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Processos de orientação e seleção profissional: história e reflexões, Notas de estudo de Pedagogia

Este estudo tem como objetivo delinear historicamente os processos de orientação e de seleção profissional, com ênfase na trajetória de formação das organizações, ou seja, pretende descrever, como, ao longo da história, as pessoas foram orientadas e selecionadas para o mercado de trabalho. Neste sentido, buscamos analisar as fases de desenvolvimento do trabalho e das organizações e, em cada uma delas, refletir acerca das práticas e concepções adotadas nos processos de ?provisão de pessoas? no Br

Tipologia: Notas de estudo

Antes de 2010

Compartilhado em 30/10/2008

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sidnei-santos-2 🇧🇷

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Baixe Processos de orientação e seleção profissional: história e reflexões e outras Notas de estudo em PDF para Pedagogia, somente na Docsity! FAE-CAMPUS BH UEM DUCAÇÃO EM FOCO Epucação 1  Editorial Faculdade de Educação – um novo tempo O ano de 2007 apresenta-se para a Revista Educação em Foco como um momento de oportunidade, após muitas crises. Descortina-se para a Faculdade de Educação a mudança de espaço físico, o que fatalmente implicará no crescimento de nossas ações acadêmicas e, conseqüentemente, no aumento de nossas produ- ções e publicações. Para caracterizar mais ainda este momento, a própria revista terá novo formato, será editada semestral- mente, ao invés de anualmente, conforme anunciado no Editorial anterior, e terá nova diagramação, atenden- do aos apelos da contemporaneidade. O fato de tornar-se semestral traz em seu bojo a duplicação de oportu- nidades para os autores que nos procuram solicitando que seus artigos sejam publicados, além de representar maior regularidade e atualidade no panorama educacional. Numa época em que a Internet é uma realidade insofismável, há um esforço enorme do editor para se colocar no ar a versão eletrônica desta importante publicação da FaE/CBH/UEMG. Solidificando ainda mais esse tempo de mudanças na FaE/CBH/UEMG, é importante destacar a perfor- mance de nossos professores, que estão se qualificando ou participando de projetos, contribuírem com sua produção científica, transparecendo os novos conhecimentos construídos e adquiridos através de artigos sobre nossa área de atuação:a educação. Sem contar com o número crescente de autores de outros estados que têm enviado trabalhos para fins de avaliação e publicação. Este número 10 da Educação em Foco apresenta matérias fruto de pesquisas realizadas na Faculdade. Neste exemplar, que coincide com o término de uma pesquisa realizada sobre o Serviço de Orientação Profissional:SOSP, teremos relatos sobre ”a existência de vestígios da História do Serviço de Orientação e Se- leção Profissional - SOSP, através de documentos e depoimentos orais”; sobre “o contexto sócio-histórico dos processos de avaliação psicológica”; sobre “delinear historicamente os processos de orientação e de seleção profissional, com ênfase na trajetória de formação das organizações” e sobre “resultados do projeto de pesquisa “Serviço de Orientação e Seleção Profissional – SOSP: Investigação sobre a História da Educação e História da Psicologia em Minas (1949-1994)” e a trajetória de recuperação de documentos relativos ao acervo SOSP, base para esta pesquisa histórica”. Os projetos de extensão contribuem neste número com o registro sobre a experiência no projeto “Edu- cação, campo e consciência cidadã” de forma a explicitar tanto os limites, quanto as potencialidades de tal expe- riência e com a “Investigação sobre as dificuldades de aprendizagem dos alunos das séries iniciais da educação básica do Instituto de Educação de Minas Gerais (IEMG) diagnosticadas pelos projetos de pesquisa e extensão do Núcleo de Estudos e Pesquisas de Psicologia e Psicopedagogia da FaE-CBH-UEMG”. Nossos colaboradores externos apresentam artigo que trata da “Administração dos Conflitos Sociais: as Reformas Administrativas e Educacionais como respostas às questões emergentes da prática social – O caso de Minas Gerais”. Tendo como objetivo primordial a recomendação de seus projetos de pós-graduação stricto-sensu - Mes- trado Institucional em Educação e Formação Humana, e Mestrado Institucional em Educação e Gestão Am- biental pela CAPES, é meta da FaE/CBH/UEMG investir cada vez mais em publicações, indo além do profícuo trabalho que hoje já realiza. A publicação de livros com artigos científicos oriundos dos resultados parciais ou finais de seus projetos de pesquisa, extensão e pós-graduação é uma realidade iminente. Educação em Foco se propõe a continuar veiculando e divulgando trabalhos de excelência buscando, cada vez mais, o reconhecimento nacional e, quiçá, internacional de seus leitores. Profa Santuza Abras Diretora da FaE/CBH/UEMG  Normas Para Publicação A remessa dos originais deve seguir os seguintes critérios: . Educação em Foco aceita para análise artigos relacionados com educação, escritos em português. . O artigo – com suas ilustrações, gráficos, tabelas e referências bibliográficas – deve- rá ter entre 15 e 20 laudas digitadas em espaço 1,5, em fonte tipo Arial, tamanho 12, com 30 linhas de 70 toques (máximo 42.000 caracteres). . Deverão ser encaminhadas três cópias impressas do artigo em uma única face e uma cópia digitada no Word for Windows, em disquete. Material que não será de- volvido ao autor. . Na página inicial, deverão constar o título do artigo, o nome do autor/autores, titu- lação, instituição onde trabalha e endereço completo – inclusive e-mail. . Acompanhando o artigo, um resumo com, no mínimo 100 e no máximo 150 palavras. Ao resumo devem se seguir 3 a 6 palavras-chave. 6. Ao final do artigo, deve ser colocada a bibliografia pertinente, de acordo com a ABNT NBR 6230. 7. O artigo será submetido ao julgamento de especialistas do Conselho Editorial, cujas áreas de competência estão relacionadas com o tema do texto. Os avaliadores não terão conhecimento do nome do autor e vice-versa. 8. O artigo reflete as opiniões de seu autor e não obrigatoriamente do Conselho Edi- torial. Ele deve ser inédito. Uma vez publicado na revista Educação em Foco, o arti- go pode ser reproduzido com a indicação da fonte original. 9. Serão fornecidos ao autor três exemplares do número da revista em que seu artigo foi publicado. 0. As colaborações deverão ser enviadas para o endereço: Educação em Foco Centro de Comunicação - CenC - FaE/CBH/UEMG Rua Pernambuco, 47- sala 124 BELO HORIZONTE - MG - Cep: 30.130-150 Telefax: (31)3274-3332 e-mail: cenc@uemg.br 6 Sumário 7. Administração dos conflitos sociais: as reformas administrativas e educacionais como resposta às questões emergentes da prática social - o caso de Minas Gerais. Profª Dra. Maria Aparecida Silva 14. Reflexões sobre a trajetória de uma pesquisa histórica: o acervo documental do Serviço de Orientação e Seleção Profissional - SOSP (1949 -1994). Profª Dra. Regina Célia Pereira Campos 25. Gestão no projeto “educação, campo e consciência cidadã: limites e desafios”. Profas. Nágela Brandão, Vânia Aparecida Costa e Ms. Gilvanice Musial 32. Considerações a respeito do contexto sócio-histórico dos processos de avaliação psicológica. Profª Maria de Lourdes Costa 40. Dificuldades de aprendizagem de alunos das séries iniciais da Educação Básica: um estudo comparativo de diferentes épocas. Profª Regina Rosa dos Santos Leal 47. Registros históricos de uma instituição: Serviço de Orientação e Seleção Profissional (1949 – 1994). Profas. Ms. Lucy Esther dos Santos Paixão e Dra. Regina Célia Pereira Campos 56. Processos de orientação e seleção profissional: história e reflexões. Profs. Sidnei Huebert dos Santos e Dra. Regina Célia Pereira Campos 64. Cursos de Pós-Graduação da FaE/CBH/UEMG 7 RESUMO Neste artigo, examino questões da prática social dos trabalhadores em geral e dos trabalhadores do ensino de modo especial, bem como sua recuperação e/ou assimilação e devolução de modo “refuncionalizado”, como reformas administrativas e educacionais. Delimito o período entre o fim da década de 70 e o ano de 1990, passando pela denominada “Nova República”. Tomam-se, como referência, as formulações de João Bernardo sobre o modelo de mais-valia relativa. Constituíram objetos de estudo (i) as transformações da organização da categoria dos trabalhadores do ensino ao se constituir sujeito coletivo, criando relações sociais novas e levantando questões relativas à organização do trabalho, (ii) as reformas administrativas e educacionais em nível federal e estadual, (iii) o papel dos intelectuais progressistas como gestores do Estado Restrito, (iv) a educação como estratégia capitalista de desenvolvimento das condições gerais de produção e (v) a estratégia capita- lista de controle da organização do trabalho por meio de “medidas racionalizadoras” que afetaram a organização do trabalho na escola estadual mineira e obstaram projetos pedagógicos. Palavras-chave: Educação; políticas públicas; mais valia relativa; Estado Restrito; Estado Amplo, refuncionalização. Introdução Este artigo é parte da pesquisa que resultou em minha tese de doutorado, e teve como objetivo analisar questões emergentes do movimento social, principalmente do movimento dos trabalhadores do ensino, no final da década de 70. É, também, objeti- vo do artigo apreender como essas questões foram captadas pelo Estado, por meio de seus gestores, e devolvidas em forma de políticas públicas, expressas em reformas administrativas e educacionais que afe- taram a organização do trabalho dos docentes. Foca- lizei, em duas gestões governamentais do Estado de Minas Gerais, no período entre 1983 e 1990, as po- líticas públicas expressas em reformas administrativas e educacionais, a fim de apreender como foram as- similadas e “refuncionalizadas” as instituições criadas e as questões suscitadas pelo movimento dos traba- lhadores em geral e dos trabalhadores do ensino em particular e devolvidas sob a forma de organização do trabalho modificada. Neste trabalho, baseei-me nas formulações teóricas do pesquisador português João Bernardo (1975- 1992), por contemplar a análise do capita- lismo nos dias atuais - o modelo da mais-valia relativa -, dar tratamento, de forma relacional, às classes so- ciais nesse modelo, elaborar uma teorização sobre as transformações do Estado ao longo da história do capitalismo e, ainda, por oferecer categorias teóricas para análise dos ciclos que ritmam o desenvolvimen- to do capitalismo. Na conceituação do autor, constitui um ciclo curto de mais-valia relativa o processo de aumento da pro- dutividade por meio da introdução de inovações tec- nológicas ou de remodelações na organização do tra- balho como resposta dos capitalistas às reivindicações dos trabalhadores, para, assim, obterem mais-valia suplementar na concorrência intercapitalista. Os ciclos encerram-se quando as inovações se generalizam e a mais-valia relativa se absolutiza, inaugurando novo ciclo. Tais ciclos vão dar ritmo ao desenvolvimento econômico, na medida em que correspondem às flu- tuações no investimento em inovações tecnológicas e na reorganização dos processos de trabalho. Os ciclos longos de mais-valia relativa, como o pró- Administração dos Conflitos Sociais: as Reformas Administrativas e Educacionais como respostas às questões emergentes da prática social - O caso de Minas Gerais Maria Aparecida da Silva* * Professora