Baixe Química Quântica - Fundamentos e Métodos e outras Notas de estudo em PDF para Física, somente na Docsity! José J. C. Teixeira Dias -
QUÍMICA
QUÂNTICA
Fundamentos e Métodos
FUNDAÇÃO CALOUSTE GULBENKIAN
QUÍMICA QUÂNTICA
José J. C. Teixeira Dias
Nasceu em 1944. Licenciou-se em
Ciências Fisico-Quimicas pela Univer-
sidade de Coimbra em 1966. Doutorou-
-se em Química pela Universidade de
Sussex (Brighton, Inglaterra) em 1970,
com uma dissertação no campo da
Química Quântica (Energias Intermo-
leculares e Espectroscopia de Raman).
Prestou provas para Professor Extra-
ordinário da Universidade de Coim-
bra em Janeiro de 1974, tendo sido
aprovado por unanimidade. Actualmen-
te é Professor Catedrático da Univer
sidade de Coimbra desde Dezembro
de 1979. Tem regido cursos de Qui-
mica-Física Molecular, Química Quân-
tica e Espectroscopia e desenvolvido
trabalhos de investigação em Química
Quântica e Espectroscopia de Raman
que se encontram publicados em revis-
tas de Química portuguesas e estran-
geiras. Tem participado activamente
em conferências internacionais no domí-
nio da sua especialidade. Os seus pro-
jectos de investigação mais recentes
incluem estudos do domínio da aná-
lise conformacional e vibracional bem
como de interacções moleculares em
diversas substâncias orgânicas de inte
resse químico e industrial. Colabora
também com um grupo canadiano de
investigação num projecto subsidiado
pela OTAN que inclui estudos espec-
troscópicos e teóricos de moléculas de
interesse em Bioquímica.
«We ate never in a position to say what really is or what really
bappens, wc can only say whar will be observed»...
E. Schroedinger
Aos meus Pais
À Teresa
“do Zé Pedro, Filipe e Jorge.
SUMÁRIO
Experiências importantes para a Mecânica Quântica
E 3 — Introdução: 1.2. Emissão de radiação pelo corpo negro; 1.3 — Efeito
Eosocléctrico; 1.4 Luz e partículas; 1.5 — Difracção de electrões. Aspectos
andulatórios da marmreza dos electró s; 16— Análise da experiência de
alifracção de clectrões através de experiências ideais; 17— O princípio da
imrerteza de Heisenberg.
Interpretação estatística da Mecânica Quântica
21 — Introdução; 2.2 — Propriedades dinâmicas dos microssistemas esa
moção de medição em Mecânica Quântica; 2.3 — Observáveis; 24 — Deter-
mminismo estatístico. Distribuições probabilísticas; 2.5 — Conceito de estado
em Mecânica Quântica; 2.6 — Amolitudes probabilísticas; 2.4 — Princípio
d= sobreposição de estados.
Linguagem matemática da Mecânica Quântica
31 — As funções amplitude probabilística como vectores do espaço de Hil-
à bem; 3.2 — Vectores do espaço de Hilbert; 3.3 — Operadores do espaço de
Hilbert.
Postulados da Mecânica Quântica
&1 — Os postulados da Mecânica Quântica: 42 — Medição simultânea de
wários observáveis; 48 — Expressões das incertezas de Heisenberg; 44 — A
Mecânica Clássica como caso limite, mais restrito, da Mecânica Quântica;
45 — Sobre a relação das incertezas na determinação do tempo e da energia.
Átomo de hidrogénio
5.1 — Introdução; 5.2 — Rotor rígido; 5.3 — Potenciais de campo central;
34 — Átomos hidrogenóides; 5.5 — Representação gráfica das orbitais hidro-
genóides; 5.6 — Novo exemplo de aplicação dos operadores escada « do mé-
todo de factorização: o oscilador hatinónico unidimensional.
Momento angular
81 — O momento angular orbital em sistemas de potencial central; 6.2 — Or-
bitais atómicas; 8.3 — Momento angular de spin do electrão; 64 — Opera-
dores cscada do momento angular; 6.5 — Indiscernibilidade de partículas
'
7. Método variacional
71-— O princípio variacional; 7.2 — Aplicação a funções de variação linear;
7.3 — Extensão do método variacional.
8. Teoria das perturbações
8.1 — Introdução; 8.2 — Teoria das perturbações para níveis não degenera-
dos; 8.3 — Teoria das perturbações para um nível energético degenerado;
8.4 — Aplicação da teoria das perturbações a um átomo de hidrogénio num
campo cléctrico; 8.5 — Resolução variacional da equação de 1: ordem da
teoria das perturbações.
9. Átomos polielectrónicos
9.1 — Introdução; 9:2 — O método de campo autocoerente de Hartrec;
9.3 — Equações do método de Hartree-Fack e seu significado físico; 92.4 — O
método de Hartree-Fock-Roothaan; 9.5 — As orbitais atómicas e o quadro
periódico; 9.6 — Correlação electrónica; 2.7 — O momento angular em áto-
mos polielectrónicos
10. Simetria molecular
10.1 — Introdução; 10.2 — Operações de simetria das moléculas; 10.3 — Gru-
pos pontuais de simetria molecular; 10.4 — Representações dos grupos pon-
tuais de simetria das moléculas; 10.5 — As representações dos grupos de
simetria e a Química Quântica.
11. Estrutura electrónica das moléculas
11.1 — A aproximação de Barn-Oppenheimer e o conceito de superfície
de energia potencial; 11.2 — A cquação de Schrocdinger na perspectiva do
químico; 11.3— Quadro de aproximações nos cálculos electrónicos molecu-
lares; 11.4 — Funções de densidade electrónica; 11.5 — As orbitais molecu-
lares como combinações lineares das orbitais atómicas: as equações de
Hartree-Fock-Roothaan; 11.6 — O método da ligação de valência; 117 —
Transformações lineares aplicadas ao conjunto de orbitais; 11.8 — Sobre a
representação de orbitais; 11.9 - A molécula H,O pelo método de Hartree-
-Fock-Roothaan; 11.10 — Orbitais moleculares localizadas; 11.11 — Dos
princípios da Química Quântica à máxima de Occam.
Apêndice
Bibliografia
idênticas. Funções de onda para sistemas polielectrónicos; 6.6 — Comutação
dos operadores de momento angular com o hamiltoniano não relativístico
dos átomos polielectrónicos; 6.7 — Adição do momento angular.
Sugestões e respostas a alguns exercícios
6
de concretização de noções abstractas — complexidade matemática
do tratamento, resultando daí, por vezes, expressões de linguagem impre-
cisa ou «modelos científicos» deficientes. À outro nivel, os cursos em
Quimica Quântica exigem uma preparação matemática e um conheci-
mento de Mecânica (Quíntica que está fora do alcance da maioria dos
estudantes. Baseando-se numa matéria organizada de modo a criar um
conhecimento sólido, integrado e claro do assunto e pressupondo apenas
os conhecimentos de matemática e física ao alcance de qualquer aluno
de ciências de um segundo ano universitário, propusemo-nos chegar rapi-
dimente «o ponto em que o assunto desperta o interesse do estudante e
lhe permite progredir na matéria, alargando os seus conhecimentos através
do estudo pessoal ou apenas guiado pelo seu espirito crítico.
Torna-se agora necessário uma palavra de esclarecimento sobre cer
tos aspectos do texto, intencionalmente redigido de modo a reproduzir
as lições de cursos que orientámos tanto a nível de licenciatura como
de pós-graduação. Assim, as demonstrações são muitas vezes interom-
as com notas, comentários ow simples observações. Embora se reco-
nheça os inconvenientes de tal técnica, não deixamos de verificar, pela
nossa experiência, os méritos desse procedimento que pretende ir de
encontro às dúvidas e perguntas que o estudante naturalmente levanta
e que, quando não esclarecidas, prejudicam o avanço da matéria. Na
medida do possível, evitámos o recurso a expressões frustantes como «pro-
va-ser ou «demonstra-se». Contudo, se alguma vez fomos forçados a
fazélo para não sobrecarregar o texto com demonstrações matemáticas
fastidiosas que cortam desnecessariamente à sequência, tivemos, então,
a preocupação de indicar referências apropriadas. Deste modo, o estu-
dante pode prosseguir a sua leitura, deixando a consulta para uma análise
posterior. Os esclarecimentos matemáticos necessários 4o entendimento
do assunto aparecem integrados no texto e não em secções ou capítulos
separados. Os exercicios, apresentados no fim dos capítulos e com cha-
madas nos locais apropriados do texto, fazem parte integrante do curso,
traduzindo uma solicitação «o estudante para o completar. Na apresen-
tação dos resultados em unidades do Sistema Internacional, destacamos
factores que, envolvendo constantes físicas como «a carga e massa do
elecirãv e a constante de Planck, vêm indicados em unidades SI numa
tabela do apêndice. Se a esses factores forem atribuidos valores unitários,
os resultados aparecem então expressos nas chamadas unidades atómicas.
A presente edição beneficiou dos comentários, observações e con
selhos dos mens colegas Professores António Amorim da Costa, João da
ii
vigência Santarém e Costa, Vitor Simões Gil, Carlos Nabais Con-
kr, João Evangelista de Jesus Simão e Carlos Geraldes a quera desejo
imir Os meus sinceros agradecimentos, Devo também uma palavra
jal de gratidão ao Lic. Vítor Jardim Barreto, mem colaborador nos
lhos de investigação, pela paciência e meticulosidade com que se
penhou na leitura de uma versão inicial do texto. En've os diversos
os de (Química Quântica que leccionei no passado, desejo reconhecer
E 4 especial influência que a experiência adquirida no curso de pós
maduação em Química Inorgânica, Lisboa, 1078, teve na presente for-
deste texto. Por último, não quero deixar de ter uma palavra de
meconbecimento pelo papel singular que a Fundação Calonste Gulbenkian
desempenhado na edição de manuais universitários em lingua portt-
sa. À publicação deste texto seria de todo inviável sem a colaboração
Plano de Edições do Serviço de Educação da Fundação Calouste
benkian a quem desejo exprimir os meus sinceros agradecimentos.
Dezembro de rg80.
José J. C. Teixeira Dias
dl;
RIÊNCIAS IMPORTANTES PARA A
MECÂNICA QUÂNTICA
Everyone wbo is seriously involved im the pursuit
of science becomes convinced that à spirit is mani-
fest in the laws of the Universe — a spirit vastly
superior to that of man, and one in the face of which
we with our modest powers must feel humble. *
Linstein
4 — Introdução
No romper do século XX conheciam-se algumas experiências enjas
mesultados não eram interpretáveis à luz das teorias físicas então existen-
mes. Tais eram, por exemplo, as experiências de emissão de radiação pelo
corpo negro e do efeito Fotoeléctrico. A interpretação c racionalização
“dos resultados dessas experiências constituia um « puzzle» por acabar onde
algumas das «peças» não encaixavam nos sítios que as teorias sobre a
matureza ca inatéria e da luz lhes destinavam. Era necessário desmontar
tudo e reiniciar o caminho com base noutro -nodelo físico.
Fo: no decorrer dn primeiro quarto do século XX que vários cien-
mistas, como Planck, Einstein, Bohr, Heisenberg, De Broghe, Born e
Dirac, realizaram essa tarefa através de um conjunto de trabalhos cientí-
* Extraido de B, Hoftmann e H. Dukas, Alberi Einstein, The Human
Side, Princeton University Press, 1979.
12
a osciladores que absorviam e emitiam energia radiante. Segundo este
modelo existiria ainda um número infinito de osciladores de modo a cobrir
todas as frequências presentes no espectro de emissão. À hipótese mais
importante que veio revolucionar o mundo da física foi a de que tais
osciladores (Nota: o exemplo mais simples de um corpo radiante é o
oscilador harmônico linear de frequência própria v) só podiam absorver
ou emitir quantidades discretas de energia £,,, proporcionais à sua Lre-
quência de oscilação. Além disso, essas quantidades discretas de energia
unham que ser múltiplos inteiros da frequência da radiação, v,
E mb (1.2.1)
onde m é um inteiro positivo e h (constante de Planck) foi determinada
de modo a reproduzir os dados experimentais (ver valor na tabela de
constantes físicas, no apêndice).
Pela sua importância apresentamos aqui a lei da radiação de Planck,
M,=nhes 19) [ePSÍOAT) ny A Go
onde M, (em Wm3) é a potência da radiação emitida por unidade
de área e de comprimento de onda, é a constante de Boltzmann ec T
a temperatura absoluta do corpo negro (Exercícios 11 e 12).
Deste modo, Planck conseguiu não só adaptar a curva de radia-
ção do corpo negro como também introduzir uma hipótese fundanen-
tal para o desenvolvimento da Mecânica Quântica — a hipótese de que
a encrgia radiante é absorvida em quanta de hv.
