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Guias e Dicas
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Manual Epidemiologico da Febre Amarela, Manuais, Projetos, Pesquisas de Gestão Ambiental

descrição da doença, agente etiológico, reservatórios, vetores, modo de transmição e tratamento

Tipologia: Manuais, Projetos, Pesquisas

Antes de 2010

Compartilhado em 04/11/2009

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cristiane-freitas-5 🇧🇷

4.7

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Baixe Manual Epidemiologico da Febre Amarela e outras Manuais, Projetos, Pesquisas em PDF para Gestão Ambiental, somente na Docsity! MANUAL DE VIGILÂNCIA EPIDEMIOLÓGICA DE FEBRE INN 3 Manual de Vigilância Epidemiológica de Febre Amarela Brasília - 1999 6 Apresentação O Brasil possui a maior área enzoótica de febre amarela do mundo, abrangendo cerca de 5 milhões de km2 , correspondendo à Região da Bacia Amazônica, que inclui as Unidades da Federação da Região Norte e Centro-Oeste e a Pré-Amazônia Maranhense. A saúde pública brasileira enfrenta atualmente um grande desafio. É necessário intensificar e aprimorar as ações de vigilância da febre amarela com a finalidade de detectar precocemente a circulação viral, se possível, antes mesmo de incidir em seres humanos, enquanto ainda atinge somente animais silvestres. É necessário ainda que as atividades de imunização alcancem altas coberturas, de forma homogênea, nas milhares de localidades da região enzoótica e também em localidades infestadas pelo Aedes aegypti fora daquela região. A Gerência Técnica de Febre Amarela e Dengue, da Fundação Nacional de Saúde, do Ministério da Saúde, coordenou a elaboração deste Manual de Vigilância Epidemiológica da Febre Amarela, fruto da contribuição de inúmeros profissionais vinculados à pesquisa, ensino, vigilância e controle desta enfermidade. Este trabalho foi necessário tendo em vista as alterações ocorridas nos fatores epidemiológicos da doença no Brasil e nas Américas, nos últimos anos. Incluem-se entre elas, a introdução no Continente Americano do Aedes albopictus, potencial vetor da febre amarela, susceptível à infecção pelo vírus amarílico, em laboratório, e o número crescente de municípios brasileiros infestados pelo Aedes aegypti, considerado, até o momento, o único vetor conhecido da forma urbana da doença nas Américas, a qual foi eliminada do País há mais de 50 anos. Espera-se que a ampla divulgação deste Manual contribua para o aprimoramento da vigilância epidemiológica da febre amarela no Brasil, aumentando a sua sensibilidade, reduzindo o número de casos da forma silvestre e evitando a re-emergência da sua forma urbana. A disseminação de conhecimentos sobre a febre amarela, acumulados ao longo de nossa história, onde eminentes sanitaristas do porte de Emílio Ribas, Adolfo Lutz, Oswaldo Cruz, Clementino Fraga e muitos outros, se destacaram internacionalmente, é o objetivo deste Manual. É desejo da Gerência Técnica de Febre Amarela e Dengue que os profissionais do Sistema Único de Saúde, a nível federal, estadual e municipal, encontrem nele um guia seguro para desenvolvimento das atividades mais adequadas de vigilância e controle, na busca da proteção da população brasileira contra esta grave doença. Pedro Luiz Tauil 7 Sumário 1. Introdução ................................................................................................................................08 2 . Distribuição Geográfica e Aspectos Históricos .................................................................09 2.1 - No Mundo......................................................................................................................09 2.2 - Nas Américas.................................................................................................................11 2.3 - No Brasil........................................................................................................................12 3 . Aspectos Epidemiológicos.....................................................................................................17 3.1 - Definição........................................................................................................................17 3.2 - Áreas Epidemiológicas .................................................................................................17 3.3 - Formas Epidemiológicas ..............................................................................................18 3.4 - Agente Etiológico..........................................................................................................18 3.5 - Fonte de Infecção ..........................................................................................................18 3.6 - Vetor Reservatório ........................................................................................................19 3.7 - Modo de Transmissão...................................................................................................19 3.8 - Período de Incubação....................................................................................................20 3.9 - Período Extrínseco de Incubação ................................................................................20 3.10 - Período de Transmissibilidade ...................................................................................21 3.11 - Suscetibilidade ............................................................................................................21 3.12 - Imunidade....................................................................................................................21 3.13 - Distribuição Segundo Tempo, Espaço e Pessoas......................................................21 3.14 - Morbidade e Letalidade ..............................................................................................23 4 . Aspectos Clínicos ...................................................................................................................24 5 . Alterações Laboratoriais ......................................................................................................27 6 . Patogenia e Patologia.............................................................................................................28 7 . Tratamento..............................................................................................................................31 8 . Diagnóstico Diferencial .........................................................................................................33 8.1 - Com as Formas Leves e Moderadas ............................................................................33 8.2 - Com as Formas Graves.................................................................................................33 9 . Diagnóstico Laboratorial ......................................................................................................35 9.1 - Rede de Laboratórios de Diagnóstico de Febre Amarela ...........................................35 9.2 - Testes Laboratoriais ......................................................................................................35 9.2.1 - Diagnóstico Virológico....................................................................................35 9.2.1.1 - Isolamento do Vírus .........................................................................36 9.2.1.2 - Detecção de Antígenos Virais e/ou Ácido Nucleico Viral.............36 9.2.2 - Diagnóstico Sorológico....................................................................................37 9.2.3 - Diagnóstico Histopatológico ...........................................................................38 9.3 - Normas para Coleta, Rotulagem e Conservação de Material ....................................38 9.3.1 - Coleta de Amostras ..........................................................................................38 9.3.2 - Rotulagem das Amostras.................................................................................40 9.3.3 - Conservação e Transporte das Amostras........................................................40 8 10 . Vigilância Epidemiológica ..................................................................................................42 10.1- Objetivos.......................................................................................................................42 10.2 - Definição de Caso.......................................................................................................42 