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Apostila de Portugues Correto 2 - Morfologia, Notas de estudo de Literatura

Apostila de Morfologia da Língua Portuguesa

Tipologia: Notas de estudo

2013

Compartilhado em 27/12/2013

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free-free-1 🇧🇷

4.9

(35)

45 documentos

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Baixe Apostila de Portugues Correto 2 - Morfologia e outras Notas de estudo em PDF para Literatura, somente na Docsity! APOSTILA DE PORTUGUÊS CORRETO Morfologia Índice/Sumário. assessoramento Caro Professor, gostaria de um esclarecimento sobre uma palavra que alguém que eu conheço insiste em usar: assessoramento. Essa palavra existe em Português? Não seria melhor usar assessoria? Por exemplo: essa pessoa usa “assessoramento técnico e comercial em transporte vertical”. Isso é correto? Obrigada por sua ajuda. Marilena R. – Campinas (SP) Cara Marilena: quanto ao assessoramento, o nosso idioma usa vários recursos para formar substantivos abstratos de ação a partir de um verbo: ou tira a terminação verbal e acrescenta simplesmente uma vogal (roubar/roubo; trocar/troca; desgastar/desgaste); ou acrescenta ao radical um dos sufixos especializados neste fim: -mento (congelar/congelamento) ; -ção (explorar/exploração) ; -dura (benzer/benzedura) ; -ia (correr/correria). O que ninguém jamais conseguirá explicar são os vínculos ocultos entre esses elementos todos, que nos fazem preferir degelo para degelar, mas congelamento para congelar. Por que não degelamento? Seria perfeitamente possível, mas não se formou, indicando que, entre as várias possibilidades, a forma degelo ganhou nossa preferência. E mais: se usamos congelamento aqui no Brasil, lembro que Portugal prefere congelação – usando uma das terminações que nossa língua admite para o mesmo radical. Por isso, é comum encontrarmos duas ou mais formas ainda disputando seu espaço; é o caso bem conhecido de monitoração e monitoramento, ambas bem formadas, que ficarão coexistindo até que uma delas vá ficando esmaecida. No meu dialeto pessoal, assessoramento e assessoria estão em pé de igualdade; nenhuma das duas tem minha preferência. Agora, como você mesma notou, ao seu colega soa melhor assessoramento, enquanto você prefere assessoria. Esse estado de indefinição pode durar décadas. Por isso, sossegue. guarda-chuvinha Como se chama um guarda-chuva pequenino? É um guarda- chuvinho, um guarda-chuvinha ou um guarda-chuvazinho? Professor, numa reunião de família, em meio a muita brincadeira e descontração, surgiu uma dúvida interessante: qual é a forma correta de escrever o diminutivo de guarda-chuva? Já buscamos em diversos materiais e nada de sanar nossa dúvida. Aguardo resposta. Vanice – Bento Gonçalves (RS) Minha cara Vanice: um guarda-chuva pequeno pode ser tanto um guarda-chuvinha como um guarda-chuvazinho. Na maioria dos substantivos de nosso idioma, podemos optar entre formar diminutivos com -inho e diminutivos com -zinho: paredinha, paredezinha; livrinho, livrozinho; colherinha, colherzinha; etc. Com -inho, fica conservada a vogal terminal do vocábulo primitivo: poeta, poetinha; tema, teminha, enquanto com -zinho, que tem um nítido caráter de adjetivo, aparece a terminação característica do gênero: um poetazinho; um temazinho. Daí nasce a discrepância entre guarda-chuvinhA e guarda-chuvazinhO (friso: ambos estão corretos!). No primeiro, o A de chuva é conservado após o sufixo: chuvinha. No segundo, -zinho se acrescenta ao composto [guarda-chuva] com o elemento terminal característico do masculino (já que este é o gênero de guarda-chuva): guarda-chuvaZINHO. É complexo; não me admira que vocês tivessem dificuldades em encontrar a resposta. absenteísmo O sufixo -ismo que está presente em cristianismo e classicismo não é o mesmo que aparece em clientelismo ou denuncismo. Caro Professor Moreno: estou em fase de redação de minha dissertação de mestrado e gostaria de orientação quanto à adequação das palavras afastamento ou absenteísmo para caracterizar a ausência do funcionário no trabalho por motivo de licença-saúde. Ressalto ainda que me refiro apenas a ausências justificadas por atestado médico. Denise B. – São José do Rio Preto (SP) Minha cara Denise: acho que você deve evitar o vocábulo absenteísmo no seu trabalho. Os vocábulos em -ismo, outrora, eram usados exclusivamente para designar doutrinas, movimentos artísticos, estilos literários: naturalismo, positivismo, classicismo, surrealismo, etc. Modernamente, contudo, este sufixo também passou a intervir na criação de vocábulos em que se percebe uma nítida intenção de criticar o exagero, o excesso. É o caso de consumismo, grevismo, assembleísmo, denuncismo, etc. Em absenteísmo, como em consumismo, o sufixo -ismo indica a exagerada repetição ou intensificação de uma prática. Consumista é quem consome sem critérios; absenteísta é quem vive faltando a seu emprego ou a suas aulas. Fique com o afastamento – ainda mais considerando que se trata de licença-saúde. adjetivos gentílicos Uma leitora argentina quer saber se brasileiro é o único gentílico com essa terminação. Caro Professor: por que o adjetivo relativo ao Brasil é brasileiro, se este sufixo não é usado em nenhum outro caso para derivados de nomes geográficos? Paula Velarco – Buenos Aires (Argentina) Você tem razão em estranhar, Paula, mas verá que há uma boa explicação para isso. Nosso idioma dispõe de vários sufixos para obter o mesmo resultado; por exemplo, na formação de substantivos abstratos de ação (aqueles que derivam de verbos), o Português, entre outros, pode us a r -mento (tratamento, abalroamento) , -dura (andadura, varredura) , -ção (descrição, provocação) ou -agem (passagem, regulagem). Não existe um padrão que determine qual desses sufixos vamos usar; a seleção se dá, caso a caso, por critérios que ainda não foram bem estudados. O mesmo vai ocorrer com os adjetivos gentílicos. Nossos sufixos mais produtivos para esse fim são -ano, -ense e -ês, mas também temos adjetivos em -ino, -ista, -ão, -ita e -enho, entre outros: -ENSE: amazonense, catarinense, maranhense, rio-grandense (é o mais usado nos gentílicos brasileiros). -ÊS: português, chinês, neozelandês, calabrês, holandês. -ANO: americano, italiano, californiano, baiano, boliviano. -INO: belo-horizontino, bragantino, argelino, marroquino, londrino, florentino. -ÃO: alemão, lapão, afegão, catalão, coimbrão, gascão, parmesão (de Parma). -ITA: israelita, iemenita, moscovita, vietnamita. -ENHO: costa-riquenho, hondurenho, porto-riquenho (de topônimos do espanhol). -ISTA: santista, paulista, campista (raro). O sufixo -eiro, por sua vez, é muito usado para indicar profissão ou atividade: jornaleiro, sapateiro, cabeleireiro, ferreiro. Isso explica por que os nascidos no Brasil são brasileiros (e não brasilianos ou brasilenses): essa era a denominação dos que trabalhavam, nos primeiros dias do Descobrimento, na extração do pau-brasil e passou a designar todos os que nasciam aqui nesta terra. Da mesma forma, chamamos de mineiros os que nascem em Minas Gerais, palavra que já existia como profissão. Como podes ver, gentílicos com a terminação -eiro são muito raros e não devem chegar a meia dezena. Não me admira que você, falante nativa de outro idioma, tivesse percebido a estranheza dessa formação. datiloscopista Saiba por que o funcionário que trabalha na expedição do documento de identidade é um datiloscopista. Caro Professor Moreno: por que é utilizado o termo datiloscopista para designar o funcionário que trabalha na expedição de documento de identidade? Obrigada! Otália Minha prezada Otália: datiloscopista é um composto erudito formado pelo elemento datilo, que significa dedo (o mesmo que aparece em datilografia, escrever com os dedos), mais scopein (no Grego, olhar, examinar – o mesmo que está em microscópio, que o olha o pequeno, ou telescópio, que olha de longe). Os datiloscopistas – que alguns organismos preferem chamar de papiloscopistas – são os peritos na identificação das impressões digitais. Temos aqui uma interessante confirmação do fato de que nosso idioma (principalmente na linguagem técnico-científica) tem duas mães, o Grego e o Latim. Digital vem do Latim digito, que significa dedo, da mesma forma que o Grego datilo. Um dr. Frankenstein poderia juntar pedaços de palavras e engendrar um digitoscopista, mas isso iria contrariar a tendência genérica de formar compostos com elementos da mesma fonte (ou tudo Grego, ou tudo Latim). Por isso, chamamos de datiloscopista aquele que examina os dedos. deletar Falando de deletar, lembro que não podemos simplesmente enxotar os parentes distantes que vêm bater à porta de nossa casa. Professor Moreno: assistindo a um programa de TV, recebi a informação de que o verbo deletar, muito utilizado em Informática, viria do latim delere (excluir, eliminar). Esta palavra latina (e outras) teria sido incorporada ao idioma anglo-saxão no período em que o Império Romano ocupou a região da Bretanha. Isto tem algum fundamento? Cleber P. – Pinhalzinho (PR) Meu caro Cleber: o vocabulário do Inglês reparte-se, em proporção quase igual, entre três origens: a anglo-saxônica (é o núcleo do idioma; são as palavras mais usadas e, em sua maioria, monossilábicas); a francesa (vocábulos que entraram no idioma com a invasão dos normandos); e a latina (para um inglês ou um americano, as mais difíceis de usar; para nós, que somos latinos, as mais fáceis). Delere, do Latim (apagar), deu o delete do Inglês e o nosso indelével (uma tinta indelével não pode ser apagada; uma impressão indelével é uma impressão que jamais esqueceremos). Portanto, quando importamos deletar do Inglês, estamos apenas trazendo de volta para casa uma prima extraviada. elegantíssimo ou elegantérrimo? Quem fica muito magra fica magríssima, macérrima ou magérrima? E muito elegante? Elegantíssima ou elegantérrima? Caro Professor Moreno: outro dia, em conversa acontecida no horário do jantar, minha filha de quinze anos, estudante do Ensino Médio, aluna premiada no colégio, falou mais ou menos assim: fulano estava elegantíssimo; na mesma hora retruquei, dizendo que o correto seria elegantérrimo. Minha filha então argumentou que os dois eram corretos. Na mesma semana, na revista Marie Claire, li alguma coisa que parecia vir em defesa aos meus argumentos, num artigo que colocava a palavra elegantíssimo em itálico, como que em tom pejorativo, e depois fazia uma referência a outro elegantérrimo em tom mais enfático. As duas maneiras estão corretas? Se estão corretas, existe uma que seria mais elegante utilizar? Antecipadamente agradeço. Paulo G. – Palmas (TO) Meu caro Paulo: sua filha mereceu o prêmio de melhor estudante: ela é que está com a razão. O superlativo de elegante é elegantíssimo. Nosso idioma forma seus superlativos por meio de uma simples operação morfológica: [adjetivo + íssimo]; assim brotam, naturalmente, belíssimo, grandíssimo, duríssimo, caríssimo. Alguns (muito poucos – não chegam a 50, de 50.000) têm também outra forma alternativa, usando a forma latina. É o caso de doce (docíssimo e dulcíssimo), negro (negríssimo e nigérrimo), etc. (veja, mais abaixo, “superlativos eruditos”). Em algumas dessas formas latinas aparece o sufixo superlativo -érrimo, que vamos também encontrar em paupérrimo, macérrimo (incluo, lá no fim, uma discussão sobre esta palavra; não estava na pergunta, eu sei, mas não pude resistir), celebérrimo – todos, como você pode ver, com um inegável toque erudito. Acontece, Paulo, que certos setores da imprensa – principalmente ligados à moda e ao colunismo social – passaram a usar liberalmente este sufixo, criando formas como chiquérrimo, riquérrimo, elegantérrimo; já ouvi boazudérrima (e, para meu espanto, uma forma totalmente inusitada, que não existia nem no Latim: carésima, gostosésima, peruésima!). Não tenho nada contra elas; as palavras, como os seres humanos, têm direito de existir, mesmo que não sejam lá boa coisa. Até gosto de usar algumas quando quero fazer ironia ou brincadeira; só não vou empregá-las quando estiver falando ou escrevendo em tom mais formal ou profissional. Nesse sentido, sua pergunta final é extremamente adequada: “Se ambas estão corretas, existe uma que seria mais elegante utilizar?”