1.3 — Efeito fotoeléctrico
Uma das experiências que mais contribuiu para a formulação da
teoria quântica foi a do efeito fotoeléctrico. Neste cfcito, quando a ener-
gia radiante actua sobre materiais (especialmente metais) pode provocar
a libertação de electrões (fotoelectrões). O efeito futoeléctrico manifesta
13
que não são interpretáveis pela teoria clássica. Segundo esta
&, era natural que a intensidade da corrente dos fotoelectrões fosse
momcional à potência da radiação incidente por unidade de superfi-
como de facto se verificou ser 0 caso. Contudo, previa-se a cxis-
iz de um atraso, dependente da potência da radiação por unidade
perfície, entre o início da iluminação do metal e o início da emis-
| Entneléctrica, para que os electrões do material acumulassem energia
mente para abandonar o metal. Tal não sucedeu, pois não foi pos-
| detectar qualquer atraso significativo. Surpreendente também Foi
mo de se ter verificado que à energia cinética máxima dos electrões
jutados por um dado material era independente da potência da energia
inte por unidade de superfície, dependendo apenas da fonte de luz
da frequência da radiação emitida.
Einstein resolveu estes problemas num artigo publicado em 1905
que propôs que & radiação de frequência v, ao interaccionar com a
a, só podia ceder energia em quanta de hyv (fotões). Esta hipó-
quantificava a radiação electromagnética, progredindo um pouco mais
é linha da hipótese quântica de Planck que, como vimos, quantifi-
a energia dos osciladores.
Depois de Einstein introduzir o conceito de fotão, o efeito Fnto-
electrico passou a compreender-se com base na colisão entre um electrão
do metal e um fotão com energia suficiente para retirar o electrão.
A diferença entre a energia kv do fotão incidente c à energia P neces-
seria para que um electrão abandone o material à que pertence aparece
sob a forma de energia cinética do fotoelectrão,
by=mu2/2+9D, (1.3.1)
Nem todos os electrões do metal exigem a mesma energia O
para o abandonarem por ernissão fotoeléctrica. O valor mínimo de Did
designa-se por função trabalho, é uma característica do metal conside-
rado e corresponde ao máximo de energia cinética do fotoclectrão cjec-
tado da superfície para um mesmo quantum de energia hy,
bu= mo 240. (1.3.2)
m
14
Assim, a energia cinética máxima dos fotoelectrões é uma fun-
ção linear da frequência cujo coeficiente angular (a constante de Planck)
é independente do tipo de material é cuja ordenada na origem dá o
valor da função trabalho (6). O valor da frequência abaixo do qual
não há, para um dado material, emissão fotoeléctrica desigrna-se por
limiar de frequência (Exercícios 13 e 1.4).
1.4 — Luz e partículas
À hipótese de quantificação dos modos de oscilação nas paredes
de uma cavidade que actue como corpo negro foi admitida por Planck
em 1901 para interpretar os resultados experimentais da emissão e absor-
ção da racdiação pelo corpo negro. Mais tarde (1905), Einstein postu-
lou a quantificação da própria radiação e admitiu que cada quantum de
radiação ou futão apresentava uma energia proporcional à sua Ireguência,
E =hy, (1.4.1)
(tal como os osciladores de Planck) e uma quantidade de movimento ?
relacionada com o comprimento de onda À da radiação pela expressão
A =. (1.4.2)
A interacção de uma partícula com um feixe de luz craduz-se
na troca de energia e quantidade de movimento com o consequente
aparecimento ou desaparecimento de quanta de luz, Ocorrem então fenó
menos de absorção c emissão induzidas ou de difusão de luz pela partícula.
À expressão (142) estabelece uma «ligação» entre dois tipos
de fenómenos: o» ondulatório, associado ao comprimento de onda À e
que caracteriza o modo de propagação da radiação, e o corpuscu-
lar, representado pela quantidade de movimento P» que sc relaciona com
o modo de interacção. da radiação com a matéria (Exercicio 1.5).
O carácter discreto dos fenómenos de interacção da radiação com
a matéria atribui à luz características corpusculares e vem completar
17
s que serviam de fontes pata os feixes atômicos ou moleculares foi
vel modificar a energia das partículas do feixe utilizado e alterar,
+ 9 seu comprimento de anda de De Broglie. A intensidade do feixc
feixe: inc dente
de electrões ERR)
í
superficie do cristal
Fig. 1.2 — Difracção de electrões pelos átomos da superfície de um cristal (figura
reproduzida de Price, Chissick e Ravensdale, pág. 382, com antori-
zação de Butterworths, London).
difundido foi determinada com o auxílio de um manómetro muito sensí-
wel. Estas experiências confirmaram a aplicação da expressão de De Bro-
gle a partículas complexas.
Hoje em dia os feixes de neutrões são abundantemente utilizados
em experiências de difracção na determinação da estrutura de cristais.
De facto, em virtude de serem partículas neutras, os neutrões podem ser
usados com comprimentos de onda longos (nentrões térmicos) que não
seram praticáveis com feixes de clectrões por estes serem então facilmente
perturbados por forças eléctricas.
Há dois resultados importantes a extrair desde já destas experiên-
cias. O primeiro é o de que as figuras de difracção obtidas com os elec-
trões são análogas às que se obteriam se em vez de electrões se utilizas
sem raios-X de comprimento de onda igual ao comprimento de onda de
De Broglie dos electrões, A=b/p,» onde Po é a quantidade de movi-
z
18
mento dos electrões relacionada com « tensão de aceleração dos mesmos
pela fórmula q =(2meV)!/2 Exercício 1.7); vet chapas de diftacção em
Hecht e Zajac. pág. 450), O segundo resultado importante consiste
no facto de o diagrama de intensidades produzido na chapa fotográfica
ser independente da intensidade do feixe de electrões. Efectivamente, se
9 número de electrões for reduzido por um factor f c o tempo de expo-
sição da chapa fotográfica aumentar f vezes » figura de difracção manter-
-se-á. Com base misto, É possível reduzir a intensidade da fonte de clec-
trões a um nível tal que corresponda praticamente à emissão de um elec-
trão de cada vez. Verifica-se então que a figura de difracção se constrói
gradualmente até adquirir o mesmo aspecto final (Fig. 1.9).
De qualquer modo uma coisa é certa: não é possível obter uma
figura de difracção com um só electrão, pois esta só se observa quando
a experiência envolve um grande número de partículas.
S o É
Fig. 13— O diagrama de difracção contróise gradualmente à medida que
aumenta o número de electrões que passam pela rede de difracção e
atingem o alvo (figura reproduzida de Price, Chissick e Ravensdale,
pág. 402, com autorização de Burrerworths, London).
1.6 — Análise da experiência de difracção de electrões através de
experiências ideais
Em 1909, G. 1. Taylor realizou uma experiência de primordial
importância na interpretação dos resultados da difracção de electrões:
iluminou um diafragma de duas fendas com uma fonte de luz tão fraca
19
que só alguns fotões eram emitidos por segundo. Ao fim de um período
de exposição muito longo, a chapa fotográfica revelou um conjunto de
zonas alternadamente claras e escuras, típicas de um diagrama de
interferência de ondas. Se o comprimento de onda à da luz for pequeno
comparado com à distância a entre as fendas, as zotias iluminadas do
alvo ficam sepatadas entre si DX/4, aproximadamente, onde D é a
distância entre o diafragma de duas fendas e a chapa fotográfica
(Exercicio 18).
O resultado surpreendente da experiência de Taylor consiste no
facto de se obter no alvo um diagrama típico de interferência entre
ondas difractadas pelas fencas, mesmo quando a intensidade da fonte
luminosa é de tal modo baixa «que corresponde à passagem, pelo sistema
de tendas, de um fotão de cada vez. Quer isto dizer que tudo se passa
como se cada fotão interferisse consigo mesmo. Ota, o diagrama de
intensidade é praticamente destruido quando se fecha uma das duas
fendas (Nota: embora se obtenha também uma figura de difracção quando
a luz passa através de uma fenda — ver, por exemplo, Born, págs. 90,
91 e Hecht e Zajac, págs. 336 € segs. — as intensidades dos máximos
de difracção decrescem, neste caso, fortemente, do máximo principal para
os lados — ver chapas de disgramas de difracção pata vários sistemas
de fendas em Hechr e Zajac, pág. 345; na difracção por uma fenda,
o máximo principal espraia-se quando se aumenta a largura da fenda ou
se diminui o comprimento de onda). Pode então concluir-se que a
interferência exige a passagem de «qualquer coisa» pelas duas fendas,
mesmo quando — e aqui reside o principal elemento de surpresa! — há
apenas um fotão a viajar entre a fonte e o alvo, Qualquer que seja
o modo pelo qual cada fotão interfere consigo mesmo (a física do
problema não tem que se preocupar necessariamente com este aspecto)
uma conclusão é certa: não faz sentido, sob o ponto de vista físico,
atribuir ao fotão um caminho definido entre a fonte e o alvo, na ausência
de qualquer observação experimental delincada com esse objectivo.
A experiência de difracção por duas fendas pode ser realizada
com um feixe de electrões. Neste caso, uma fonte de electrões (por
22
importante para responder ao problema que pusemos anteriormente.
Para obscrvar por qual das fendas passa cada electrão tere
mos que dispor de uma fonte luminosa intensa colocada atrás da
parede impermeável entre as duas fendas. Se existissem aparelhos que
permitissem realizar esta experiência (só por razões técnicas não é pos-
sível realizá-la; contudo, não há qualquer impedimento teórico ou de
princípio à sua realização; trata-se de uma experiência ideal) obteríamos
forçosamente um de dois resultados possíveis: passagem do electrão pela
fenda a (a luz difundida pelo electrão aparece do lado da fenda 4) ou
passagem do electrão pela fenda b. O resultado final (o diagrama de
difração) não pode então deixar de ser senão a soma dos diagramas de
difracção por uma fenda (Fig. 1.4-b) tal como sucede com partículas
macroscópicas, porque os dois acontecimentos sendo discerníveis fotam
tornados independentes pela observação experimental. Isto significa que
o facto de termos observado os electrões à passagem nas fendas é sufi-
ciente para alterar o resultado da experiência e destruir a interferência.
A observação da posição nas fendas admite dois resultados. É surpreen-
dente que o resultado final dependa de sc observar ou não a passagem
dos electrões. Pelo menos, à escala macroscópica tal não sucede.
Importa tirar algumas conclusões importantes da análise anterior.
Os resultados mostram que não é possível determinar por qual das
fendas passa cada electrão sem se alterar profundamente a própria
experiência. Somos ainda levados a concluir que não faz sentido supor
que cada electrão possui, na ausência de uma determinação experimental,
uma posição nas fendas bem definida. De facto, esta suposição forçaria
a previsão errada de que o diagrama de difracção por duas fendas deveria
ser igual à soma dos diagramas de difracção por uma fenda. Por outras
palavras, tal suposição não se coadunaria com o fenómeno da interferência
manifestado pelos electrões.
Como já se disse anteriormente, é possível reduzir a intensidade
da fonte de electrões a um nível de tal modo baixo que corresponda
23
à emissão de um electrão de cada vez. Aumentando o tempo de exposição
da chapa fotográfica no alvo obter-seá o diagrama de intensidades da
difracção por duas fendas. Este resultado diz-nos que o fenómeno da
interferência é mais surpreendente do que à primeira vista se poderia
imaginar, pois não resulta da interacção entre electrões provenientes de
fendas diferentes mas pode ser exibido por cada electrão individualmente.
É possível que as conclusões anteriores suscitem no estudante, para
além de um natural sentimento de surpresa e de desconfiança na capa-
cidade da ciência física, uma insatisfação pela impossibilidade de
construir uma imagem física que «visualize» a realidade por «detrás»
dos acontecimentos.
Em primeiro lugar, devemos dizer que a física se baseia em dados
de observações experimentais e não na existência de imagens físicas dos
fenómenos. Não devemos, portanto, entrar em especulações sobre domí-
nios inobserváveis. O objectivo principal da física consiste na formulação
de leis que regulem os fenómenos observados e permitam prever outros
desconhecidos. Se possuitimos uma imagem coerente com os resultados
experimentais tanto melhor. Mas este aspecto não tem, em física, uma
importância primordial.
Em segundo lugar, a observação de um fenómeno em microfísica
implica uma interacção tão importante entre o aparelho de observação
e o sistema obscrvado que altera profundamente a própnia experiência
e os seus resultados. Pode o leitor pensar que esta limitação na obser-
vação dos lenómenos em microfísica resulta de uma inaptidão técnica
ou experimental para aplicar perturbações [ísicas suficientemente suaves.
Aliás, no mundo macroscópico temos a intuição de que se [formos
cuidadosos poderemos reduzir a qualquer nível desejável a perturbação
que acompanha a nossa observação. Dentro desta maneira de ver, correcta
apenas a nível macroscópico, os conceitos de grande e de pequeno,
macroscópico e microfísico, são relativos e relacionam-se com a suavidade
dos processos experimentais de observação. O conhecimento que possui
mos do mundo microfísico mostra que existe um limite no nosso poder
+ E e
a.