do CEFET-MG - masilva46@des.cefetemg.br 0 deles ex-exilados, outros banidos das Universidades, atuando nos institutos de pesquisas, outros, ainda, nas organizações das diversas categorias profissionais (ANPOCS, ANPED, ABI, OAB, entre outras). Depa- raram-se, de um lado, com um quadro sociocultural modificado com a explosão da indústria cultural de massa (Rede Globo, Abril Cultural, por exemplo) e, de outro, com os trabalhadores auto-organizados a partir de suas lutas sociais. Imbuídos da convicção de poderem fazer a transformação do social de dentro do Estado R, em desaprumo diante dos movimentos autônomos dos trabalhadores, viram-se competidos a se entrarem em partidos políticos situados mais à esquerda do “status quo”. O MDB, agora PMDB, foi a alternativa encontrada. A esses intelectuais carac- terizo-os como progressistas, em contraposição ao outro grupo - o dos intelectuais engajados nos mo- vimentos sociais - os quais pressupõem a capacidade organizatória dos trabalhadores em sua constituição como sujeito coletivo. Por isso mesmo, esses inte- lectuais fizeram contraponto para aqueles. As bandeiras de luta e as instituições gestadas no seio dos movimentos sociais foram paulatinamente recuperadas no plano político: Distensão, Anistia, Abertura Política, Diretas já, ̈ Nova Repúlica¨. É nes- se momento que entraram em cena, como gestores no interior dos aparelhos do Estado Restrito, os in- telectuais progressistas que, no poder, efetivaram-se reformas administrativas e educacionais que expres- saram de uma inflexão por parte do Estado R na forma de gerir o social. As Reformas Administrativas como respostas às questões emergentes da prática social A ascensão dos intelectuais progressistas ao po- der, em Minas Gerais, ocorreu após a posse do go- verno do PMDB - Tancredo Neves (1983) - eleito pelo voto popular. Tal fato não é exclusivo de Minas Gerais, uma vez que o fenômeno se repete em vários Estados da Federação onde a oposição con- sentida foi vitoriosa e na composição dos Ministérios, após a posse do Presidente José Sarney, eleito pelo Colégio Eleitoral. Em Minas Gerais, no Secretariado de Tancredo Neves, constatou-se uma série de critérios que vão do técnico ao político-ideológico. Destacou-se, na formação da equipe de Governo, a nomeação para as pastas sociais (Educação, Saúde, Trabalho e Promo- ção Social), de políticos mineiros reconhecidamente progressistas do PMDB. Embora essas nomeações surpreendessem, são explicáveis, considerando-se a subordinação das áreas sociais às determinações das áreas econômicas, numa economia de mercado. O que surpreendeu foi a ilusão de, ao ocuparem postos do poder, esses políticos pudessem viabilizar as pro- postas progressistas e não fossem cooptados e não legitimassem iniciativas governamentais. A nomeação de Octávio Elísio Alves de Brito para a Secretaria de Estado da Educação ensejou a ocupação de postos de gestão nessa Pasta por in- telectuais progressistas ligados ao meio acadêmico, sendo o próprio titular vinculado à UFMG (Univer- sidade Federal de Minas Gerais). Possibilitou, tam- bém, a substituição das vagas de antigos membros do Conselho Estadual de Educação de Minas Gerais, por intelectuais com posições progressistas. Os no- vos conselheiros passam a constituir o grupo em defesa da escola pública dentro do Conselho, antes predominantemente composto por representantes das escolas particulares. Com essa composição, foi possível a tomada de algumas medidas voltadas para a expansão da escola pública e de medidas que a fa- vorecessem. A análise das reformas indica que, no ciclo inter- médio de mais-valia relativa, houve necessidade da obtenção do consenso pela via da “padronização” de um conjunto de comportamentos, valores, normas, atitudes e idéias, enfim de um “ethos”, sendo que as reformas administrativas e educacionais foram a via privilegiada para que essa direção se viabilizasse, numa tentativa de reordenação da sociedade, na medida em que, por seu intermédio busca-se ad- ministrar os conflitos sociais. Nesse sentido, pode-se concluir que o controle é o ponto de unificação dos gestores, seja no interior do Estado Restrito, seja no do Estado Amplo. Esse ponto de unificação decor- reu do fato de o capital ser uma relação social em que o controle do processo econômico e dos meios de produção assumiu importância fundamental, inde- pendente de a propriedade ser particular ou pública.  As propostas pedagógicas, as medidas “racionalizadoras” e a organização do trabalho A ocupação dos espaços do poder por intelec- tuais progressistas provocou um conjunto de altera- ções na dinâmica e no funcionamento dos órgãos públicos. Muitos desses intelectuais haviam participa- do da campanha de Tancredo Neves/Hélio Garcia e colaborado com o seu documento básico. Governar é... Diretrizes para um plano de Governo. Atentos às experiências alternativas que se desen- volveram à margem do sistema educacional (Escola Tio Beijo, Creches comunitárias e escolas infantis do Movimento Fé e Alegria, entre outras em Minas Ge- rais), bem como às formas de organização dos mo- vimentos sociais e dos trabalhadores do ensino, os intelectuais progressistas planejaram o envolvimento dessas forças emergentes. O Congresso Mineiro de Educação foi o evento aglutinador e recuperador, no plano político- pedagógico, das esperanças e sonhos dos trabalhadores do ensino e da população em re- lação à Educação. Para a UTE, entretanto, o evento, ao recuperar as instituições do movimento dos tra- balhadores do ensino, provocou a desmobilização da categoria. As conclusões do Congresso Mineiro de Educação foram a base para a elaboração do Plano Mineiro de Educação. Para marcar a diferença com o tempo passado, a ênfase se desloca da quantidade para a qualidade da educação pública. No que se refere à recuperação de aspirações do movimento dos trabalhadores do ensino, desta- ca-se, dentre as propostas pedagógicas, a administra- ção colegiada. A análise dos pressupostos do cole- giado, a partir dos documentos, possibilitou investigar em que medida a administração colegiada contribuiu para uma gestão democrática. A democratização res- tringiu-se ao pedagógico e voltou-se para a gestão da organização do trabalho na escola, mas não para as condições de trabalho dos profissionais da educação. Não se trata de ignorar os avanços ocorridos com a participação maior e mais intensa nas questões pe- dagógicas e nas questões administrativo-pedagógicas, mas de questionar a restrição da participação colegia- da à participação funcional e não se posicionar em relação à organização do trabalho associada às condi- ções de trabalho dos profissionais da educação. Em relação ao pedagógico, evidenciou-se a preocupação da proposta de currículos de 1º Grau, com conhecimentos básicos, universais, flexíveis, com o aprender a aprender, com a aquisição de comportamentos necessários à inserção no mundo do trabalho, com as tendências da economia mundial e com as exigências atuais de requisitos na formação de mão-de-obra. A exceção, expressa na justificati- va, foi a da proposta para o ensino de História, que parecia estar com as costas voltadas para o mundo, na medida em que enfatiza o local, o regional e o na- cional. Tal constatação foi um grande paradoxo, pois assistia-se à tendência para a transnacionalização da economia a nível mundial. Como, porém, todo pa- radoxo esconde, sob sua aparência, explicações mais profundas, a hipótese que levantei foi a de que, ao se destacar à proposta de currículo, teria ocorrido um viés ideológico, renascido com muitas carapaças - o nacionalismo. Por outro lado, poderia simplesmente ter sido uma falta de compreensão das tendências atuais de globalização da economia que começaram a imperar no mundo, com implicações em diversos campos, como na geopolítica, na organização do tra- balho, na organização da sociedade e na cultura. Na primeira fase da “Nova República” - Gestão Tancredo Neves - as medidas de ordem administra- tiva estavam sendo gestadas: (i) anúncio das leis dele- gadas por Tancredo Neves e informação do proble- ma principal da Secretaria de Educação - “inchaço de pessoal”-, pelo titular da Pasta , na primeira reunião do Governador com seu Secretariado, e (ii) leis, de- cretos e resoluções aprovados, não colocados em prática, mas que serviram de ponto de partida para medidas administrativas da próxima gestão - Newton Cardoso. Ainda em relação ao pedagógico constatou-se que, no processo de elaboração do currículo de 1º Grau e da Escola Normal, bem como na proposta de Curso de Especialização para professores e especialis- tas de Educação, imperou uma visão autonomista do pedagógico, na medida em que não se dimensionou que tais propostas dependiam, para sua viabilização, de condições materiais. Essas condições passam pela organização do trabalho e pela gestão de pessoal. As medidas adotadas pelos intelectuais progres- sistas, na primeira fase da “Nova República”, não  conflitaram com os interesses do capital. Tal congru- ência se deveu ao fato de a educação escolarizada ser uma das condições gerais de produção e ao fato de o desenvolvimento das forças produtivas da época privilegiar a componente intelectual. A compatibili- dade entre a preocupação pragmática capitalista de desenvolvimento das forças produtivas e a proposta política dos intelectuais progressistas, na condição de gestores do Estado Restrito, entrou em contradição com a suposição do colapso do sistema, uma vez que reforçou o desenvolvimento das forças produ- tivas. Vale lembrar, aqui, duas afirmações do então Superintendente Educacional, Neidson Rodrigues: a primeira, sobre o que espera a sociedade da escola, Rodrigues (1985:54) afirmou ser “o preparo dos seus membros para a vida social e política, para o trabalho, para o desenvolvimento de suas habilidades indivi- duais, que sistematize e organize o conhecimento universal, a produção científica, as conquistas da tec- nologia e da cultura mundial”. Não há aspectos dessa afirmação de que possa um pragmático conservador discordar. Na segunda parte de sua argumentação (1985:64), marcou-se a diferença ideológica quando explicitou o horizonte político - “A superação histórica da sociedade de classes deve-se dar no combate das lutas sociais que conduzam à destruição do germe alimentador das classes sociais”. Prosseguindo, Ro- drigues (1985:64) propôs que os conhecimentos transmitidos pela escola se constituíssem em armas, semelhantes às das classes dominantes, para as ne- cessidades das classes subalternas na luta contra a desigualdade. As propostas pedagógicas levadas a efeito pelos intelectuais progressistas, como gestores do Estado Restrito, não foram incompatíves com a expectativa pragmática capitalista em relação à escola, na primei- ra fase da “Nova República”. Houve assim, em um primeiro momento, congruência no que se refere ao objetivo da implementação de currículos e pro- gramas de ensino, e de capacitação de docentes e especialistas, porque essas medidas, em última ins- tância, favoreceram o desenvolvimento das forças produtivas. Havia compatibilidade entre a implanta- ção da administração colegiada e a necessidade de recuperação, ainda que “refuncionalizada”1 como participação funcional, das aspirações dos trabalhado- res da Educação de participar da organização do tra- balho. Vale registrar que as reivindicações mais caras aos trabalhadores do ensino continuaram negadas - a eleição direta para diretor de escola e a participação na