10.2.1 - Caso Suspeito...........................................................................................................42 10.2.2 - Caso Confirmado por Critério Clínico-Laboratorial .............................................43 10.2.3 - Caso Confirmado por Critério Clínico-Epidemiológico .......................................43 10.2.4 - Caso Descartado.......................................................................................................43 10.3 - Notificação ..................................................................................................................43 10.4 - Investigação Epidemiológica e Medidas de Controle ..............................................44 10.5 - Fatores que Condicionam o Aparecimento de Epidemias........................................46 11 . Medidas de Controle de Rotina .........................................................................................47 11.1 - Medidas Referentes aos Fatores de Transmissão......................................................47 11.2 - Medidas Referentes ao Hospedeiro ...........................................................................47 11.2.1 - Vacinação .................................................................................................................47 11.2.1.1. Características da Vacina.......................................................................................48 11.2.1.2 - Estratégias de Vacinação......................................................................................49 11.2.2 - Informação, Educação em Saúde e Comunicação.................................................50 12 . Recomendações Gerais .......................................................................................................51 13 . Bibliografia ...........................................................................................................................52 14 . Anexos ...................................................................................................................................55 11 Surtos de febre amarela ocorrem na África há muitos anos. Na África tropical, essa doença é enzoótica em macacos nas áreas florestais. Antes das campanhas de imunização em massa nesse continente ocorreram surtos urbanos em Lagos (Nigéria) em 1925/1926; em Accra (Ghana) em 1926/1927 e em 1937; em Banjul (Gâmbia) em 1934/1935. Uma epidemia de grande magnitude ocorreu no Sudão em 1940, quando 15.641 casos e 1.627 óbitos foram registrados numa população de 230.000 habitantes, com uma taxa de letalidade em torno de 10%. Estimativas baseadas em inquéritos sorológicos evidenciaram que aproximadamente 40.000 pessoas foram infectadas. Duas estratégias de luta foram adotadas na África durante os últimos quarenta anos: vacinação sistemática e programa de controle emergencial após o início de um surto. Em 1940, um programa obrigatório de vacinação de rotina foi instituído nos países de língua francesa da África Ocidental, onde 25 milhões de pessoas foram imunizadas em 4 anos. Em conseqüência, os ciclos de ocorrência das epidemias de febre amarela foram interrompidos nessa região, desaparecendo gradualmente nesses países, enquanto a atividade epidêmica e endêmica se manteve nos países sem programas de imunização. Infelizmente, a partir de 1960 essa estratégia foi negligenciada em função do decréscimo do número de casos e do próprio desinteresse pela doença. Adotou-se, então, um sistema de vacinação e de luta emergencial do tipo “apaga incêndio”, que resultou na ocorrência de uma série de epidemias de gravidade variável. O mais severo episódio ocorreu na Etiópia, em 1960/62, quando uma dramática epidemia afetou o sudoeste do país, com a notificação de 3.000 óbitos. Em 1989, o Programa de Imunização da Organização Mundial da Saúde (OMS) recomendou a inclusão da vacina contra febre amarela no esquema de vacinação infantil dos 33 países de risco da África. Atualmente, apenas 17 países têm uma política nacional neste sentido e desses, apenas 3 (Burkina Faso, Gâmbia e Mauritânia) têm alcançado coberturas vacinais acima de 50% em crianças menores de 1 ano. Entretanto considerando os 33 países de risco, os níveis de cobertura vacinal não passaram de 11% em 1992 e de 7% em 1993. Vale ressaltar que 38% dos casos de febre amarela ocorridos em Ghana em 1993 e 33% dos casos durante uma epidemia do Quênia em 1992, acometeram crianças, ou seja, esse grupo etário também faz parte da população de risco. Os países africanos expostos ao risco de febre amarela estão entre os mais pobres do mundo. Embora a vacina anti-amarílica custe menos de U$ 0,25 por dose para os países em desenvolvimento, este preço ainda constitui um obstáculo para muitos deles. A febre amarela continua sendo uma ameaça nas zonas endêmicas da África, apesar da existência de uma vacina eficaz. Embora a doença seja de notificação obrigatória, somente uma pequena percentagem dos casos é conhecida; apenas através de inquérito sorológico é que se conhece a verdadeira extensão e distribuição da doença. Nos últimos trinta anos, alguns surtos de febre amarela foram transmitidos por Aedes aegypti (Senegal-1965, 1981 e 1995; Angola-1971 e 1988; Serra Leoa-1975; Gambia-1978/79; Costa do Marfim-1982; Nigéria-1987/88), mas não tem ocorrido transmissão da forma urbana nas grandes cidades, embora esse risco exista em decorrência da infestação de muitas delas pelo Aedes aegypti. Na década de 90, a Nigéria foi o país que mais registrou casos da doença na África. Dos 12.283 casos e 2.165 óbitos notificados no período de 1989 a 1995 no continente, 11.434 casos (93,1%) e 1.933 óbitos (89,3%) foram procedentes daquele país. 12 2.2 - Nas Américas Não se sabe se a febre amarela já existia no Novo Mundo antes das viagens de Colombo. Evidências levam a crer que tenha sido introduzida na América tropical através dos navios que faziam o tráfico de escravos. Presume-se que a epidemia febril que atacou os conquistadores espanhóis na Península de Yucatan, em 1648, tenha sido febre amarela. As tripulações dos barcos que navegavam pelas rotas transatlânticas e costeiras em águas equatoriais constituíam uma fonte permanente de vítimas com o vetor se adaptando à vida de bordo, utilizando os recipientes de água doce como locais de proliferação. Dessa maneira, a febre amarela se transformou na “praga dos mares”, fazendo vítimas em praticamente todos os portos que recebiam essas embarcações. Durante os séculos XVIII e XIX e início do século XX, “a febre amarela foi o maior flagelo das regiões tropicais, fazendo inúmeras excursões estivais pelas zonas temperadas dos hemisférios boreal e austral, de tal modo que não há região no Continente Americano, que não tenha sido invadida, desde o sul, da Argentina ao Chile, até o norte, no Canadá” (Soper, 1942). A febre amarela afetou principalmente imigrantes europeus recém-chegados, não imunes. No início do século XIX uma grande epidemia dizimou as expedições francesas enviadas ao Haiti para debelar uma rebelião. Na região do Caribe foram descritas 83 epidemias no período de 1620 a 1900. Nos arredores de Havana (Cuba), o vírus permaneceu em atividade desde 1762 até o início deste século, quando Gorgas conduziu a erradicação do vetor. Nos Estados Unidos era freqüente a ocorrência de casos da doença na costa do Golfo do México. Em 1905, foi registrado em Nova Orleans o último caso autóctone de febre amarela naquele país. Por muitos anos acreditou-se que a transmissão da febre amarela se fazia através dos miasmas, do desenvolvimento espontâneo da doença nos navios negreiros e outras teorias. Foi Nott quem primeiro, em 1848, vagamente aventou a idéia de que a febre amarela poderia ser transmitida por mosquito. Mas o divulgador, quem primeiro a defendeu, foi o médico francês Louis Daniel Beauperthuy que, em 23 de maio de 1854, relatou os fatos relacionados com a transmissão da febre amarela, em artigo publicado na “Gaceta Oficial de Cumaná”, nº 57, ano 4, Venezuela. Quase três décadas após, em 1881, Carlos Finlay defendeu a mesma teoria, incriminando o Aedes aegypti, baseado em cuidadosas observações que, infelizmente, não receberam o crédito merecido, à época. As campanhas anti-culicidianas realizadas em Havana, Panamá, Santos, Rio de Janeiro e outros centros urbanos, após a demonstração experimental, em 1909, dos Dr. Reed, Carroll, Lazear e Agramonte, de que a febre amarela podia ser transmitida de uma pessoa a outra pelo mosquito Aedes aegypti, resultaram no desaparecimento da doença das vastas zonas tropicais americanas, onde se adotou medidas de controle contra esse mosquito. Do mesmo modo, as campanhas organizadas no Equador, Peru, Colômbia, América Central e México foram seguidas do completo desaparecimento da doença. A febre amarela continua confinada às matas das bacias dos rios Amazonas, Orinoco, Catatumbo, Atrato e Madalena, onde afeta pessoas não imunes. Na América do Sul, a doença vem sendo registrada a cada ano, basicamente em 5 países: Bolívia, Equador, Peru, Colômbia e Brasil, onde no período de 1989 a 1995 foram registrados 1.373 casos silvestres, com 762 13 óbitos e letalidade de 56%. Em 1998, a Venezuela notificou um surto de febre amarela silvestre em área indígena yanomami, após 11 anos sem registro da doença. 