24
de observação e na capacidade de reduzirmos indefinidamente a pertur-
bação que acompanha o processo de observação. Este limite é estabelecido
pelo princípio de Heisenberg que adiante vamos expor.
Outra consideração importante a fazer sobre a experiência de
difracção é a de que o carácter indeterminado, irregular c, portanto,
imprevisível do comportamento individual dos microssistemas contrasta
com o carácter determinado do resultado estatístico expresso no diagrama
de distribuição dos electrões no alvo. De facto, embora não seja possível
prever em que posição do alvo incide um determinado electrão (conforme
já vimos nem seguer é possível saber por qual das fendas passa sem
alterar drasticamente o resultado da experiência), verifica-se que o
diagrama de difracção na sua forma final é determinado pela quantidade
de movimento que os clectrões do feixe incidente possuem e pelas carac-
terísticas das fendas (largura e distância entre elas). Isto significa que
em microfísica, embora não exista determinismo a nível do comportamento
individual dos microssistemas, existe determinismo ao nível do com-
portamento estatístico de grande número de microssistemas. O resultado
da experiência de difracção de electrões, isto é, o diagrama de distri-
buição no alvo, é característico de um grande número de electrões, não
de cada electrão individualmente. Por esta razão, os objectos de estudo,
em microfísica, não são os microssistemas individuais, mas sim conjuntos
constituídos por um grande número (N>co) de microssistemas da
mesma espécie, em condições devidamente especificadas e determinadas
por aparelhos macroscópicos de preparação. Tais conjuntos são formados
por um grande número de réplicas de um dado microssistema, no sentido
em que todas elas resultam da repetição da mesma experiência, e apre-
sentam propriedades bem definidas a nível macroscópico que resultam,
estatisticamente, de propriedades microfísicas eventualmente distintas.
Doravante, designaremos tais conjuntos estatísticos por ensembles.
1.7 — Princípio da incerteza de Heisenberg
Segundo a Mecânica Clássica, os valores, num dado instante, das
variáveis dinâmicas de uma partícula, posição e quantidade de movimento,
27
(Fig. 15). Então, as componentes segundo x (dizecção paralela a0 alvo)
da quantidade de movimento do fotão difundido e observado estão com-
preendidas entre Ep'sinO, em que pb é a quantidade de movimento
do fotão difundido. (Admite-se que não houve alteração de ) na coli
Gi Ç
são). Como a quantidade de movimento total do sistema electrão-
8/totão fotão
difundido cifundido KO
secuo do Dee ião
electrão
Fig. 1.5 — Orientações limites do vector quantidade de movimento do fotão difun-
dido por um electrão para que caia dentro do ângulo subtendido pela
lente e incida no alvo (reprodução de Cropper, pág. 105, com auto.
rização de Oxford University Press, New York).
-fotão se conserva, conclui-se que a quantidade de movimento do clectrão
segundo o eixo dos xx, depois da observação, fica compreendida entre
Pot (bi Ísind e p—(bD)sinb onde Po é a quantidade de movimento
inicial do electrão. Mas sinb=tanb=A/( 24). Portanto, a incerteza na com-
ponente x da quantidade de movimento do electrão depois da colisão é
(1.7.2)
e o produto das incertezas na posição (1.7.1) e na quantidade de movi-
mento do electrão (1,72)
AxÃp =b. (1.7.8)
A esta restrição à capacidade da ciência física para conceber expe-
riências que permitam medir a posição Ea quantidade de movimento
exactas de uma partícula mictofísica pocerá objectar-se que, sendo pos-
a AE
28
sível medir a posição do electrão com qualquer desejada precisão, tal
equivale a dezerminar a velocidade, pois basta determinar posições em
instantes sucessivos para se calcular a velocidade. Assim, admitamos que
a medição da posição do electrão no instante é, dá o resultado x, e que,
no instante posterior é, se obtém o valor x. Dir-se-á, então, que reduzindo
o intervalo £t,, isto é, efectuando a segunda medição ao fim de um inter-
valo de tempo mais cutto, se pode obter um valor para o limite da razão
inctemental (w-x,)/(tt)) que define à vclocidade do electrão no ins-
tante £,. Só que não existe um tal limite, De facto, a medição, no ins-
tante t,, da coordenada posicional com total precisão (erto nulo) intro-
duz, como vimos, alterações tão profundas na sua quantidade de movi-
mento que tornam imprevisível a posição da partícula num instante
posterior, impedindo a definição da velocidade através do limite da razão
incremental. Tal como Schroedinger escreveu: «We must not admit the
possibility of continuous observation».
O exemplo que apresentâmos para chegar à expressão (1.7.3) não
constitui uma demonstração do princípio da incerteza que à frente (Sec
ção 43) deduzitemos de um modo matemático e geral utilizando o
formalismo da Mecânica Quêntica. Contudo, não podemos deixar de
chamar a atenção do leitor para algo de universal e, de certo modo,
essencial que já existe no exemplo referido: a medição de qualquer pro-
priedade exige sempre uma interacção entre o aparelho de observação
(o microscópio, no caso presente) e o sistema observado (o electrão, no
exemplo dado). Tal interacção resulta da Forçosa existência de um vei-
culo de comunicação (fotão difundido pelo electrão) entre o aparelho
de observação e u sistema observado, veículo esse que pode provocar pro-
fundas alterações no sistema observado (ver D. V. George, J. Chem.
Educ., 46,663 (1969)). Muitas vezes, essas alterações evidenciam-se
sobremaneita ao determinar simultaneamente duas propriedades, como
sucede no caso presente com a posição e à quantidade de movimento.
Embora tenham sido imaginadas inúmeras experiências ideais
(«thought cxperiments» = experiências de raciocínio) nunca foi pos
29
sível conceber uma aparelho de medida bascado em princípios físicos reais
que conseguisse ultrapassar as limitações impostas pelo princípio da incer-
teza. Estas continuarão a ser o principal tema do capítulo seguinte.
Exercícios
11—A análise dos resultados experimentais de emissão de radiação por um
corpo negro mostra que o comprimento de onda correspondente ao máximo de
emissão À uy Se desvia para valores de À mais baixos à medida que a tempe
ratura do corpo negro T sobe e que o produto
TA
* ma — Constante
Esta relação é vulgarmente designcda por lei do deslocamento de Wien.
Para dar uma idcia da ardem de grandeza de E ao basta notar que
o Sol à temperatura de 6000 K irradia como um corpo negro com 2, 2480 nm
(região azul do espectro) c que um corpo negro à temperatura ce 2800 K apre-
senta À 1240 nm.
“mam
Mostrar que a expressão da lei da radi
ão de Planck (1.2.2), que se ajusta
excelentemente aos resultados experimentais para todos os valores de ),, se coaduna
com a lei do deslocamento de Wien c determinar o valor da constante de Wien
acima referida.
1.2 — Partindo da lei da radiação de Planck (1.2.2) mostrar que é possível
obter o resultado clássico expresso pela lei de Rayleigh-Jeans (M,=2mkTe/xs)
se a constante h for considerada como sendo suficientemente pequena, admitin-
do-se, no limite, ho<0. Mostrar ainda que, segundo a lei de Rayleigh-Jeans,
os osciladores de comprimento de onda extremamente curto (correspondente
a luz ultravioleta, raios-X e até mesmo raios Y) podem ser fortemente excitados
mesmo à temperatura ambiente. Este absurdo revela a inadequação do trata-
mento clássico e designa-se por catástrofe do ultravioleta.
13— A função trabalho D, pata o césio é 1,9 eV. Calcular a energia cinérica
máxima dos electrões emitidos quando o metal é irradiado com luz de a) 600 nm;
b) 400 “THz.
14. O limiar de frequência do ríquel é 1210 THz. Calcular o valor D, da
função trabalho.
1.5-A energia roral de um fotão, tal como a de qualquer outra partícula, é
dada pela expressão relativística E=meº onile m=m [(1-v2 [cê 3/2, Sabendo
32
de amplitude probabilística. São estes os temas abordados neste capítulo.
A orientação adoptada segue de perto a dos textos de Eisen bud e de Feyn-
man, Leighton e Sands.
2.2 — Propriedades dinâmicas dos microssistemas e a noção de
Medição em Mecânica Quântica
Sendo necessário estabelecer uma linguagem apropriada à Mecá-
nica Quântica que integre conceitos devidamente definidos c adequados
às particularidades desta ciência física, começaremos por estabelecer a noção
de propriedade dinâmica. Este termo está intitnamente ligado ao conceito
de medição em Mecânica Quântica e apresenta um significado diferente
c mais restrito do que em Termodinâmica, onde equivale ao conceito
que aqui é designado por observável (Secção 2.3).
O termo propricdade é, muitas vezes, usado, a nível da física
clássica, como sinónimo de atributo geral, independentemente do valor
específico que pode adquirit num certo instante e em determinadas con-
dições experimentais. Assim, a posição, a velocidade ou a cnergia de um
“ móvel são consideradas como propriedades dinâmicas de um sistema. De
um modo geral, o valor específico da posição de um móvel num certo
instante não é tido, em linguagem clássica, como propriedade, na medida
em que é susceptível de variar no tempo, não possuindo, portanto, as
características de estacionaridade e até de incrência atribuídas ao termo.
Esta. interpretação justifica-se na medida em que, ua Mecânica Classica,
as propriedades são objectivas, isto é, «cxistem» independentemente de
serem medidas, não exigindo condições quanto à preparação prévia do
sistema observado como sucede a nível microfísico.
Ora, em Mecânica Quântica não existem propriedades que sejam
inobserváveis. Portanto, só faz sentido falar na posição, na velocidade
ou na encigia de um microssistema se estas variáveis dinâmicas tiverem
sido: objecto de medições. Trata-se de uma característica essencial da
Mecânica Quântica que sugere uma reformulação do termo propriedade.
Assim, designaremos o valor específico que uma determinada variável
dinâmica dum ensemble pode exibir, num certo instante, isto é, uma
33
certa posição x, uma determinada energia E, ctc., por propriedade do
ensemble nesse instante. Esta afirmação só faz sentido se todos os micros-
sistemas do ensemble exibirem, nesse instante, a referida propriedade.
Em imicrofísica, as propriedades dos ensembles apenas têm signi-
ficado real como expressões do resultado de medições. Foi essa a conclusão
a que chegámos ao verificar, pela análise das experiências de difracção
e pelo princípio da incerteza de Heisenberg, que a observação de uma
propriedade provoca, regra geral, alterações imprevisíveis, muitas vezes
profundas, nos microssistemas. Ota, a determinação experimental duma
propriedade exige um certo aparelho de observação. As respostas que
o aparelho de observação lormece indicarão se a referida propriedade
(relembrar que o termo tem aqui o significado que a nível clássico cortcs-
ponde ao resultado duma medição) está ou não presente nos mictos-
sistemas observados. Podemos então designar essa determinação expe-
rimental por teste. Por exemplo, o aparelho de teste da propriedade
posição x, de um electrão no instanie E» com uma incerteza dx,
poderá consistir num microscópio, numa fonte de iluminação e requer
o conhecimento das direcções no espaço para orientação e localização do
microscópio e da fonte e o aparecimento duma cintilação num alvo
dentro ou fora duma determinada zona, como indicação da presença
ou ausência da referida propriedade (respostas «Sim» ou «Nãov). À res
posta «Sim» a este teste apenas significa que o electrão observado exibiu,
no instante da observação, a proptiedade referida (posição x, com incer-
teza Ax), não garantindo que a mesma esteja presente em momentos
diferentes dos da observação (anteriores ou posteriores a esta). É, pois,
importante distinguir entre duas situações: 4) «o sistema exibe a proprie-
dade q, no instante é» e b) «o sistema possui a propriedade g,». A se-
gunda afirmação, muito mais restritiva que a primeira, exige que se garan-
ta a permanência da propriedade q, o que equivale a dizer que é neces
sário que medições subsequentes revelem a sua ocorrência. Tal pressupõe
a preparação da propriedade exigindo instrumentos, ditos de preparação,
que seleccionem, entre os microssistemas dum conjunto inicial, apenas
us que dão resposta positiva ao teste, Posteriormente à preparação, terá
que proceder-se a testes que confirmem a permanência da propriedade em
a
En fo E A
34
todos os microssistemas do ensemble previamente preparado. Só assim
se poderá atribuir o resultado da medição ao ensemble observado.
Um exemplo simples mas clucidativo, a nível clássico, da prepa-
ração e teste duma propriedade é o da experiência, realizada pela pri-
meira vez por Newton em 1666, de análise da luz solar. A propriedade
(aqui no sentido clássico do termo) que é preparada c testada é a «cor
da luz». Um feixe de luz branca incide num prisma. Depois de experi-
mentar refracção, selecciona-se, por meio dum sistema conventente de
fendas o feixe da cor que pretendemos. À subsequente passagem do feixe
seleccionado por novo prisma não decompõe o feixe em mais cores.