organização do processo de trabalho. As medidas “racionalizadoras” - gestão Newton Cardoso - atingiram a organização do trabalho, invia- bilizando as propostas pedagógicas. Com as medidas racionalizadoras voltadas para pessoal, o que se bus- cou, por um lado, foi com o menor tempo e com o menor custo proporcionar um bem consumível na própria produção, ou seja, o ensino. Para atingir esse objetivo, foram editados os decretos “racionalizado- res” e as conseqüências daí advindas tornaram impos- síveis de serem efetivadas as porpostas pedagógicas. Por outro lado, os profissionais da educação foram proletarizados e a escola pública tornou-se precária. Ficou patente nos registros, no jornal mineiro de maior circulação - o Estado de Minas - dia após dia da década de 80, e no resultado da CPI da Educação, o sucateamento da rede pública estadual de ensino, a proletarização dos trabalhadores da Educação, o funcionamento das escolas em condições precárias e, por decorrência, o ensino de qualidade discutível. A análise das propostas pedagógicas ocorridas na gestão Tancredo Neves/Hélio Garcia, e as medidas “racionalizadoras” levadas a cabo na gestão Newton Cardoso evidenciaram o pressuposto de que não é suficiente a vontade pedagógica para provocar mudanças na Educação. Estas dependem de outras variáveis que passam pelas decisões de gestores de outras pastas, mais precisamente a fazenda, o plane- jamento e a administração. Considerações Finais Pela análise das reformas administrativas e educa- cionais, fica evidente a constatação de que, enquanto se encaminhavam as discussões e a implantação das IPor refuncionalização entende-se o mecanismo utilizado pelas instituições do capitalismo de, apesar dos antagonismos entre capital e trabalho, e de sua dinâmica calcada na contradição, tentar recuperar a dissidência, isto é, apreender o que ameaça e contesta sua estrutura e trazê-lo para dentro do sistema pela via da cooptação. É nesse sentido que se entende a tentativa, por parte dos órgãos estatais e empresariais, de recuperar as lutas e bandeiras dos movimentos sociais e redirecioná-las para seus fins, refuncionalizando-as, isto é, distorecendo a sua primitiva orientação e subordinando-as à sua lógica.  Discussão acerca do resgate de docu- mentos históricos para fins de pesquisa Em Minas Gerais, a coleta, a guarda e a preser- vação de objetos e documentos do passado encon- tram-se sob a responsabilidade de instituições, tais como o Arquivo Público Mineiro3, o Arquivo da cida- de de Belo Horizonte e o Museu da Escola de Minas Gerais, entre outros. Nesses espaços, o intercâmbio de experiências possibilita a formação de profissionais e pesquisadores. A nova política do Arquivo Público Mineiro tem sido incentivar e apoiar as instituições no sentido da guarda de seu próprio material, através do apoio e treinamento de funcionários para o trata- mento dos acervos. Desta forma, a preservação de patrimônio histó- rico nacional e de seus bens culturais, principalmente aqueles produzidos pelas instituições públicas, ainda aguardam iniciativas de formação de Centros de Me- mórias institucionais, que tornem acessíveis dados, fontes e fundos documentais a pesquisadores e es- tudiosos, constituindo-se num espaço privilegiado de discussão e produção de conhecimento. A aplicação de políticas comprometidas com es- sas questões, tanto no nível institucional como em nível das políticas públicas, entretanto, tardam, espe- cialmente no campo das ciências humanas. Como denuncia Peixoto (2001): “Em Minas, os estudos até agora desenvolvidos evidenciam que muito da nossa história já se per- deu e que, em breve, já não será possível resgatar o conhecimento que vem sendo construído em nossas escolas” (p. 195). De fato, o acervo do SOSP também esteve na iminência de se perder, de ser incinerado e foi manti- do fora de circulação por quase seis anos, conforme se pode observar neste trecho da tese de doutorado de Motta (2004, p. 176): Infelizmente, em minha visita ao SOSP, em junho de 2004, não foi possível pesquisar os arquivos. Não encontrei um consenso sobre o paradeiro desses arquivos, mas, somente foi possível ter acesso a uma pasta com algumas correspondên- cias do ano de 1951, da qual será examinado um único laudo encontrado, que descreve um diag- nóstico infantil. Também uma lista de atendimento dos primeiros sete anos, com poucos dados. Encontrei, nessa pasta, um anteprojeto de lei (sem data definida), que propõe modificações na lei de criação do SOSP, após a regulamentação da profissão do psicólogo (1962)... Motta (2004), pesquisadora em Saúde Coletiva da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas, em sua tese de doutorado intitulada “Fragmentos da História e da Memória da Psicologia no mundo do trabalho no Brasil: relações entre a industrialização e a psicologia”, ao discutir as relações entre a Psicologia da Educação, a Psicotécni- ca, a modernidade mineira e o processo de fundação do SOSP (1949) menciona, com surpresa, o desapa- recimento do material do SOSP, por ocasião de sua coleta de dados. O material estava, desde 1998, em caixas e pa- cotes plásticos, cobertos por uma lona empoeirada, dentro de um galpão da Universidade do Estado de Minas Gerais, sem destinação, em precárias condi- ções de conservação e em vias de ser incinerado. O então diretor da Faculdade de Educação da UEMG, prof. José Cosme Drummond, consultou a então Chefe do Departamento de Psicologia e Me- todologia de Pesquisa, profa. Lucy Esther dos Santos Paixão e a profa. Dra. Regina Célia Pereira Campos, sobre essa situação. Visando principalmente ao res- gate desse material, formaram uma equipe e elabo- raram, em 2004, o projeto de pesquisa “Serviço de Orientação e Seleção Profissional: uma investigação sobre a História da Educação e da Psicologia em Mi- nas Gerais”. 3Informação dada pelo diretor do Arquivo Público Mineiro – APM, prof. Renato Venâncio, à coordenadora da pesquisa, profa. Dra. Regina Célia Pereira Campos, em abril de 2005. Nesta ocasião, foi firmado o treinamento de três pesquisadores da equipe SOSP pelo APM para a orientação sobre o tratamento do material do SOSP. O treinamento, com duração de uma semana, aconteceu em abril de 2005 e deu fundamentação técnica ao processo de higienização dos documentos. 6 No galpão, foram encontrados cerca de 32 m3 de papel. Logo que as primeiras caixas foram abertas, verificou-se que os documentos eram de considerá- vel valor histórico para as áreas da Educação e da Psi- cologia. Entre os diversos papéis estavam documen- tos datados da década de 50, entre eles, relatórios, encaminhamentos de crianças, correspondências e uma grande quantidade de laudos psicológicos de orientações educacionais, vocacionais e profissionais. Foram localizadas, ainda, várias provas de seleções para diversos cargos do funcionalismo público do es- tado de Minas Gerais como, por exemplo, para os cargos de diretores de escola e professores de escola primária. Alguns documentos, por seu estado de de- terioração, tiveram que ser descartados lá mesmo. Gradativamente, o transporte dos documentos foi sendo realizado para as dependências da Facul- dade de Educação da UEMG. O grande volume de material e a fragilidade das caixas de papelão já de- terioradas fizeram com que muitas se desfizessem, dificultando a mudança e atrasando os trabalhos. O trabalho de organização do material ocorre no pátio da Faculdade. Após a organização e a catalogação, o material é armazenado na própria sala onde estão os materiais trazidos do galpão, pois não há sala disponí- vel para realizar esse trabalho. A importância em se utilizar tanto a investigação de fontes documentais como a história oral, como formas de desenvolver uma metodologia de pesquisa histórica, tem sido destacada por diversos pesquisa- dores (Wertheimer, 1982; Goulart, 1995; Brozek & Guerra, 1996; Bom Meihy, 1996; Faria Filho, 2000; Campos, 2003; e outros). Lakatos e Marconi (2001), sobre o método histórico, afirmam: Assim, o método histórico consiste em investigar acontecimentos, processos e instituições do pas- sado para verificar a sua influência na sociedade de hoje, pois as instituições alcançaram sua forma atual através de alterações de suas partes com- ponentes, ao longo do tempo, influenciadas pelo contexto cultural particular de cada época. Seu estudo, para uma melhor compreensão do pa- pel que atualmente desempenham na sociedade deve remontar aos períodos de sua formação e de suas modificações. (...) Portanto, colocando-se os fenômenos, como, por exemplo, as institui- ções, no ambiente social em que nasceram, en- tre as suas condições “concomitantes”, torna-se mais fácil a sua análise e compreensão, no que diz respeito à gênese e ao desenvolvimento as- sim como às sucessivas alterações, permitindo a comparação de sociedades diferentes: o método histórico preenche os vazios dos fatos e aconte- cimentos, apoiando-se em um tempo, mesmo que artificialmente reconstruído, que assegura a percepção da continuidade e do entrelaçamento dos fenômenos. (p. 107) Adotando o método histórico, na perspectiva de continuidade e entrelaçamento dos fenômenos, a pesquisa buscou investigar os acontecimentos e pro- cessos ocorridos no SOSP e verificar sua influência na Psicologia da Educação de hoje. Buscou, ainda, perceber as sucessivas alterações propostas ao lon- go do tempo e devidamente contextualizadas, que poderiam revelar as inter-relações ocorridas entre a formação do campo profissional da Psicologia e as práticas fundamentadas nos campos da Educação e do Trabalho. Segundo Peixoto (2001, p. 193), a perspectiva de se fazer história, hoje, passa por construir uma nova história: A nova história, iniciada com a Revolução dos Analles, promove a dessacralização da memória dos grandes homens, dos eventos políticos, mi- litares e diplomáticos, focalizando o interesse da história em todos os homens. Neste sentido, o histórico não é o grandioso, o singular, o espe- tacular, mas a teia diária da vida de todos os ho- mens. O que explica a atenção, em nossos dias, à chamada História do Cotidiano: aí está o tom do processo social, feito pelas pequenas coisas, não de vistosas e enganosas fachadas, mais ocultantes que esclarecedoras da realidade. Isto implica na ampliação do conceito de documento, palavra que passa a ser considerada no seu sentido mais amplo – documento escrito, ilustrado, transmiti- do pelo som, pela imagem ou de qualquer outra 7 maneira. Na perspectiva dessa nova história, esta pesquisa revela essa forma de fazer teimosamente a história - a história do SOSP, buscando refletir sobre as práticas de um serviço de Psicologia aplicado à Educação, em meados do século XX, a partir de seu produto – do- cumentos, cartas, laudos e outros. Produto este que quase se tornou expurgo e que, para alguns, ainda hoje é considerado lixo. A análise desses documentos aponta registros de práticas psicológicas e representações de funcio- nários, de usuários e de uma grande parte da socie- dade. O resgate de documentos históricos, entretanto, é um trabalho exaustivo e desafiante, conforme assi- nala Brozek e Guerra (1996, p.11): Os relatos de eventos passados representam reconstruções baseadas em fragmentos desse passado. O historiador identifica os vestígios para poder coletá-los, organizá-los e interpretá-los. Descobre os documentos, fotografa e os trans- creve, torna-os disponíveis. A recuperação de do- cumentos é uma valiosa contribuição aos nossos conhecimentos. (...) os