. É isso aí, Paulo! Esse é o verdadeiro segredo de quem usa bem o Português: não se trata apenas de escolher entre uma forma correta e uma errada, mas sim escolher, entre duas formas corretas, a mais adequada para a situação. Elegantíssimo? Podemos usar sempre, em qualquer contexto, em qualquer nível de linguagem. Elegantérrimo? Só no salão de beleza, na crônica social, na conversa entre amigos. Um abraço, e não deixe de dizer à sua filha que ela é que estava certa. P. S.: Quanto ao macérrimo: eu disse que a composição vernácula de nossos superlativos é para a morte na cadeira elétrica. Aquela criação, artificial e doméstica, que os dicionários de Portugal não registram (a bem da verdade, contudo, devo assinalar que um importante filólogo da terra de Camões sugeriu, por sua vez, um não menos horrendo eletrocidar...), tem a desvantagem de produzir um verbo inviável, eletroplessar(?). Basta comparar eletrocuto, eletrocutas, eletrocuta, com eletroplesso, eletroplessas, eletroplessas, para ver qual dos dois é o sobrevivente. Você tem toda a razão, Marina: “Ele morreu eletroplessado” é de amargar! No Aurélio, os dois sentidos de eletrocussão, eletrocutar são registrados: tanto a execução penal quanto a simples morte por eletricidade. No Dicionário Médico, de Rodolpho Paciornik, vemos “Eletrocussão [De eletro + execução] – O ato de matar por meio de uma corrente elétrica. Poderá ser acidental ou no cumprimento de uma sentença legal de pena de morte”. O Dicionário da Língua Portuguesa, da Porto Editora, traz simplesmente “morte por meio da eletricidade”. O INSS e os organismos oficiais de controle de acidentes de trabalho falam só de eletrocussão. O que mais quer esse seu leitor? Grande coisa que eletrocutar, ao nascer, quisesse dizer “executar por descarga elétrica”; as palavras mudam e ampliam seu significado, e não adianta espernear contra isso. Ou esse leitor vai exigir que as rubricas voltem a ser feitas em tinta rubra (como eram, inicialmente), ou que o pontífice volte a cuidar das pontes (como na Roma Antiga), ou que se volte a bordar apenas nas bordas do tecido? esterçar Eis um termo muito útil para quem entende de automobilismo. Prezado Professor: quando criança (interior de Minas Gerais), eu ouvia muito a expressão “desterçar a roda de um carro” ou então “esterçar a roda de um carro”. Já constatei que nenhuma dessas duas palavras existe; já vi “terçar”. Será que lá em Uberlândia todos falavam erradamente essa palavra? Aguardo sua ajuda. Abraços José R. – Uberlândia (MG) Meu caro Régis: o que você quer dizer com “nenhuma dessas palavras existe”? Presumo que se traduza em “não estavam no dicionário em que procurei”, não é isso? Ora, lembre-se sempre de duas verdades básicas: (1) nenhum dicionário do mundo contém todas as palavras de uma língua e (2) se você ouvia essas expressões em Uberlândia, elas decididamente existiam (a não ser que sua feliz infância fosse povoada de alucinações auditivas). Claro que a palavra poderia ser escrita de outra forma, o que explicaria a pesquisa infrutífera. Lembro do leitor que reclamou não ter encontrado no Aurélio um vocábulo tão comum quanto *odômetro; ele deve ter ficado sem jeito quando eu o informei de que ele estava procurando no endereço errado: o vocábulo é hodômetro, e mora na letra H, não na letra O do amansa. Este, no entanto, não é o seu caso; a forma é esterçar, mesmo. É um vocábulo usado em automobilismo e, portanto, coisa bem moderna. A edição atual do Morais (1999) dá esterçar com o significado de “mover à direita e à esquerda o volante do automóvel”. Nosso dicionário campeão, o Houaiss, registra o mesmo significado, mas traz muitas outras informações, entre elas que o termo vem do italiano sterzare, vocábulo registrado em 1743, com o sentido primitivo de “fazer girar a carroça”, que adquiriu, no século XX, o sentido de girar o volante do automóvel. Uma rápida pesquisa nas páginas especializadas de automobilismo, na internet, mostra dezenas de exemplos do emprego de esterçar, esterçamento e esterçante. Não encontrei desesterçar, mas num lugar onde se esterça, por que também não se desesterça? Afinal, o prefixo des- pode ser acrescentado a qualquer verbo que admita, semanticamente, o inverso da ação: enterrar, desenterrar; colar, descolar; pregar, despregar; comer, descomer; etc. A maior parte do nosso léxico ligado ao automóvel proveio da França, de onde foram importados os primeiros carros que entraram no Brasil; esterçar, contudo, termo muito útil no automobilismo desportivo, veio da Itália, pátria das Ferraris, Maserattis e Lamborghinis. Além disso, o que justifica sua incorporação ao nosso idioma é a sua grande utilidade, pois serve de base para outros vocábulos muito empregados nos textos sobre segurança ao dirigir, como subesterçar e sobre-esterçar. Um carro subesterçante é o que tende a sair de frente, na curva, enquanto um sobre-esterçante tende a sair de traseira. Neste último caso, inclusive, o remédio que os peritos recomendam (e que os simples mortais como eu não têm reflexo nem coragem para empregar) é o contraesterço, que consiste em aumentar a pressão no acelerador e girar a direção mais ainda em direção à curva! Os conceitos de subesterço e sobre-esterço são amplamente empregados na literatura especializada mundial, onde aparecem como sottosterzo e sovrasterzo (Italiano) e understeering e oversteering (Inglês). Fique tranquilo, que esterçar está correto em Uberlândia e no mundo todo! gay ou guei? Aprenda a diferença entre gay, guei e homossexual. Caríssimo Professor: existe um sítio brasileiro na internet sobre a homossexualidade que insiste em usar o termo guei em vez de gay. Eu acho isso um puritanismo linguístico bastante nacionalista, bem extremista. Eu prefiro usar o termo reconhecido internacionalmente, e defendo o seu uso, pois acho que a palavra homossexual carrega um certo tom clínico nem sempre apropriado em meios sociais. Ademais, não sei de nenhuma palavra para gay em português que seja positiva, ou mesmo neutra – tudo me parece muito pejorativo. Seria um grande prazer receber uma resposta sua. Paul B. – Seattle, WA (EUA) Meu caro Paul: enquanto gay é a forma internacional (acho melhor, porque é instantaneamente reconhecida), guei é uma forma que acrescenta ao significado já tradicional um nítido posicionamento nacionalista, como você bem percebeu. Cada um se alinha entre as hostes que prefere, e a escolha das palavras ou da forma de grafá-las expressa também uma tomada de posição. Intitular-se gay é aderir a uma comunidade sem fronteiras; intitular-se guei é, além disso, reforçar uma identidade nacional e, o que pode ser o caso, assumir uma postura politizada. Quanto à escolha entre gay (ou guei) e homossexual, não há dúvida de que são conotativamente diferentes (embora denotativamente idênticas); a segunda é a única forma aceitável, a meu ver, em textos filosóficos ou psicanalíticos, enquanto a primeira, além de ser a única cabível no discurso do quotidiano, é mais coloquial e descontraída. Nos guias de viagens vais encontrar a rubrica “hotel gay”, “boate gay”, mas seria impensável “hotel homossexual”, “boate homossexual”. Quanto ao léxico do Português, parece que realmente ainda não temos nenhuma designação para gay que não tenha coloração pejorativa – nem mesmo no vocabulário da comunidade GLS. Você sabe muito bem, Paul, que a linguagem apenas espelha a cultura que lhe corresponde; se um dia ela mudar, o vocábulo aparecerá. herbicidar? Podemos dizer que suicídio está para suicidar assim como herbicida está para herbicidar? O Doutor mostra que não é bem assim que funciona a nossa língua. Olá, Professor: minha dúvida nasceu de uma conversa com um colega agrônomo que crê ser herbicidar um verbo que pode ser conjugado normalmente, descrevendo a ação de “matar ervas”. Eu lhe disse que nem todo substantivo pode se tornar verbo e que correria menos risco se falasse apenas “aplicar herbicida”. No entanto, precisamos de seu voto credenciado e decisivo à questão. Fábio M. – Santa Maria (RS) Prezado Fábio: obrigado pelo cumprimento; posso dar a vocês um voto credenciado, mas não decisivo, pois o saber humano é infinito em seu progresso. Como agrônomos, vocês dois devem se sentir em casa com a ideia de que a língua é um organismo vivo e, como tal, tende para a economia de energia e de recursos. Se fizesse sentido criarmos um herbicidar (do ponto de vista morfológico, até que é um verbo viável), por que não teríamos homicidar, genocidar, infanticidar, pesticidar, parricidar, etc.? Comparando custo e benefício, vocês verão que não vale o esforço – e o sistema linguístico parece ter chegado à mesma conclusão. É significativo que o único verbo a surgir autonomamente foi suicidar-se, certamente por todas as implicações trágicas e excepcionais que cercam o ato. Embarcar veio de barco, mas hoje podemos embarcar em trem, avião, carruagem, ônibus espacial e até numa fria. No tempo da Semana de Arte Moderna, os poetas (que não passavam, em sua maioria, de piadistas) usavam alegremente avionar, trenzar, etc. – mas nada disso vingou. Continuem a “aplicar o herbicida”, que é melhor. Aliás, notem que há uma disputa de significado aí nesse hipotético herbicidar: ele significaria “aplicar herbicida”, ou “matar ervas”? São coisas bem diferentes, como vocês, mais do que ninguém, devem saber. hétero, héteros S e motocicleta gerou a forma reduzida moto, heterossexual produziu a forma hétero. Como estou diariamente envolvido com dezenas de textos sobre gays e lésbicas, tendo em vista que realizo um trabalho específico nesta área, às vezes preciso referir-me às pessoas que não são gays e tenho que deixar isso claro no texto. Nestes casos, uso a palavra heterossexuais, mas todos temos de convir que é muito grande, principalmente se comparada com gay, e fica pedante e cansativa se for repetida duas ou três vezes num trecho pequeno de texto. Assim, é muito comum as pessoas se referirem aos não-gays simplesmente como héteros. Minha dúvida é sobre a existência desta palavra e sobre a grafia correta, pois não sei se deve levar acento e se posso flexioná-la em gênero e número como um adjetivo ou substantivo normal. Por exemplo: “Compareceram à Parada Gay milhares de gays e héteros, inclusive suas famílias”; “Eu achava que sua irmã fosse hétera, mas ela mesma me confirmou que é gay (lésbica)”. Pergunto: a palavra hétero existe? Marcelo A. – Rio de Janeiro Meu caro Marcelo: um dos mais recentes processos de formação de palavras no Português é o que chamamos de redução: no momento em que algum vocábulo complexo, geralmente composto de elementos eruditos e científicos, passa a fazer parte do vocabulário quotidiano, há uma forte tendência a reduzi-lo para um padrão prosódico mais confortável. Assim, a fotografia virou foto, o telefone virou fone, a motocicleta, depois