Esta experiência pode ser efectuada com uma rede de difracção como
elemento dispersivo, onde incide um feixe de [otões de diversas frequências
(feixe não monocromático). Se o poder de resolução cromática da rede for con-
veniente aparecerão diagramas de difracção para os fotões de cada frequência
com os máximos mais intensos devidamente distanciados (Nota: a largura eficaz
de uma linha espectral pode ser definida através da separação angular entre os
primeiros zeros de intensidade de cada lado do máximo principal; o critério de
Rayleigh para a resolução de dois feixes espectrais exige que o méximo principal
de um deles coincida com o primeiro mínimo do outro; o poder de resolução
cromática dum espectrómetro define-se para cada comprimento de onda ) e é
dado por R=A/A), onde AX é a menor diferença resolúvel de comprimento
de onda; ver, por exemplo, Iecht e Zajac, págs. 8358-361, sobre espectroscopia
de redes de difracção observando, em especial, a figura da pég. 360).
Através de fendas convenientemente colocadas no cspaço será então possi-
vel, em princípio, seleccionar o máximo mais intenso de difracção da luz de
determinada frequência (na zona visível do espectro elecuromagnético será luz
de determinada «cor»). Se sujeitarmos o feixe de fotões assim seleccionado a nova
difracção obtém-se um diagrama de difracção simples com um único máxime
de intensidade mais elevado. Esta experiência — equivalente à de Newton mas
em que
utiliza uma rede de difracção — chama a atenção para o facto de,
em qualquer passagem da luz por um elemento dispersivo, haver sempre for
mação de franjas de difracção. (Nota: a deflexão dos fotões de um cesto ângu-
lo Q ma rede de difracção implica a selecção dos que possuem determinada
energia).
37
propriedades x c p, no sentido de ser admissível a preparação dum
ensemble com tais propriedades (foi, aliás, neste sentido, que enun-
ciámos o princípio da incerteza). Diz-se, então, que estas proprie-
dades são incompatíveis. Repare o leitor que já estamos a admitir uma
interpretação estatística do princípio da incerteza na medida em que
o referimos à preparação de ensembles. O termo estatístico não é usado
aqui no sentido clássico que só pressupõe o desconhecimento do porme-
nor por razões do elevado número de acontecimentos analisados e não
da sua natureza inttínseca como sucede em microfísica.
Tal como se tem vindo a acentuar ao longo deste capítulo a teoria
dos processos microfísicos tem um carácter eminentemente estatístico. De
um modo geral, só as propriedades de ensembles, e não as de microssiste-
mas individuais, são objecto de determinação experimental no domínio
da mictofísica. É nesse sentido que se deve entender o exemplo agora
dado de propriedades incompatíveis E -As considerações que sobre
ele tecemos.
2.3 — Observáveis
Às condições que definem um ensemble são, como já vimos (Sec-
ção 2.2), estabelecidas pelo aparelho de preparação. Dada a natureza
estatística dos processos microfísicos, torna-se necessário conhecer não só
o domínio de valores que uma certa variável dinâmica pode exibir no
ensemble observado (o domínio das propriedades dessa variável ou o seu
espectro) como também a probabilidade de ocorrência de cada valor (pro-
priedade). Tal é o objectivo de cxperiências realizadas para medir a cner-
gia ou a quantidade de movimento, por exemplo. A medição da energia
exige a realização de testes simultâneos para todos os valores específicos
da energia que o conjunto pode exibir num dado instante. O tipo de
aparelhagem destinado a medir as energias dos fotões dum feixe pode
ser constituido por um fotomultiplicador, um amplificador e um osci-
loscópio. A altura de cada impulso é proporcional à fracção do núme-
ro total dos micrassistemas que exibem a correspondente energia. Fica-
remos, assim, a conhecer a distribuição de energias no ensemble obser-
a 4 TE LT»
38
vado. Esta medição equivale a uma dezerminação experimental simultânea
de todas as propriedades «energia» dos microssistemas. O conjunto de
todas estas propriedades cencreta» designa-se por observável «energia».
Do mesmo modo, o conjunto de todas as propriedades «posição» consti
tui o observável «posição», o de todas as propriedades «quantidade de
movimento», o observável «quantidade de movimento», Ete:
As propriedades que formam um observável têm duas caracteris-
ticas importantes (Eisenbud, Secção 74): 1) excluem-se mutuamente:
2) constituem um conjunto completo, isto é, incluem entre si todos os
possíveis resultados da medição do observável (exemplo: se se realizarem
testes para todas as possíveis posições dum elecrrão vetificar-se-á que
ele se encontra com certeza numa delas).
É possível distinguir em Mecânica Quântica, dois tipos importan-
tes de relações entre observáveis. Assim, diz-se que dois observáveis q e 7
são compatíveis se as proptiedades de todos os pates (q,r;)- -q; repre
senta qualquer propriedade do observável q. 7; qualquer propriedade de 7 -
— forem compatíveis ou de mútua exclusão (neste último caso, o par de
propriedades não corresponde a qualquer situação fisicamente real ou pre-
visível; só consideramos esta hipótese para que a descrição seja exaustiva).
Por outro lado, para que dois observáveis q e s se digam incompatíveis
basta que, entre todos os pares de propriedades Gn Ex exista um que
seja incompatível.
Qualquer par de variáveis posicionais cartesianas distintas de uma
pattícula, ou de componentes da quantidade de movimento segundo eixos
cartestanos distintos ou ainda, pot exemplo, o par de observáveis Formado
pela quantidade de movimento de fotões e a sua polarização constituem
exemplos de observáveis compatíveis. À energia de uma partícula no cspa-
ço livre (energia cinética) c a sua quantidade de movimento são também
observáveis compatíveis. Neste caso, os pares de propriedades formados
por uma propricdade de cada um destes observáveis ou são compatíveis
ou se excluem mutuamente; à exclusão mútua aplica-se a situações fisica-
mente absurdas, quando, por exemplo, uma das propriedades for nula
e a outra diferente de zero porque a energia cinética c a quantidade de
39
movimento estão relacionadas entre si através de uma dependência funcio-
nal, T=pº/(2m). Dc acordo com a definição dada (ver Eisenhud, pág.15),
todos os observáveis, em Mecânica Clássica, são compatíveis.
À posição c a quantidade de movimento constituem, como é óbvio,
um exemplo de observáveis incompatíveis. De facto, neste caso, todos
os pares de propriedades destes dois observáveis são incompatíveis segundo
o princípio da incerteza (pressupomos que as propriedades dos pares con-
siderados correspondem a valores exactos). Ao longo do texto datemos
outros exemplos de observáveis dos tipos aqui referidos.
2.4 — Determinismo estatístico. Distribuições probabilísticas.
Já tivemos ocasião de chamar a atenção pata o indeterminismo que
caracteriza o comportamento individual dos imicrossistemas. Por exem-
plo, nas experiências de difracção de electrões é impossível prepatar dois
electrões de modo a garantir a sua incidência no mesmo ponto do alvo.
É também impossível gatantir que dois determinados nuclídeos radioacti-
vos experimentem o mesmo tipo de decaimento, no mesmo instan-
te. O princípio do determinismo clássico (iguais condições produzem os
mesmos efeitos) não se aplica aos microssistemas. Voltando à experiência
de difracção, embora não exista qualquer correlação entre a posição
no alvo c a quantidade de movimento inicial de cada partícula,
existe sim uma correlação entre a distribuição final dos electrões no alvo
e a quantidade de movimento com que eles foram preparados. Para a
mesma geometria do aparelho de difracção, formar-se-à gradualmente a
mesma distribuição final dos electrões no alvo à medida que aumenta o
número de electrões que lé chegam (Fig. 1.3). Embora os acontec-
mentos individuais escapem a um determinismo clássico, o comporta-
mento global dos ensembles obedece a um determinismo estatístico.
Por esta razão, us objectos de interesse em microfísica não são os mictos-
sistemas mas sim os ensembles.
O conhecimento da distribuição dum observável implica a deter-
minação simultânea dos valores específicos ou propriedades exibidas por
cada um dos microssistemas que compõem o ensemble. Assim, a distri-
42
médio cu valor expectável) e a incerteza (desvio-padrão ou raiz quadrada
da média dos quadrados dos desvios). (Nota: a variância é o quadrado
do desvio-padrão).
A média (9) define-se através das igualdades:
Ega BN IN), (2.4.3)
Ê. k k
onde q, representa o valor da propriedade q, em determinado sistema de
unidades. As expressões (2.4.3) traduzem, como é fácil de ver, a média
ponderada de todas as propriedades que [omnam o observável q
(os pesos são as fracções NAN que representam as probabilidades de
ocorrência das propriedades qu
A incerteza (Ag) define-se pelas igualdades
ua (244)
pira dg LA RIO
Já vimos como é possível medir simultaneamente as distribuições
de todos os observáveis de um ensemble; consequentemente, também os
parâmetros dessas distribuições (média c incerteza) podem ser calculados.
Conclui-se daqui, por exemplo, que, embora não seja possível preparar um
ensemble onde x e p, contrariem o princípio da incerteza ( Ax.Ap <h)
nada impede que se determinem com precisão os scguintes parâmetros das
distribuições probabilísticas de x e Ps gs Pr Axe dp, Também as de-
Lam - SS PR SERA E E pu
pendências temporais de x e Pos isto é, x (1) é PÁ, são características
objectivas dos ensembles.
2.5 — Conceito de estado em Mecânica Quântica
A noção de estado decorre naturalmente das considerações ante-
riores sobre as distribuições probabilísticas dos observáveis. Começaremos
por relembrar o conceito clássico para que o leitor reconheça as diferen-
ças que ele apresenta em microfísica.
43
Em Física Clássica admite-se o princípio do determinismo segun-
do o qual «as mesmas condições produzem os mesmos efeitos e conse-
quências distintas não podem senão sesultar de condições diferentes».
Assim, por exemplo, se dois móveis tiverem as mesmas condições ini-
ciais (posição e quantidade de movimento) realizarão, sob a acção das
mesmas forças, os mesmos movimentos. Dir-se-á também que possuem
o mesmo estado mecânico. À palavra «estado» é utilizada quer para
traduzit a situação do sistema num determinado instante, quer para
descrever a sua evolução no tempo ou movimento. Sempre que haja
necessidade de distinguir estas noções diz-se que a última traduz um
«estado de movimento».
As considerações da secção anterior mostram que o conceito clás-
sito de estado não se aplica aos microssistemas. É impossível preparar
dois electrões de modo a que, depois de passarem redes de difracção
idênticas, incidam em posições equivalentes de dois alvos. Ao nível dos
microssistemas individuais, as mesmas condições não determinam iguais
consequências, o que equivale a dizer que o princípio do determinismo
não se lhes aplica. Aliás, se assim não sucedesse, todas as propriedades
dos microssistermas seriam objectivas, tal como em Física Clássica, e não
haveria observáveis incompatíveis. A indeterminação que se verílica no
comportamento individual dos microssistemas implica que o conceito de
estado, sendo como é uma conseguência do princípio do determinismo,
não lhes diga respeito.
Em microfísica, sabemos que as distribuições probabilísticas de
obscrváveis são características objectivas dos ensembles, Dois ensembles
são equivalentes se apresentarem a mesmas distribuições de todos os seus
observáveis. Diz-se, então, que os referidos ensembles estão no mesmo
estado. Nestas condições, temos que concluir, pelo princípio do deter-
minismo estatístico, que ensembles equivalentes tiveram as mesmas con-
dições iniciais, isto é, foram preparados com as mesmas propriedades.
Estas propriedades, necessariamente compatíveis, designam-se por proprie-
dades de estado e os observáveis que lhes correspondem por observáveis
de estado. Por exemplo, na experiência de difracção de electrões que
apresentámos no início, os electrões foram preparados com uma deter-
ata ET AD
44
iminada quantidade de movimento PSL P=Po G é a direcção do
feixe incidente). Estas propriedades são propriedades de estado porque
determinam a distribuição do observável! posição no alvo e os observáveis
Po Py Po São observáveis de estado.
Pela mesma ordem de ideias, se dois ensembles apresentarem, num
dado instante, distribuições diferentes para algum dos seus observáveis
deveremos concluir que esses ensemmbles lotam preparados num instante
anterior com propriedades distintas de acordo com o mesmo princípio
do determinismo estatístico.
Destas considerações decorre novamente a conclusão de que o con-
ceito de estado não se aplica, em microfísica, a sistemas individuais, mas
sim a ensembles. No entanto, sempre que um cnscmble esteja num deter-
minado estado, pode admitit-se, sem que daí resultem quaisquer com-
plicações teóricas, que um dado microssistema está nesse estado. Esta
conclusão tesulta do carácter estatístico do conceito de estado.