documentos constituem a matéria-prima, dados crus da historiografia, não história mesma. Tornam-se história por meio de análise e elucidação. Entre identificar os documentos e torná-los dis- poníveis há um longo caminho. Os documentos, se- gundo o autor, são “vestígios”, “matéria-prima”, “da- dos crus” que precisam ser coletados, organizados, fotografados e transcritos para, então, tornarem-se “história por meio de análise e elucidação”. Segundo Machado, Oliveira, Souza e Veiga (2002, p.99), “Cabe aos pesquisadores interpretar a história através das fontes, apropriando-se para isso de novos objetos e novas abordagens metodoló- gicas que possibilitem um diálogo constante com o presente, reiterando as experiências históricas passa- das.” A interpretação da história através de fontes im- põe exigências aos pesquisadores, à instituição, às agências de fomento e, mais precisamente, ao poder público: um compromisso ético de guarda do ma- terial; um compromisso moral de sigilo e confiden- cialidade; um compromisso acadêmico e científico de apoio e incentivo a novas pesquisas documentais exploratórias; enfim, exige a persistência e a teimosia de quem quer aprender com os grandes mestres e com experiências que, se inovadoras no passado, hoje podem constituir um traço de nossa identidade. O desafio de se fazer pesquisa histórica fica claro quando se inicia o processo de investigação docu- mental para se constituir o acervo. Segundo Peixoto (2001, p.195-196), o trabalho do pesquisador nes- sas circunstâncias é um trabalho de garimpagem: O processo de constituição do acervo assumiu, assim, a dimensão de um trabalho de garimpa- gem, marcado pela tensão. A alegria em conseguir chegar aos porões escuros, empoeirados e chei- rando a mofo, o encantamento provocado pelos cadernos amarelados, com suas letras bordadas, pelos jogos pedagógicos repletos de cupim... Os pesquisadores do SOSP vivenciaram situa- ções parecidas ao relato da autora acima citada. Por um lado, cada caixa aberta trazia uma surpresa: ora baratas, ora um rato pulando, ora um escorpião. Por outro lado, o resgate de cada documento, muitas vezes, trazia bens preciosos para o pesquisador: ma- nuais de técnicas de aplicação dos testes psicológicos e educacionais, histórias de vidas, laudos psicológicos ou seleções para cargos de um órgão do Estado de Minas Gerais. Já não se trata de uma letra morta, um papel en- velhecido, uma voz silenciada. Quando se apura o ouvido é possível escutar o burburinho das filas de pessoas buscando um atendimento ou uma inscrição e até notar as lágrimas secas sobre o papel de uma mãe ao falar de sua história de vida e de seu filho. Para resgatar e conservar um acervo documen- tal rico e diversificado sobre as práticas da Psicologia e suas implicações na Educação e outras áreas afins, como o acervo SOSP, é preciso possuir sensibilidade e contar com o apoio de uma política institucional efetiva, um local de instalação do acervo e pesquisa- 0 Para investigar sobre a inter-relação entre Psi- cologia e Educação no Brasil, Antunes (2002) busca realizar uma leitura histórica de publicações relativas às duas áreas, no período de 1930 a 1962. A au- tora identifica e analisa 200 publicações, sendo 100 em periódicos de Psicologia e 100 em periódicos de Educação, referentes ao período que vai de 1930 à regulamentação da profissão de psicólogo. A intrincada relação entre Psicologia e Educação é destacada pela autora no seguinte trecho: Considerando o período anterior [ao da profissão de psicólogo ser regulamentada] pode-se dizer que tal relação foi essencial para o processo de au- tonomização da Psicologia no Brasil, de tal maneira que se pode dizer que a Educação foi o terreno fértil no qual a Psicologia se desenvolveu. Essa re- lação permaneceu forte nos anos subseqüentes, podendo-se dizer que foi no campo da Educação que a Psicologia mais efetivamente encontrou as bases para seu desenvolvimento e, ao mesmo tempo, que foi na Psicologia que mais o campo da Educação fundamentou suas teorias e práticas. Dando seqüência ao processo de reconhecimen- to da autonomia da Psicologia como área especí- fica do saber, segue-se um período no qual ela se consolida, ampliando sua produção nas esferas do ensino, da pesquisa e da prática, gerando as condi- ções para o reconhecimento legal da profissão de psicólogo. (ANTUNES, 2002, p. 193). A profissão de psicólogo foi regulamentada, de acordo com os dispositivos da lei 4.119, em 27 de agosto de 1962. Segundo a autora, os temas abordados nes- sas publicações são diversos. Desenvolvimento; aprendizagem; comportamento, conduta, atitudes; psicometria; problemas (dificuldades, disfunções, distúrbios) escolares; educação especial e orientação educacional/profissional aparecem como as principais discussões deste período. É interessante notar a presença da categoria Orientação Educacional e Profissional. Sobre essa categoria, Antunes (2002, p.195) reflete: ... esse campo de ação foi um dos que mais in- corporaram a ciência psicológica a uma prática educativa então recente, tendo sido uma das mais importantes bases para o desenvolvimento da Psicologia Educacional e ponte para o estabeleci- mento de relações entre a Psicologia e o campo da organização e racionalização do trabalho... A referida pesquisa revela, ainda, como tendên- cias próprias da época as abordagens de temas, tais como diferenças individuais, motivações, aptidões e vocações, sobretudo relacionadas à orientação educa- cional/profissional e à utilização de testes psicológicos. Esses dados refletem também as demandas de uma sociedade em busca de sua inserção no mundo industrializado, projeto este que teve na articulação entre Educação e Psicologia uma importante contribuição para a realização de seus fins, especialmente no que diz respeito aos métodos de racionalização do trabalho, repre- sentado, entre outras formas de intervenção, na adequação do trabalhador à tarefa, por meio da orientação educacional/profissional aos jovens aprendizes. (ANTUNES, 2002, p.195). De fato, em meados do século XX, a sociedade brasileira buscava sua inserção no mundo industriali- zado e a Educação, articulada à Psicologia, implantou métodos e técnicas de orientação educacional/pro- fissional aos jovens futuros profissionais, que incluíam a racionalização do trabalho e a adequação do traba- lhador à tarefa. Nos documentos do SOSP, também, estão registradas essas influências, sobretudo nos conteúdos das provas de seleção formuladas. Terminando sua exposição Antunes conclui que: ...não há diferença significativa entre os conteúdos das produções dos periódicos de Psicologia e de Educação; revelam-se autores bastante produti- vos; há heterogeneidade de referenciais teóricos; há diferentes concepções de educação e conse- qüentemente diferentes formas de abordagem  dessa questão; há temas tratados com originali- dade e que são ainda atuais, assim como existem outros assuntos e abordagens que foram próprios da época e que são hoje considerados ultrapassa- dos. (2002, p.199). Apesar de a autora ressaltar a heterogeneidade e a originalidade dessa produção, observa-se que os trabalhos coletados não registram publicações rela- tivas ao Serviço de Orientação e Seleção Profissio- nal. Esse dado revela que, infelizmente, apesar de a equipe ter produzido práticas relevantes para a cons- tituição da Psicologia, como ciência e profissão, na interlocução com a Educação mineira, essas práticas estavam voltadas para a prestação de serviço e, por força da natureza de órgão público estadual, foram pouco divulgadas no nível nacional. O resgate desse material, portanto, possibilitará o resgate desse conhecimento produzido nos quase cinqüenta anos de funcionamento do SOSP e a re- flexão sobre as diversas interpretações dadas a essas práticas. Voltando à pesquisa de Motta (2004), realiza- da por ocasião de sua tese de doutoramento, será importante refletir sobre a análise que essa autora realiza, utilizando-se de apenas um caso de um me- nino de 8 anos, datado de 1951. Contextualizando, a autora relata que: “Esta carta-relatório, infelizmente o único documento do gênero encontrado no an- tigo SOSP, hoje CENPA, será aqui foco de reflexão parcial de um atendimento desenvolvido naquela ins- tituição.” Sobre o relatório, a autora acrescenta: “O relatório descreve uma criança prepotente, desejosa de ser estrela nas atenções, mimada e vaidosa, bem distante da descrição foucaultiana... “(p.182). O referido relatório indica que, após a aplica- ção do teste de inteligência Binet-Terman, o SOSP, na figura de seu diretor o professor Symcha Jersey Schwarzstein, definiu que a criança “fosse entregue na mão de educadores profissionais em um bom in- ternato”. Motta (2002) então, baseando-se nas conside- rações de Foucault, faz a crítica à Psicologia, comen- tando sobre os pressupostos higienistas e o poder normativo da medicina. A autora conclui: “O objetivo do uso do teste de inteligência foi normatizar a crian- ça e sua família, mesmo que seja preciso o exílio.” (p. 184). Em relação a essas interpretações não se pode deixar de considerar que: . O diagnóstico da criança fora dado pelo profes- sor Symcha, que dirigiu o SOSP nos dois primei- ros anos de seu funcionamento (1949-1950). O teste de nível mental citado era, na época, o me- lhor instrumento para medição. A pesquisadora relata que o diagnóstico fora baseado apenas nos resultados do referido teste. As entrevistas realizadas com os pais são desconsideradas pela pesquisadora, mas trata-se de um elemento de grande valor diagnóstico para a psicologia. . A falta de registro de outros testes não descar- ta sua ocorrência. Provavelmente este relatório estava incompleto, pois os relatórios encontra- dos demonstram um processo diagnóstico mais complexo, com o uso de testes infantis, incluin- do desenhos. . Mesmo que estivesse na íntegra, estando da- tado de 1951, o diagnóstico foi elaborado em um período anterior, dez anos antes da regula- mentação da profissão do psicólogo no Brasil. Por fim, . contextualizando, a década de 50 ainda está marcada pela presença da educação tradicional em grandes instituições internas. Em Minas Ge- rais, estudar em um colégio interno era destino apenas dos filhos das elites e para a formação dos futuros padres. A interpretação dada pela pesquisadora como um “exílio” da criança pa- rece ser demasiado forte, pois desconsidera o contexto da época, em que os pais valorizavam a educação dos grandes internatos. Sem elementos para aprofundar o caso, Motta (2004) tira conclusões precipitadas, que merecem ser revistas. O material do SOSP, agora localizado, opor- tunamente estará à disposição dos pesquisadores.  