de passar por motociclo, virou moto. Observe como o mesmo não ocorreu com a caligrafia ou a filmografia, com o interfone ou o xilofone, exatamente pela pequena ocorrência desses vocábulos na linguagem usual (ao menos até agora). A meu ver, este processo de redução, extremamente produtivo no Francês, será cada vez mais frequente em nosso idioma. O vocábulo heterossexual era perfeitamente manejável na linguagem técnica, na qual vivia recluso. No momento em que o termo entrou na língua do dia-a-dia, no entanto, passou a ser um trambolho prosódico, sofrendo a redução para hétero, proparoxítono, como você observou. A acentuação destes vocábulos encurtados segue a regra oficial; por isso, bíci (de bicicleta), ou deprê (de depressão). Não importa que a parte remanescente fosse, no vocábulo original, uma forma presa (geralmente elementos de origem grega ou latina) – ela agora passa a ser autônoma e independente. Já estamos acostumados a pornô, máxi, míni, múlti; o supermercado virou, em algumas regiões, o súper; a poliomielite já tornou-se pólio, e assim por diante – tudo isso no Português usual (mais ainda na linguagem específica de várias profissões; basta ouvir médicos conversando entre si para avaliar como o processo está mais adiantado). Plural ele vai ter, naturalmente: héteros, como fotos, motos, máxis, pólios. Quanto à flexão dele no feminino, acho que ainda preferimos o seu uso invariável (uma militante hétero). No entanto, não me surpreenderia se fosse crescendo a tendência a transformá-lo em biforme (hétero, maniático O Professor explica que nem todo maniático é um maníaco. Olá, Professor! Acabaram de me falar que a palavra maniático não existe. Fui conferir em alguns dicionários e realmente não a encontrei. Neles constava apenas o termo maníaco. Considerando também o uso corriqueiro da palavra maniático, pergunto se é errado usá-la, pois – ao menos para mim – ela parece ter um sentido mais específico, enquanto maníaco parece se estender a vários outros casos. Obrigada pela atenção. Uda S. – Brasília (DF) Minha cara Uda: realmente, o vocábulo maniático, que é largamente empregado no Espanhol, parece estar fazendo falta por aqui, pois serve para designar a pessoa que tem lá as suas manias, seus hábitos idiossincráticos, mas inofensivos, distinguindo-se, dessa forma, do maníaco, usado em sentido técnico pelos profissionais da área Psi. O problema desses dois vocábulos começa com a mãe deles, a palavra mania – literalmente, “loucura”, no Grego. Esse significado continua vivo na Medicina e na Psicologia; é por isso que se fala de uma psicose maníaco-depressiva e que se internam psicopatas no manicômio (foi pelas manias que o imorredouro Simão Bacamarte, de Machado de Assis, acabou enchendo a Casa Verde com seus parentes e vizinhos). Com o tempo, porém (o Tempo é o senhor da Linguagem – é bom não esquecer!), mania saiu do vocabulário exclusivamente científico e vulgarizou-se na linguagem corrente, passando a denominar apenas aqueles hábitos, esquisitos ou não, que fogem um pouco do usual: (1) Nada de mais em tomarmos café numa xícara; Fulano, contudo, tem a mania de só usar um copinho das Geléias Tabajara. (2) Ela tem a mania de folhear o jornal do fim para o começo. (3) Ele tem a mania de tirar o som da TV e ouvir a transmissão do jogo pelo rádio. Mesmo na linguagem usual há novas distinções a caminho. Maníaco é a forma preferida para “gostar de alguma coisa, ser louco por ela”: eu sou maníaco por doce de leite. Maniático vai entrando no Português para designar “aquele que é cheio de manias, cheio de nove horas”: ela desistiu do namoro porque ele era muito maniático. Se o vocábulo não está ainda em nossos dicionários, isso não quer dizer que ele não exista, Uda. Centenas de palavras que empregamos não estão lá também (o Houaiss tem um pouco mais de 220 mil registros, enquanto se estima o léxico do Português em quase 600 mil itens). A vantagem de “estar no dicionário” é que isso elimina qualquer necessidade de justificar o emprego de um vocábulo, ao passo que o uso dos que “ainda não estão” pode ser contestado por algum boi-corneta. Avalie bem a situação em que você vai empregar o termo, e mande bala. música, musicista Três diferentes leitores comparecem com a mesma dúvida: a mulher que faz música é uma música? A que nasce na Indonésia é uma indonésia? Caro Professor Moreno, minha dúvida é a seguinte: posso chamar uma médica especializada em clínica geral de “clínica geral fulana de tal”? Qual é a maneira certa? Obrigado e um abraço. Sérgio A. Professor Moreno, posso dizer que uma senhora é uma grande música? Note que me refiro a sua profissão. Francisco Galvão Professor: moro no Japão há muitos anos e casei com uma mulher nascida na Indonésia. Se a minha esposa é nascida na Indonésia, a sua nacionalidade é indonésia ou indonesiana? Não acho tão estranho chamar um homem de indonésio, mas sinto um certo incômodo em chamar minha mulher de indonésia, por coincidir com o nome do país. Gostaria de obter uma resposta pelas dificuldades que tenho em consultar livros especializados, estando aqui no Japão. Reginaldo – Togane (Japão) Prezados amigos: noto que todos ficaram em dúvida ao se depararem com estes femininos (clínica, música, indonésia, matemática, estatística, etc. ) que coincidem com o próprio nome da profissão, da instituição ou do lugar de origem. É verdade que, às vezes, o efeito é tão desagradável que nos faz hesitar. No caso da música, temos a feliz possibilidade de utilizar o sinônimo musicista, comum de dois gêneros, evitando assim frases esquisitas ou ambíguas como “esqueci aquela música”, “a música me deixou emocionado”, etc. No caso da clínica, não há substituto; o máximo que podemos fazer é inverter a ordem dos elementos, usando “Fulana de Tal, Clínica Geral”. Vejam a confusão que se estabelece entre a “Clínica Geral Mariazinha dos Anzóis” – nome que foi dado a uma instituição – com “a pneumologista Teresinha de Jesus e a clínica geral Mariazinha dos Anzóis” – o nome de duas profissionais da Medicina. Em situações como essa, o melhor é contornar. Quanto ao feminino indonésia, a dificuldade é a mesma que enfrentamos com o feminino armênia ou argentina. Meu caro Reginaldo, se você não quer dizer que sua esposa é indonésia (o que estaria correto), pode muito bem empregar indonesiana, já que o termo é bastante empregado e esta formação sufixal também é frequente na formação dos adjetivos gentílicos de nosso idioma. Lembro que o Brasil chama de canadense o que Portugal chama de canadiano; temos tanto argelino quanto argeliano, alasquense ou alasquiano, baiense e baiano, bósnio e bosniano, salvadorenho e salvatoriano. plúmbeo Veja o que plúmbeo, chumbo e prumo têm em comum. Dizemos que a água da chuva escoa pelo esgoto pluvial. Caro professor, este pluvial não viria de plúmbeo (de chumbo, da cor de chumbo, etc.)? Um abraço. Antônio A. – Palmas (TO) Meu caro Antônio: a sua sugestão, se não está correta – plúmbeo nada tem a ver com a pluvia do Latim, que significa “chuva” –, se não está correta, repito, acertou em cheio noutro par de dublês: plumbum evoluiu no Português para chumbo; quando foi reconstituída, deu o adjetivo plúmbeo, que significa “cor de chumbo”, e mais uma dúzia de derivados de uso científico (plumbagina, plumbago, etc.) Lembro que, no Inglês, o vocábulo para “encanamento hidráulico” é plumbing, e o sujeito que faz consertos até hoje se chama plumber, reminiscência do tempo em que os canos de água eram de ferro galvanizado, e as juntas tinham de ser soldadas com chumbo derretido. A única semelhança que existe entre plúmbeo e pluvial é a presença da conversão regular do grupo PL latino para o nosso CH: pluvia deu chuva; plaga deu chaga; plumbum deu chumbo; e assim por diante. emboramente, apenasmente Veja como se processa a formação dos advérbios em -mente em nossa língua e entenda por que esses dois vocábulos não passam de dinheiro falso. Caro Professor Moreno, nosso colega de trabalho insiste em dizer emboramente em suas frases. “Emboramente eu tenha feito aquilo...”. Essa palavra pode ser utilizada de tal maneira? Max Meu caro Max: isso é coisa do Odorico Paraguaçu, aquele inesquecível prefeito palavroso criado por Dias Gomes. É conhecido o processo pelo qual nosso idioma passou a formar advérbios e m -mente (processo esse, aliás, presente também nas outras línguas românicas): o substantivo mente (o mesmo de “mente humana”, de “poder da mente”) e o adjetivo que o antecedia (clara mente, serena mente), que vinham separados por um espaço em branco, terminaram formando um único vocábulo composto (como passatempo, girassol, etc.). Nesse composto, mente perdeu o seu significado originário e passou a indicar “maneira, modo”. Se um de nossos longínquos antepassados românicos entendia que “ele dispôs de seus bens serena mente” significava “com a mente serena”, nós já entendemos como “de maneira serena” – o que permitiu o acréscimo de mente a todo e qualquer adjetivo. Os falantes não têm mais consciência dessa composição, tomando os advérbios em -mente por vocábulos simples. Mesmo assim, é emocionante observar como levamos, de forma automática, o adjetivo para o feminino (quando ele tiver os dois gêneros), reencenando, sem perceber, um antiquíssimo ritual de concordância nominal: puro, puramente; glorioso, gloriosamente; Como você pode ver, todos os advérbios em -mente que existem (e também os que virão a existir) começam por um adjetivo. Essa é uma regra morfológica de nossa língua (não é uma regra dos gramáticos; é uma das leis internas do idioma). Formações como *emboramente, *apenasmente, etc. são de brincadeirinha. bonitíssimo Um cidadão alemão que está aprendendo nossa língua saiu-se com um bonitíssimo. Esta forma existe? É correto usar uma palavra que não está relacionada nos dicionários? Professor Moreno: tenho um primo na Alemanha tentando aprender a nossa língua portuguesa. Ele vem fazendo seu trabalho muito bem, mas outro dia, num museu, apontou para um quadro e disse: “Olhe! É bonitíssimo!”