2.3 - No Brasil “A febre amarela foi o principal problema de saúde pública já enfrentado pelo Brasil, tanto pelo alto índice de letalidade da própria doença, como pelo desconhecimento da sua profilaxia e tratamento, na segunda metade do século passado, quando ela se instalou no litoral brasileiro e depois se alastrou pelo interior do país. Foi criado um clima de terror. Ninguém sabia como e nem porque começavam as epidemias, se do ar, do solo, da água ou do contato entre objetos e pessoas. A única coisa que se sabia era que as epidemias vinham todos os anos e se alastravam rapidamente, matando mais de um terço das pessoas contagiadas por ela. Essa terrível certeza tirava o sossego e a segurança de todos. Desde os pobres, que viviam em área insalubres e eram as vítimas mais numerosas, até os barões do café que, embora isolados em suas fazendas, temiam as conseqüências das epidemias na economia do país. Enquanto isso, o transmissor continuava livre, sem barreiras que o impedissem de se deslocar para os mais distantes lugares para se procriar. As condições sanitárias das cidades brasileiras no fim do século passado eram as mais precárias possíveis. As redes de esgoto praticamente inexistiam. Na grande maioria das casas não se conheciam as mais rudimentares noções de higiene e, mesmo nas residências mais abastadas e mais limpas, havia tinas permanentemente cheias de água parada para não ressecar as tábuas do barril serrado, servindo de criadouro para o mosquito. Além de matar mais que uma guerra, durante mais de meio século o “tifo americano” entravou também o desenvolvimento do país, ao afugentar os estrangeiros que aqui pretendiam trabalhar tanto nas fazendas de café como investir capitais no incipiente comércio ou na quase inexistente indústria da jovem nação. O trabalho de combate até a erradicação da febre amarela no Brasil durou mais de 50 anos e não foi obra de uma só pessoa. Entre todos os abnegados trabalhadores dessa campanha, destaca-se o médico paulista, de Pindamonhangaba, Emílio Marcondes Ribas, que precedeu Osvaldo Cruz no combate ao mosquito vetor da febre amarela.” (O Estado de São Paulo, nº 63 - Suplemento do Centenário, 06.03.76). Um resumo da história da febre amarela e do percurso dos vetores envolvidos com essa doença no Brasil, é exposto a seguir: 1685 - Primeira epidemia de febre amarela no Brasil, em Recife/PE. 1686 - Presença de Aedes aegypti na Bahia, causando epidemia de febre amarela (25.000 doentes e 900 óbitos). 1691 - Primeira campanha sanitária posta em prática, oficialmente no Brasil, em Recife /PE. 1849 - A febre amarela reaparece em Salvador/BA, causando 2.800 mortes. Neste mesmo ano, o Aedes aegypti, instala-se no Rio de Janeiro, provocando a 16 1993/94 - Epidemia de febre amarela silvestre no Estado do Maranhão em 4 municípios (Mirador, Barra do Corda, Esperantinópolis e Pastos Bons), com 86 casos, dos quais 12 foram a óbito. 1995 - O Aedes aegypti foi identificado em 25 dos 27 Estados, exceto Amazonas e Amapá. 1996 - Surto de febre amarela silvestre no Estado do Amazonas, com 14 casos e 12 óbitos. 1996 - Identificado o Aedes aegypti em Manaus/AM, totalizando 2.617 municípios infestados por esse vetor. 1997 - Identificado foco do Aedes aegypti no município de Oiapoque/AP, evidenciando sua presença em todos os estados e abrangendo 2.719 municípios. 1998 - O Aedes aegypti continua sua dispersão abrangendo 2.921 municípios, atingindo inclusive áreas enzoóticas. 1998 - O Aedes albopictus dispersa-se para 1.465 municípios de 13 estados, adaptando-se ao ambiente urbano, muitas vezes ocupando os mesmos criadouros do Aedes aegypti. 1998 - Surto de febre amarela silvestre no Estado do Pará, com 23 casos e 9 óbitos. 17 3. Aspectos Epidemiológicos 3.1 - Definição A febre amarela é uma doença febril aguda, de curta duração (no máximo 12 dias) e de gravidade variável, cujo agente etiológico é um arbovírus do gênero Flavivírus. A forma grave caracteriza-se clinicamente por manifestações de insuficiência hepática e renal, que podem levar à morte. 3.2 - Áreas Epidemiológicas No início deste século, quase toda a totalidade do território brasileiro era área de risco de febre amarela. Com o desaparecimento da modalidade urbana da doença e a manutenção de casos humanos de febre amarela silvestre, estudos epidemiológicos anteriores à década de 70 tornaram possível a delimitação de 3 áreas epidemiologicamente distintas no país (Mapa 2): Mapa 2 • Enzoótica ou endêmica - corresponde à área onde o vírus amarílico circula entre os hospedeiros naturais (principalmente macacos, marsupiais e outros), há a presença de vetores silvestres e o homem é infectado de forma acidental. Abrange os estados das regiões Centro-Oeste e Norte e a parte pré-amazônica do Maranhão. • Epizoótica ou de transição - corresponde à área onde no início do século havia intensa circulação do vírus amarílico entre os hospedeiros naturais. No entanto, com o crescente processo de desmatamento, acredita-se que o nicho ecológico tenha sido alterado e nos últimos 30 anos a circulação viral foi evidenciada de forma esporádica no Estado de Minas Gerais. Abrange uma faixa na área noroeste de Minas Gerais, São Paulo, Paraná, oeste de Santa Catarina e noroeste do Rio Grande do Sul. Mais aceita hoje como área de transição, será objeto de estudos para melhor delimitação. Brasil, 1998 Fonte: MS/FNS DADOS GERAIS (1) ÁREA ENZOÓTICA UNIDADES FEDERATIVAS - 12 SUPERFÍCIE Km²: 5.482.727 ÁREA INDENE UNIDADES FEDERADAS - 16 SUPERFÍCIE Km² - 2.968.452 ÁREA ENZOÓTICA OU ENDÊMICA ÁREA EPIZOÓTICA OU DE TRANSIÇÃO ÁREA INDENE (1) O Maranhão está incluído em duas áreas ÁREAS EPIDEMIOLÓGICAS DE FEBRE AMARELA 18 • Indene - corresponde à área onde não há circulação do vírus amarílico. Abrange os estados das regiões Nordeste, Sudeste e Sul. 3.3 - Formas Epidemiológicas Apresenta-se sob duas formas epidemiologicamente distintas: febre amarela silvestre e febre amarela urbana. Semelhantes dos pontos de vista etiológico, fisiopatológico, imunológico e clínico, as diferenças entre elas dizem respeito à localização geográfica, espécie vetorial e tipo de hospedeiro. A febre amarela silvestre ocorre acidentalmente pela penetração do homem no ciclo enzoótico natural. Esta forma epidemiológica da doença é uma séria ameaça às populações rurais e um risco permanente para a introdução do vírus nas grandes cidades e pequenas localidades infestadas pelo Aedes aegypti. Em intervalos cíclicos de cinco a sete anos, a febre amarela silvestre pode aparecer em surtos, conseqüentes a epizootias em macacos. Nestes animais, a doença manifesta-se periodicamente num intervalo suficiente para o surgimento de novas populações suscetíveis, após cada grande epizootia (Amaral et al., 1983). Ao mesmo tempo, não havendo população símia disponível, o vírus movimenta-se para encontrar novos hospedeiros viáveis visando à manutenção natural. Assim, no decurso da epidemia de 1934 até 1940, o vírus amarílico se deslocou desde o Estado de Mato Grosso até os Estados de Santa Catarina e Espírito Santo através de sete ondas sucessivas (Hervé et al., 1983). Já na população humana, as epidemias podem não ser registradas regularmente em função de fatores que interferem na susceptibilidade aos vetores silvestres infectados, como é o caso de uma boa cobertura vacinal da população exposta ao risco (Amaral et al., 1983) ou de um Sistema de Vigilância Epidemiológica que não consegue identificar todos os surtos. 3.4 - Agente Etiológico O vírus amarílico é o protótipo do gênero Flavivírus, família Flaviviridae, que inclui pelo menos 68 membros. É um RNA vírus. Apresenta antígeno grupo-específico com outros flavivírus, tais como Uganda S, Zika e Wesselsbron, sendo o vírus Zika que ocorre na África, o mais antigenicamente relacionado ao vírus amarílico. Estas afinidades sorológicas podem corroborar a teoria da origem africana da espécie. 