Essas considerações refletem ainda que, para essa análise, será importante refletir sobre os pressupostos higienistas. Antunes (2004, p. 119) clareia que: Os pressupostos higienistas exerciam, nessa épo- ca, uma substancial influência sobre a Medicina, particularmente sobre a Psiquiatria, (...) Os ideais higienistas geralmente se articulavam aos princí- pios da eugenia, intimamente ligados ao pensa- mento racista brasileiro. (...) É importante dizer que tais idéias já se definiam como conteúdos próprios da Psiquiatria, distanciando-se, pelo me- nos diretamente, daquilo que se produzia como conhecimento psicológico, embora este trouxera, pelo uso de testes, uma certa contribuição para corroborar “cientificamente” tais concepções. Prestando-se a tais “ideais”, o percurso da Psico- logia foi consolidando sua área de conhecimento e campo de aplicação. Os dados referentes ao SOSP, entretanto, trazem evidências de alterações nos diag- nósticos de avaliação psicológica produzidas ao longo tempo que coincidem com os ideais da sociedade brasileira em cada época. A crise, que se registra sobre o paradigma domi- nante da ciência moderna, é mais ampla e mais com- plexa e ultrapassa a Psicologia. Trata-se de uma crítica sobre os pilares do rigor científico, da padronização, dos referenciais de normalidade, dos dualismos, das classificações e da neutralidade científica. Concebendo a Psicologia como interligada a ou- tros saberes, Mancebo (2004, p.17) afirma: Em síntese, da aproximação da Psicologia com outros saberes, do exercício crítico às especiali- zações e às purificações teórico-metodológicas positivo-funcionais, decorrem referenciais de análise que afirmam o caráter histórico dos fenô- menos psicossociais. Os conhecimentos psicoló- gicos, construídos estão emebidos no contexto temporal, cultural, espacial em que são criados, e se considera que as formações da subjetividade não podem ser compreendidas como desligadas da formação social na qual se constituem. (...) Em conseqüência, os conhecimentos alcançados são transitórios e destinados a serem superados, modificados e esquecidos, na medida em que deixem de responder às condições sócio-histó- ricas que os favoreceram, exigiram e os fizeram florescer. Assim, para se compreender as práticas psicoló- gicas do SOSP ou de outros dados de pesquisa histó- rica, é fundamental não ter preconceito e estar aber- to para receber os dados sejam quais forem. Mais adiante, Mancebo acrescenta: “Implica, igualmente, superar o entendimento de que as dinâmicas disci- plinares são impelidas pelo motor interno das idéias, em favor de uma compreensão “contextualizada” das idéias, do pensamento, das teorias”. (p. 22). Antunes (2004), ao descrever o desenvolvimen- to científico e profissional da Psicologia no Brasil du- rante o século XX, aponta que a preocupação com o fenômeno psicológico vem desde o Brasil colônia, “não se poderia afirmar que se tratava propriamente de Psicologia; só aos poucos ela conquistaria a con- dição de área específica de conhecimento e pouco mais tarde, por decorrência, a de campo de inter- venção prática.” (ANTUNES, 2004, p. 111). Os ideais que sustentavam a condição de mo- dernidade primavam por um homem novo e uma Escola Nova, que “se pretendia pedagogia científica e buscava na ciência psicológica uma de suas mais importantes bases de sustentação, proporcionou um terreno fértil para o desenvolvimento da Psicologia”. (ANTUNES, 2004, p. 112). Considerações Finais O trabalho de pesquisa sobre o SOSP gerou a preocupação dos pesquisadores com a localização, tratamento, guarda e disponibilização do acervo do- cumental e mobilizou diversas ações no sentido da sensibilização e apoio institucional, bem como expec- tativa do estabelecimento de políticas públicas relativas à preservação desses documentos. O que preocupa a equipe de pesquisadores é que, até o presente mo- mento, não há definição sobre o local final onde será constituído o acervo. Por essa razão, a disponibiliza- ção do Acervo SOSP ainda não está prevista.  RESUMO Este trabalho tem como objetivo analisar o processo de gestão desenvolvido no interior do projeto “Educação, campo e consciência cidadã” de forma a explicitar tanto os limites quanto as potenciali- dades de tal experiência. O referido projeto visa, dentre outras metas, alfabetizar e escolarizar 1500 jovens e adultos moradores em acampamentos e assentamentos de Reforma Agrária no estado de Minas Gerais. Se, de um lado, esta experiência apresenta uma série de limites em função da ausência de políticas públicas claras na área da Educação de Jovens e Adultos, de outro lado, ela possibilita a criação de práticas inovadoras na gestão do projeto e dos processos educativos. Estas apontam na direção da busca da autogestão e efetiva participação dos sujeitos (educadores e educandos) e dos parceiros (movimentos sociais, universidade e governo) nas decisões tanto de ordem pedagógica quanto de ordem administrativa. É claro que, com tais reflexões, não pretendemos reforçar a idéia de um Estado fraco no que diz respeito às políticas sociais. Ao contrário, por meio da organização, mobilização, respeito às diferenças é possível fortalecer a luta na construção de um Estado de novo tipo. Palavras-chave: Educação do Campo, Educação de Jovens e Adultos, Autogestão . Introdução Nas três últimas décadas, um conjunto de trans-formações vem sendo efetivado no seio das sociedades capitalistas, provocando modificações no modo de viver de grandes parcelas da população. Tanto as reformas introduzidas no nível da produção (o que se convencionou chamar de reestruturação produtiva) quanto aquelas realizadas no âmbito do Estado (as reformas neoliberais) fazem parte de um mesmo processo: a resposta do capital à crise con- temporânea. Os resultados desta reação são catas- tróficos dentre os quais destacam-se as altas taxas de desemprego, o agravamento das desigualdades sociais (tanto no interior dos países ricos quanto na relação entre países ricos e pobres) e da pobreza, o aumento da concentração de renda, poder e riqueza e o problema ecológico. Ao mesmo tempo, um conjunto de políticas de contratendência vem sendo elaborado por vários setores do movimento operário, camponês, social e popular. Desde a resistência à regressão de direitos conquistados historicamente pelas classes subalter- nas, até a construção de práticas que apontam para a possibilidade de “um outro mundo possível”. Neste sentido, pode-se dizer, como OLIVEIRA (1999), que existe uma crise do Estado colocada pelos setores dominados da sociedade e que questiona o estatuto da relação Estado – sociedade. É neste contexto que se inscreve o movi- mento “Por uma educação básica no campo” (ver KOLLING, E.; CERIOLI, P.; CALDART, R., 2004), bem como as diretrizes operacionais para educação básica do campo assumidas pelo Ministério da Educa- ção (ver Resolução CNE/CEB N0 1, 2002). Forma- do por movimentos sociais, sindicais e vários setores da sociedade comprometidos com a reforma agrária, este movimento demanda um espaço maior na ela- boração das políticas públicas, forçando uma redefini- ção nas relações do Estado com a sociedade. O objetivo deste artigo é analisar o processo GESTÃO NO PROJETO “EDUCAÇÃO, CAMPO E CONSCIÊNCIA CIDADÔ: LIMITES E DESAFIOS. Nágela A. Brandão Vânia Aparecida Costa Gilvanice Barbosa S. Musial 6 de gestão no interior do projeto “Educação, cam- po e consciência cidadã – 1º Segmento do Ensino Fundamental” que é uma das materializações deste movimento maior na sociedade civil. Dessa forma, espera-se contribuir para as reflexões acerca dos limi- tes e potencialidades de programas e projetos desta natureza no contexto de reforma do Estado. . Estado, Políticas Públicas e Educação do Campo. No Brasil, a Educação de Jovens e Adultos vinha, desde os anos 40, conquistando apoios de diferen- tes setores da sociedade civil e dos governos que se sucederam, e, no decorrer da década de 90, passa a perder força. Nessa década, iniciou-se um proces- so de desqualificação da EJA no âmbito das políticas públicas, provocando um retrocesso em conquistas alcançadas nos últimos 50 anos de luta pela inclusão da população jovem e adulta no direito à educação (HADDAD, 1997; MACHADO, 1998; DI PIERRO et al.; 2001). As reformas que se apresentaram nos anos do governo Fernando Collor de Mello ganham relevo nos anos seguintes, anunciando a prioridade que o Estado iria destinar à Educação Fundamental para as crianças de 7 a 14 anos, deixando de lado outros ní- veis e modalidades de ensino. Nesse sentido, o dis- curso sobre inclusão é substituído pela “focalização” e estabelecimento de prioridades acompanhadas da restrição dos direitos (HADDAD, 1997; BRASIL, 2000b). O retrocesso no plano das políticas públicas tam- bém se exprimiu no quadro legal por meio de me- didas restritivas tomadas durante o governo de Fer- nando Henrique Cardoso. “Em 1996, uma emenda à Constituição suprimiu a obrigatoriedade do ensino fundamental aos jovens e adultos, mantendo apenas a garantia de sua oferta gratuita”. Essa mudança de- sobrigou o Estado de assumir uma ação convocatória e mobilizadora no campo da EJA (DI PIERRO et al., 2001, p. 67). Mas, além de se desobrigar frente à oferta da EJA, o Governo suprimiu do artigo 60 das Disposições Transitórias, da Constituição Federal, o compromis- so da eliminação do analfabetismo no prazo de dez anos de sua promulgação, bem como da destinação de, pelo menos, 50% dos percentuais mínimos dos recursos públicos estabelecidos constitucionalmente para educação (CF, art 212) para este fim e para uni- versalizar o ensino fundamental. E, ainda, exclui as matrículas do ensino supletivo do cálculo das verbas do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valori- zação do Magistério - FUNDEF -, que é a base de cálculo para o repasse de recursos relativos à educa- ção para Estados e Municípios, alegando não dispor de dados necessários para aferir o número de matrí- culas no ensino supletivo. Essa medida desestimulou a criação de vagas nesses cursos, em todo o país (DI PIERRO et al., 2001, p. 67). Fica por conta, também, do governo Fernando Henrique Cardoso o veto à Lei que criou o Progra- ma Empresarial de Alfabetização de Adultos, e que obrigava as empresas e órgãos públicos, com mais de cem empregados analfabetos, a criar salas de al- fabetização, assumindo as condições necessárias para o seu funcionamento, tais como: equipamentos, ma- terial escolar e pessoal docente especializado (HA- DDAD, 1997). É nesse contexto de ausência de políticas públi- cas consistentes que surge em 1997, fruto da luta dos movimentos sociais do campo, o Programa Nacio- nal de Educação na Reforma Agrária – PRONERA. Criado no espaço de relações entre o poder público constituído e os Movimentos Sociais e Sindicais, o PRONERA tem como objetivo a criação de projetos de educação em acampamentos e assentamentos de Reforma Agrária. Para a realização desse objetivo, são articuladas parcerias entre o Governo, os Movi- mentos Sociais e Sindicais e as Universidades. Conforme aponta estudo recente do Ministério da Educação (2005), a escolaridade média da popu- lação de 15 anos ou mais residente na zona rural é de 3,4 anos, correspondendo a quase metade da estimada para a população urbana. A taxa de anal- fabetismo da população adulta na área rural brasileira é de 29,8% enquanto que a da zona urbana é de 10,3% (sem considerar os analfabetos funcionais). 