. Não soube explicar por que não era assim que se falava, mas a situação acabou me deixando na dúvida. Essa forma está muito errada mesmo? Todos os adjetivos têm um superlativo? Entendo que existe uma forma erudita para os superlativos e também a forma vernácula, mas os dicionários comuns (como o famoso Aurélio) só apresentam alguns superlativos menos óbvios como o boníssimo, mas não contêm o belíssimo (muito óbvio). Desta forma, como sei se o superlativo que estou propondo existe? Bonitíssimo não está lá. O que concluo? Bonitíssimo não existe, ou existe e é tão básico que nem se dão ao trabalho de publicar umas letrinhas a mais no dicionário só pra tranquilizar os menos informados?! Obrigada por sua atenção! Aline R. – Campinas (SP) Minha cara Aline: é claro que existe bonitíssimo. Os dicionários (de qualquer língua, por sinal) costumam deixar fora de suas listas todas aquelas formações que, de tão produtivas, são facilmente deduzidas pelo falante. Assim, em Português, quase não se registram (1) os diminutivos em -inho e -zinho, (2) os superlativos em -íssimo e (3) os advérbios em -mente. Por exemplo, não há necessidade de incluir pobrezinho, pobríssimo e pobremente, três formações automáticas a partir de pobre. É uma economia considerável de três entradas no dicionário – e não apenas de algumas letrinhas! Multiplique isso pelas dezenas de milhares de substantivos e adjetivos, e vai ver que vale a pena! Agora, uma coisa é certa: há padrões morfológicos que se aplicam a todos os vocábulos que existem e a todos os que virão a existir em nossa língua. Se um dia, hipoteticamente, for criado um adjetivo “calurdo”, no mesmo instante teremos a possibilidade de formar “calurdozinho”, “calurdíssimo” e “calurdamente” – porque essa é uma potencialidade de todo e qualquer adjetivo. O seu primo alemão apenas aplicou uma regra poderosíssima de formação de superlativo; se nós não gostamos de usar bonitíssimo, haverá muita gente que goste; esta forma está lá, sempre latente, esperando apenas que alguém precise dela para vir à tona, como foi o caso. Eu diria que ele está realmente começando a dominar o nosso idioma. malformação Veja por que malformação não é um vocábulo malformado. Caro Professor: sou médico e há muito tempo questiono a forma como uma palavra bastante usada no nosso meio para designar falhas no desenvolvimento de certos órgãos ou estruturas é grafada: é malformação (sem hífen e com L, como no inglês malformation), mau-formação (já que não é uma boa formação) ou má-formação (uma vez que o substantivo é feminino)? Procurei no meu dicionário (Celso Pedro Luft) e não encontrei a solução. Ricardo C. – Brasília (DF) Meu caro Ricardo, muita gente compartilha esta mesma dúvida. Malformação realmente parece uma estrutura inadequada, estranha aos padrões do nosso léxico, já que estaria unindo um advérbio (mal) a um substantivo (formação); muito mais aceitável, dizem eles, seria má- formação, à semelhança de má-vontade, má-fé, mau-humor; malformação não passaria de uma adaptação desajeitada do Inglês malformation (ou do Francês, que também o usa). Quem matou a charada foi nosso saudoso professor Luft, meu mestre e patrono desta página. O equívoco, ensinava ele, é tentar interpretar os elementos constitutivos de malformação em termos de classes de palavras; o mal- que temos aqui é um simples elemento formador, que atua num nível em que ainda não se distingue o adjetivo do advérbio. No Inglês, que não tem o vocábulo mal, este elemento é uma forma presa, um prefixo, presente também em malocclusion, malfunction, malnutrition, e foi assim que entrou no Português. Como em nosso idioma existe a oposição adjetivo/advérbio entre mau, má/mal, alguns falantes reanalisam o vocábulo e pretendem nele enxergar, como elemento inicial, o adjetivo mau, na forma feminina (má), concordando com formação. Do mesmo modo, nos ensina Luft, um francês também pode estranhar, no malformation do Francês, o fato de não estar ali o adjetivo mauvaise. Acontece – e aqui bate o ponto! – que malformation, no Francês, não é um composto [mal + formation], mas um substantivo derivado de um particípio: malformé + ation. É o mesmo que ocorre com malcriação, que não é um composto do advérbio mal mais o substantivo criação, mas sim um substantivo derivado do adjetivo malcriado, com o acréscimo do sufixo -ção. Diz Luft: “Vê-se que não tem cabimento a reformulação purista má-criação: evidentemente não se trata de criação que seja má, e sim de ação/qualidade (-ção) de malcriado”. Parece uma explicação ad hoc? Pois não é; são muito frequentes os exemplos desses substantivos formados pelo acréscimo de um sufixo a estruturas do tipo [advérbio+verbo]: malversação, maledicência, malevolência (e benevolência) , malfeitoria (e benfeitoria), maleficência (e beneficência). P.S.: Houaiss e Aurélio-Vivo (2a ed.) preferem malformação; o Aurélio-XXI, coerente na sua ruindade, volta atrás e prefere má-formação. invertibilis latino e esquecendo, estranhamente, a mesma possibilidade de alomorfia naquele idioma, como se vê na convivência de conversibilis e convertibilis. A ocorrência dessa dupla nas demais línguas românicas também é significativa: no Francês, usa-se apenas inversible; no Espanhol, temos uma preferência de invertible sobre inversible na razão de 2 por 1; no Italiano, quase só se emprega o invertibile. Aqui no Brasil, uma rápida passada pelo Google mostra uma divisão entre as duas formas, com razoável preferência por inversível. Assim é a linguagem humana, em toda sua fluidez e dinamicidade, meu caro professor. Qual das duas vai prevalecer? O uso dos técnicos e especialistas é que poderá responder a esta pergunta. No seu caso, trate de defender o inversível, que é boa moeda, contra a opinião de outros, que vão defender invertível; é desnecessário lembrar que esta polêmica só vai discutir preferências, pois nenhum dos lados poderá alegar que a sua é a forma correta. Abraço, e saudações acadêmicas. Prof. Moreno sorvetaria Temos sorveteria e sorvetaria, joalheria e joalharia. Por que não teríamos também doceria, doçaria? Caro Professor Moreno, aprendi que o sufixo -aria designa lugar, como em padaria, drogaria e doçaria. Então, por que falamos sorveteria e não sorvetaria? Seria errado ou pedante falar desse modo? Grata. Maíra F. – São Paulo (SP) Minha cara Maíra: estranho raciocínio esse seu: o fato do sufixo -aria designar lugar não impede que -eria (aliás, uma variante deste sufixo) faça o mesmo! Essas duas formas aparecem como opções em dezenas de palavras de nosso idioma: leiteria, leitaria; lavanderia, lavandaria; joalheria, joalharia; etc. A escolha é pessoal (geralmente, determinada também pelos hábitos da região onde vive o falante); no entanto, nota-se, no Brasil, uma acentuada preferência por -eria quando o sufixo se ligar a um substantivo que tem E como vogal temática: leiteria, sorveteria, uisqueria, joalheria, engraxateria. Se você disser sorvetaria – mesmo sendo uma forma lícita, registrada nos dicionários –, vai soar como o ET de Varginha. É a velha distinção entre o certo e o adequado. soteropolitano Quem nasce em Salvador, na Bahia, é salvadorense ou soteropolitano; salvadorenho é vinho de outra pipa. Prezado Professor: numa prova do colégio, perguntaram como se chama o brasileiro que nasce na capital da Bahia. Minha filha respondeu salvadorenho, mas a professora marcou errado, dizendo que é soteropolitano. Eu nunca ouvi falar nisso e acho que a menina está certa, mas não tenho instrução suficiente para discutir com a professora. O senhor concorda comigo? M. P. Camargo – São Carlos (SP) Meu prezado Camargo: a professora fez bem em recusar o salvadorenho, mas exagerou um pouco ao indicar a resposta apenas como soteropolitano (é esquisitíssimo, eu sei, mas existe). Algumas cidades têm dois gentílicos diferentes: o usual, formado pelos processos naturais de nosso idioma, e outro mais erudito, formado artificialmente com radicais do grego ou do latim. Assim, para São Luís, no Maranhão, temos são-luisense e ludovicense (de Ludovicus, nome do latim tardio que deu origem ao nosso Luís); para Salvador, na Bahia, temos salvadorense e soteropolitano (do grego soteros, “salvador”, mais polis, “cidade”; “Soterópolis”, portanto, seria Salvador com anel de doutor e diploma na parede). Em alguns casos, só existe a forma erudita: para o estado do Rio de Janeiro, usamos fluminense (do Latim flumen, “rio”, pois inicialmente se pensava que a Baía da Guanabara fosse um grande rio); para Três Corações, em Minas Gerais, usamos tricordiano (do Latim tri, “três”, mais cordis, “coração”). Como você pode ver, sua menina errou a resposta; ou melhor, errou de Salvador: salvadorenho é quem nasce na república de El Salvador, não na cidade da Bahia. Aliás, a maioria dos vocábulos que usam o sufixo -enho são gentílicos de origem espanhola: caraquenho (Caracas), caribenho (Caribe), cusquenho (Cusco), limenho (Lima), hondurenho (Honduras), panamenho (Panamá), etc. Agora, a professora, ao meu ver, ao lado de soteropolitano deveria ter indicado também a variante salvadorense, a única que eu uso. Abraço. Prof. Moreno trissesquicentenário O Professor se une às comemorações dos 450 anos de São Paulo e explica por que não temos uma palavra específica para a data. Prezado professor: precisamos de um vocábulo adequado para designar o 450º aniversário da cidade de São Paulo. Outro professor que consultamos disse que é trissesquicentenário, mas continuamos em dúvida e resolvemos consultar o senhor, que ainda parece ser de confiança. Jornal do Estudante – Redação – São Paulo Prezados amigos do Jornal do Estudante: fico satisfeito por gozar, entre vocês, de uma boa reputação; agrada-me essa aparência de ser confiável (embora aquele “ainda” esteja a me avisar que não deverá ser por muito tempo...). Entendo o problema de vocês: como ninguém quer andar falando por aí no quadringentésimo quinquagésimo aniversário da cidade, seria bom se tivéssemos um vocábulo para substituir toda essa traquitanda. No entanto, já vou avisando: percam as esperanças. O elemento sesqui (literalmente, “e meio” – do Latim semis, “meio”, mais que, “e”) costuma indicar uma vez e meia a medida especificada em X na fórmula [sesqui + x]. No Latim, sesquilibra era uma libra e meia; sesquimensis era um mês e meio; sesquiuncia era uma onça e meia. Por analogia, criou-se sesquicentenário, um centenário e meio. Ora, para indicar os 450 anos, criou-se artificialmente o mostrengo trissesquicentenário, que deveria ser decomposto, no cérebro do falante, como [três vezes um centenário e meio] – numa ingênua tentativa de transpor mecanismos da Matemática para o mundo infinitamente mais complexo que é a linguagem humana. Não é assim (graças aos deuses!) que as palavras funcionam. Os poucos lunáticos que tentaram defender essa palavra tiveram a felicidade de estar diante de uma conta redonda (450 = 150 x 3). E como ficam os 250, os 350, os 550, que não são múltiplos de 150? Nos EUA (sim, lá também há birutas de todo gênero), tentaram emplacar um demisesquicentennial (“meio sesquicentenário”) para designar os 75 anos! Felizmente, é sempre assim que acontece quando são propostas essas palavras inviáveis: a língua vem, cheira, não gosta e aí enterra. desinquieto Se desleal é antônimo de leal, como é que desinquieto é sinônimo de inquieto? Sempre me interessei pela formação das palavras e em uma delas não consegui chegar a conclusão alguma, apesar do dicionário Aurélio aceitá-la. Em Minas, costuma-se falar muito que uma criança está desinquieta, ou seja, agitada. O prefixo des-, sendo de negação, não indicaria que ela é uma criança não-inquieta, ou seja, quieta? Nilza F. – Araxá (MG) Prezada Nilza, nem sempre o des- vai ser prefixo de negação. Mesmo os gramáticos mais antigos, como Said Ali, já observavam que ele pode ser usado com sentido positivo – uma espécie de intensificador –, sem que o vocábulo mude o seu significado. Essas formas prefixadas são empregadas como meras variantes das formas simples: desinquieta (inquieta), desinfeliz (infeliz), desapartar (apartar), desabalar (abalar), desafastar (afastar). Sugiro-lhe uma olhadela, tanto no Houaiss quanto no Aurélio, no verbete des-; ambos registram e exemplificam o fenômeno. Isso não ocorre apenas com o “des-”; compare as dobradinhas soprar e assoprar, levantar e alevantar (bem no início de Os Lusíadas), mostrar e amostrar, baralhar e embaralhar, soalho e assoalho, renegar e arrenegar, esposar e desposar. Há uma teoria de que esses seriam “falsos prefixos”, já que são vazios de sentido (embora se perceba, em alguns casos, o efeito de reforço) e não chegam a formar um vocábulo novo. Se você prestar atenção, vai encontrar muitos outros exemplos. o -ipe de Sergipe Uma leitora quer saber o que significa o -ipe de Sergipe. Caro Professor: sou estudante de Letras; numa pesquisa que fizemos, fiquei intrigada com a quantidade de nomes de lugar que terminam em -ipe, como Cotejipe, Sergipe, Mutuípe, entre outros. Qual o significado deste morfema? Se possível, gostaria que o senhor me