3.5 - Fonte de Infecção Na forma silvestre, os primatas não humanos são os principais hospedeiros do vírus amarílico, principalmente os macacos pertencentes ao gênero Cebus (macaco prego), Alouatta (guariba), Ateles (macaco aranha) e Callithrix (sagui). Os macacos Alouatta, assim como os Callithrix e Ateles, são muito sensíveis ao vírus e apresentam taxa de letalidade elevada. Já os Cebus infectam-se facilmente, mas apresentam baixas taxas de letalidade e geralmente desenvolvem imunidade. Diversos mamíferos também são suscetíveis à doença, destacando-se os marsupiais e alguns roedores que funcionam possivelmente como reservatórios do vírus na natureza. Inquéritos sorológicos em áreas endêmicas e estudos durante epidemias têm mostrado a participação do gambá, porco espinho e do morcego no ciclo silvestre da doença. Contudo, a importância epidemiológica destes animais na manutenção da doença ainda não é conhecida. 21 3.10 - Período de Transmissibilidade Começa 1 dia antes do início dos sintomas e vai até o terceiro ou quarto dia de doença, o que corresponde ao período de viremia (período em que o vírus permanece no sangue). Não se transmite por contágio direto, nem através de objetos contaminados. 3.11 - Suscetibilidade É universal. 3.12 - Imunidade Imunidade ativa: a doença confere imunidade ativa natural, permanente, não se conhecendo recidivas. A vacina confere imunidade ativa artificial por um período mínimo de 10 anos. Imunidade passiva natural: lactentes filhos de mães imunes podem apresentar imunidade passiva até o 6º mês de vida. 3.13 - Distribuição Segundo Tempo, Espaço e Pessoas A comparação da epidemiologia da febre amarela silvestre em três países da América Latina (Bolívia, Brasil e Venezuela) revela características comuns quanto à distribuição dos casos da doença segundo tempo, espaço e pessoas. • Tempo A doença ocorre com maior freqüência no final da temporada de chuvas (Gráfico 1), quando a densidade da população vetorial é elevada e as pessoas se dedicam ao desmatamento. A distribuição sazonal dos casos difere de um país para outro, segundo a latitude e outros fatores que afetam o começo da temporada de chuvas. Gráfico 1 DISTRIBUIÇÃO SAZONAL DE CASOS DE FEBRE AMARELA Bolívia, Brasil e Venezuela 0 10 20 30 40 JAN FEV MAR ABR MAI JUN JUL AGO SET OUT NOV DEZ Meses N º de c as os BOLÍVIA BRASIL VENEZUELA Fonte: Bol of Saint Panam 102(4), 1987. 22 Uma série temporal, representativa dos casos de febre amarela registrados no Brasil no período de 1930 a 1997 (Gráfico 2), evidencia uma tendência cíclica da ocorrência da doença a cada 5 ou 7 anos. Intervenções pontuais, como vacinação em massa ou mesmo intensificação da vacinação de rotina, influenciam a tendência geral da ocorrência da febre amarela, de forma decrescente. Esse impacto foi bastante evidente a partir do advento da vacina em 1937, havendo uma queda importante do número de casos da doença, que evoluiu para a eliminação da forma urbana, à medida em que se formava uma barreira de imunidade coletiva na população. Quanto a sazonalidade, a análise da série histórica da incidência da febre amarela silvestre, a partir de sua descoberta em 1932, revela oscilações periódicas e regulares, prevalecendo entre os meses de janeiro a junho, que correspondem à temporada de chuvas na área enzoótica, ocasião em que a densidade vetorial é mais elevada. • Espaço Conforme já mencionado anteriormente, a doença é própria da região de matas onde circula o vírus amarílico. Entretanto, a forma urbana pode ocorrer em qualquer localidade desde que exista população humana susceptível, presença do Aedes aegypti e introdução do vírus. • Pessoas A maioria dos casos se verificam entre adultos de 15 a 40 anos de idade (Gráfico 3). Em relação ao sexo, os homens são afetados com uma freqüência quatro vezes maior do que as mulheres. A distribuição por idade e sexo se explica pela exposição ocupacional durante as atividades agrícolas e outras relacionadas ao ambiente silvestre, tais como: garimpeiros, caminhoneiros, pescadores, desmatadores, caçadores, turistas, etc. Entretanto, em algumas regiões tem variado esta distribuição. Por exemplo, em 1981, em Rincón del Tigre na Bolívia, onde as mulheres e os meninos desempenham papel importante no trabalho agrícola, cerca de 25% dos casos corresponderam a meninos menores de 10 anos e a proporção entre homens e mulheres afetados foi de 1:1,3. FEBRE AMARELA Nº de casos e doses de vacinas aplicadas Brasil, 1930 -1997 0 50 100 150 200 250 300 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 Milhões CASOS VACINA 30 40 50 60 70 80 90 Fonte: MS/FNS/CCDTV/DEOPE/GT-FAD. Gráfico 2 23 Gráfico 3 DISTRIBUIÇÃO DE CASOS DE FEBRE AMARELA POR FAIXA ETÁRIA Bolívia, Brasil e Venezuela 0 5 10 15 20 25 30 0 5 10 15 20 25 30 35 40 45 50 55 60 Idade N º de c as os BOLÍVIA BRASIL VENEZUELA 3.14 - Morbidade e Letalidade Em inquéritos realizados após surtos da doença, demonstrou-se que até 90% da população apresenta anticorpos recém adquiridos. No Brasil, no período de 1980 a 1997, foram registrados 342 casos de febre amarela silvestre, dos quais 201 foram a óbito, evidenciando uma taxa média de letalidade de 58,8%, variando desde 22,9% até 100%. Isso representa uma média de 19 casos por ano. A letalidade da febre amarela grave é de aproximadamente 50%. No entanto, considerando todas as formas clínicas da doença, é da ordem de 5%. Fonte: Bol of Saint Panam 102(4), 1987. 26 Quadro 1 FORMA QUADRO CLÍNICO DURAÇÃO MÉDIA LEVE OU FRUSTA Discreto aumento de temperatura e cefaléia, de duração fugaz e evolução para a cura Até 2 dias MODERADA Febre e cefaléia de início abrupto, náuseas, vômitos, epistaxe, icterícia e sinal de Faget (dissociação pulso-temperatura) Até 2 dias GRAVE Infeccioso ou congestivo Início súbito, febre alta, cefaléia, mialgias, artralgia, dores ósseas generalizadas, náuseas, vômitos e sinal de Faget Geralmente até 2 dias Remissão Melhora clínica dos sintomas Poucas horas a 2 dias P er ío do s Toxêmico Novo aumento de temperatura, exacerbação das manifestações clínicas descritas nas formas anteriores, insuficiência renal, do tipo pré-renal que evolui para a insuficiência renal intrínseca, apresentando oligúria e anúria. Os sintomas de insuficiência hepática são evidenciados pela icterícia, melena, hematêmese e outras manifestações hemorrágicas (epistaxes, gengivorragias e otorragias) Até 2 dias No surto de febre amarela silvestre ocorrido em 1972, no Estado de Goiás, foram observadas as seguintes manifestações clínicas, em ordem decrescente: febre 100%, icterícia 91%, dor abdominal 85%, mialgias 85%, náuseas 80%, vômitos 72,5%, cefaléia 62,5%, oligúria 57,5%, calafrios 55%, melena 50% (Gráfico 4). Gráfico 4 SINTOMAS DA FEBRE AMARELA SILVESTRE Surto de 1972 em Goiás 0 20 40 60 80 100 120 FEBRE ICTERÍCIA DOR ABDOMINAL MIALGIAS NÁUSEAS VÔMITOS CEFALÉIA OLIGÚRIA CALAFRIOS MELENA S in to m as Porcentagem Fonte: FNS/CR/GO. 27 5. Alterações Laboratoriais Nas formas leves e moderadas, que apresentam quadro clínico benigno e autolimitado, não há alterações laboratoriais importantes . Nas formas graves podem ser encontradas as seguintes alterações: • Leucograma: na fase inicial da doença observa-se discreta leucocitose com neutrofilia e intenso desvio à esquerda com eosinopenia. A partir do 3º ou 4º dia o quadro hematológico altera-se para leucopenia com linfocitose, permanecendo o desvio à esquerda e a eosinopenia; • Bioquímica: - transaminases bastante aumentadas (em geral acima de 1.000 UI), sendo que o aumento maior se faz às custas da TGP, refletindo a intensa necrose do tecido hepático causada pelo vírus amarílico; - aumento das bilirrubinas, com predomínio da bilirrubina direta, podendo alcançar 20 mg% ou mais; - aumento do colesterol e da fosfatase alcalina; - níveis de uréia e creatinina muito elevados, podendo alcançar até 5 ou 6 vezes os valores normais ou até mais altos. • Urina: caracteristicamente observa-se proteinúria, hematúria e cilindrúria. Nos casos graves ocorre oligúria com baixa densidade, em conseqüência de dano tubular renal; • Coagulograma: nos casos graves há aumento do tempo de protrombina, tempo de tromboplastina parcial e tempo de coagulação. Diminuição dos fatores de coagulação sintetizados pelo fígado (II, V, VII, IX e X). Nos casos de coagulação intravascular disseminada há diminuição do fator VIII e fibrinogênio, além de trombocitopenia. Observação: Os níveis séricos das transaminases, juntamente com os da uréia e creatinina, são importantes indicadores laboratoriais da gravidade da doença. Por outro lado, os níveis das bilirrubinas direta e indireta, colesterol e fosfatase alcalina, embora constantemente elevados, não guardam correlação com a evolução clínica da doença, não se prestando, portanto, para indicação prognóstica. 