O número de propriedades exigido para definir um conjunto de
propriedades de estado depende do tipo de propriedades que se tiver esco-
lhido. Assim, para um ensemble de átomos de hidrogénio, a propriedade
«energia do clectrão igual a 13,6 cV» constitui por si só um conjunto
de propriedades de estado se ignorarmos o spin e as interacções dos
átomos com a radiação eletromagnética. De [acto, esta é a energia
do estado fundamental do átomo de hidrogénio (electrão na orbital 15)
e é quanto basta para definir este estado electrónico. Contudo, para níveis
degenerados, é necessário especificar, além da encrgia, o momento angu-
lar total (Capítulo 9) para definir cabalmente o estado de um ensem-
ble de átomos.
2.6 — Amplitudes probabilísticas
De acordo com o princípio do determinismo estatístico, as proprie-
dades de estado de um conjunto definem univocamente as distribuições
probabilísticas de todos os seus observáveis em qualquer instante. Cabe
a
ção englobam uma amplitude e uma fase, Por isso, deverão ser conside-
radas como variáveis complexas. Então, pata obter a probabilidade de ocor-
rência de um acontecimento teremos que quadrar o módulo da amplitude
probabilística ou multiplicar essa amplitude pelo seu complexo conjugado,
(26.3)
ul
Pa vElSulo [3= Su [u,28<
ih
Mbultiplicando membro a membro (2.62) pelo seu complexo con-
jugado obtém-se, atendendo a (2.8.3),
q.” 9a E +» E E
o o o
+ <Qu>"<alp,>"<qj> <bpç>+
<Q|> “<bhp, se “<q u> Ss ps (2.6.4)
O leitor poderá verificar agora que esta equação difere da expressão
(261) porque apresenta as dues últimas percelas que dão conta do
fenómeno da interferência.
Dissémos anteriormente que se «forçássemos» os electrões à pas-
sarem por a ou por b- - para o que bastava observar por qual das fendas
passa cada um dos electrões — verificar-se-ia a relação de probabilidades
aplicável a corpúsculos com comportamento clássico, relação essa que se
traduz apenas pelas duas primeiros parcelas de (264), Mas então os
acontecimentos «passagem do electrão por a» e «passagem do elecrrão
por b» setiam discemíveis e independentes. Neste caso quadram-se as
amplitudes correspondentes a cada acontecimento para obter as respec-
tivas probabilidades e somam-se estas.
Em resumo, se uma determinada situação ocorrer por vátios pro-
cessos ow caminhos indiscerníveis, somam-se as amplitudes probabilísticas
associadas a esses processos e só depois se quadra o resultado para calcular
a probabilidade rotal. Se a situação ocorrer por caminhos disceríveis
somam-se as probabilidades relativas a cada um dos processos inde-
pendentes.
48
Perguntar-se-á em que medida são estas conclusões confirmadas pelos
dados experimentais. Para responder a esta questão relataremos, seguindo
Feynman, Leighton e Sands, Vol. III, Secção 3-3, uma experiência de difusão de
neutrões por um cristal. Representamos o cristal por um conjunto de átomos da
mesma espécie cujos núclcos, distribuidos periodicamente, são numerados com o
contagens
por segundo
(c)
Fig. 2.1 — Possíveis resultados da difusão de neutrões por um cristal (ver texto)
(reproduzido de Feynman, Leighton e Sands, vol. HI, pág. 3-8, com
autorização de Addison-Wesley, Reading, Massachusetts).
índice ; (1=1,2...,N) onde N é o número total de átomos. Podemos ignorar a
interacção entre os electrões dos átomos e os neutrões porque, sendo estes parti-
culas neutras com uma massa em repouso cerca de 1840 vezes superior à dos pti-
49
meiros, não experimentam difusão senão por interacção com os núcleos dos átomos.
Os resultados experimentais (intensidade de difusão em função do ângulo
8 de difusão) estão esquematizados na Fig. 2.1 onde se ilustram os casos em
que os núcleos do cristal apresentam spin nulo (caso a) ou spin 1/2 (caso c).
À importância do spin nuclear reside no facto de ele poder actuar como uma
marca wu registo dos processos de difusão, tornando-os distinguíveis c, conse-
quentemente, eliminando a interferência das curvas de intensidade. É que a
interacção dos spins (do neutrão incidente e do núcleo difusor) obedece a uma
regra de conservação do spin total. No caso (a) em que o spin do núcleo
difusor só admite o valor zero não há hipótese de altcração do spin nuclear, não
ficando qualque: registo da difusão. Temos, então, processos indiscerníveis e os
resultados apresentam variações bruscas de intensidade características da inter-
ferência. Contudo, em determinados tipos de cristais observa-se curiosamente o
aparecimento de picos de interferência a sobressair de uma base contínua como
na Fig. 2-1-c). Trata-se da sobreposição dos diagramas (a) e (b) em que a base
contínua está associada a processos de difusão discermíveis, portanto sem mani-
festações de interferência. Senão, vejamos. Quando o spin de uma partícula é
1/2 existem duas orientações possíveis de spin correspondentes aos valores + 1/2
e-1/2 (poder-se-á dizer que o observável spin é o conjunto completo de duas
propriedades que se excluem mutuamente — spin+1/2 e spin — 1/2). Nestas
condições, a conservação do spin total de que falémos atrás pode verificar-se de
dois modos: 1) não há alteração dos spins das partículas, então os processos
de difusão são indiscerníveis, há interferência e o resultado é o da Fig. 2.1.9);
2) há alteração dos spins das partículas. Este caso verifica-se quando os spins
das partículas interactuantes, núcleo e neurrão, apresentam orientações diferentes,
porque, então, a conservação do spin total pode também resultar (além da hipó-
tese considerada em (1)) da alteração simultânea da orientação de spin do núclco
e do neutrão (de 1/2 para—1/2, numa das partículas, e— 1/2 para+1/2, na outra).
Ora, em casos como este, a difusão do neutrão deixa um registo no núcleo
através da modificação do spin deste. Temos, então, o caso dos processos discer-
níveis com o consequente comportamento clássico (ausência de interferência).
O caso em que o spin dos núcleos é 1/2 apresenta, portanto, uma curva de inten-
sidade de difusão que é a soma de (a) e (b) na Fig. 2.1.
Muitas outras experiências de difusão de partículas, algumas envol.
vendo a possibilidade de permuta de partículas idênticas (Feynman,
Leighion e Sands, vol. HI) confirmam e ilustram a importância do con-
ceito de amplitude probabilística e a interpretação física que apresentâmos.
Não obstante tal facto, é natural que o leitor se interrogue sobre o que
o
4
uh]
1
52
destes coeficientes, basta imaginar a medição do observável w no ensem-
ble preparado com a propriedade de estado 9. Encontratemos, então,
com certeza, as diversas propriedades td; com probabilidades Papo Isso
não significa, contudo, que |&> seja uma colecção ou mistura de estados w,
Se assim sucedesse não observaríamos o comportamento mecânico-quân-
tico e o diagrama de difracção por duas fendas seria sempre a soma dos
diagramas de difracção por uma fenda. O comportamento mecânico-
-quântico inerente a (272) manifesta-se enquanto as propriedades w,
não forem sujeitas a determinação, isto é, enquanto forem «latentes» e,
portanto, indiscerníveis.
Quando se considera um estado y como combinação de outros
estados w, não se faz mais do que utilizar a equação (2.7.4) para des-
crever matematicamente o estado em termos de amplitudes. Aqui, o termo
estado tem um significado matemático, abstracto, convencionalmente
representado pelo símbolo |>. Dentro deste contexto matemático, pode-
mos utilizar a equação anterior para construir novos estados Y a partir
da combinação linear dos estados w,, mas agora com coeficientes atbitrá-
rios c, Quer dizer, em vez de constituir um método de decomposição
linear do estado q (|y>) em estados wi(|w;>) com os coeficientes
<w,|9>, a equação (2:74) permite agora representar um processo de
construção de um novo estado ') a partir da combinação linear dos esta-
dos w, com cocficientes arbitrários c,,
Eloa |s>. (21.5)
Ora, a afitmação de que a combinação linear de estados representa tam-
bém um estado do sistema traduz o princípio da sobreposição de estados
e baseia-se na suposição de que, sendo (2:74) válida para quaisquer
estados w, e consequentemente quaisquer amplitudes <w,g>, é lícito
admitir que (partindo agora no sentido inverso) quaisquer que sejam
os coeficientes c, e os estados w, a combinação lincar (27.5) também
traduz um possível estado do sistema- Contudo, não devemos perder
de vista o facto de a relação importante ser a das amplitudes probabilis-
ticas (272). As expressões (274) e (275) resultam dela por abstracção
matemática.
53
As próximas considerações têm por objectivo mostrar a natureza
não clássua da sobreposição de estados expressa no princípio anterior.
Em termos clássicos o estado resultante da sobreposição de outros deveria
apresentar características intermédias entre as dos estados originais. Tal
não sucede, contudo, com a sobreposição quântica de estados. A título
de exemplo, consideremos dois estados 4 e B tais que o resultado
de uma medição em conduz, com certeza, ao valor « e o resul
tado da mesma medição cm B dá, com certeza, o valor 8. Admita-
mos ainda que x e £ permitem especificar completamente os respec-
tivos estados 4 e B, ou seja, que a cada resultado corresponde um só
estado, isto é, são estados não degenerados. Pader-se-á então perguntar
qual é o tesultado da mesma medição quando o sistema estiver no estado
resultante da sobreposição de À e BP À resposta é: umas vezes &, outras
vezes B. Se a obscrvação se repeuir um grande número de vezes verificar-
-se-á que cada um dos resultados ocorre segundo uma fracção bem defi-
nida do número total de vezes, isto é, de acordo com numa probabilidade
bem definida. Estas proba
idades estão relacionadas com os pesos rela-
tivos dos estados 4 e B no processo de sobreposição sendo unicamente
através delas que se manifesta o carácter intermédio do estado sobreposto.
Note-se que nunca ocorrerá um resultado diferente de a ou £ residindo
aí um dos aspectos peculiares da sobreposição de estados em Mecânica
Quântica. De facto, estas conclusões nada mais são do que um resumo
dos resultados experimentais a que nos referimos anteriormente. Por
exemplo, quando se observa por qual das fendas passa cada electrão na
experiência de difracção, obtém-se sempre um dos dois resultados: fen-
da a ou fenda b. A probabilidade de ocorrência de cada um destes resul-
tados é bem definida. Na ausência de observação, a suposição de que
os electrões passam por uma ou por outra das fendas não se coaduna
com o diagrama de intensidades no alvo. A sobreposição de estados
exprime-se aqui segundo a igualdade abstracta,
> =e [> +et>. (2.7.6)
LE
Outro exemplo, talvez nais sugestivo, é o da determinação expe-
simental do estado de polarização dos fotões (Dirac, Cap. 1, Secção 2;
Feynman, Leighton e Sands, vol. HI, Secção 11-4). Consideremos um
feixe de luz monocromática a passar por um cristal de turmalina que
tem a propricdace de se deixar atravessar apenas por luz pleno-polari-
zada perpendicularmente ao seu eixo óptico. Se o feixe de luz for pola
rizado perpendicularmente ao eixo óptico (estado de polarização le),
então todo ele atravessará o cristal; sc for polarizado paralelamente ao
eixo (estado de polarização lj. não passará luz alguma; se estiver
polarizado segundo um plano que faça um ângulo « com o eixo (estado
l,>), verifica-se experimentalmente que só passará a fracção sin? a do
feixe incidente. A dificuldade surge quando se pergunta o que é que
sucede a cada fotão de um feixe plano-polarizado segundo o ângulo «?
Para responder a esta pergunta temos que imaginar um detector de fotões
colocado do lado do cristal oposto ao da incidência do feixe e reduzir
a intensidade do feixe de fotões incidentes a um nível tal que corres-
ponda à passagem de um fotão de cada vez. Nestas condições, verifica
remos que umas vezes o fotão passa inteiramente — resultado 2 —
ourras vezes não passa — - resultado Ph Nunca sucede passar uma fracção
do fotão incidente ou passar um fotão num estado de polarização inter-
média, Segundo o princípio da sobreposição, o estado do fotão incidente
representa-sc pela expressão
nai ma (217)
Se repetirmos a observação um grande número de vezes verifica-se que a
fracção dos fotões incidentes que atravessam o cristal é igual a sina = a
e a fracção dos que não atravessam é ERRO) - Uma vez determi
l
nado o cstado de polarização de cada fotão, encontra-se sempre um dos
dois possíveis valores: P, ou Pp Vez alguma se encontra um estado de
polarização intermédia correspondente a p . Mas antes de atravessar o
cristal cada forão encontra-se polarizado segundo o plano que forma o
57
de Hilbert (H), cujos vectores não são representáveis por segmentos de
recta dirigidos no espaço como sucede em E, 4 mas sim por funções com-
plexas de variável real.