informasse o significado de Cotejipe, por exemplo. Renata M. – Salvador (BA) Prezada Renata: confesso que o Tupi é uma das lacunas da minha formação; minha faculdade de Letras jamais ofereceu esta língua como disciplina regular, e o pouco que conheço fui colhendo aqui e ali, ao longo de minhas leituras sobre o Português do Brasil Colonial. No entanto, os deuses me sorriram e acabei encontrando na internet o curso breve do Tupi do professor Eduardo de Almeida Navarro, da USP (http://www.filologia.org.br/viicnlf/anais/caderno03-02.html), “com base nos nomes de origem tupi da geografia e do Português do Brasil”. As lições são interessantíssimas; você não pode deixar de visitá-las. No que se refere à sua pergunta, nosso tupinólogo explica o seguinte: assim como nossas preposições vêm antes do nome regido (como o prefixo pre- já indica), o Tupi usa posposições, que vêm depois. Pe é uma dessas posposições, indicando “lugar onde ou para onde”. Além disso, as relações que o Português exprime com a preposição de (posse: o livro de Pedro; matéria: casa de tijolo) são indicadas, no idioma Tupi, com a simples inversão da ordem dos componentes, mais ou menos como faz o Inglês (Pedro livro, tijolo casa – como Peter’s book, brick house). Por isso, enquanto a estrutura do sintagma, em nosso idioma, é [no+rio+dos+siris], em Tupi fica [siris+rio+em] – o que, traduzido na língua lá deles, fica siri ‘y-pe (onde siri é o próprio, e ‘y é rio) = Sergipe (no rio dos siris). Adivinhe então, Renata, o que seria Tatuípe? Claro que é no “rio dos tatus”. E Cotejipe, que você perguntou especificamente? Nada menos que “no rio das cutias”. E Coruripe? Se pensarmos no sapo cururu, do poema de Manuel Bandeira, vamos nos dar conta de que é “no rio dos sapos”. Jaguaripe só pode ser “no rio das onças”, Jacuípe, “no rio dos jacus”, e assim por diante. Vale a pena passear pelas dez lições do professor; você vai ver como muitos nomes corriqueiros têm etimologias surpreendentes. Desta vez, sua consulta serviu para que nós dois – eu e você – aprendêssemos. descriminar Deborah, de São Paulo, gostaria de saber se é correto dizer descriminar e em que situações este verbo pode ser utilizado. Minha cara Deborah: descriminar significa “legalizar, retirar da classificação de crime”. Fala-se agora em descriminar a maconha, i. é, retirar a maconha da relação de substâncias cuja posse, venda, etc. é crime arrolado no Código Penal. Uns falam, nesse mesmo sentido, em descriminalizar, mas prefiro a forma mais curta, mesmo. perviedade Iseu C., de Curitiba (PR), precisa escrever, em um texto médico, um termo que exprima a qualidade de “estar pérvio”. O que seria preferível: perviedade ou perviabilidade? Meu caro Iseu: os substantivos terminados em -bilidade provêm de adjetivos em -vel: legível, legibilidade; permeável, permeabilidade; solúvel, solubilidade. Logo, pérvio não poderia formar um perviabilidade. Se óbvio dá obviedade, pérvio deve produzir perviedade. amêndoa e amendoim Bruno S., de Belo Horizonte (MG), quer saber se amêndoa e amendoim têm alguma relação. Será que uma palavra surgiu da outra? Meu caro Bruno: sim, amêndoa e amendoim têm relação entre si – mas dada pelos humanos. O amendoim é nativo da América, e os portugueses o conheceram através do nome indígena mandubi, mendubi ou mendubim. Por analogia com amêndoa, palavra europeia, formou-se o amendoim ou amendoí. guarda-noturno não é derivado Geraldo, professor de Português, pergunta se guarda-noturno é um vocábulo derivado. “Vi essa classificação numa gramática, mas compartilhei esta dúvida com outros três colegas – e nenhum de nós achou que essa era uma classificação correta.” Meu caro Geraldo: os vocábulos novos nascem, no Português, de duas maneiras básicas: (1) ou partimos de um radical e acrescentamos afixos (prefixos ou sufixos) – é a derivação; (2) ou juntamos dois vocábulos, cada um com seu radical próprio – é a composição. Guarda-noturno é formado por composição, unindo dois vocábulos completamente independentes (um deles, aliás – noturno – formado por derivação de noite). Não há como confundir os dois processos. viçosidade Vânia, de Ourinhos (MG), gostaria de saber se é correto usar a expressão viçosidade para a qualidade da pele viçosa. Prezada Vânia: a língua não precisou formar viçosidade porque já dispõe de um termo para designar a qualidade do que é viçoso: viço. Fala-se do “viço da pele”, como se fala do “viço das plantas”. É bem antiga e dispensa similares. continuação, continuidade Judival, de Brasília, quer saber se a frase correta é “...optamos pela continuação da greve” ou “...optamos pela continuidade da greve”. Meu caro Judival: a gente opta pela continuação da greve. Ela vai continuar; é isso. Não estamos falando de continuidade ou descontinuidade (se sofre ou não sofre interrupções, se é contínua ou descontínua). atingimento? Romy B., Técnica em Planejamento, escreve: “Trabalho com acompanhamento de projetos, verificando se as metas estão sendo atingidas. Posso dizer que acompanho o atingimento das metas? Está correto este termo?”. Prezada Romy: não vejo por que não existiria atingimento. Se de fingir e tingir nominalizamos para fingimento e tingimento, respectivamente, não há razão para bloquear o mesmo processo para o verbo atingir. Nunca esqueça que o léxico de uma língua é composto de todas as palavras que já foram formadas e registradas, mais todas aquelas que ele, potencialmente, virá a formar – respeitadas as regras da fonologia e da morfologia daquela língua. Uma pesquisa no Google revelou mais de 5.300 ocorrências para esta palavra – inclusive no texto de leis e outros documentos jurídicos; os dicionários atuais é que ainda não a registraram, como também não registraram centenas de vocábulos usuais. Pode usar sem risco. diminutivo de texto A leitora Adriana achava que o diminutivo de texto era textinho, mas disseram-lhe que seria testículo. Pergunta: “Isso é verdade ou um absurdo?”. Prezada Adriana: isso é uma velha piada do meu tempo de ginásio; o diminutivo de texto é textinho ou textozinho, como quiser, mas nunca testículo. Diminutivo de texto, aumentativo de tese – eu e meus colegas nos divertíamos com bobagens assim, mas tínhamos apenas doze anos. overdose, superdose Guillermo C., de São Carlos (SP), quer saber por que usam a palavra overdose em lugar de sobredose ou superdose. Over não seria uma palavra em Inglês que significa “sobre”? Caro Guillermo: sim, overdose vem do Inglês (na gíria dos viciados americanos, OD – lê-se /oudi/). Em Português seria superdose. Por que usam essa palavra aqui, em vez da nacional? Acho que não é por esnobismo ou por vontade de imitar o estrangeiro, dessa vez: é que superdose tem um sentido genérico demais para ser útil. Eu posso tomar uma superdose de vitamina C quando me sinto gripado, ou posso pedir ao homem do bar para servir uma superdose de uísque – mas não se trataria de uma overdose. Este vocábulo, sim, está indissociavelmente ligado às drogas pesadas. Além disso, overdose, ao contrário da outra, sempre sugere graves consequências médicas. Abraço. Prof. Moreno leitão é aumentativo? Roberto L., de Barreiras (BA), quer saber qual o motivo para chamar o filhote do porco de leitão. “Conforme o Aurélio, vem de leite + ão; ora, sendo o filhote, qual o motivo para usarmos o sufixo -ão, que é aumentativo, e não - inho?” Prezado Roberto: o final -ão de leitão não é o nosso tradicional indicador de aumentativo; neste caso, ele traz uma ideia intensificada de hábito, de ação frequente (como chorão, fujão). Pois você não estranhou que o filhote de um porco use o radical de leite? Evidentemente, o nome designa o animal que ainda está sendo amamentado – algo assim como o mamão (“que ainda mama”) que empregamos para os cordeiros. aumentativo de pão Arnaldo C., de São Paulo (SP), diz que há tempos procura o aumentativo de pão, mas não o encontra em lugar algum. Meu caro Arnaldo: é um aumentativo regular, em -[z]ão: pãozão, com dois tis (oposto ao pãozinho). colherinha ou colherzinha? Maria Eduarda, de São Paulo, ficou intrigada com o que ouviu em um programa de culinária na televisão: “O diminutivo de colher é colherinha ou colherzinha?” Prezada Maria Eduarda: como no caso de muitos substantivos, você pode tanto formar o diminutivo em -inho como em -zinho: colherzinha, colherinha; livrinho, livrozinho; menininho, meninozinho; papelzinho, papelinho (Portugal); mulherzinha, mulherinha (Portugal); nuazinha, nuinha – e assim por diante. onzentésimo? Khristofferson, de Macaé (RJ), pergunta sobre o numeral ordinal correspondente a 111. “Lendo a magnífica obra O Senhor dos Anéis, há alguns anos, me deparei com a expressão onzentésimo aniversário para representar o aniversário em que o personagem comemorava seus 111 anos. Esta expressão é válida?” Meu caro Khristofferson: isso é uma brincadeira da turma do Tolkien, e não deve ser levada a sério fora do mundo tolkieniano – tanto quanto elfos e duendes. Aqui fora, é um burocrático centésimo décimo primeiro. É mais ou menos como dizia o ascensorista de uma grande loja, de brincadeira, falando do 11º andar: Ônzimo: brinquedos, roupas infantis! formação de adjetivo Arlan S., do Rio de Janeiro, quer saber como adjetivar uma composição química destinada a revestir uma superfície: “Sugeriram-me composição revestível, mas não me satisfiz. No meu entender, a construção é dúbia, pois tanto pode se referir a uma composição que reveste algo como também a uma composição que aceita revestimento”. Meu caro Arlan: sua estranheza quanto a revestível é justificada. O sufixo -vel tem sentido passivo e geralmente indica “aquele que pode ser”: descartável, inteligível, dobrável. No seu caso, deveria ser usado um sufixo agentivo (“aquele que faz”); a forma que me parece mais viável seria composição revestidora (assim como verniz selador, película protetora). aumentativo de rio A leitora Solange M. percebeu que um assunto simples como os aumentativos e diminutivos também pode esconder armadilhas: “Pelo que entendi, consultando os dicionários, não há aumentativo para a palavra rio; estou certa?”. Prezada Solange: fazemos aumentativos ou diminutivos de qualquer substantivo; basta querer ou sentir necessidade. Já usei, e já vi várias vezes usado, o aumentativo riozão, assim como friozão, marzão, etc. Não se iluda com os dicionários: por razões de economia, deixam de registrar a maior parte dos aumentativos e dos diminutivos, já que eles obedecem a processos quase automáticos de formação e podem ser intuídos pelo falante. a cal Prezado Professor: quer dizer que cal, febre e moral, que eu tratava com uma certa distância, por pensar que fossem masculinos, de acordo com o dicionário são femininos? Posso então tratá-los com mais delicadeza, já que são, na verdade, elementos do sexo frágil? E agora, acredito nisso? Agradeço; um abraço. Jorge Augusto Meu caro Jorge Augusto: sua estranheza com relação ao vocábulo cal é compartilhada pela maioria dos brasileiros, que veem nele um masculino como sal ou mal; a tradição erudita, contudo, conserva o gênero no feminino, como era tradicionalmente. Ora, sabemos que o gênero dos substantivos que não estão ligados a seres vivos pode muitas vezes alterar-se ao longo da evolução do idioma; planeta e cometa eram femininos para Camões, mas hoje são masculinos. Em outros casos – como hélice, sucuri ou avestruz –, o gênero é flutuante, cabendo ao falante escolher. Acho que cal vai fazer parte deste último grupo. Com relação a moral, você estava perdendo metade do filme: existe A moral, conjunto de princípios éticos que rege uma comunidade (“O filme atenta contra a moral estabelecida”), e existe O moral, ânimo, estado de espírito (“O moral da seleção está cada vez mais baixo”) – nesse último caso, corresponde ao popular astral. Agora, febre? Ô, Jorge Augusto, é a primeira vez que vejo alguém tentar usar este vocábulo no masculino! Por acaso você nunca ouviu falar de febre terçã, de febre amarela, de febre aftosa – sempre com o adjetivo concordando no feminino? nenhuns Uma leitora brasileira que mora em Portugal estranha o emprego dos plurais bastantes e nenhuns. Prezado Professor: sou paulistana, mas moro em Portugal há dois anos. Estranho muito quando as pessoas falam “Há bastantes carros nas ruas?”; “Não, não há nenhuns carros nas ruas”. Como pode existir plural neste tipo de advérbio? O meu chefe, que é português, já teimou comigo que sou eu quem fala errado! Ora, que eu saiba é redundante colocar plural nessas palavras que expressam quantidade, mas que não servem para quantificar em números alguma coisa. Ficaria melhor dizer muitos ou nenhum. Estou certa? Patrícia C. – Porto (Portugal) Minha cara Patrícia: sinto dizer, mas seus colegas estão corretos. Bastante, na frase que você menciona, não é advérbio (se fosse, realmente seria invariável), mas um pronome indefinido. Nós também o usamos assim, com uma única diferença: no Brasil, ele adquire o sentido de “suficiente”: “Tenho razões bastantes para concluir que...”