7 Sendo assim, fica evidente a necessidade de ações efetivas para diminuir as desigualdades sociais existen- tes, sobretudo entre as zonas rural e urbana. Desse modo, fruto da liderança dos movimen- tos sociais de luta pela terra no Brasil o PRONERA cumprirá, no final da década de 90 e início do século XXI, um papel importante no cenário da Educação de Jovens e Adultos. Primeiro, por explicitar o quan- to a educação dos jovens e adultos se encontra, no contexto da Reforma Agrária e no campo brasileiro, em situação radical de exclusão. Segundo, por colo- car em pauta nas universidades públicas brasileiras, envolvidas com o referido programa, a educação dos jovens e adultos residentes em acampamentos e assentamentos de Reforma Agrária. Por último, por aproximar alguns segmentos das universidades dos movimentos de luta pela terra. É no PRONERA que se inscreve a experiência do Projeto Educação, Campo e Consciência Cidadã: 1º segmento do Ensino Fundamental que apresenta- mos em seguida. . Organização e Gestão do Traba- lho no Projeto “Educação, Campo e Consciência Cidadã – º Segmento do Ensino Fundamental”. O Projeto “Educação, Campo e Consciência Ci- dadã: 1° segmento do Ensino Fundamental” iniciou- se em dezembro de 2004 e tem seu encerramento previsto para setembro de 2007. Ele é resultado de um acúmulo de experiências vivenciadas em dois ou- tros projetos1 e representou um avanço no que diz respeito ao aumento do número de salas de aula, dos alunos atendidos, da população beneficiada e, principalmente, à garantia da escolarização e certifi- cação no 1º Segmento do Ensino Fundamental aos educandos atendidos e a escolarização no 2º Seg- mento aos educadores do projeto que ainda não possuem o Ensino Fundamental completo2. Este Projeto tem como parceiros o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST/MG, a Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Es- tado de Minas Gerais – FETAEMG, o Instituto Na- cional de Colonização e Reforma Agrária –INCRA/ Superintendência de Minas Gerais, a Faculdade de Educação da Universidade do Estado de Minas Ge- rais – FAE/UEMG, Faculdade de Filosofia e Letras de Diamantina – FAFIDIA, o Departamento de Educa- ção da Universidade Federal de Viçosa - DPE/ UFV e a Secretaria de Educação da Prefeitura Municipal de Contagem. Dada à natureza multicampi da UEMG, a parce- ria com a UFV e a localização dos assentamentos e acampamentos nas diversas regiões de Minas Gerais - Triângulo / Alto Paranaíba, Jequitinhonha, Mucuri, Rio Doce, Centro-Sul – configurou-se uma estrutura descentralizada. Aliás, esta é uma das premissas do PRONERA, descentralizar as ações das instituições públicas envolvidas e fomentar uma prática de gestão em que movimentos sociais e sindicais, instituições de ensino, pesquisa e extensão, governos estaduais e municipais colaborem na construção da justiça social e elevação das condições de vida e de cidadania de trabalhadores e trabalhadoras no campo. O PRONERA se desenvolve por meio de uma gestão participativa, cujas responsabilidades são assumidas por todos(as) em uma construção co- letiva na elaboração dos projetos, no acompanha- mento e na avaliação (BRASIL/MDA, 2004:13). Neste sentido, todo o processo de planejamen- to e construção do referido projeto contou com a discussão e participação de todos os parceiros en- volvidos. A indicação das demandas educativas foi feita pelos representantes dos movimentos sociais e sindicais, a partir de discussões com comunidades dos acampamentos e assentamentos. Os princípios 1A primeira experiência intitulada Projeto Alfabetização, Campo e Consciência Cidadã foi desenvolvida no período de dezembro de 2000 a janeiro de 2002. Uma segunda, intitulada Projeto Educação, Campo e Consciência Cidadã, foi realizada no período de dezem- bro de 2003 a dezembro de 2004. 2As metas finais desse Projeto pretendem: a) alfabetizar/escolarizar - no 1° segmento - 1.500 jovens e adultos dos acampamentos e assentamentos de Reforma Agrária nas regiões do Triângulo/Alto Paranaíba, Jequitinhonha, Mucuri, Rio Doce, Centro e Sul; b) capacitar 75 alfabetizadores/educadores residentes nas áreas atendidas para o desenvolvimento da prática pedagógica e c) escolarizar - no 2° segmento - 15 educadores de jovens a adultos dos acampamentos e assentamentos de Reforma Agrária dessas regiões. 0 não se possa fazer algumas reflexões acerca dos cri- térios de avaliação de projetos desta natureza. É sabido que uma das premissas do projeto neo- liberal de reforma do Estado busca instaurar critérios próprios da economia de mercado, como “custo- benefício”, “eficiência”, “racionalidade”, no âmbito da avaliação das políticas públicas. Direitos, demandas e necessidades anteriormen- te consideradas como assuntos públicos transfor- maram-se, da noite para o dia, em questões indi- viduais diante das quais os governos de inspiração neoliberal consideram que nada têm a fazer a não ser criar condições mais favoráveis para que seja o mercado o encarregado a lhes dar uma resposta (Boron, 2004:27). Pode-se dizer que o neoliberalismo reforça ainda mais o desafio da efetividade enquanto me- dida de avaliação das organizações e políticas. Se a eficiência fala da necessidade de uniformização dos procedimentos, da impessoalidade de tratamento e das definições claras e objetivas das funções e res- ponsabilidades segundo critérios de competência técnica e a eficácia trata da capacidade de atingir os fins almejados, a efetividade é “um critério essencial- mente político” (Campos, 1981:119). Ser efetivo é ser capaz de atender às demandas e necessidades da clientela/público, é prever a participação ativa dos sujeitos na definição dos objetivos, na busca de alter- nativas de execução, na avaliação de resultados. Não é por acaso que Campos (1990) e Boron (2004) lembram que não existe tradução para “ac- countability” no Brasil e na América Latina. As práti- cas políticas de relação do governo com a sociedade que predominam nesta região são de clientelismo e tutela, tornando difícil a tradução de um termo que significa controle da sociedade organizada sobre o governo, aparato governamental descentralizado e a serviço efetivo dos cidadãos, efetividade das políticas públicas. Neste sentido, pode-se dizer que o projeto “Educação, Campo e Consciência Cidadã” contribui para traduzir “accountability” para o português. . Considerações Finais Os governos neoliberais promovem um proces- so de regressão social pautado por uma crescente mercantilização do público e adoção de critérios contábeis para administrá-lo. Como diz Chesneaux (1995:138), “governar é gerir”. Nestas conside- rações finais é preciso perguntar em que medida programas e projetos como o “Educação, campo e consciência cidadã” reforçam ou rompem com a configuração neoliberal de Estado? Esta é uma questão de difícil resposta. Se pen- sarmos que a presença do Estado é fraca no que se refere à garantia de condições de infra-estrutura de funcionamento, remuneração adequada, direitos trabalhistas conquistados pelo setor público, pode-se dizer que tal projeto está em consonância com ideá- rio do Estado Mínimo. Porém, esta pode ser uma avaliação superficial e apressada, pois se pensarmos que tanto o PRO- NERA quanto o Projeto são frutos de um movi- mento amplo na sociedade de garantia do direito à educação do campo, pode-se dizer que ele rompe profundamente com o ideário neoliberal ao afirmar a política como metodologia de ação e ao forçar a adoção de critérios de efetividade na aplicação de recursos públicos. Além disso, tal Projeto constitui um espaço importante de aprendizado dos sujeitos na prática da gestão coletiva. Desse modo, por meio da organização, mobilização, respeito às diferenças é possível fortalecer a luta na construção de um Estado de novo tipo. . Referências ANTEAG – Associação Nacional dos Trabalhadores em Empresas de Autogestão e Participação Acioná- ria. Autogestão: construindo uma nova cultu- ra nas relações de trabalho. São Paulo: Anteag, 2000. BAREMBLITT, G. Compêndio de análise insti- tucional e outras correntes: teoria e prática. Rio de Janeiro, Record: Rosa dos Tempos, 1998, cap.1. BORON, A. “Os “novos Leviatãs” e a pólis demo-  crática: neoliberalismo, decomposição estatal e deca- dência da democracia na América Latina”. In: SADER, E. e GENTILI, P. (orgs.). Pós-Neoliberalismo II. Petrópolis: Vozes, 2004, p. 7-67. BRASIL. Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária – PRONERA: Manual de ope- rações. Brasília, MDA/INCRA, 2004. BRASIL. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação/Câmara de Educação Básica. Diretri- zes curriculares nacionais para a educação de jovens e adultos. Parecer CEB 11/2000a. Relator: Carlos Roberto Jamil Cury. 10 de maio de 2000. 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A Psicologia surgiu como uma ciência no século XIX e buscou adaptar- se às exigências de sua época, desenvolvendo meios que favorecessem a objetivação e a quantificação de seu objeto de estudo. Em decorrência dos contextos social, político e econômico da época práticas psicológicas, fundamentadas na Psicometria, passam a ser utilizadas através do uso de testes específi- cos. Apesar dos testes serem em sua essência apenas instrumentos de medida, sua utilização foi consi- derada a maneira mais prática de realizar avaliações, no sentido de determinar as medidas intelectuais, aptidões, interesses e personalidade dos sujeitos. Este trabalho visa, portanto, verificar como ocorreu o desenvolvimento dos testes psicológicos ao longo de sua história. Existiram momentos em que se acreditava que os teste poderiam “revelar tudo” sobre o indivíduo. Em outros, porém, os testes foram duramente criticados, sendo questionada sua utilidade para a profissão do psicólogo e suas aplicações nas áreas da educação e do trabalho, bem como para a ciência e geral. No século XXI a psicologia tem ampliado, cada dia mais, sua atuação na sociedade nas mais diversas áreas como educação, saúde pública, justiça. Desse modo, a avaliação dos processos psicológicos passa a ser entendida como uma forma de conscientização para intervenções que visem o bem estar dessa sociedade. Palavras-chave: Avaliação Psicológica, Testes Psicológicos, Psicometria, História da Psicologia. . Origem e Histórico da Psicometria Examinando a evolução das ciências, podemos verificar que, embora o método de avaliação através dos testes psicológicos seja recente, a utili- zação dos instrumentos de medida acompanha a humanidade desde os primeiros tempos. Desde a antiguidade, o homem percebeu a importância de conhecer as próprias características e aquelas do meio a seu redor, para assegurar sua sobrevivência e conseguir algum controle sobre o meio ambiente. Até nas culturas mais primitivas já se encontravam sistemas de registro e de contagem de observações. Um indício desse interesse milenar pela medida, são os calendários que já existiam, entre os egípcios, há mais de 5.000 anos a.C. Cerca de 2.700 anos a.C., esse mesmo povo demonstra notável conhecimento das medidas de espaço e de geometria que funda- mentou a construção das pirâmides. Nesse mesmo milênio, os sumérios padronizaram pesos e medidas, segundo mostram as pedras do templo de Lagash, e os assírios e os babilônios desenvolveram a astro- nomia, abreviando seus cálculos com artifícios que lembram os ábacos da antiga Grécia. Considerava-se que uma ciência seria mais evo- luída quanto mais cedo fosse sua preocupação com a mensuração dos dados. Na área do comportamento humano a medida serviu para diagnosticar desvios e enganos da observação não-controlada, ao verificar com objetividade os atributos pré-definidos e os re- sultados alcançados. Por outro lado, permitia colher informações imparciais e realistas sobre as diferentes áreas da vida mental, ampliando o conhecimento sobre o indivíduo. Muitos pesquisadores se em- penharam em tentativas de medir, com precisão e CONSIDERAÇÕES A RESPEITO DO CONTEXTO SÓCIO-HISTÓRICO DOS PROCESSOS DE AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA Maria de Lourdes Costa Ribeira1 1Psicóloga – Diretora do Centro de Psicologia Aplicada da Universidade do Estado de Minas Gerais. Rua Paraíba, 232 - Funcionários - Cep: 30.130 - 140 - Telefone: (31) 3226-6713 - e-mail: lourdinharibeiro@yahoo.com.br  pode inferir a respeito de seu comportamento