Voltemos à equação das amplitudes probabilísticas (2.7.2). A pro-
babilidade de ocorrência da propriedade x, num ensemble preparado no
estado & obtém-se quadrando o módulo da amplitude probabilística
SXulP7. À equação (2:12) pode escrever-se para qualquer propriedade
Xy, do observável x. A correspondência entre as propriedades y, Dad had]
e as amplitudes probabilísticas <p> traduz-se numa função que ire-
mos, doravante, designar por & (3
, designar por & Gy),
PO) =<yjo> (3.1.1)
Note-se que enquanto à direita em (3.1.1) Q representa o rótulo
de um determinado estado do ensemble, em y (%) o sítabolo q é usado
para representar uma função matemática cujo valor, em cada Xy, é igual
à amplitude probabilística associada a cada propriedade aa io NDA
Funções como q (x) terão que concordar com os resultados das expé-
riências a que dizem respeito dando conta do comportamento mecânico-
-quântico dos ensembles. Para representar as características ondulatórias
inerentes à interpretação dos fenómenos microfísicos, as funções amplitude
probabilística py (x) deverão abranger duas entidades: uma amplitude
de onda c uma fase. Serão, pois, funções complexas de variável real que
representam vectores no espaço de Hilbert. (Nota: o Exercício 3.1 tem
por objectivo relembrar a utilização dos números complexos). Contudo,
nem todas as funções complexas de variável real podem ser vectores de
Hilbert. Para que tal suceda é necessário que a função satisfaça a condi-
ção básica de o quadrado do seu módulo traduzir uma função probabi-
lidade estabelecendo, deste modo, a ligação com os resultados experimen-
tais. Assim, q (x) representa uma função amplitude probabilística ou
função de transformação desde que
Oo P= x? <a |9>, (k=12,..), (3.1.2)
58
seja a probabilidade de ocorrência da propriedade x; no ensemble prepa-
rado no estado q. No caso de x, ser um entre um contínuo de valores,
[24d [dx Kg] 92" <xy [92d (Rai ar). (3.1.3)
é agora a probabilidade clementar para que x, ocorta com um valor
compreendido entre x, c XytdXy € (312) passa a representar a cor-
respondente densidade probabilística.
Usando a definição de função amplitude probabilística podemos
englobar numa única expressão todas as igualdades do tipo (27.2) para
as diferentes propricdades x,
<xle>=E<y|w,> <p>. (3.1.4)
Tal como sucede em (2.72), esta igualdade pressupõe que o-
somatório se estende a todas as propriedades w, do observável w (as pro-
pricdades que compõem um observável constituem um conjunto com-
pleto). Consideremos, agora, 0 caso particular em que x e Q represen-
tam o mesmo estado, y=q. Então, a substituição de q por x em (3.1.4)
permite obter
[xx [P=[E<x| > <w, x> [= (3.1.5)
(Nota: a amplitude probabilística <yxlx> satisfaz a <yxly>"<yy>=
sapo
Por outro lado, 2, 4 S0X>"<ulx>, segundo (2.6.3). Ora,
somando estas probabilidades sobre todos os w, isto é, sobre o conjunto
completo das propriedades w, obtém-se o acontecimento certo,
2<m,|y>"<wj) >=1 (3.1.6)
59
A compatibilidade entre (315) co quadrado de (3.1.6) implica
<xo>=<w y>* (3.1.7)
qualquer que seja 9, e com certeza também, para qualquer estado x,
uma vez que o não particularizámos.
As considerações que acabámos de fazer dizem respeito a um con-
junto discreto de propriedades e». Para o caso de um domínio contínuo
(por exemplo, se « for o observável posição x) os somatórios das expres-
sões (3.1.4,6) convertem-se em integrais, segundo o que foi dito para
(31.8). Assim, por exemplo, teremos
<yp>= | uix><aje ds (3.1.8)
Usando a notação (3.1.1) e o resultado (8.1.7) podemos então escrever
(818) do seguinte modo
Sxle- | x Caolx dx (3.1.9)
Esta igualdade torna mais explícito o significado da notação <y|g>
proveniente da teoria da transformação de Dirac e nomeadamente dos
símbolos |> e <| (ver, por exemplo, Pauling e Wilson, Secção 54, e
as referências lá indicadas entre as quais se encontram as de Dirac; ver,
também, Feynman, Leigbton e Sands, vol. HI, Secção 162 e Feynman,
Rev. Mod. Phys., 20, 367 (1948)).
3.2 — Vectores do espaço de Hilbert
Existem duas operações comuns a todos os espaços vectoriais: a
multiplicação por um escalar e a adição de vectores, Estas operações pro-
duzem vectores do próprio espaço. Outro aspecto primordial de muitos
espaços vectoriais é a existência de uma operação chamada produto inter-
no. O leitor está, por certo, familarizado com esta operação em E,.
62
base ortonormal. Tanto em H comp em E, existe uma infinidade de
conjuntos que satisfazem esta condição. NES encuanto em E, todos os
conjuntos dos vectores de basc contêm apenas três vectores, em H um
conjunto de vectores de base é de dimensão infinita. Assim, se fe (x)
representar um conjunto ortonormal completo em H, então, qualquer que
seja o vector-H, Ux), é sempre possível encontrar um conjunto de coefi-
cientes (cj), tal que
o
Wlx)=5 cxpi(x). (3.2.10)
i=1
Ora, se calcularmos o produto interno de um vector-H da base º, por
Yx) em (32.10), obtemos
<eju>=<o, jEos> a asejo>= SeBy=o, (3.2.11)
ias!
onde a penúltima igualdade se deve à ortonormalidade dos vectores da
base, Este tesultado é importante porque mostra que os coeficientes c, da
da expansão (2.2.10) são os produtos internos <y, |>. Podemos então
reescrever a igualdade (32.10) do seguinte modo:
co
D)=E<y [4>g (x) (3.2.12)
i=1
Esta equação é formalmente semelhante à que exprime o princípio da
sobreposição de estados (274) (ver Secção 3.1).
3.3 — Operadores do espaço de Hilbert
É fácil estabelecer uma analogia simples entre o conceito de função
Hx) e o de operador. Como sabemos, uma função f(x) traduz uma
regra de correspondência entre dois números, a variável independente x
e a variável dependente y=f(x). Este conceito é aplicável também
63
as regras de correspondência entre vectores. Simplesmente, neste caso,
A
tisa-se o termo operador. Assim, O é um operador no espaço de Hilbert
se e só se traduzit uma regra de correspondência entre dois vectotes em
H, Vlx) e W(x), isto é, se
e(e)= Out) (3.3.1)
Ao actuar sobre Y(x) o operador O transforma este vector-H no
vector-H q(x). Por exemplo, “d/dx” é o operador derivação em relação
à variável x e “log” representa o operador logaritmo.
Na secção anterior considerámos as seguintes operações com vecto-
res em H: (i) multiplicação por um escalar; (ii) adição entre vectores;
(iii) produto interno. Também entre operadores podemos definir as seguin-
tes operações:
(OJt)=AOW(+)) (3.3.2)
(O +0 WG)=0 VEIO Ux) (3.3.3)
1 2 1 2
A A A 4
(0,0, )W(x)=0 (0, vtx)) (33.4)
Em relação à última igualdade é conveniente desde já chamar a atenção
para o facto de nem sempre ser irrelevante a ordem de aplicação dos
A A AN Ra
j E : 4 = =
operadores 0, e Os isto é, nem sempre So, Co. (Alias, em
casos muito importantes esta igualdade não se verifica, como veremos
mais tarde). Contudo, se esta condição se verificar para dois determina-
AR
dos operadores À e B, qualquer que seja o vector de Hilbert a que se
A
E
aplique o produto dos operadores, diz-se que 4 e B comutam. Assim
RN
4 e B comutam se e só se
A EA (3.3.5)
qualquer que seja o vector-H q(x).
64
Quase todos os operadores de interesse em Mecânica Quântica
possuem uma propriedade designada por lincatidade. Por definição, um
A
operador O diz-se linear se e só se
Ôle bla) des (6,08 (2)+ 608,00) (83.0)
quaisquer que sejam os vectores Plx) e Vylx) e os números com-
plexos c, = c, (Exercicio 3.4).
Há, em Mecânica Quântica, um importante po de operadores
A
que se designam por hermiteanos. Um operador O é hermiteano se e só
se, para quaisquer dois vectotes-H (x) e Dylx), se verificar a igual-
dade (Exercício 3.5)
<4, [O4,>=<04,|d,> (3.3.7)
A título de exemplo, podemos verificar se o operador O = c (c é um
escalar) é ou não hermiteano. Se D(x) e U5(%) orem dois vectores-H
arbitrários, teremos
<y Jey,>= Sb |d>.
Mas como
c<y Jy,>= [ "Par 6) 4,6) de= ns [4 (2) W,(x) de
o JE
O nv
conclui-se que
EEE dom Suor
Portanto, para se verificar a igualdade (337) o operador c tem que satis-
A
fazer à condição c=c”, isto é, O=c é um operador hermiteano se c tor
67
Para demonstrar este teorema mostraremos que Rs ins
dois vectotes-H, (x) e (x), se verifica a relação <y|do>=<Agjg>
que define Á como operador hermiteano,
Por Iupótese, tx,(x)) é um conjunto completo de vectores-H.
Portanto, é possível expandir qualquer vector-H em termos dos a lx),
ou scja, aplicando esta conclusão a P(x) e P(x) escrevemos
Plx)=3 cx, (x) Plx)=Ldy&n( x)
A A
Calculamos agora <Agly> utilizando a linearidade de 4 e o facto de
A
Kn(x) serem vectores próprios de Á:
m ma
A A
SAP|e>=< AE c, a) Edoç%
= Bop dom Edytu>
= Ecydn kn] Bd km>
Ea
—EBciaidaGnjem
E DE A Om sin
am
=5ot
Lonardn
n
Portanto, <áylo>= Eckétd.. De um modo análogo, o leitor pode
atada
mostrar que e vldç>= Zckd, ti . Estes resultados ao iguais porque os
A
valores próprios são reais, por hipótese. Fica então provado que <p| Ap >=
A
<Av|e> para quaisquer (x) e o(x) do espaço do Hilbert, o que é
A
equivalente a afirmar que 4 é hermitcano, qe:
O conjunto completo de vectores e valores próprios de um determinado
operador tem enorme importância em Mecânica Ro como sc confirma pelo
que sc segue. Considerando um operador linear A designe-se por Tam (w)) a
conjunta completo e ortonormal dos seus vectores próprios e por (a 1) os cor-
respondentes valores próprios. Prova-se que o conhecimento de (antx)) e de
fa, 5 basta para definir completamente o operador 4. De facto, pata qualquer
ATTT IN
68
A A
vector «b(x), o vector que resuita da aplicação de 4 a dx) Ab(x), pode
ser completamente definido através de (a,) e (a,) como a seguir se demonstra,
tan) é um conjunto completo de vectores no espaço de Hilberr. É possível,
portanto, expandir qualquer função cm termos de
ta, 8, consequentemente
também «b(x).
bla)=Eo, a, (x)
n
=» Sa |b>a, (x)
A segunda igualdade utiliza o resultado (3.2.12), demonstrado anteriormente.
A
Sendo 4 um operador linear cujas funções próprias são &n vem
A a
Cacio (62)
a
Esta igualdade prova a afirmação, na medida em que o segundo membro fica
inteiramente determinado através dos vectores x , dos valores 4,e dos coefi-
n ú
cientes <a, |y>. Estes últimos pressupõem o conhecimento de (x) que
está, aliás, implícito no raciocínio.
Exercícios
31 — a) Representar o número 2=4hiy (x, y reais, i= y/ —1) no plano com-
plexo exprimindo o valor absoluto ou módulo de > (=distância » do ponto z à
origem) e a sua fase ou argumento (=ângulo 8 que o raio vector ao ponto z faz
com o semicixo positivo dos xx) em função de x e y.
' E 8
Db) Calcular 22*, eb mostrar que z=re e calcular o valor absoluto e
a fase de; 25, gen 435, d*
c) Usando à igualdade z=reº, definiz produto e cociente de dois números
complexos.
d) Partindo da igualdade
jk
89
onde k é inteiro, zero, negativo ou positivo, determinar as n raízes complexas
distintas da umidade.
e) Mostrar que
mao UG) ja;
Bla
e cost=(e +e )/2
3.2 — Provar as expressões (3.2.3) (em que condições é comutativo o produto
interno no espaço de Hilbert?), (3.2.4). (325) e (3.2.6)
3.3 — Sendo v, (x) e d, (x) dois vectores do espaço cc Hilbert, mostrar que:
a) O pratico interno CY, 4, > é um número complexo com módulo finito;
b) Qualquer combinação ! linear é também um vector do espaço de Hilbert.
3.4 — Classificar os seguintes operadores como operadores Jineares ou não-lineares:
a) nd? /dx2; b) (...)2 (representar este operador sob a forma (3.8.1));
A a A a
c) exp; d) À tal que Ap=q*; e) B tal que By=1/y.
3.5 — Mostrar que a definição de operador hermiteano que resulta de (3.3.7)
fazendo d=0,=4 isto é,
PoyrOpar= [(Og* ddr
é equivalente a (3.8.7) (Sugestão: substitua +b por fteg, em que f e g obede-
cem «os requisitos de vectores do espaço de Hilbert e em que « é um parâmetro
arbitrário eventualmente complexo).
