serve porque a casca “não trava” (deduzindo- se que o teor de tanino é reduzido). A exploração, diferentemente do encontrado por Silva (2002), se dá no período de chuvas, ressaltando que o corte é interrompido na floração. O informante tem a como principal atividade a agropecuária, sendo o curtimento do couro uma atividade complementar de renda, desenvolvida em apenas em determinado período do ano. Única referência local na atividade, o curtidor tradicional nunca ouviu falar em tanino em pó. Nos grandes curtumes empresariais, o cromo é um elemento essencial para curtimento em escala industrial, sendo os taninos vegetais industrializados empregados no recurtimento (acabamento), resultando em produto de alta qualidade. Por outro lado, há a tendência do mercado em direção à substituição do cromo por produtos mais aceitos ambientalmente. CONSIDERAÇÕES FINAIS Observou-se que há uma forte tendência de profissionalização do setor de curtumes, já dominado por grandes indústrias que detém a tecnologia e provavelmente estabelecem os preços de couros e peles in natura. Um perfil alternativo de produção (produção de couro verde, preparado com curtentes produzidos local e sustentavelmente) exigiria um mercado também diferenciado e apenas nessa situação poderia ser viável adotar modelos de produção sustentável de taninos a partir de espécies nativas do semiárido. Mesmo para esse mercado com valores sociais e ambientais agregados, a produção de taninos vegetais a partir do angico ou de outras espécies potenciais depende não só da garantia de produção mas também do beneficiamento do produto, caso contrário os taninos extraídos não seriam 2A estimativa de massa é feita tomando como referência o volume de cascas correspondente a um saco com capacidade de 60 kg. 3A referência aqui também é tomando por base o saco com capacidade de 60kg. Biodiversidade - V.14, N1, 2015 - pág. 103 capazes de competir com os taninos vegetais industrializados existentes no mercado. Há insuficiência de parâmetros técnicos de produção e rendimento quanto aos taninos vegetais oriundos de espécies nativas. As pesquisas são pontuais, a base experimental é restrita e os resultados até certo ponto inconsistentes. Resultados de laboratório dificilmente podem ser transpostos para situações práticas pois há diferenças marcantes entre as condições de extração e uso dos taninos. A clandestinidade é uma característica da atividade extrativista, pois coloca os extratores de casca na condição de fora-da-lei, apesar de tratar-se da exploração de um recurso renovável, como tantos outros. Por outro lado, essa condição de transgressor aumenta o risco de exploração predatória, dissociada de qualquer cuidado com a renovação do recurso explorado. O angico parece ser a espécie com maior potencial para a inclusão em modelos produtivos, haja vista seu valor madeireiro e possibilidades múltiplas de aproveitamento, principalmente quando integrada ao manejo da propriedade rural. No entanto, faltam evidências de que a extração de faixas de cascas garanta a recuperação efetiva da árvore, principalmente considerando-se as diferentes épocas do ano e fases fenológicas (mencionadas como variáveis importantes pelos coletores). Por outro lado, o corte de árvores adultas, associado ao aproveitamento adequado da madeira, pode ser uma possibilidade a considerar, desde que a dinâmica da espécie nas populações onde ocorre naturalmente seja conhecida e sua regeneração promovida, de forma a garantir a sua perpetuidade. A oferta de cascas de espécies arbóreas nativas da região para atender ao mercado de curtimento de couros, em sistemas de produção sustentável, enfrentaria dois grandes empecilhos: os grandes curtumes não contam com estrutura tecnológica para trabalhar com cascas, mas apenas com taninos industrializados, com qualidade homogênea e garantida, além de exigirem segurança no fornecimento; por outro lado, os pequenos curtumes locais dificilmente remunerariam devidamente os produtores de casca, já que contam com material a baixo custo, retirado clandestinamente, principalmente de árvores de angico ainda existentes. Sem regulamentação específica nem fiscalização, o produto produzido de forma sustentável não teria condições de competir com resultante da exploração clandestina. REFERÊNCIAS AGUILAR-ORTIGOZA C. J.; SOSA V.; AGUILAR-ORTIGOZA M. Toxic phenols in various Anacardiaceae species. Economic Botany, v. 57, n. 3, p. 354 – 364, 2003. ALBUQUERQUE U. P. Etnobotânica aplicada para a conservação da biodiversidade. In: Albuquerque UP, Lucena RFP (2004) Método e técnicas na pesquisa etnobotânica. Recife: NUPEEA/Livro Rápido, 2004. ANDRADE B. G. et al. (2013) Determinação do potencial tanífero em povoamentos de angico. Ciência da Madeira (Braz. J. Wood Sci.), v. 4, n. 2, p. 139-151, 2013. AZEVEDO T. K. B. et al. Relações entre madeira, casca e teor de substâncias tânicas presentes em jurema preta (Mimosa tenuiflora): Resultados Parciais. In: III CONGRESSO DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE CAMPINA GRANDE, Campina Grande, 2006. Anais, Campina Grande: Universidade Federal de Campina Grande, v. 1. p. 1 - 6, 2006. Biodiversidade - V.14, N1, 2015 - pág. 104 BRASIL (2012) Lei Nº 12.651, de 25 de maio de 2012. Dispõe sobre a proteção da vegetação nativa; altera as Leis nos 6.938, de 31 de agosto de 1981, 9.393, de 19 de dezembro de 1996, e 11.428, de 22 de dezembro de 2006; revoga as Leis nos 4.771, de 15 de setembro de 1965, e 7.754, de 14 de abril de 1989, e a Medida Provisória no 2.166-67, de 24 de agosto de 2001; e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2012/Lei/L12651.htm> Acesso em 12 nov. 2012. LORENZI H.; MATOS F. J. A. Plantas medicinais no Brasil: nativas e exóticas cultivadas. Nova Odessa: Instituto Plantarum, 2002. MONTEIRO J. M. et al. Teor de tanino em três espécies medicinais arbóreas simpátricas da caatinga. Revista Árvore, v. 29, n. 6. p. 999 -1005, 2005. PAES J. B. et al. 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