28 6. Patogenia e Patologia Os conhecimentos sobre a patologia da febre amarela baseiam-se em estudos experimentais em macacos, bem como nas alterações morfológicas observadas em casos humanos fatais. Pouco se conhece sobre as alterações histopatológicas das formas leves e moderadas, embora se saiba que elas são as mais freqüentes. Após a inoculação pelo mosquito, o vírus localiza-se nos gânglios linfáticos regionais, onde se multiplica silenciosamente durante 3 a 6 dias, após os quais ocorre viremia e localização no fígado, rins, coração, sistema nervoso central, pâncreas, baço e demais órgãos linfóides. A intensa multiplicação do vírus nos órgãos atingidos produz necrose seletiva das células de origem epitelial com escassa reação inflamatória. As lesões tissulares são mais proeminentes no fígado e nos rins, com destruição de grande quantidade de células parenquimatosas. As disfunções orgânicas são causadas diretamente pelo vírus amarílico ou são decorrentes de reações secundárias desta agressão. Nos casos fatais, a agressão ao organismo é de caráter universal, havendo comprometimento simultâneo, em maior ou menor grau, de praticamente todos os órgãos. A hemorragia e a congestão vascular intensa são as alterações mais constantes (Figura 3). Figura 3 GÊNESE DAS PRINCIPAIS MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS DA FEBRE AMARELA Fonte: Adaptado de MONATH, T. P., 1984. In VERONESI, Doenças Infecciosas e Parasitárias. 8ª ed. cap. 21, Guanabara Koogan, 1991. 31 7. Tratamento Nas formas leves e moderadas faz-se apenas o tratamento sintomático da febre, cefaléia, mialgias e artralgias. Nas formas graves os pacientes geralmente demandam atendimento em unidades de saúde e, por se tratar de uma doença sistêmica com comprometimento de múltiplos órgãos, se necessário, o paciente deve ser atendido em Unidade de Terapia Intensiva. Estes cuidados reduzem as complicações e a letalidade. Não há tratamento específico. É o tratamento suportivo o único disponível para os casos graves de febre amarela. Este é fundamentado na sintomatologia apresentada. Entretanto, deve visar à correção das alterações freqüentemente encontradas em pacientes graves, que apresentam disfunções hepáticas, renal, da coagulação e hemodinâmica. Neste sentido, o tratamento inespecífico procura tratar a insuficiência hepática, insuficiência renal, hemorragias e alterações metabólicas, bem como os sintomas gerais mais exuberantes, quais sejam, febre, cefaléia, náuseas, vômitos e agitação. Para o combate à febre e cefaléia, o paracetamol é a droga mais indicada. Preconiza-se o uso de 500 mg a cada intervalo de 6 horas. O tratamento das náuseas e vômitos deve ser feito com antieméticos, sendo a metoclopramida a droga de eleição. Nos casos graves, a via endovenosa é a mais indicada. Nos casos moderados, podem ser usados supositórios via retal. A dose varia de acordo com o caso, mas em média 80mg, com o intervalo de 8 horas entre as aplicações, geralmente é suficiente. Para tratar a agitação é preferível ministrar o diazepam, na dose inicial de 10 mg via endovenosa e, de acordo com a resposta, ajustam-se a dose e horário de aplicação. Esta droga seda o paciente sem alterar o nível de consciência. As outras medidas terapêuticas preconizadas estão voltadas para tratar as seguintes complicações: • Insuficiência hepática É crucial o tratamento nas primeiras manifestações de descompensação hepática, como alteração do tempo de protrombina e tempo da tromboplastina parcial. O tempo de protrombina é considerado como o melhor marcador de disfunção hepática quando está duas vezes maior que o valor normal. A manutenção de uma dieta adequada e a prevenção de hipoglicemia como o uso de soluções hipertônicas de glicose estão recomendadas. Especial cuidado deve ser tomado na administração do volume do soluto glicosado, especialmente na iminência de insuficiências renal ou cardíaca. Atenção especial deve ser dada à hipoperfusão e oxigenação, pois podem agravar a lesão hepatocitária. • Insuficiência cardíaca e choque Todos os pacientes que se encontram na fase de intoxicação devem ter seu balanço rigorosamente sob controle. A monitoração constante desses pacientes justifica a transferência dos mesmos para Unidades de Tratamento Intensivo. A hipotensão, que é devida ao seqüestro de fluidos ou perdas excessivas, requer um tratamento cuidadoso para evitar posteriormente uma hipervolemia que pode ter repercussões danosas, principalmente na vigência de insuficiência cardíaca. 32 A medida da pressão venosa central também auxilia na orientação das medidas terapêuticas. São muito importantes os dados relativos aos sinais vitais. Estes devem ser tomados de 2 em 2 horas ou menos, de acordo com a gravidade do caso. Outros dados que são de grande ajuda são as dosagens dos gases arteriais e eletrólitos. A freqüência dos exames está em função da gravidade do caso. O uso de oxigênio está indicado na vigência de hipoxemia arterial e quando a diferença na relação de oxigenação entre sangue arterial e venoso é muito grande. • Insuficiência renal O tratamento depende se a insuficiência renal é devida a um fluxo sangüíneo baixo (azotemia pré-renal) ou decorrente de necrose tubular aguda. No caso de azotemia pré- renal conseqüente a um fluxo sangüíneo renal diminuído, está indicado o uso de diuréticos, como a furosemida. Caso a insuficiência seja devida à necrose tubular aguda, a indicação de diálise peritoneal ou hemodiálise é o melhor caminho para se tentar fazer o controle da falência renal. • Hemorragias Ainda que o estômago se constitua no sítio de maior sangramento na febre amarela, pouca atenção foi dada para prevenir hemorragia gastrointestinal. Monath (1987) preconiza o uso de infusão venosa de cimetidina associada à aspiração do conteúdo estomacal por sonda nasogástrica, como medida simples para diminuir os riscos de sangramentos. Quanto ao tratamento da coagulopatia na febre amarela, ainda é matéria bastante controversa. Há consenso apenas na origem, já que todos concordam dever-se à queda dos níveis dos fatores de coagulação. Nos casos de sangramentos severos o uso de plasma fresco ou sangue total deve ser imediatamente indicado. O uso de heparina e vitamina K tem sido defendido por uns autores, mas combatidos por outros. Ademais, parece não ter ação nos casos de necrose hepática fulminante (Monath, 1987). 33 8. Diagnóstico Diferencial 8.1 - Com as Formas Leves e Moderadas O diagnóstico diferencial é amplo, devendo ser feito com as doenças infecciosas do trato respiratório, digestivo e urinário. Na evolução observa-se aumento discreto das transaminases reforçando a suspeita clínica de febre amarela. 8.2 - Com as Formas Graves • Leptospirose - manifestações digestivas são menos pronunciadas. Hemorragias são mais tardias. Os níveis de transaminases estão discretamente aumentados. Hemossedimentação e mucoproteínas aumentadas são favoráveis à leptospirose; • Malária por P. falciparum - as formas graves, nos primeiros dias, apresentam quadro clínico compatível com o de febre amarela. Na malária a anemia é precoce, com a presença de esplenomegalia, menor tendência hemorrágica e aumento discreto das transaminases. A pesquisa do parasita no sangue confirma imediatamente o diagnóstico. Pode haver concomitância das duas doenças, uma vez que ambas podem ser adquiridas nas mesmas condições epidemiológicas; • Hepatite viral - pode ser confundida com a febre amarela, uma vez que a icterícia, sintomas digestivos e sangramento são comuns em ambas. Na hepatite a febre é pouco acentuada ou ausente. Os níveis sangüíneos de uréia e creatinina são normais e há ausência de albuminúria; • Septicemia por gram negativo cursando com icterícia - apresenta menor freqüência de hemorragias e há aumento discreto das transaminases. A existência de portas de entrada e hemocultura positiva fecham o diagnóstico; • Febre Maculosa Brasileira - lesões de porta de entrada e lesões exantemáticas que surgem após o 3º dia da doença, bem como o início tardio da icterícia, permitem orientar o diagnóstico na presença de dados epidemiológicos compatíveis; • Febres hemorrágicas virais - este grupo complexo de doenças, produzidas por arbovírus, que inclui a febre hemorrágica do dengue, constitui o maior problema de diagnóstico diferencial, uma vez que os dados clínicos e epidemiológicos têm vários pontos comuns. O diagnóstico diferencial é possível mediante investigação epidemiológica, identificação do vírus, estudos sorológicos, alterações histopatológicas típicas e conhecimento de áreas de incidência dessas doenças. Existem outros diagnósticos diferenciais da febre amarela, mas de menor freqüência, como febre tifóide, febre recorrente, intoxicações por fósforo, tetracloreto de carbono, halotano, etc. Os principais diagnósticos diferenciais estão resumidos no Quadro 2. 