A A
3.6 — Sendo Oque o, operadores hermiteanos provar que
A A
ac 0, +68, O, é hermiteano se c e A forem reais;
dr Di
b) o pro Õ, Õ, é hermitcano sc o, e 04 comutarem, isto é, (0: Õ a
=0,0,-0,0, a
37 — Ind: E E tea quais dos seguintes operadores são hermiteanos
a) d/dx; b) i(d/dy); o) dº/dx?; ilda/de2); e) XP, (Ps =-iho/0x).
3.8 —Será que (ABr BA ya é um operador hermiteano se à e B o forem?
3.9 — Determinar as funções próprias e os correspondentes valores próprios do
operador d/dx. Quais são as funções próprias de d2/dx2 que apresentam valores
próprios negativos?
A
3.10 — Sendo em, funções próprias de 4 com o mesmo valor próprio a (nível
degenerado), provar que qualquer combinação linear de my E bs é também fun-
n
ção própria de 4 com o valor próprio a.
A.
POSTULADOS DA MECÂNICA
QUÂNTICA
Ultimately we must resort to postulates; no theore-
tical science can do otherwise *
W. H. Cropper
41 — Os postulados da Mecânica Quântica
As considerações dos capítulos 1 e 2, especialmente deste último,
mosttam claramente que o principal problema da Mecânica Quântica
é o cálculo das probabilidades de ocorrência dos possíveis resultados
de uma medição. No capítulo 2 apresentmos ainda, entre outros con-
ceitos importantes em Mecânica Quântica, o de observável, de função
de estado ou função de onda e indicámos, no capítulo 3, as entidades
matematicas que lhes correspondem. Iremos, agora, apresentar um con-
junto de postulados que permite à utilização quantitativa dos conheci-
mentos adquiridos e a sua aplicação a sistemas atómico-moleculares.
Ao consultar diversos livros de Mecânica Quântica, o leitor Facil-
mente verificará que não existe um conjunto único de postulados. O que
aqui vamos apresentar é extraído do excelente livro de Levine.
* Do attigo «Quantura Mechanics with a little less mystery» por W. H. Cropper,
J. Chem. Educ. 46, 839 (1969).
73
Postulado 1 — O estado de um sistema é descrito por
uma função W das coordenadas e do tempo. Esta função,
designada por função de estado ou função de onda, contém
toda a informação que se pode obter sobre o sistema. Postu-
Ja-se ainda que W é univoca, contiana é quadraticamente
integrável (este último requisito é omitido para estados do
não )
continno ).
Este postulado está nz sequência natural das considerações que
apresentámos, no capítulo 2, sobre o conceito de estado em Mecânica
Quântica (Secções 2.5, 26 e 27) e, em especial, no capítulo 3, cobre
as [unções amplitude probabilística como vectores ce Hilbert (Secções
31 e 3.2, (Exercício 4.1).
As finções de onda de um especrro contínuo são ortonotmalizadas
recorrendo a função delta de Dirac. Sobre estes assuntos (função delta
de Dirac é espectros contínuos) ver qualquer livro de Mecânica Quântica
avançada (por exemplo, Merzbacher, Secções 8.4, 14.6, 14.7; ver também
Exercicio 3.14).
Postulado 2 — 4 cada observável corresponde um ope-
rador bermiteano linear Para se deduzir à expressão deste
operador, escreve-se a expressão mecânico-clássica em termos
das coordenadas cartesianas e das correspondentes componen-
tes da quantidade de movimento e substitui-se cada coorde-
nada x pelo operador x e cada componente p, pelo operador
=1h0/0x.
Entende-se este postulado na seguência das propriedades dos ope-
radores hermiteanos lineares (Secção 3.3, Exercício 42). A primeira afir-
mação restringe os operadores correspondentes a observáveis a operadores
hermiteanos o que é consequência do requisito de serem números reais
os resultados de uma medição. A linearidade dos operadores hermiteanos
tessalta do princípio da sobreposição de estados (Secção 27). Quanto à
tegrta de construção dos operadores que se referem a observáveis (Exer
cício 43) existe uma dificuldade sempre que a expressão clássica con-
*
asse ma
a
tenha o produto de uma coordenada cartesiana pela correspondente com-
ponente do momento conjugado. Neste caso, os operadores que corres-
pondem a estes observáveis não são comutativos em Mecânica Quântica
e, portanto, põe-se a questão de saber qual a ordem que se deve seguir
além de se levantatem as dificuldades já apresentadas nos exercícios 37.e)
e 38.0 leitor interessado poderá consultar E. H. Kemere W. G. Sutcliffe,
FT Math. Phys, 11,891 (1970) cas referências lá incluídas. O assunto
levar-nos-ia para fota do âmbito deste texto, não sendo por isso aqui
considerado: (Sobre o cálculo de comutadores efectuar os Exercícios
4d e 45),
Postulado 3 — ()s valores que resultam das medições do
observável G são unicamente os valores próprios g, da equação
A
CY ge, (4.1.1)
A
onde Gé o operador corespondente ao observável G. Ás
funções próprias q, obedecem aos requisitos matemáticos de
uma função de estado.
Este postulado contém, fundamentalmente, uma definição de fun-
ção própria de um operador, através da relação que estabelece com o pro-
cesso de medição de um observável. De facto, à função própria de um
operador correspondente ao observável G é a função representativa de um
estado y, do ensemble que foi preparado com a particularidade de dar
um valor único e certo: g, na medição de G. A equação (4.1.1) pres-
supõe que todos os microssistemas do ensemble foram preparados no esta-
do q, caracterizado pela propriedade de estado g; Contudo, mesmo
no caso em que o cstado do sistema ) não coincide com qualquer estado
próprio de e, os resultados da medição de G só podem ser os valores pró-
prios g;.
Estando o ensemble no estado P; pode levantar-se a questão de
saber qual é o resultado de sucessivas medições do observável G. Basta,
n
então, aplicar o operador (7 sucessivas vezes a ?,. Ora,
HGo)=Cge)= e (69) ge,
o
A conclusão será, pois, a de que, independentemente do estado
A
em que o ensemble [o preparado ser ou não estado próprio de G, os
q cn ol
resultados da medição são unicamente os valores &i (postulado 3) sendo
=penas possível, dentro da Mecânica Quântica, estabelece: as suas pro-
Babilidades de ocorrência, a partir dos coeficientes e, (ver Secção 2.7, sobre
& significado da sobreposição de estados em Mecânica Quântica). Nes
fas condições, quando o resultado de uma medição não é certo e único
fo ensemble não está preparado no estado próprio do observável medido;
emplo: ensemble de átomos de hidrogénio em equilíbrio térmico com
” exterior a temperatura constante e em que as populações dos níveis
de energia obedecem à distribuição de Boltzmann), interessa saber calcular
o valor médio do observável. É esse o objectivo do postulado seguinte.
Postulado 5-— Se W (gut) representa « função de estado nor-
malizada de um sistema no instante t, então o valor médio
do observável G nesse instante é
<g>= [U'Gua, (4.1.2)
de dr representa o elemento de volume no espaço das coordenadas das
tículas do sistema. Se estas forem coordenadas cartesianas vem, por
cada partícula i considerada dr =dx dy dz, e di= nai Apliquemos
este postulado juntamente com os dois anteriores:
A A
<g>= [W'GUui= E (Bete )G (Tejo de=
i
=EBefe, [e !Cp de=BBc Peg y= Bag 2,8;
c, representa a probabilidade de ocorrência do tesultado &
No caso Pa em que 'P traduz um estado próprio w, do observável
G, vem
= f POP dA=e
78
ou seja, o resultado da medição é então único e igual ao valor gy (a dis-
tribuição probabilística de valores não tem dispersão, neste caso).
A definição de valor médio
GR (4.1.8)
é válida para os valores discretos de um observável, No caso de valores
contínuos aquela definição deverá ser expressa por
<G>= [P(gJgdg. (41.4)
Neste caso, Plg) representa uma densidade probabilística e Plgldg a
probabilidade elementar de ocorrência de g com valores compreendidos
entre g e g+dg. Se o observável G for uma coordenada posicional, por
exemplo x, é
<y> — Pixar
Mas, de acordo com este postulado, será também
Ce | Molida= [ Wado,
Comparando as igualdades anteriores chega-se à conclusão que
Ha NO (x) de= [U( 2) Pd representa a probabilidade de ocorrência,
no instante é, da coordenada posicional x entre x e x+dx. Aliás, esta
afirmação já nos apareceu na secção 2.8, equação (2.6.3). Não a consi-
detámos agu como um postulado distinto (vulgarmente conhecido por
postulado de Bor) por estar contida no postulado 5, como acabámos
de provar.
79
Postulado 6. 4 evolução no tempo do estado de um sis-
tema não perturbado é dada pela equação de Schroedinger
dependente do tempo
moW/0=ry (4.1.5)
A
onde H é o bamiltoniano do sistema, ou seja, o sem ope-
rador de energia.
liste postulado prende-se com a evolução temporal do estado
de um sistema não perturbado É será abordado numa perspectiva de
comparação com a correspondente equação da Mecânica Clássica, na
Secção 44. Até 4o momento tínhamos considerado apenas us casos em
que o sistema (na realidade, subconjuntos do ensemble ou subensembles,
ver Secção 2.4) era sujeito à medição de um observável e, consequente
mente, sujeito a uma interacção com o aparelho de medida.
Podemos, agora, concluir que a função de estado de um sistema
pode alterar-se de dois modos. Um, para o sistema isolado, não pertur-
bado, corresponde a uma variação contínua descrita pela equação de
Schroedinger dependente do tempo. Outro, ocorre na medição de uma
propriedade, podendo implicar uma alteração brusca, descontínua, do esta-
do dos subensembles que são objecto de medição. A Mecânica Quântica
não permite prever o resultado desta alteração, mas apenas a probabr-
lidade de ocorrência de qualquer possível resultado. Esta mudença brusca
do estado W para um estado próprio de G P;, designa-se por redução
da função de estado mas não tem reflexos nas distribuições probabilísti-
cas dos obscrváveis (Secção 2.4; ver N. D. Christondouleas, J. Chem.
Educ., 52, 573 (1975); embora não sejam discutíveis as previsões expe-
rimentais da Mecânica Quântica, ainda hoje existe controvérsia quanto
à sua interpretação conceptual: ver B. S. DeWitt, Physics Today, 28,
30 (1970)),
Seguidamente vamos extrair dos postulados anteriores algumas
conclusões imediatas e importantes. A primeira diz respeito aos obser-
s
="
82
Substituindo esta função em (41.8), imediatamente se verífica que a
exponencial dependente do tempo pode ser eliminada de ambos os mem-
bros, visto o hamiltoniano não depender, por hipótese, do tempo. Che-
p E Pp E
gamos assim à equação
Hu(g)-Eo(g) (4111)
O factor exp( —ibilh ) que aparece na expressão da função de estado
Wíg.t) (factor de fase) representa apenas a variação, com o tempo,
da fase na função de onda. Não tem qualquer significado físico, visto
não afectar a densidade probabilística PP º=W"W dos estados estacio-
nátios. Por isso, é vulgar considerar-se W(g) como sendo a função
de onda e (41.11) como sendo à equação de valores próprios da energia
ou equação de Scbroedinger independente do tempo. (Nota: no fim desta
Secção recomenda-se y Exercício 4,7).
4.2 — Medição simultânea de vários observáveis
Postulámos anteriormente que, se uma função de estado b for
A
função própria do operado: 4 com o valor próprio q, então a medição
do observável 4 com o ensemble no estado conduz por certo ao tesul-
tado a (postulado 3). Se & for simultaneamente função própria de dois
A KA
operadores 4 e B,
A A
AÁv=ey By=by (42.1)
os observáveis 4 e B têm simultancamente, no estado 4, valores bem
definidos. Estas considerações referem-se a um estado y bem definido
que é estado próprio dos dois operadores. Mais geral e importante, será
um critério mavemático que permita reconhecer quando é que é pos-
sível medir simultânca c cxactamente dois observáveis. Pelo que
acabámos de dizer tal critério prende-se com a possibilidade de exis-
tir um conjunto completo de funções, simultaneamente funções pró-
83
prias dos dois operadores Á e B. Ora, um importante teorema da Mecá-
nica Quântica afirma:
(i) se existir um conjunto completo de funções próprias comum
a dois operadores, então esses operadores comutam;
(1) se 4 e B comutarem, é possível encontrar um conjunto com-
pleto de funções próprias que lhes é comum.