. Lembro que aqui se costuma usar, na linguagem coloquial, um bastante invariável que substituiria “muito, muitos, muita, muitas”: “coma bastante fruta”, “tenho bastante livros”, “comprei bastante revistas”. Nossa gramática formal, no entanto, condena essa esquisita substituição de um pronome indefinido variável (muito) por um advérbio. O nenhuns que você estranha é o polo oposto de alguns; mais uma vez, não se trata de um advérbio, e sim de outro pronome indefinido. Confesso que soa muito mal, mas não há nada de errado aqui; ocorre apenas que os brasileiros não empregam este pronome no plural. “Conheço alguns restaurantes” é normal, mas uma frase como “não conheço nenhuns restaurantes” soa esquisito para nós, que preferimos (como você mesma o faz) utilizar simplesmente o singular (“não conheço nenhum restaurante”). Posso mencionar vários escritores que usaram esse plural: Alexandre Herculano, Capistrano de Abreu, José Veríssimo, Júlio Dinis, Rui Barbosa, Euclides da Cunha (“O coronel Carlos Teles, em carta dirigida à imprensa, afirmou de maneira clara o número reduzido de jagunços – duzentos homens válidos, talvez sem recursos nenhuns” – Os Sertões), Eça de Queirós (“Ega afirmou logo que em poemas nenhuns corria, como nos do Alencar, uma tão bela veia lírica” – Os Maias), o grande Machado de Assis (“Simples era a mobília, nenhuns adornos, uma estante de jacarandá, com livros grossos in-quarto e in-fólio; uma secretária, duas cadeiras de repouso e pouco mais” – Helena). Hoje, no entanto, nenhuns deixou de fazer parte da língua literária do Brasil; ao que parece, contudo, continua vivo aí em Portugal. Ambas as formas estão corretas; é apenas questão de uso e de preferência. ela foi o segundo juiz Ao contrário do que muita gente pensa, o Português sempre privilegiou o gênero feminino. Prezado Professor: um jornal de destaque em nossa capital estampou a seguinte manchete: “Denise Carvalho foi o segundo juiz afastado do cargo pelo TJ em razão de investigação envolvendo decisão contra a Petrobras”. O substantivo juiz, no masculino, está empregado corretamente para se referir à juíza? Marcela A. – Goiânia (GO) Minha cara Marcela: o jornal está corretíssimo. Como o gênero feminino sempre exclui o masculino, se escrevessem que ela foi a segunda juíza afastada do cargo, estariam afirmando que duas juízas tinham sido afastadas. Como, ao que parece, não foi o caso, o segundo juiz engloba o masculino e o feminino. Esta é uma das características do nosso idioma que vem sendo desconsiderada por muitas feministas: ele é muito menos machista do que se pensa. Enquanto, para a Psicologia, a mulher pertence ao gênero não-marcado, ocorre exatamente o inverso no Português. Mattoso Câmara Jr. há muito matou a charada: a marca do plural é o -S, enquanto o singular se assinala pela ausência desse -S; a marca do feminino é o -A, enquanto o masculino se assinala pela ausência desse -A. Ninguém duvida que aluna, mestra e cantora sejam femininos, porque ali está a marca; ninguém duvida que aluno, mestre e cantor sejam masculinos, porque ali NÃO está a marca. Por isso, sempre que queremos ser genéricos, podemos usar o singular, masculino (número e gênero não- marcados): “O brasileiro trabalha mais do que se pensa” (entenda-se: todos). Exatamente por perceber essa indefinição do gênero masculino das palavras é que as pessoas sentem a necessidade de especificar quando mais de um sexo estiver envolvido: “Tenho três filhos homens”, “Tenho três filhos: um homem e duas mulheres” – o que não acontece com “Tenho três filhas”. Essa inconfundível marca feminina exclui automaticamente todos os homens. Se um jornal publicar que “Maria foi a vereadora mais votada na cidade”, ele estará dizendo que, entre as vereadoras eleitas, Maria foi a mais votada. Agora, se estampar que “Maria foi o vereador mais votado na cidade”, estará dizendo que Maria obteve a maior votação entre todos os vereadores (homens e mulheres). softwares O Professor adverte: as palavras estrangeiras que ingressam em nosso idioma devem receber tratamento idêntico às nacionais. Olá, Professor! Trabalho em uma agência de publicidade, e um cliente de tecnologia disse que não existe o plural da palavra software. Consultei o Houaiss e ele não diz nada sobre isso. O cliente está correto? Obrigada. Carolina G. – São Paulo (SP) Prezada Carolina: no Inglês culto formal, hardware e software ainda são considerados substantivos não-contáveis (mass nouns), o que faz com que o emprego do plural seja desaconselhado pela maioria dos gramáticos daquele idioma. Para o resto das línguas do planeta, contudo, a opinião dos gramáticos do Inglês vale menos que um tostão furado, e os dois vocábulos, que entraram no vocabulário tecnológico de dezenas de países, passaram por uma evidente evolução. Inicialmente, quando software designava a parte não-física da máquina (como na velha piada: “Software é o que a gente xinga, hardware é o que a gente chuta”), era comum usar-se este vocábulo apenas no singular; no entanto, no momento em que ele passou também a significar “programa de computador”, o plural passou a ser empregado largamente. Só para você ter uma ideia, a forma pluralizada softwares – abra bem os olhos! – bateu 2.140.000 ocorrências no Google; quase todas essas páginas são escritas em países cuja língua nativa usa o S como marca do plural (Português, Francês, Espanhol, por exemplo) ou em países cuja língua, apesar de marcar seus plurais de outra forma, usa o S para os plurais estrangeiros (como o Alemão e o Italiano). É natural que assim aconteça, porque os falantes de todos esses idiomas tratam software como um substantivo normal, desconhecendo a classificação de “não-contáveis” que a gramática do Inglês atribui a ele. Quando os vocábulos migram, eles acabam, assim como as pessoas, submetendo-se às leis do seu novo país. Não importa que gramáticos ingleses considerem e-mail como um não-contável, porque o mundo inteiro envia e recebe e-mails (no plural); não importa que, em Inglês, o plural de mouse seja mice; para nós, é mouses mesmo. E tem mais: como a internet é uma estrada que vai e vem, os próprios falantes do Inglês começam a aceitar esses plurais – a julgar pelo considerável número de artigos americanos, ingleses e canadenses que condenam a sua adoção (e que não seriam escritos se não houvesse simpatia pelas novas formas). A forma mouses, aliás, vem recebendo a preferência dos usuários técnicos e já está registrada num dicionário importante como é o American Heritage. Prezada Carolina: o cliente disse que esse plural “não existe”? Ele não entende nada de linguagem. Ele poderia alegar, isso sim, que o singular é a forma recomendada no Inglês culto, ou também no uso técnico, quando estiver em jogo a oposição conceptual “hardware x software”. Aqui, no entanto, é diferente. cenoura ou cenoira Uma leitora pergunta o que é cenoira; ora, diz o Professor, é aquilo que os coelhos comem em Portugal. Prezado Professor, gostaria que o senhor me ajudasse, respondendo o que significa a palavra cenoira. Lydianne – João Pessoa (PB) Minha cara Lydianne: a cenoira é a comida preferida dos coelhos em algumas regiões de Portugal. Em muitos vocábulos de nosso idioma, o ditongo OU alterna (ou alternou) com OI; o Formulário Ortográfico de 1943 considera esse um fato normal e cita, como exemplos, balouçar e baloiçar, calouro e caloiro, dourar e doirar. Embora essa alternância ocorra principalmente antes de R (touro, toiro; tesoura, tesoira; ceroula, ceroila), ela já se manifestou em pares como dois, dous; noite, noute; biscoito, biscouto; coisa, cousa; ouço, oiço. Em todos os pares que mencionei, há uma tendência geral do Português Brasileiro em escolher a primeira variante, enquanto a segunda ainda aparece, com alguma frequência, no Português Europeu (chamamos assim o Português falado em Portugal). Em certos casos, a hesitação ainda vive entre nós: podemos ouvir, aqui mesmo no Brasil, toucinho e toicinho, louro e loiro. Isso é normal; as duas variantes convivem por algum tempo, até que uma delas tenha a preferência estabilizada pelo uso. O tempo vai alterando algumas formas e fixando outras; Castro Alves, na 1ª edição de O Navio Negreiro, em 1868, assim escreveu: ‘Stamos em pleno mar... Doudo no espaço Brinca o luar – doirada borboleta E as vagas após ele correm... cansam Como turba de infantes inquieta. Se trocássemos, numa edição moderna, doudo por doido e doirada por dourada, a alteração passaria despercebida pela quase totalidade dos leitores. Aliás, muitas editoras têm feito isso, considerando que essa atualização não desfigura a sonoridade dos versos originais, mas isso é discussão fora da minha horta; deixo-a para os doutores em Literatura. degrais? Uma jovem baianinha estranha o cartaz de sua escola que proíbe os alunos de sentar nos *degrais. Prezado Professor: há um cartaz em nossa escola que diz “Não sente nos degrais”. Não deveria ser degraus? Obrigada por responder. Paula (10 anos) – Salvador (BA) Minha prezada Paula, tão jovem e já tão atenta para os problemas de nosso idioma: você tem toda a razão. O plural de degrau é degraus, como o de todos os vocábulos terminados no ditongo AU – mingau, mingaus; luau, luaus. O que deve ter atrapalhado a pessoa que escreveu essa preciosidade de cartaz é a semelhança fonética com os vocábulos terminados em AL, que fazem o plural em AIS: jornal, jornais; quintal, quintais. A mesma confusão às vezes se manifesta entre os terminados em ÉU e os terminados em EL: chapéu, chapéus; escarcéu, escarcéus; ilhéu, ilhéus; mas papel, papéis; tonel, tonéis. Na cidade em que nasci, corria uma anedota sobre um famoso prefeito que, apesar de honesto e competente, tinha pouco ou quase nenhum estudo e vivia tropeçando da Língua Portuguesa. Certa feita, ao discursar de improviso na recepção de três atletas locais que tinham sido premiados em diferentes modalidades olímpicas, percebeu que não sabia se o plural de troféu era troféus ou troféis (note, Paulinha, que ele já estava ficando mais sabido, pois ao menos deu-se conta da dificuldade). Fez então o que fazemos muitas vezes quando encontramos um desses “recifes” gramaticais – desviou e passou pelo lado: “Eu ia saudar esses atletas pelo troféu conquistado, mas agora me dou conta que não foi só um, foram três!”