atual. A princípio, os testes necessitavam de credibili- dade científica e para tanto seus criadores adotavam a terminologia de outras disciplinas mais antigas, como a medicina e a engenharia. O objetivo era provar que a psicologia era tão científica como as demais ciências, há tempos estabelecidas. Ao utilizar a analogia com outras ciências, os psicólogos desejavam aumentar a credibilidade dos testes. Segundo Medeiros (1999), “a medida psicológica conquistava melhores bases e termos de referência para as comparações tornando-as menos subjetivas e, portanto, mais confiáveis”. (MEDEIROS, 1999, p. 63). Com a ampliação e o aperfeiçoamento de seus mé- todos e instrumentos, a medida psicológica permitiu a descrição da realidade de modo mais exato e preciso. Segundo Anastasi & Urbina (2000), podemos compreender as limitações e os avanços da avaliação psicológica na contemporaneidade a partir do século XIX, quando existiam duas tendências. A primeira tendência surge na França, com a ênfase dada nas áreas da psicopedagogia e psiquiatria por meio dos estudos de Esquirol, Seguin e Binet, que se preo- cupavam com o cuidado adequado às pessoas que apresentavam problemas mentais e, desta forma, com o estabelecimento de critérios uniformes para identificar, classificar e oferecer treinamento a esses indivíduos. Essa tendência enfocava as diferenças in- dividuais de sanidade e de desenvolvimento. As pes- quisas realizadas por esses pesquisadores permitiram a construção de padrões de referência capazes de fornecer dados mensuráveis para a ordenação e a hierarquização dos indivíduos de acordo com seus atributos pessoais. A segunda tendência surge na Ale- manha, Inglaterra e Estados Unidos com ênfase dada ao uso da metodologia experimental. Os psicólogos experimentalistas se preocupavam com a padroniza- ção das situações de testagem para possíveis genera- lizações do comportamento dos indivíduos, descon- siderando as diferenças individuais. Essas diferenças eram ignoradas ou aceitas como um mal necessário que limitava a aplicabilidade das generalizações. Esses pesquisadores tinham como foco de atenção a uni- formidade e não as diferenças no comportamento. Ainda segundo Anatasi & Urbina (2000), o bi- ólogo inglês Sir Francis Galton foi considerado o principal responsável pelo movimento de testagem. Seus esforços direcionavam-se para investigações das diferenças individuais e o papel da hereditariedade, assim como a importância do meio ambiente no desenvolvimento da inteligência humana. Publicou os resultados dos seus primeiros trabalhos em Here- ditary Genius, em 1869, Inglês Men of Science, em 1874, Inquiries into Huma Faculty, em 1883, Natural Inheritance, em 1889 e Noteworthy Families, em 1906. Esse estudioso acreditava que as operações mentais poderiam ser avaliadas por meio de medidas sensoriais. Como toda informação do indivíduo che- ga pelos sentidos quanto melhor o estado deles, mais aperfeiçoadas as operações intelectuais. Foi, também, o pioneiro no uso das escalas de avaliação, questioná- rios e técnicas de associação, além de ser o primei- ro a se preocupar com a padronização dos testes. Ainda, no que se refere às contribuições de Galton para a Psicometria, pode-se citar o desenvolvimento de medidas da discriminação sensorial e o desenvol- vimento e simplificação de métodos estatísticos para analisar quantitativamente os dados coletados. James McKeen Cattell, psicólogo americano, foi também um dos expoentes no desenvolvimento da testagem psicológica por meio de seus estudos sobre o tempo de reação. Influenciado pelas idéias de Gal- ton, em relação ao estudo das diferenças individuais, enfatizou principalmente as medidas sensoriais para avaliar os processos mentais porque essas permitiam maior precisão. Num artigo da revista Mind intitula- do “Mental Tests and Measurement”, escrito por Cattell em 1890 empregou-se, pela primeira vez na literatura psicológica, o termo “teste mental” para designar uma prova organizada de maneira cientí- fica e não a priori. Esse artigo descrevia uma série de testes que estavam sendo aplicados anualmente a estudantes universitários com a finalidade de ava- liar o nível intelectual. Embora esse estudioso tenha cunhado a expressão “teste mental”, o primeiro tes- te de habilidade mental foi desenvolvido por Alfred Binet e Théodore Simon que, através de medições mais complexas do que as selecionadas por Catell, produziram uma avaliação mais efetiva das habilida- des cognitivas humanas. Em 1895, esses mesmos pesquisadores apresentaram várias críticas à maioria dos testes existentes. Afirmavam que os mesmos eram medidas sensoriais e, mesmo que permitissem 6 maior exatidão, não mantinham relações importan- tes com as funções intelectuais. Afirmavam, também, que se eram testes de conteúdo intelectual, esses se dirigiriam a habilidades específicas, quando deveriam medir funções mais amplas. Segundo Campos (2003), os pesquisadores Al- fred Binet e Théodore Simon, atendendo à demanda do Ministério da Educação Francês, construíram um instrumento de diagnóstico de crianças com dificulda- des escolares. Embora esse teste tenha tido sucesso, não foi sua orientação que fomentou o desenvolvi- mento da Psicometria, pois lhe faltava o enfoque da quantificação que era específico da orientação da Psi- cologia Experimental. Desse trabalho resultaram as escalas de medida do desenvolvimento da inteligên- cia e o conceito de “idade mental”, posteriormente proposto por William Stern como “quociente inte- lectual” - QI. Essa determinação do QI revelou-se, aos poucos, insuficiente uma vez que não permitia situar qualquer pessoa em relação aos indivíduos de sua própria idade. Entre as décadas de 1910 e 1930, ocorreu a era dos testes de inteligência, sobretudo devido ao impacto da Primeira Guerra Mundial que ocasionou a necessidade de um processo de seleção de solda- dos para o exército. Como o Stanford-Binet era um teste individual e o exército necessitava de um teste que pudesse ser aplicado coletivamente, tornou-se necessário o emprego de um teste de inteligência coletivo. Esses testes, desenvolvidos por psicólogos do exército, tornaram-se conhecidos como o Army Alpha e Army Beta. O primeiro foi planejado para testagem geral e o segundo, uma escala não-verbal, utilizada para aplicação em analfabetos e estrangeiros. Após a liberação dos testes do exército para o uso civil, segundo Pasquali, (2001), esses serviram como protótipo para o desenvolvimento de outros. A so- ciedade presenciou, então, um aumento significativo na quantidade de testes, em sua aplicação para se avaliar diferentes aspectos do comportamento e no emprego de técnicas cada vez mais variadas e sofisti- cadas. Essa popularização e o uso indiscriminado dos testes sem um adequado controle valorizaram a Psi- cologia, de modo significativo. Esse aumento no uso de testes psicológicos está relacionado aos processos de desenvolvimento econômico pós-guerra. Países economicamente instáveis precisavam encontrar métodos que indicassem as pessoas mais adequadas para os cargos existentes, principalmente de chefia e militares. O trabalho do psicólogo estava, então, ligado às demandas de um regime de adequar e de ajustar visto que se “aplicava testes” para selecionar “a pessoa certa para o lugar certo”. Gradualmente, os psicólogos percebiam que os testes de inteligência eram bastante limitados, uma vez que apenas alguns aspectos estavam sendo men- surados e eram muito dependentes da cultura onde haviam sido criados. O contexto cultural, social e po- lítico em que o teste é usado pode influenciar os re- sultados e a interpretação dos dados obtidos. Alguns testes são elaborados em países com uma realidade política e socioeconômica diferente daquela onde são usados e, no Brasil, a tradução dos mesmos, sem a devida adaptação para a realidade nacional, pode resultar em distorções da capacidade de medida des- se instrumento. O período compreendido entre as décadas de 1940 e 1980 foi chamado por Pasquali (2001) como a era da sistematização. Vários pesquisadores se pre- ocuparam em organizar os trabalhos realizados com testes psicológicos em duas tendências opostas: es- tudos de síntese e os estudos de crítica. Em relação aos primeiros, ocorreu a sistematização dos conheci- mentos sobre psicometria, teoria clássica dos testes, teoria sobre medida escalar, análise fatorial, análise da medida da personalidade e teoria da inteligência. No que se refere aos trabalhos de crítica, esses ocorre- ram devido aos problemas apresentados nas esca- las de medidas e com a Teoria Clássica dos Testes – TCT. Essa teoria teve seus fundamentos históricos lançados em 1808 e começou a ser utilizada, para fins de avaliação psicológica, em 1859. Com a TCT se consegue que os escores obedeçam a uma escala aproximadamente intervalar em quase 95% dos ca- sos, pois se supõem que medidas que se distribuem normalmente sejam aproximadamente intervalares. A Escala Intervalar é uma forma quantitativa de re- gistrar um fenômeno, posicionando-o com relação a um valor conhecido arbitrariamente e denominado como ponto zero. Tal aferição é realizada conceitu- ando-se a unidade de medida a ser usada nessa com- paração a partir de diferenças entre o valor do ponto zero e um segundo valor conhecido. Sua proprieda- de básica está no fato de que duas variações iguais, 7 em termos de medidas intervalares, necessariamente correspondem a variações diferentes em termos do valor que está sendo medido. Essa escala possibilita realização de operações aritméticas de soma e sub- tração de escores, o que não é possível na Escala Or- dinal que avalia um fenômeno em termos de onde esse se situa dentro de um conjunto de patamares ordenados, variando desde um patamar mínimo até um máximo. Os valores de uma Escala Ordinal são designados em termos de numerais ou ranking. A partir dos trabalhos pioneiros de Lord (1952) e Rasch (1960), que propunham modelos estatísticos paramétricos para itens de testes, surgiu Teoria de Resposta ao Item – TRI. Essa teoria utiliza o concei- to de traço latente e por isso é conhecida, também, como a Teoria do Traço Latente. Em muitas situações de medida a variável de interesse é de entendimento intuitivo para todos, porém nem sempre é observá- vel diretamente. É isso que a Psicometria chama de variáveis não observáveis ou habilidades ou traço la- tente e embora essas variáveis possam ser descritas, elas não podem ser medidas diretamente como a altura ou o peso de uma pessoa. A Teoria de Res- posta ao Item é um conjunto de modelos estatísticos utilizados para fazer predições, estimativas ou infe- rências sobre as habilidades medidas em um teste. Através dos modelos estatísticos é possível predizer tais habilidades por meio de correspondência entre a pontuação obtida por um sujeito num teste e os itens a ele apresentados. A maioria dos testes usados nes- sa teoria é de múltipla escolha e os itens podem ser dicotômicos (certo ou errado) ou politômicos (incor- poram variáveis categóricas em suas respostas). Essa teoria passou a ser utilizada apenas recentemente devido às dificuldades das análises estatísticas envolvi- das. Segundo Pasquali (2001), existem três modelos matemáticos envolvidos na TRI, a saber: . o modelo clássico de um parâmetro logístico ou modelo de Rasch em que se supõe que os itens pos- suem o mesmo nível de discriminação e que não há respostas dadas ao acaso, ficando como parâmetro a ser avaliado apenas a dificuldade dos itens; . o modelo