36 9.2.1.1 - Isolamento do Vírus O isolamento é realizado através da inoculação do material do paciente e/ou animal (sangue e derivados ou tecidos) nos seguintes meios: a) Culturas celulares: muito utilizadas recentemente por apresentarem boa sensibilidade. Após 3 a 5 dias da inoculação, o vírus causa efeito citopatogênico caracterizado por alterações morfológicas das células. As células mais usadas são: • Cultura de células de mosquitos Aedes albopictus, clone C6/36, atualmente a mais utilizada no diagnóstico. Utiliza-se também o Aedes pseudoscutellaris AP61. É um método relativamente rápido, sensível e econômico. • Cultura de células de vertebrados: - VERO (rim de macaco africano); - BHK-21 (rim de hamster recém-nascido); - LLC-MK2 (rim de macaco Rhesus). Identificação do vírus - Uma vez isolado, o vírus é identificado através dos testes de Fixação do Complemento e de Imunofluorescência Indireta. b) Camundongos brancos Swiss, recém-nascidos: após inoculação intracerebral, os animais são observados diariamente, durante 2 a 3 semanas. Dos que evidenciam sinais de doença, geralmente 6 a 12 dias após a inoculação, retira-se material para novas passagens ou para a identificação viral pelos testes sorológicos. Uma vez isolado o vírus, a identificação é feita utilizando as técnicas de Fixação de Complemento e Neutralização; c) Mosquitos adultos ou larvas: o emprego de mosquitos, tais como, o Toxorhynchites amboinensis, tem-se mostrado útil, uma vez que o vírus multiplica-se muito bem após a inoculação intratorácica. Não sendo espécie hematófaga, não apresenta perigo para a disseminação do vírus na comunidade, como é o caso da utilização de mosquitos do gênero Aedes. Para isolar o vírus do sangue ou do soro, a amostra deve ser coletada nos primeiros 5 dias após o início da febre. 9.2.1.2. Detecção de Antígenos Virais e/ou Ácido Nucleico Viral Não são utilizados na rotina. Podem ser detectados antígenos ou ácido nucleico viral no sangue e tecidos humanos, de macacos e mosquitos, mediante os seguintes métodos: • Imunofluorescência: a detecção de antígenos virais em tecidos criopreservados pode ser feita pela técnica de imunofluorescência direta ou indireta; • Imunohistoquímica: na mesma amostra de tecidos usada para diagnóstico histopatológico pode-se fazer a detecção de antígenos virais em tecidos fixados em formalina, utilizando anticorpo marcado com uma enzima (fosfatase alcalina ou peroxidase); 37 • Hibridização “in situ”: é possível detectar os genomas virais específicos usando sondas radiativas (radioisótopos) ou não radiativas (enzimas), inclusive em materiais conservados por muitos anos; • Reação em Cadeia da Polimerase (PCR): permite a detecção de quantidades reduzidas de ácido nucleico viral presente nos espécimes, pela amplificação do c-DNA obtido a partir do RNA viral. 9.2.2 Diagnóstico Sorológico Existem vários testes empregados no diagnóstico sorológico de febre amarela, sendo os mais freqüentemente utilizados: • Reação imunoenzimática de captura de IgM (MAC - ELISA); • Inibição da Hemaglutinação (IH); • Teste de Neutralização (N); • Fixação de Complemento (FC); - O MAC-ELISA é um dos métodos mais úteis para o diagnóstico de infecção recente e para diagnóstico dos casos onde existem reações cruzadas para flavivírus nos outros testes. É uma prova simples e rápida, baseada na detecção de anticorpos da classe IgM específicos de febre amarela. Pode fornecer um resultado presuntivo utilizando apenas uma amostra de soro. Esta deve ser coletada a partir do 5º dia de doença, quando o organismo já começa a responder com a produção de anticorpos. A duração dos anticorpos IgM é desconhecida e parece ser bastante variável. Em pessoas vacinadas com a cepa 17D, os anticorpos IgM neutralizantes estão presentes até 18 meses após a imunização. Na infecção primária, anticorpos IgG específicos são encontrados regularmente e anticorpos IgM são altamente específicos e usualmente presentes. Observação: O resultado deve ser considerado presuntivo onde houver circulação de vários flavivírus. Se o MAC-ELISA for negativo para outros flavivírus (ex: dengue, Ilhéus, encefalite St. Louis, etc.) o resultado é altamente indicativo de febre amarela, principalmente na presença de clínica e epidemiologia compatíveis. Em casos duvidosos, deve-se levar em conta outros resultados de laboratório. - A Inibição da Hemaglutinação é um teste sensível, de fácil execução e requer equipamentos simples, porém é a menos específica. É ideal para inquéritos sorológicos, uma vez que os anticorpos IH persistem por um longo período de tempo, talvez pela vida inteira e são usualmente detectados em casos de resposta primária, a partir da primeira semana da doença. Em casos de resposta secundária, altos títulos de anticorpos IH podem ser precocemente detectados (2 a 3 dias após o início da febre). Às vezes podem ocorrer reações cruzadas com outros flavivírus, dificultando a interpretação. A IH não é boa para avaliar resposta à vacina e é freqüentemente negativa em pessoas que demonstram soroconversão pelo teste de neutralização. A limitação deste teste deve-se à necessidade de coletar 2 amostras com intervalo de 15 dias. Considera-se positivo quando há soroconversão, representada pelo aumento de pelo menos 4 vezes os títulos de anticorpos em relação à primeira amostra. - O Teste de Neutralização é o mais específico. Detecta anticorpos neutralizantes que aparecem tão precocemente quanto os anticorpos IH, durante a primeira 38 semana da doença e permanecem por muitos anos, provavelmente por toda a vida. Os anticorpos neutralizantes são protetores e se caracterizam pela capacidade de reduzir ou eliminar a infectividade do vírus. As técnicas usadas para detecção dos anticorpos neutralizantes incluem a redução em placa em cultura celular e o teste de proteção de camundongos. Atualmente, a redução em placa é a técnica padrão para avaliar resposta à vacina antiamarílica. - A Fixação de Complemento é um teste mais específico que a IH. A presença de anticorpos é indicativo de infecção recente. Os anticorpos detectados aparecem durante a 5ª semana após o início dos sintomas e declinam rapidamente a baixos níveis, 6 a 12 meses após a infecção. No entanto, em alguns estudos os anticorpos podem persistir em títulos moderados ou elevados por períodos mais prolongados (até 2 anos). As provas sorológicas produzem resultados bem definidos quando se realizam em um paciente exposto pela primeira vez a um flavivírus. Os anticorpos específicos aparecem nos primeiros dias, alcançando níveis bastante elevados em comparação aos anticorpos heterólogos. No entanto, quando a pessoa foi exposta anteriormente a outro flavivírus, a reação é rápida e intensa em função da memória imunológica prévia. Neste caso, os anticorpos heterólogos são iguais ou mais elevados que os específicos. Estas considerações permitem entender a dificuldade na interpretação das reações sorológicas em casos de exposição anterior a outros flavivírus. 9.2.3. Diagnóstico Histopatológico O diagnóstico histopatológico da febre amarela grave é realizado a partir de espécimes obtidos “post-mortem”. As lesões anatomo-patológicas podem ser encontradas no fígado, rins, baço, coração e linfonodos. As maiores alterações encontram-se no fígado e rins (Patogenia e Patologia - ítem 6). 9.3 - Normas para Coleta, Rotulagem e Conservação de Material A confiabilidade dos resultados dos testes laboratoriais depende dos cuidados durante a coleta, manuseio, acondicionamento e transporte das amostras. 9.3.1 - Coleta de Amostras É necessário realizar os procedimentos de coleta com assepsia, usando materiais esterilizados. As amostras a serem colhidas são: • Sangue Recomenda-se coletar a 1ª amostra de sangue na primeira consulta do paciente, e a 2ª, após 14 a 21 dias. O sangue deve ser colhido em frascos estéreis, hermeticamente fechados, com tampa rosca ou em tubos à vácuo. Preferencialmente devem ser coletados 10 ml de sangue (mínimo de 5 ml). Em crianças pequenas, procurar colher o maior volume possível (2 a 5 ml). 