. Seria mais ou menos como o cartaz do colégio dizer: “Não sente no degrau – em nenhum deles!”. masculino de formiga Cada formiga tem seu formigo? Drummond diz que a foca tem o seu foco, e a tamanduá tem o seu tamanduó. Prezado Professor, gostaria de saber qual é o masculino de formiga, se é formigão ou formigo, ou se esta palavra possui gênero comum-de-dois. Juni C. – Uberaba (MG) Meu caro Juni: formiga é como girafa, onça, pantera – só tem um gênero (feminino), embora possa designar animais de ambos os sexos; é o que a Gramática chama de epicenos. Se for preciso distinguir entre os sexos biológicos, usamos macho e fêmea. Olhe, quanto aos mamíferos, tenho certeza de que existem os dois sexos; no caso da formiga, não estou tão certo, porque, entre os insetos, as coisas nem sempre são tão bipolares assim. Tomemos a abelha como exemplo: o macho da espécie é raro e tem outra palavra para designá-lo, o zangão. Portanto, abelha só tem masculino do ponto de vista biológico, mas não do ponto de vista gramatical. Com a formiga ocorre o mesmo: não tem masculino (a palavra); quanto à Biologia, temos de consultar um especialista. P.S.: Assaz interessante: o Português não formou o masculino de formiga porque esse não é um traço que interesse à nossa cultura. Ou melhor: não interessava; começa a haver sinais do contrário. Falando no filme AntZ – aqui traduzido para FormiguinhaZ –, um crítico de jornal diz que “o filme conta a história de uma formiga, na verdade um formigo operário neurótico, chamado Z-4195, que tenta se libertar da sociedade totalitária”. Outro crítico, falando da personagem, diz que “ela, ou melhor, ele, visto que se trata de um senhor formigo, anseia por se libertar das suas obrigações como trabalhador”. Mais adiante: “No bar da colônia AntZ ouve, da boca de um velho formigo, uma história incrível”. Acho que você vai concordar que o masculino, nesses exemplos, apareceu com aquela naturalidade típica do que é necessário. Despeço-me com um precioso fragmento do Carlos Drummond, extraído da crônica A Solidão do Girafo: “Quando já não se sabe ao certo quem é varão, quem é varoa, pelo menos se saiba distinguir o pavão da pavoa ou pavona, o elefanto da elefanta, o sabiau da sabiá, o cisno da cisna, o tigro da tigra, em vez de nos socorrermos do aditamento macho e fêmea. Se distinguimos gato e gata, por que não foco e foca, tamanduó e tamanduá, tatu e tatua?” A língua agradece aos poetas; ninguém a entende como eles. A nós, só cabe admirá-los e morrer de inveja. membra Na nossa tradição, membro sempre foi exclusivamente masculino; com a virada do século, contudo, começa a aparecer a sua versão feminina (ô frasezinha que ficou ambígua!). Caro Professor: na contracapa da obra A Prova por Indícios no Processo Penal, da Editora Saraiva, está consignado que a sua autora é membra do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais. Pergunto: o feminino de membro é mesmo membra? Luiz Carlos – São José dos Campos (SP) Meu caro Luiz Carlos: se eu seguisse o meu primeiro impulso e baseasse minha resposta no que eu sempre encontrei na bibliografia tradicional, eu diria que essa foi uma escorregada que deu a Saraiva, geralmente tão rigorosa na sua editoração. Sempre dissemos que membro, ídolo, vítima, carrasco, monstro, etc. são vocábulos que, embora se apliquem a indivíduos de ambos (só dois?) sexos, não têm flexão de gênero e nem ao menos aceitam que essa flexão seja assinalada pela troca do artigo que os antecede (com fazemos, por exemplo, com o/a estudante, o/a contratante, os famosos substantivos comuns-de-dois). “Ele é uma vítima da sociedade”, “Michelle Pfeifer é meu ídolo”, “a mulher dele é um monstro”, “ela é um membro destacado no Parlamento”. Portanto, “ela é *uma membro” ou, pior “*uma membra”, como você encontrou no livro, seria classificado por mim como um erro de fazer chorar bacalhau em porta de venda. No entanto, o exemplo que você mandou fez com que eu desconfiasse de que algo estava mudando. Dei então uma percorrida na internet e encontrei mais de duzentos exemplos do emprego de membra. É verdade que nenhum deles vem de autor respeitado, mas isso me obriga a repensar o problema. Parece que o vocábulo está começando a ser flexionado normalmente por uma faixa razoável de falantes, assim como já começa a aparecer, aqui e ali, uma monstra eventual. Um desses implacáveis “juízes do idioma” que andam por aí poderia dizer que é por pura ignorância; quem conhece um pouco de Linguística, contudo, não pode dizer um absurdo desses. Quando milhares de falantes começam a usar uma forma que nos parece desviante, basta procurar um pouquinho e vamos encontrar suas motivações, não para concordar com elas e segui-las, mas para entender o que realmente está acontecendo. Pensando sobre o assunto, confesso que a tendência a dar um feminino para membro facilita – e muito – a sua inserção sintática. Permite a confortável concordância no feminino de frases do tipo “ela é a mais idosa membra de nossa comunidade”, “Fulana é uma antiga membra – e bem ativa – do Grupo de Apoio do Paciente”. Eu não gosto disso nem um pouquinho, mas não posso culpar quem prefira escrever desse modo, pois entendo que para eles soa melhor assim do que “ela é o mais idoso membro de nossa comunidade” ou “Fulana é um antigo membro – e bem ativo – do Grupo de Apoio”. Já conhecemos o desfecho: pode demorar dez anos, pode demorar cinquenta anos, mas o vocábulo se encaminha para se tornar biforme (membro, membra). As pessoas com mais formação e mais leitura vão continuar estranhando esse feminino, mas ele vai ter de ser aceito como alternativa. A mim, particularmente, ele sempre soou e sempre soará muito mal; ele me lembra um pequeno cineclube de que participei, na universidade, que era formado de onze homens e uma só mulher – à qual nos referíamos, com um misto de ironia e admiração, como “a membra”. O que era piada, hoje está deixando de ser. plural de papai noel Veja a diferença entre o Papai Noel verdadeiro e os papais-noéis que andam por aí. Professor Moreno, Papai Noel tem plural? Nara D. – Goiânia (GO) Minha prezada Nara: olha, vamos simplificar: o plural é papais-noéis; o uso do hífen fica à escolha do freguês, já que não existe regra para casos como este. Agora, distingo: temos um personagem mágico, que mora em algum lugar do Ártico, que cruza o céu com seu trenó e deveria trazer presentes para as crianças boazinhas: este é o Papai Noel, primeiro e único (ou isso só se diz para o Rei Momo?). No mundo mitológico, ele tem domicílio, tem ocupação, tem empregados (os gnomos), dirige um veículo de tração animal e não me espantaria se tivesse CPF. É, em suma, um cidadão, e as maiúsculas do seu nome são as mesmas do meu ou do nosso nome; Noel aqui funciona como um sobrenome de origem francesa. Por outro lado, temos milhares de mortais que usam – por prazer, por masoquismo ou por necessidade de ganhar a vida – as roupas e as barbas tradicionais que atribuímos ao chamado “bom velhinho”. São os papais-noéis. É mais ou menos como, mutatis mutandis, o Diabo (outro cidadão do mundo dos mitos) e os diabos, o Saci e os sacis, o Bicho Papão e os bichos-papões. perca? Ficar fazendo algo inútil é uma perca ou uma perda de tempo? Não perca esta explicação. Caro Professor, dias atrás um colega de trabalho me corrigiu por eu ter falado “Isto é uma perda de tempo!”, dizendo ele que o correto é “Isto é uma perca de tempo!”. Afinal, o que está correto? Márcia – Curitiba (PR) Minha cara Márcia: ser corrigido quando a gente fala já é ruim, mas ser corrigido por um boi- corneta, que não sabe o que diz, ainda é bem pior! Claro que é perda de tempo! Esses substantivos deverbais (nascidos a partir de um verbo) são formados pelo acréscimo de um elemento terminal (as vogais A, E ou O) ao radical do verbo: comprar, compra; vender, venda; trocar, troca; resgatar, resgate; estudar, estudo. E, como não poderia deixar de ser, perder, perda. A forma perca existe, sim, mas é o presente do subjuntivo de perder: “Ele não quer que eu perca o prazo”. Mostre esta frase ao seu colega para que ele aprenda: “O chefe não quer que eu perca horas preciosas arrumando os arquivos; ele disse que isso é pura perda de tempo”. afegão, afegãos Um leitor manda bombásticas saudações e pergunta qual o plural de afegão. Caro Professor: após acompanhar atentamente os últimos acontecimentos, e profundamente sensibilizado com o povo afegão, gostaria de saber qual é o plural correto de afegão. E o plural de talibã? Obrigado, e lembranças bombásticas. Pedro F. – Rio de Janeiro Meu caro Pedro: o plural dos nomes terminados em -ão não é coisa muito simples, como você bem sabe. Hoje temos uma só forma no singular (leÃO, irmÃO, alemÃO) e três formas no plural (leÕES, irmÃOS, alemÃES). Sua pergunta (e a de muitos outros leitores) pode ser traduzida do seguinte modo: qual dessas três terminações (-ões, -ãos ou -ães) vai ser usada no plural de afegão? Como é que se escolhe entre elas? Quando as gramáticas registram a tripla possibilidade para o plural de vilão (vilões, vilães e vilãos) ou para aldeão (aldeões, aldeães e aldeãos), estão apenas refletindo o estado de hesitação de nossa língua, que teve paralisado, pela difusão do texto escrito, um movimento em direção a uma forma única de plural (-ões, sem dúvida alguma). Essa seria a situação ideal: ou teríamos três singulares, correspondendo aos três plurais diferentes, ou apenas um singular e apenas um plural. No entanto, ficamos assim suspensos no meio da evolução, com um único singular e três plurais diferentes, e temos de conviver com isso. Todos os aumentativos e todos os novos vocábulos em -ão que ingressam no Português fazem o plural em - ões, o que o credencia, estatisticamente, como o plural canônico para os vocábulos com essa terminação. Os outros (poucos) que escolhem -ãos e -ães são memorizados pelos falantes (mão, mãos; irmão, irmãos; pão, pães), isso quando não terminam também aderindo ao genérico -ões: é o caso de corrimão, cujo plural original é corrimãos (já que vem de mão), mas que aparece também, em todos os dicionários, com a possibilidade de um corrimões. Nesses casos, o que nos ajuda mesmo, meu caro Pedro, é olhar por cima do muro e ver o que nosso vizinho de sempre, o Espanhol, anda fazendo, pois lá existem três singulares para três plurais: hermano, hermanos; leon, leones; alemán, alemanes! A boa notícia é que podemos aproveitar isso para nossa língua (há estudos sérios sobre o assunto, mas vou simplificar): -ano, -anos do Espanhol correspondem aos nossos -ão, -ãos (hermano, hermanos: irmão, irmãos); -on, -ones, aos nossos -ão, -ões (leon, leones: leão, leões); e -án, -anes, aos nossos -ão, -ães (alemán, alemanes: alemão, alemães). Pode haver um ou outro vocábulo desviante, mas em geral o sistema funciona direitinho. Vamos ao plural de afegão: a maioria dos falantes do Português prefere afegãos; uma pequena minoria opta pela variante afegães, que não pode ser condenada, mas que vai certamente desaparecer com o passar do tempo. Se visitarmos o Espanhol, encontramos afgano, afganos, uma plural de real Qual é o plural de nossa moeda? É vinte reais, vinte réis ou vamos de vinte real mesmo? Caro Professor: estive estudando gramática no livro do professor Hildebrando, e ele diz que o plural de real (moeda) é réis. Achei muito estranho. Será que todos