Embora seja a alínea ii) que responde directamente à questão
levantada (condições para que dois operadores possuam um conjunto
completo de funções próprias comum e, consequentemente, possam ser
simultaneamente mensuráveis com exactidão), começaremos pot provar
A A
i) por ser mais simples e directa. Ássim, designando pr 4 ebB dois
operadores lineares que possuem um conjunto completo de funções pró-
prias &, comum, virá
A A
Aa Babo; (4.2.2)
onde a, c b, são os valores próprios. Pretendemos provar que, nestas
condições,
AA
(4,B)=º. (4.2.3)
ou seja,
An aa
(AB-BA)y=0 (4.2.4)
para uma função arbitrária x. Como as funções q formam um conjunto
completo (postulado 4), é possível expandir x segundo a igualdade
x=Lc9, (4.2.5)
Então,
(AB-BA)y=(AB-BÁJZC,
=se(ÁB-RÁJe,
= Be(Áb, cs Bao;)
=Be(bagi abs)
= (o
Pa 1“ F
p'! U
84
Deve-se notar que a condição para que os operadores comutem exige a
existência de um conjunto completo de funções próprias comuns e não
apenas de uma ou algumas funções próprias comuns. Os operadores pode-
comuns e, con-
tudo, não comutarem. No Capítulo 6 sobre Momento Angular encon-
trar-se-ão exemplos desta situação.
riam, eventualmente, possuí algumas funções própria
A
Passemos agora à alínea ii) do teorema. Pretendemos provar que, se A
A
e B comutarem, é possível construir um conjunto completo de funções próprias
de Ê nesta circunstância designadas per q, comum a gi Dividiremos à dermons-
tração em «luas partes, uma relativa à níveis não degenerados, outra a níveis
degenerados. Começando pela primcira parte, basta fazer o raciocinio pata um
nível não degenerado Porque, como veremos, a conclusão é igualmente válida
para qualquer outro, na medida em que, durante a demonstração, não se verifica
a «mistura» de funções próprias relativas a estados com valores próprios diferen-
A
tes. Isto dá-nos a oportunidade de eliminar o índice 4 nas funções próprias de 5,
€; O que se toma especialmente vantajoso no caso seguinte dos níveis degene-
ã
rados, na medida em que alivia a notação, então necessariamente mais complicada.
Comecemos, então, pelo caso não degenerado e representemos por b e q um
A
valor próprio e a correspondente função própria do operador 8,
4
Bo=by, (4.2.6)
A
Aplicando à esquerda, a ambos os membros desta equação, o operador 4 e utili
A K ;
zando a camutabilidade de 4 com B (hipótese), obtém-se
RAR A
A(By)=A(be) =b(Ãg) aii E
DV Brag)=b( Ap) (4.2.7)
-=B(do)
A
Esta igualdade prova que « função y= Átp também é função própria de É com
o mesmo valor próprio. Para níveis não degencrados, como é o caso de &, isto
significa que 4 e q são linearmente dependentes e uma função é múltipla
da outra:
Udo, (4.2.8)
87
ções , (ver 4.2.13). As n raízes de (4.2.17) dão os valores próprios 4, 88,
Introduzindo estes resultados em (42.16) determninam-se então os coeficientes d,
que prssáic conhecer as E e (ver 42.11), funções próprias simultanea-
mente de á (ver (42,12) e de Du ed.
O teorema que acabimos de demonstrar revela a cxtraordinária
importância, em Mecânica Quântica, dos pares de operadores que comu-
tam. Considerando três observáveis 4, Be €, poderemos perguntar agora
se as condições
(ÁBj=0 (42.18)
(ACI (42.19)
são sulicientes para assegurar a existência de um conjunto completo de
funções próprias dos três operadores e, consequentemente, permitir a
medição simultânca e exacta dos três observáveis.
A primeira igualdade permite concluir que é possível construir
á tim A A E
um conjunto de funções próprias comum a 4 e B; da segunda infere-se
fade
o mesmo para 4 e C. Será então que os dois conjuntos de funções pró-
A RUA
prias de 4 são idênticos, comuns a Be C?2 À resposta poderá ser «não»,
A
se algumas das funções próprias de 4 pertencerem a um nível dege-
nerado, Neste caso, como qualquer combinação linear de Rae
pr róprias relativas ao nivel degr enerado é uma função própria de io pode
suceder que as combinações lineates que são funções próprias comuns
A ARA
A
a À e B não coincidam com as que são funções próprias comuns a 4 e C.
Portanto, para garantir a existência de um conjunto de funções próprias
comuns aos três operadores e, consequentemente, assegurar a medição
simultânea e exacta de o B E 51 conclui-se que é necessário exigir
também
(B, C)-0, (4.2.20)
88
No capítulo 6, sobre Momento Angular, ocotterão frequentemen-
te casos que ilustram esta situação.
4.3 — Expressões das incertezas de Heisenberg
Na sequência do teorema anterior (dois observáveis, representados
por operadores que comutam, podem ser medidos simultancamente com
precisão), vamos considerar agora c caso de dois operadores hermitea-
A A
nos 4 e B que não comutem, pois, neste caso, Os observáveis não pode-
rão set medidos simultânea e exactamente. As incertezas nas medições
de 4 e B estarão relacionadas com as variâncias ou dispersões que se
definem como
(SA = [Ut(d=<A> rp (48.1)
(AB) | qHB-<B>)ydr (4.3.9)
onde Y representa a função de estado que não é, em princípio, unção
própria comum a A e B e pode nem sequer ser, admitamos mesmo, fun-
ção própria de qualquer dos operadores. Neste estado, a medição de À
dá um conjunto de resultados diferentes 4, (Postulado 3), cuja disper-
são à volta da média se define através da média dos quadrados dos des-
vios, variância ou dispersão de À (43.1). Note-se que não seria lógico
considerar simplesmente a média dos desvios porque então o resultado
seria nulo devido à compensação de desvios positivos e negativos (Exer-
cicio 4.8).
O significado físico de (43.1) é mais claro quando se expan-
de Y nas funções próprias de á, y=Ec,?p e se introduz esta expressão
em (43.1), obtendo (Exercicio 4.9)
(AA=BIe (MA, <AD>. (4.3.3)
Vê-se claramente que se trata de uma soma ponderada dos quadrados dos
desvios (os pesos c; =cic, traduzem, como sabemos, as probabilidades
de ocorrência dos resultados Á, no estado Y, ver (43.1).
89
As raizes quadradas positivas das vatiâncias, A4 e AB, designam-
-se por desvios padrão ou inceriezas em À e B e obedecem à uma impor-
tante expressão,
| a4AB2>|[ AB de, (4.3.4)
|
que demonstraremos a seguir c da qual deduziemos as expressões
das incertezas de Heisenberg (Merzbacher. Secção 8.6),
Comecemos por usar a qualidade de operador kermiteano que tan-
ta A como B possuem, resultando nas expressões (43.1) c (432)
(Má je= [[A-<A> WU A-<A> ds
= [(d-<a>ypar (4.3.5)
(aB)2= [|(B-<B>)yjtas. (4.8.6)
Para demonstrar (4.3.4) é necessário usar a seguinte desigualdade,
aplicável a funções complexas,
E É vs
Lrido Joga, | reteDap, (4.3.7)
da qual é fácil deduzir, como casos particulares, as conhecidas desigual-
dades de Schwarz. Deixando a demonstração de (43.7) para depois da
de (434), basta substituir em (43%) f por CAE e g por
A
i(B— <B>) para se chegar facilmente (Exercício 4.10) a
as A A
(AAJ(AB)= = [OCAR BA Jydr]? (4.3.8)
O leitor reparará por certo no sinal negativo fora do quadrado, no
segundo membro da expressão, e pode ficar com a impressão de que o
resultado a que chegámos é trivial, na medida cm que o primeiro mem-
bro é necessariamente positivo. Na realidade, não é trivial, pois se prova
92
tador (2, Pa) a funções próprias 4, de Po usando a qualidade de hermi-
teano deste operador, vem
Si p)> = | USP ads
Sl f 4Abada | pá Way de
=2,1 [ 4º ,4,8x] 2d [at la]=0. (4.317)
a nm
Por outro lado, sc substituitmos Lx, Py ) pelo resultado (43.15)
vem
Ep, PD =ih (49.18)
Ora, comparando (43.17) e (43.18) surge imediatamente a contradi-
ção O=;h!,
O artigo que divulgou a discussão de paradoxos deste tipo entre
químicos terá sido o de E. R. Davidson, J. Chem. Phys., 42, 1461 (1965),
posteriormente comentado por R. Yaris, ibid, 44, 425 (1966). Mais recen-
temente, R. À. Harris e H. L. Strauss, J. Chem. Educ., 55, 374 (1978)
trouxeram o assunto à atenção de um maior número de químicos.
A resolução do paradoxo parte do conhecimento de que o estabele-
cimento de um operador pressupõe um determinado domínio de funções
em relação ao qual ele se definc. O leitor não considerará, por certo,
esta afirmação como nova, se se lembrar do teorema demonstrado no fim
da Secção 3.3 em que se afirmou que o conjunto de todos os vectores
e valores próprios de um operador basta para o definir. Poderá, à pri-
meira vista, parecer que caímos num círculo vicioso, vectores e valores
próprios que se referem a uin certo operador a servirem para o definir-
Contudo, assim não é, porque o Postuiado 3 mostra que os valores é
vectores próprios têm um significado físico que lhes é conferido no pro-
cesso de medição de um observável, independentemente da definição da
entidade matemática que é o operador. A ideia de que a um determi
nado operador corresponde um certo domínio de funções de onda, sobres-
93
sai, aliás, na apresentação do conceito de operador em vários livros de texto
como, por exemplo, Landan e Lifshitz, Secção 8, ou Kemble, Secção 36b.
Assim, quando se define um operador automaticamente se define um
conjunto de funções próprias que estabelece o domínio em que é válido
o referido operador (o leitor facilmente reconhece que esta afirmação
faz sentido à luz das considerações sobre medição de um observável,
à
Secção 4.1. Postulado 3). Ora o comutador (4.8, tratado como
ne A
um único operador, não contém as funções aróprias de 4 e B entre as
funções do seu domínio. Ao ignorar tal aspecto estamos a alargar, impli-
ALA
citamente, o domínio de funções de (4,B) e consequentemente, a
definir um operador novo, diferente do que pretendemos. Eventualmen-
tc, saímos mesmo do domínio em que cada um dos operadores, por
A
exemplo «4, é hermiteano c representa um observável, porque aumen-
A
tamos o seu domínio com as funções By, que não são funções próprias
de 4 (W, é função própria de À).
Estas considerações permitem concluir que não existe contradição
real na expressão (4.3.4) dentro do domínio de funções em que o comu-
tador é definido. Segundo Yaris a questão importante consiste em saber
se esta restrição (normal, como vimos) exclui algumas Junções de onda
fisicamente aceitáveis. Analisemos o exemplo anterior. Scrá que as fun-
ções próprias de Z c p, representam funções de estado aceitáveis? Con-
, 5 A A
stderemos o caso das funções próprias de 2,
AX
a= e” (4.3.19)
onde N é a constante de normalização (ver Exercício 3.9). Esta função
própria diz-nos que a probabilidade de encontrar a partícula entre x e
x+dx é
E
Vic (e)da="da, (4.3.20)
“pp
Aa ir Res E Rato
94
ou seja, a mesma probabilidade em qualquer ponto ao longo do eixo
dos xx. Tal basta para mostrar que as funções próprias Y, não reptesen-
tam situações fisicamente admissíveis porque com elas desaparece com-
pletamente a individualidade da partícula. Embora as [unções próprias
a A ; , - -
de x ou p, não sejam apropriadas como funções de estado podem servir
para cxpandir matematicamente uma função de estado adequada, repre-
sentativa de uma situação fisicamente concebível.
44 — A Mecânica Clássica como caso limite, mais restrito,
da Mecânica Quântica
A informação completa sobre um ensemble pressupõe não só o
conhecimento das distribuições probabilísticas dos seus observáveis num
dado instante como também a evolução destas no tempo. A função de
estado (função de onda) fornece toda esta informação. De facto, o qua-
drado do módulo da função de estado num ponto do espaço configura-
cional contém a vatiável tempo como parâmetro permitindo assim deter-
minar as distribuições probabilísticas em qualquer instante. Deve ser,
pois, possível, mesmo à escala quântica, prever os fenómenos físicos,
dentro dos limites que o princípio da incerteza impõe e no contexto
do princípio do determinismo estatístico. Se o conhecimento da função
de estado num dado instante permite estabelecer a evolução das distri-
buições probabilísticas no tempo, então WW está relacionada com a sua
derivada em ordem ao tempo, CW/0r, e essa relação deve ser represen-
tada por uma equação linear em obediência 20 princípio da sobreposição
de estados. Consideremos um ensemble isolado durante um certo inter-
valo de tempo e representemos por (b,(g.1,)) o conjunto completo
de todas as tunções próprias de um observável de estado qualquer, no
instante £,. Este conjunto de funções permite definir qualquer estado
do ensemble no instante 5,
Cgi )=Red(g,). (44.1)
TA
A relação linear (44.1) que define, pelo princípio da sobreposição de
estados, um estado I” no instante ty deve manter-se durante o inter-