41 Os soros destinados a isolamento viral podem ficar a 4º C, no máximo por 6 horas. Após esse período devem ser congelados no freezer a -70º C ou no nitrogênio líquido. Para o transporte deste material é aconselhável usar um botijão criobiológico contendo nitrogênio líquido. Os tubos deverão ser de plástico, previamente esterilizados, com tampa rosca, devidamente rotulados, lacrados com fita durex, envolvidos por gaze ou saco plástico, antes de serem colocados no nitrogênio. Na falta de nitrogênio líquido poderão ser transportados em gelo seco (CO2). Amostras de tecidos obtidos “post-mortem” para isolamento viral devem ser mantidas a -70º C e transportadas no nitrogênio líquido ou em gelo seco. Amostras fixadas no formol devem ser mantidas e transportadas à temperatura ambiente. As amostras de tecidos para estudos histopatológicos e imuno-histoquímicos devem ser transportadas à temperatura ambiente, devendo chegar ao laboratório até 24 horas após a coleta. Um resumo destas informações está contido no Quadro 3: Quadro 3 COLETA, ROTULAGEM, CONSERVAÇÃO E TRANSPORTE DAS AMOSTRAS PARA O DIAGNÓSTICO LABORATORIAL DE FEBRE AMARELA TIPO DE AMOSTRA MOMENTO DA COLETA RETRAÇÃO DO COÁGULO ARMAZENA- MENTO TRANSPORTE SANGUE a) Isolamento viral 1º - 5º dias 2 - 6 horas a 4ºC Soro a -70ºC Nitrogênio líquido ou gelo seco (Fase aguda) b) Diagnóstico sorológico após o 5° dia 2 - 6 horas à temperatura ambiente Soro a -20º C Gelo seco ou gelo reciclável SANGUE (Fase convalescente) Diagnóstico sorológico 14 a 21 dias após a 1ª coleta 2 - 6 horas à temperatura ambiente Soro a -20º C Gelo seco ou gelo reciclável TECIDOS (óbitos) 1. Isolamento viral A -70º C Nitrogênio líquido ou gelo seco 2. Histopatologia/ Detecção viral Tão cedo quanto possível (ideal < 8 horas; no máximo 12 horas após o óbito)b Em formalina Temperatura ambiente 42 10. Vigilância Epidemiológica A vigilância epidemiológica da febre amarela é um dos componentes do Programa de Controle de Febre Amarela e Dengue (PCFAD), cujo objetivo é manter erradicada a febre amarela urbana e evitar surtos de febre amarela silvestre. A febre amarela é uma doença de notificação compulsória internacional, objeto de vigilância pela Organização Mundial da Saúde (OMS), de acordo com o Regulamento Sanitário Internacional. Fazem parte deste grupo de doenças a peste, o cólera e a febre amarela. Nestas doenças é obrigatória a notificação imediata de todos os casos suspeitos às autoridades de saúde (Município, Estado, Ministério da Saúde, Organização Mundial da Saúde) por telefone, fax, via Internet ou qualquer outro meio rápido de comunicação. Na maioria dos países onde a febre amarela é endêmica, a vigilância epidemiológica é realizada de forma passiva. Como resultado, tem-se um conhecimento limitado sobre a situação epidemiológica, já que nem todos os casos clínicos são notificados, inclusive as formas graves diagnosticadas. Em conseqüência, há focos de transmissão que não são detectados e nenhuma medida de controle é acionada. No Brasil, esta situação é extremamente preocupante pelo risco de reurbanização, considerando que todas as Unidades Federadas que fazem parte da área endêmica para febre amarela silvestre têm a presença do Aedes aegypti. 10.1 - Objetivos • manter zero a incidência de febre amarela urbana; • reduzir a incidência de febre amarela silvestre; • detectar precoce e oportunamente a circulação viral; • conhecer o estado imunológico para estimar a população sob risco de adoecer; • conhecer o comportamento epidemiológico da febre amarela. 10.2 - Definição de Caso 10.2.1 - Caso Suspeito Paciente com quadro febril agudo (há menos de 7 dias), de início súbito, acompanhado de icterícia e que apresente pelo menos um dos seguintes achados clínicos e/ou laboratoriais ou paciente com quadro (há menos de 7 dias), de início súbito, procedente de área endêmica para febre amarela silvestre e/ou de ocorrência de casos de febre amarela: • sinal de Faget; • manifestações hemorrágicas (epistaxe, gengivorragia, hematúria, hematêmese e melena); • dor abdominal alta; • albuminúria; • oligúria. 43 10.2.2 - Caso Confirmado por Critério Clínico-Laboratorial Todo caso suspeito que tenha pelo menos uma das seguintes condições: • detecção de anticorpos do tipo IgM pela técnica de MAC ELISA; • isolamento do vírus amarílico; • laudo histopatológico compatível, com vínculo epidemiológico (procedência de área endêmica e/ou de transição para febre amarela silvestre); • detecção do genoma viral; • demonstração de um aumento de 4 vezes ou mais nos títulos de anticorpos IgG através da técnica de IH. 10.2.3 - Caso Confirmado por Critério Clínico-Epidemiológico É o caso suspeito de febre amarela que evoluiu para óbito em menos de 10 dias, sem confirmação laboratorial, no curso de surto ou epidemia em que outros casos já tenham sido comprovados laboratorialmente. 10.2.4 - Caso Descartado Caso suspeito com diagnóstico laboratorial negativo, desde que se comprove que as amostras foram coletadas e transportadas adequadamente, ou caso suspeito com diagnóstico laboratorial de outra doença. 10.3 - Notificação Para que o objetivo da vigilância epidemiológica seja alcançado, todo caso suspeito deve ser notificado à Secretaria Estadual de Saúde imediatamente, pela via mais rápida. O fluxo de notificação deve acompanhar os fluxos das doenças de notificação compulsória de cada município ou Unidade Federada, lembrando que se trata de uma doença de notificação compulsória internacional. Deve ser notificada toda e qualquer mortandade de macacos (epizootia) referida pela comunidade e/ou profissionais da área de saúde. Não se conhece exatamente a incidência real da febre amarela silvestre no Brasil, uma vez que muitos casos não são diagnosticados como tais e, por isso mesmo, não são notificados. São várias as causas dessa sub-notificação: • ocorrência da doença em áreas muito distantes dos serviços de saúde; • desconhecimento da doença por parte dos profissionais de saúde, levando a um baixo índice de suspeição; • quadro clínico compatível com outras doenças endêmicas, tais como hepatite viral, malária, especialmente no início do surto, quando a alta taxa de letalidade ainda não é evidente; • dificuldade de acesso ao diagnóstico laboratorial específico; • carência de informações sobre a doença e pouca divulgação junto a comunidade. 46 gestantes e crianças, a partir de 4 meses de idade. As autoridades de saúde devem ter pleno conhecimento da situação, sendo imprescindível que as ações de informação, educação e comunicação sejam acionadas desde o primeiro momento e permeiem as atividades de controle a serem desencadeadas. Deve ser colocado imediatamente em prática um Plano Nacional com a participação de todas as esferas de governo, para impedir a propagação do agravo na Unidade Federada e sua posterior dispersão para outras regiões do país. 10.5 - Fatores de Risco para o Aparecimento de Epidemias Em relação à febre amarela urbana, constituem condições favoráveis para a ocorrência de epidemias: • alta infestação (superior a 5%) por Aedes aegypti; • presença de uma quantidade suficiente de pessoas susceptíveis; • proximidade de um foco enzoótico, particularmente se está ativo, de onde o vírus possa deslocar-se para a área urbana; • melhoria dos meios de transporte, favorecendo o rápido deslocamento de pessoas infectadas para áreas com a presença do Aedes aegypti. Em relação à febre amarela silvestre, as condições favoráveis para o aparecimento de surtos são: • deslocamento, por motivos diversos, de pessoas susceptíveis para a área endêmica de febre amarela silvestre; • abundância de vetores, freqüentemente relacionada a fatores meteorológicos; • baixa cobertura vacinal da população residente nas áreas endêmicas e de transição para febre amarela silvestre; • presença de primatas que, por apresentar altas viremias, são verdadeiros amplificadores e disseminadores do vírus; • aparecimento de macacos mortos sem causa determinada. 47 11. Medidas de Controle de Rotina 11.1 - Medidas Referentes aos Fatores de Transmissão Na forma silvestre, onde os vetores estão amplamente distribuídos e com hábitos silvestres, não é possível a aplicação de medidas de controle. Na forma urbana, onde o vetor é o Aedes aegypti, há risco de transmissão quando os índices de infestação são superiores a 5%. Devem ser aplicadas as medidas de combate a esse vetor, de acordo com as técnicas preconizadas no “Manual de Normas Técnicas - Instruções para pessoal de combate ao vetor” - FNS/MS, 1997. 