escrevemos errado quando escrevemos dois reais num cheque de R$ 2 ou deveríamos escrever dois réis? Obrigado. Walter L. – Biguaçu (SC) Meu caro Walter, não li tudo o que o professor Hildebrando André escreveu, mas tenho certeza de que ele não deve ter dito exatamente isso. Embora eu discorde de muitas de suas posições teóricas, ele é um gramático escolar sensato e estudioso. Quando a nossa atual moeda foi instituída, em 1994, houve uma breve discussão sobre qual seria o seu plural; os mais afobadinhos encontraram “real – plural réis” nos dicionários e vieram, triunfantes, corrigir os que começavam a dizer reais. Em pouco tempo, contudo, esclarecia-se o equívoco: réis era o plural de um real virtual (“moeda ideal”, diz o dicionário do Morais), valor apenas de referência; o verdadeiro real, antiga moeda portuguesa, fazia mesmo o plural reais (como, aliás, qualquer substantivo terminado em -al). O velho Morais (minha edição é de 1813) é bem rico em detalhes: explica-nos que havia os “reais brancos del-Rei D. Duarte; eram de cobre com estanho, vinte deles faziam uma libra e valiam 36 réis”; “os reais pretos, de cobre sem liga”; e “os reais de prata”. Diga-se de passagem que o verbete “real” é bem extenso, mostrando o esforço do dicionarista em explicar, com os conceitos econômicos da época, os valores relativos entre as diferentes moedas cunhadas pelos sucessivos reis de Portugal. Portanto, caro Walter, continue tranquilamente a usar reais para o plural de nossa moeda – como vimos fazendo desde 1994. Réis é outra coisa muito diferente. Curioso é observar dois usos populares: (1) Mil-réis passou a designar qualquer unidade do inconstante dinheirinho brasileiro; eu já usei mil-réis (o nosso simpático merréis, avô da merreca) para falar do cruzeiro, do cruzado, do cruzado-novo, do cruzeiro-novo e agora do real. Se um dia – que os deuses não permitam! – surgir o real-novo, com certeza lá estarei dizendo “Custa dois mil-réis”. (2) Tem gente que simplesmente não usa o plural da moeda e prefere dizer, sem enrubescer, “vinte real”, assim como os camelôs falam de “dez dólar”. Aí já é demais! pluralia tantum Caro Professor, gostaria de saber se existe a grafia no singular das palavras parabéns, condolências, núpcias, pêsames, etc. – ou estas palavras são grafadas somente no plural? Marli Z. – Criciúma (SC) Minha cara Marli: existem, em nosso idioma, muitos vocábulos que são usados exclusivamente no plural, conhecidos como pluralia tantum – expressão tradicional da gramática latina que significa “apenas plurais”. Não são tão poucos quanto se pensa; entre os mais conhecidos, lembro afazeres, anais, arredores, bodas, condolências, confins, esponsais, fezes, exéquias, núpcias, parabéns, pêsames, primícias, trevas, víveres. Como o S que marca o plural é sempre acrescentado a uma forma anterior, não-marcada, não há dúvida de que todos eles têm (ou tiveram) uma forma singular, que, por razões semânticas, simplesmente deixou de ser empregada. Em textos mais antigos vamos encontrar, aqui e ali, alguma ocorrência de pêsame, fez, boda, etc., uso logo abandonado. Vieira, em seus Sermões (séc. XVII), usa parabém por toda parte, inclusive fazendo um jogo de palavras tão ao gosto do nosso gênio da língua: “Alcançaram o que pediram, aceitaram muito contentes o parabém do despacho, mas o despacho não era para bem”. Certamente vamos encontrar outros exemplos em escritores da mesma época, mas isso não deve obscurecer o fato, hoje incontestável, de que esses vocábulos devem ficar mesmo é no plural. Para fins práticos, devem ser considerados como aquelas cadeias de montanhas, que também sugerem a existência de um singular primitivo, hoje desconhecido: os Alpes, os Andes e os Pirineus. poeta ou poetisa Cecília Meireles e Adélia Prado são duas poetisas brasileiras, ou posso dizer que são duas poetas? Caro Professor: sempre ouvi falar em poetisa, mas acredito que o certo seria a poeta. Estou certo? Gilson S. Caro Gilson: o feminino de poeta sempre tinha sido poetisa; contudo, essa forma adquiriu uma conotação pejorativa, por lembrar aquele tipo de senhora que se veste espalhafatosamente e participa das reuniões dessas dezenas de “academias femininas de letras” que brotaram como flores silvestres por todo o território nacional na primeira metade do século XX. Na sua santa ingenuidade, ao criarem essas instituições femininas paralelas, estavam simplesmente reforçando a crença chauvinista de que as “verdadeiras” academias eram privilégio dos homens. Por causa disso, alguns críticos e intelectuais, ao falar de alguém do quilate de uma Cecília Meirelles, por exemplo, começaram a dizer: “É uma grande poeta!”. A moda pegou no meio literário e acadêmico: o vocábulo passou a ser usado por muitos como se fosse um comum-de-dois (aqueles substantivos como atleta, artista, estudante, jovem, etc., que têm uma só forma para os dois gêneros, mas se distinguem pelo artigo). Hoje, portanto, podemos escolher entre as duas formas de feminino: ou usamos poetisa, ou simplesmente poeta. Outros preferem acrescentar que eles próprios é que têm de agradecer – como os garçons britânicos, que dizem thank you quando eles nos trazem o cardápio, o talher extra ou o sal que nós acabamos de pedir. Parece um pouco sem lógica, mas esse costume, que certamente torna o convívio social mais agradável, já chegou em nosso país tropical. Nesse caso, diremos “obrigado a você” (subentenda-se: “eu é que fico obrigado a você”), ou ainda “obrigado, eu” (subentenda-se: “obrigado fico eu”). Acho que não preciso lembrar que obrigado sempre vai concordar com o sexo de quem está falando; portanto, uma mulher diria “obrigada a você” ou “obrigada, eu”. generala: o feminino de postos e cargos Saiu na Folha de São Paulo a manchete “EUA admitem que uma general sofreu assédio”. Não seria melhor dizer logo generala? Luís Paulo – Presidente Prudente (MG) Há uma forte resistência em usar a flexão feminina nos cargos e nos postos que, durante séculos, foram ocupados exclusivamente por homens. Quem acompanhou a ascensão da mulher no mundo político, nos últimos trinta anos, viu a lentidão com que a mídia foi adotando formas femininas que hoje já não causam estranheza: primeira-ministra, senadora, deputada, prefeita, vereadora, etc. Os que defendiam o estranho uso “a primeiro-ministro Indira Gandhi” argumentavam que se tratava do cargo, e o cargo era de “primeiro-ministro” – argumento de jerico, pois, se o levássemos a sério, teríamos “a diretor Fulana”, “a vereador Beltrana”. Pode ser que a causa fosse, em parte, um preconceito sexista; meu palpite, contudo, é que o principal responsável sempre foi a leitura errada dos dicionários. Brasileiro não sabe ler dicionário; é capaz de ir ao Aurélio e, ao ver ali registrado “menino – s. m.”, concluir que não existe a forma menina! É de amargar! Coisa semelhante vem ocorrendo com os postos militares. O ingresso de mulheres nas Forças Armadas e nas Polícias Militares é fato recente; ao que parece, esses organismos preferiram manter inflexionados os tradicionais soldado, sargento, capitão, coronel, general – daí a forma utilizada pela Folha de São Paulo. É apenas uma questão de tempo, Luís Paulo, e estaremos usando soldada, sargenta, capitã, coronela, generala. Na verdade, essas formas já vêm sendo usadas há muito no Português, como se pode ver nos bons dicionários do passado: no Morais (1813) aparece capitoa como uma mulher que lidera outras (“Por capitoa, Isabel Madeira”). “Capitoa Úrsula os vai guiando”, registra Domingos Vieira. Caldas Aulete (na 1ª edição, a confiável), diz: “capitoa – mulher que dirige outras em alguma ação heróica. Fem. de capitão”. Essa forma em -oa deu lugar a capitã (mais ou menos como o alemoa cedeu o passo a alemã), termo que sempre utilizamos para designar a atleta que comanda uma equipe. Generala e coronela serviam para designar a mulher do general ou do coronel; não esqueça, entretanto, que esses também podiam ser títulos meramente honoríficos e, como tais, sempre foram usados no feminino. “A princesa é a coronela honorária do regimento” (Aulete). Há um clássico da literatura erótica intitulado As Primas da Coronela. Como se tudo isso não bastasse, existe, há décadas, a figura ingênua e dedicada do Exército da Salvação, com seus músicos tocando (ainda tocam? nunca mais vi) pelas esquinas deste mundo – todo ele organizado com uma hierarquia pseudomilitar, com suas soldadas, sargentas, capitãs, coronelas e generalas. Em suma: as formas existem; se as Forças Armadas querem adotá-las, é outra história. A Folha é que me parece atrasada. o ou a personagem? Aqui vai um estudo definitivo para terminar com a discussão sobre o gênero da palavra personagem. Prezado Doutor: eu estava lendo uma resenha literária e estranhei quando o autor falou sobre o personagem Capitu. Eu sempre aprendi que era a personagem, mas meu amigo me fez ver que também soa meio esquisito dizer a personagem Bentinho. Afinal, como é que ficamos? Sérgio G. – Taquara (RS) Meu caro Sérgio: para que você e os demais leitores possam entender a minha posição quanto ao gênero do vocábulo personagem, devo começar relembrando alguns pontos de nossa velha gramática descritiva. Os substantivos do Português que se referem a seres humanos apresentam, na sua maior parte, uma forma para cada gênero: professor, professora; mestre, mestra; padeiro, padeira; etc. Há, no entanto, um pequeno grupo que tem uma única forma, que vamos usar tanto para homens quanto para mulheres. É muito importante lembrar que esse grupo de substantivos uniformes divide-se, por sua vez, em três subgrupos: 1 – comum-de-dois – é aquele substantivo que, apesar de invariável, permite que nós distingamos o feminino e o masculino com base no artigo, numeral ou pronome que o antecede: o/a agente, este/esta colega, aquele/aquela intérprete, meu/minha cliente. 2 – sobrecomum – é o substantivo que tem um gênero gramatical determinado (ele é ou masculino, ou feminino), mas que serve para designar pessoas de ambos os sexos. Um bom exemplo é cônjuge; este é um vocábulo exclusivamente masculino (o cônjuge, meu cônjuge); se eu precisar distinguir entre o homem e a mulher, no entanto, vou ter de lançar mão de recursos linguísticos adicionais: o cônjuge feminino, o cônjuge varão, etc. Esse tipo de substantivo pode (e deve), por sua vez, ser dividido em dois subgrupos: 2.1 – sobrecomum masculino – serve para ambos os sexos, mas só tem a forma masculina, com a qual vão concordar todos os seus determinativos: o indivíduo, os dois cônjuges, o algoz. 2.2 – sobrecomum feminino – serve para ambos os sexos, mas só tem a forma feminina: a testemunha, a vítima, a criança. O problema com personagem pode ser traduzido numa simples pergunta: em qual dos três grupos acima ele deve ser enquadrado? Da resposta que escolhermos, caro leitor, dependerá o tratamento que vamos dar a esse vocábulo: 2.1 – sobrecomum masculino – se nossa opção foi por esse grupo, vamos usar sempre o personagem, não importando se é homem ou mulher. “Capitu é talvez o melhor personagem de Machado de Assis”, “Ceci e Isabel são os dois personagens femininos mais importantes de O Guarani”, etc. Este é o gênero do vocábulo em Francês (personnage), de onde proveio a nossa palavra personagem; talvez por isso mesmo essa opção pelo masculino seja muito atacada pelos puristas, que veem aqui o espectro do galicismo (ainda haverá quem fale nisso?). 2.2 – sobrecomum feminino – quem prefere esta, usa sempre o feminino: “A personagem
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