11.2 - Medidas Referentes ao Hospedeiro 11.2.1 - Vacinação A descoberta da suscetibilidade do macaco Rhesus ao vírus da febre amarela, em 1927, por Stokes, Bauer e Hudson (membros da Comissão de Febre Amarela da Fundação Rockefeller na África Ocidental) possibilitou a análise laboratorial do vírus e o estabelecimento de métodos que permitiram o estudo da doença como infecção experimental. A partir dessa descoberta, a obtenção de um meio eficaz de vacinação contra a febre amarela passou a ser objeto de atenção por parte de numerosos investigadores. Em 1937, logo após o isolamento da cepa 17D, por Theiler e Smith, nos Laboratórios da Fundação Rockefeller e a constatação de sua capacidade imunogênica para o homem, uma quantidade desta cepa foi trazida para o Brasil. No Brasil, com a finalidade de se obter uma metodologia que permitisse a produção da vacina em grande escala e por ser baixa a titulagem então preparada por replicação do vírus in vitro, Smith e Henrique Penna desenvolveram e passaram a utilizar uma nova técnica de produção por inoculação do vírus 17D em ovos de galinha embrionados, em desenvolvimento. A produção da vacina anti-amarílica no Brasil, em março de 1937, permitiu pela primeira vez o seu uso em maior escala durante o surto epidêmico de febre amarela ocorrido no município de Varginha/MG. Posteriormente, foi utilizada em programas de vacinação em outros estados brasileiros, com grande sucesso. A partir de então, a vacina passou a ser aplicada na área endêmica, de forma sistemática, aplicando-se anualmente, cerca de 4 milhões de doses. Em abril de 1991, com a criação da Fundação Nacional de Saúde, a execução das atividades de vacinação passou a ser de responsabilidade do Programa Nacional de Imunizações (PNI). As estratégias para a operacionalização passaram a ser estabelecidas em conjunto com a Gerência Técnica de Febre Amarela e Dengue, levando em consideração a situação epidemiológica da febre amarela. 48 11.2.1.1 Características da Vacina • Composição: a vacina preparada pela Fundação Oswaldo Cruz é da cepa 17D constituída por vírus vivo atenuado, procedente da amostra africana Asibi. Na preparação da vacina, o vírus é repassado em embrião de pinto de 7 a 10 dias, visando conseguir a titulagem recomendada, ou seja, em cada 0,5 ml existem 1.000 doses letais para 50 camundongos jovens. • Apresentação: a vacina é apresentada sob a forma liofilizada em frasco-ampola de 50 doses, acompanhada de diluente. Cada frasco ampola deve trazer o número do lote e sua validade. • Idade de aplicação: a partir dos 6 meses, sem limite de idade. • Via de administração: subcutânea. • Reações adversas: 2 a 5% dos vacinados podem apresentar do 5º ao 10º dia após a vacinação, mal estar, cefaléia, dores musculares e febre baixa. Esta reação dura 1 a 2 dias. Raros casos de encefalite pós vacinal foram descritos, geralmente em menores de 6 meses. Reações de hipersensibilidade imediata, causadas por erupção e urticária, são incomuns (incidência<1/1.000.000) e ocorrem principalmente em pessoas com histórico de alergia a derivados de galinha. • Esquema: dose única (0,5 ml). Observação: o reforço deve ser de 10 em 10 anos. Recomenda-se que a vacina anti-amarílica esteja disponível de forma permanente nos Serviços de Saúde, fazendo parte do Calendário de Vacinação, com vistas a proteger efetivamente a população sob risco. Recomenda-se que toda a população residente na área endêmica (Região Norte, Centro-Oeste e área pré-amazônica do Maranhão) seja periodicamente vacinada. Na área indene, esta atividade deve ser direcionada à população de risco (motoristas, agricultores, turistas, caminhoneiros, pescadores, caçadores, garimpeiros, dentre outros) que se dirigem esporádica e/ou freqüentemente à área endêmica. A vacina deve ser aplicada, no mínimo, 10 dias antes do deslocamento. • Imunidade: a Organização Mundial da Saúde considera que a vacina confere pelo menos 10 anos de imunidade. Estudos realizados mostram que 97,1% das pessoas vacinadas têm anticorpos protetores contra o vírus após 18 anos. Os anticorpos aparecem depois de um período de conversão de 10 dias após aplicação da vacina. • Contra-indicação: história de hipersensibilidade a ovos de galinha e seus derivados, idade inferior a 6 meses, gestação (exceto em situações de emergência epidemiológica), doença infecciosa aguda em estado febril (acima de 38,5ºC) e estados de imunodepressão. 51 12. Recomendações Gerais • Implementar a vigilância clínica das Síndromes Febris Ictéricas (doenças que fazem diagnóstico diferencial com a febre amarela), através da divulgação, capacitação e treinamento em serviço dos profissionais de saúde, com o objetivo de ampliar o arco de diagnóstico laboratorial e aumentar a sensibilidade. • Estabelecer a vigilância laboratorial das Síndromes Febris Ictéricas. Toda amostra de soro negativa para hepatites virais, leptospirose, malária falciparum e febres hemorrágicas virais, devem ser testadas para febre amarela, considerando algumas particularidades: - aumento de 4 vezes ou mais nas trasaminases; - pacientes suspeitos de hepatite com os seguintes testes sorológicos negativos: anti-HAV IgM, anti-HBs Ag e anti-HBc IgM, anti-HCV. • Reforçar junto às Secretarias de Saúde e seu corpo clínico, a importância da realização dos exames complementares (função hepática e renal) como uma triagem para sorologia. • Dar cumprimento às normas de vigilância sanitária, exigindo o Certificado Internacional de Vacinação contra febre amarela para todo viajante que ingressar no país, procedente de área endêmica, assim como para todo brasileiro que se dirigir para países de risco. • Incentivar a captura de mosquitos silvestres (vivos) na área endêmica para tentar o isolamento viral com vistas a prevenção de casos da doença. • Atentar para a mortandade de macacos sem causa determinada, situação que requer o rápido estabelecimento de uma barreira de imunidade na população sob risco. • Cada município deverá dispor de um técnico ou responsável pela vigilância epidemiológica da febre amarela, que se encarregará da notificação positiva imediata. 52 13. 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(Publicacion Cientifica, 299). 56 - REGIÃO CENTRO-OESTE: ISDF-DF Área de abrangência: DF, GO, TO, MT, RO - REGIÃO SUDESTE: FIOCRUZ-RJ Área de abrangência: RJ, ES, BA, MG - REGIÃO SUL: Instituto Adolfo Lutz-SP Área de abrangência: SP, MS, PR, SC, RS 57 Anexo 3 - Fluxograma de Atividades diante do Caso Suspeito de Febre Amarela CASO SUSPEITO Área Endêmica suspeito Definir local provável de infecção Investigação Atendimento médico Notificação Área Indene suspeito Coleta de material Envio ao laboratório Negativo para Aedes aegypti Positivo para Aedes aegypti Alerta ao SVE p/ o aparecimento de possíveis casos suspeitos Agilizar o resultado laboratorial Levantar coberturas vacinais Pesquisa Entomológica Reduzir os IIP a menos de 5b% nos locais de trânsito durante o período de viremia Plano Nacional Encerrar o caso Negativo Positivo Resultado laboratorial Intensificar a vacinação nas localidades com coberturas < 90% Levantar coberturas vacinais Vacinação de bloqueio Coleta e envio de material: ♦ Vetores silvestres p/ tentativa de isolamento; ♦ Macacos (se houver epizootias); Busca ativa de casos Verificar se há necessidade de realizar inquérito sorológico Coleta de amostras e posterior vacinação seletiva Encerrar o casoNegativo Positivo Resultado laboratorial Situação de Alerta 58 Equipe de Elaboração: Disney Antezana Urquidi – GT-FAD/FNS e SES/DF Elizabeth Silva de Oliveira Araújo – FNS/CR/GO Mirtha Suzana Tanaka Yamada – COLAB/FNS Zouraide Guerra Antunes Costa – GT-FAD/FNS Colaboração: Amélia Travassos da Rosa – IEC/FNS Gizelda Katz – CVE/SES/SP Joaquim Caetano de Oliveira Neto – UFGO Luiza Therezinha Madia de Souza – IAL/SES/SP Pedro Luiz Tauil – UNB Rita Nogueira – FIOCRUZ Venâncio Avancini Ferreira Alves – IAL/SES/SP Apoio Administrativo: Cátia Cilene Serafim Parreira – GT-FAD/FNS Marli de Mesquita Silva - GT-FAD/FNS Itamar de Freitas – FNS/CR/GO Capa: Claudia Helena Batista – ASCOM/PRE/FNS Edmar Chaperman – ASCOM/PRE/FNS Diagramação: Cláudia Helena Batista – ASCOM/PRE/FNS Revisão Editoração: Maria Liliane M. Montefusco dos Santos – ASCOM/PRE/FNS Revisão Bibliografia: Raquel Machado Santos – ASCOM/PRE/FNS Apoio: Organização Pan-Americana de Saúde – OPAS/OMS
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