logístico de dois parâmetros que avalia a dificuldade de discriminação dos itens, assumindo que não há respostas dadas ao acaso; . o modelo de três parâmetros de Lord, no qual os três parâmetros dos itens são avaliados. . Os Testes Psicológicos No Brasil A psicologia aplicada, no Brasil, não surgiu de princípios estabelecidos e comprovados em labora- tório, já que tais princípios não evoluíram, necessaria- mente, para técnicas de aplicação gerais e específicas. A grande contribuição do laboratório foi o desenvol- vimento da atitude e da disciplina científica, a saber: curiosidade, criatividade, sistematização, rigor e hu- mildade. Segundo Campos (2003), o primeiro laborató- rio de psicologia aplicada à Educação (psicologia pe- dagógica) foi instituído no Rio de Janeiro, em 1890 e um segundo laboratório de psicologia experimental foi inaugurado em 1913, na Escola Normal de São Paulo, sob a direção de Ugo Pizzoli. Em 1929, Lourenço Filho criou o primeiro instrumento nacional para a avaliação psicológica, denominado Teste ABC, destinado à avaliação da maturidade para alfabetização e ao desenvolvimento de habilidades dos alunos com dificuldades na apren- dizagem da escrita. O surgimento das universidades de Psicologia, no período de 1930 a 1960, inicia um movimento mais organizado no ensino, na pesquisa e na profissão. Ao lado disso, de acordo com Pasquali (2001), a neces- sidade de desenvolvimento da pesquisa psicológica ultrapassou o âmbito acadêmico e passou a ser de- senvolvida em instituições orientadas para questões do trabalho como o Instituto de Seleção e Orien- tação Profissional (ISOP, no Rio de Janeiro), Serviço de Orientação e Seleção Profissional (SOSP, em Belo Horizonte), Serviço Nacional de Aprendizagem In- dustrial (SENAI), Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (SENAC), entre outros. Os pesquisado- res utilizavam testes psicológicos como instrumento de investigação. O período de 1962 a 1970 foi marcado pela re- gulamentação dos cursos de formação do psicólogo (Lei N.º 4.119 de 1962). A partir dessa regulamen- tação ficou reconhecida, dentre outras atividades do psicólogo, a avaliação psicológica como uma função privativa de seus profissionais. 0 RESUMO Este artigo busca refletir sobre as dificuldades de aprendizagem dos alunos das séries iniciais da educação básica do Instituto de Educação de Minas Gerais (IEMG) em diferentes épocas. Partindo do projeto de pesquisa e do projeto de extensão desenvolvidos pelo Núcleo de Estudos e Pesquisas de Psicologia e Psicopedagogia da FAE-UEMG, busca-se identificar a abordagem das dificuldades de aprendizagem diagnosticas pelo Laboratório do Serviço de Seleção e Orientação Profissional (SOSP) na década de 70, e a abordagem das dificuldades de aprendizagem, diagnosticadas pelo Laboratório de Psicopedagogia da FAE-UEMG, dos alunos que freqüentam a escola, hoje, numa proposta de in- clusão. A reflexão vincula-se à análise dos procedimentos utilizados do ponto de vista metodológico, nos diferentes contextos sócio-histórico de cada Laboratório. Palavras-chave: Dificuldades de aprendizagem, História da Psicologia, Pesquisa, Psicopedagogia. Introdução Na história da educação mineira surge, como um dos palcos principais das práticas educati- vas, o Instituto de Educação de Minas Gerais – IEMG. Criado em 1906, com o nome de Escola Normal Modelo buscava, em sua essência, a formação de professores. Em 1929, o Curso Normal do IEMG passou a ser denominado Escola de Aperfeiçoamento de Pro- fessores tornando-se um Instituto Superior na área da Pedagogia, com o objetivo de formar especialistas para promover a implantação da Reforma de Ensi- no Francisco Campos, no Estado de Minas Gerais. Com a chegada da década de 30, as mudanças políticas, sociais e culturais ocorridas no país, a partir da renovação da base econômica, contribuíram para novas mudanças na política educacional, introduzindo uma nova concepção para o processo de formação de professores. A Reforma de Ensino da década de 30 em Minas Gerais instalou-se pela disposição do então Secretário da Educação do estado de Minas Gerais, Dr. Francisco Campos, que, segundo Coelho (1990), interessa-se por colocar em prática as mais avançadas idéias peda- gógicas da época. Em 1929, chegava a Minas Gerais a Comissão Européia que aquele secretário mandara contratar para trabalhar na renovação do ensino mi- neiro. Essa comissão, composta por professores-pes- quisadores, entre eles: Prof. Dr. Theodore. Simon; diretor do estabelecimento de anormais de Parray – Vandeuse, perto de Paris; colaborador de Alfred Binet, o criador dos primeiros teste de inteligência; Mme Artus, professora do Instituto J.J. Rousseau e da Escola Normal Superior de Genebra; Mme Hélene Antipoff, auxiliar do psicólogo Eduard Claparède, do Instituto Jean-Jacques Rousseau da Universidade de Genebra, entre outros nomes ilustres. Esse grupo de professores europeus instalou-se em Minas Gerais e criou o primeiro Laboratório de Psicologia da Escola de Aperfeiçoamento de Profes- DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM DE ALUNOS DAS SÉRIES INICIAIS DA EDUCAÇÃO BÁSICA: UM ESTU- DO COMPARATIVO DE DIFERENTES ÉPOCAS Profª Regina Rosa dos Santos Leal1 1Professora da Faculdade de Educação, Campus BH/UEMG, coordenadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas de Psicologia e Psicopedagogia, do Laboratório de Psicopedagogia e do Projeto “A psicopedagogia vai à escola e envolve as famílias: uma experiência de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão.  sores, que constituiu o núcleo de pesquisas e experi- mentação na área da psicologia e da metodologia do ensino. Coube à psicóloga de origem russa, Helena Antipoff, coordenar a organização do Laboratório de Psicologia Experimental da Escola de Aperfeiço- amento. Os trabalhos desenvolvidos no referido Laboratório foram influenciados pelas pesquisas de- senvolvidas na linha da psicogenética, produzidas por Jean Piaget no Instituto Jean-Jacques Rousseau e pelo movimento Escola Nova, passando a ser um marco na divulgação dos trabalhos na área da psicologia e da pedagogia em Minas Gerais. Aos poucos, a Escola de Aperfeiçoamento tor- nou-se o centro de irradiação de estudos nas áreas da psicologia e da educação, através do atendimento às crianças, professores e preparação de lideranças no campo educacional. Para Schwartzman, Bousquet e Bomeny (2000), a reforma da década de 30 foi influenciada pelo mo- vimento da Escola Nova. Esse movimento, sem se constituir em um projeto totalmente definido, estru- turava-se ao redor de princípios pedagógicos que se afastavam da transmissão autoritária e repetitiva de conhecimentos e ensinamentos, procurando apro- ximar-se dos processos criativos e menos rígidos de aprendizagem. À frente desse movimento, destaca- vam-se grandes nomes, como: Anísio Teixeira, alu- no de John Dewey da Universidade de Colúmbia, Fernando de Azevedo e Manuel Lourenço Filho. A proposta da Escola Nova, portanto, foi marcada pela orientação de Dewey que punha toda ênfase no ato de aprender em detrimento da ação de ensinar, acreditava no aprender-fazendo, livremente. Coelho (1990), ao citar Prates, assinala que o enfoque dos trabalhos desenvolvidos no Laboratório de Psicologia Experimental da Escola de Aperfeiçoa- mento de professores mantinha uma concepção psi- cologizada, que se fundamentava na linha de estudos da equipe européia. Com o passar dos anos, as questões da edu- cação em Minas Gerais não preocupavam tanto os políticos mineiros, que conduziam seu jogo de poder através de recursos mais visíveis e grupos de interes- ses mais articulados, dos quais não faziam parte os professores, os estudantes e as instituições educacio- nais. (Schwartzman, Bousquet, e Bomeny, 2000). Segundo Mafra e Castilho (1999), no final da dé- cada de 40, iniciou-se a transformação da Escola de Aperfeiçoamento em Curso de Administração Esco- lar (CAE) que, segundo Coelho ( 1990 ), “desvincu- la-se o pensamento pedagógico da reflexão sobre o social, e este irá dominar de forma quase absoluta o campo intelectual da educação brasileira até a década de 60”. (COELHO,199 p.284). Frente ao modelo político econômico desen- volvimentista e à necessidade de conceber um “novo homem” para o mercado de trabalho, influenciada por idéias taylorista e fordista, a nova concepção surge direcionando as pesquisas realizadas nas áreas da psicologia e da pedagogia. Em 1948, novos pro- fessores foram convidados a compor uma equipe de pesquisadores que implementasse a política educa- cional mineira. Entre eles, o prof. Myra y Lopez que veio ao Rio de Janeiro para criar o Instituto de Sele- ção e Orientação Profissional – ISOP. Assim, nos moldes do ISOP, do Rio de Janeiro, foi criado o Serviço de Orientação e Seleção Profissional - SOSP, como órgão anexo ao IEMG. Inaugurado em 1949, o serviço, de cunho inovador, buscava, através da fundamentação na linha da psicologia experimen- tal e da pesquisa psicométrica, atender às demandas educacionais com vistas à formação e aperfeiçoamen- to de psicólogos, orientadores educacionais e peda- gogos, bem como, promover a seleção e orientação profissional. Segundo Goulart (1987) havia, na época, uma tendência psicométrica de aplicação dos testes de inteligência trazidos dos Estados Unidos para se- rem utilizados no diagnóstico da inteligência, sonda- gem de aptidões e avaliação de interesses. O SOSP, de 1949 a 1994, produziu e reuniu um grande volume de material, documentos referentes às suas práticas de orientação e seleção. Em 1994, com a fundação da Universidade do Estado de Mi- nas Gerais, diversas instituições foram incorporadas, entre elas, o curso de Pedagogia do IEMG, que se transformou na Faculdade de Educação da Univer- sidade do Estado de Minas Gerais. Nessa mesma incorporação, o SOSP deu lugar ao Centro de Psi-  cologia Aplicada - CENPA, tornando-se vinculado à Reitoria da Universidade do Estado de Minas Gerais. Hoje, a tradição das pesquisas na área da Psicologia e da Metodologia de Ensino no espaço e tempo da Fa- culdade de Educação de Minas Gerais continua desa- fiando as atividades de estudos de seus professores, estimulando-os a formar os Núcleos de Estudos e Pesquisas da FaE-Uemg. No final de 2003, no De- partamento de Psicologia e Metodologia de Pesquisa, sob a chefia da Professora Lucy Esther dos Santos Pai- xão, foi criado o Núcleo de Estudos de Pesquisas de Psicologia de Psicopedagogia que, em 2005, passou a desenvolver dois projetos. O primeiro projeto desenvolveu a pesquisa so- bre o Serviço de Orientação e Seleção Profissional: SOSP, investigação sobre a história da Psicologia e a história da Educação em Minas Gerais (1949-1994), coordenado pela Profª Dra. Regina Célia Pereira Campos, como está no texto: O projeto do SOSP nasceu do apelo: era neces- sário resgatar um grande volume de material ori- ginário do SOSP, que se encontrava sem destina- ção, tratamento e preservação, ou seja, sem uma política de preservação arquivísitica e de pesquisa para o mesmo. Este material encontrava-se em um dos galpões da Universidade do Estado de Minas Gerais, em vias de ser incinerado. (CAM- POS, 2005, p.3) O referido projeto foi financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais – FAPEMIG (SHA 501/04) e desenvolveu pesquisa sobre as implicações das atividades do SOSP na his- tória da Educação de Minas Gerais, através da pes- quisa e análise histórica documental. A pesquisa SOSP encerrou-se em maio de 2007. Iniciou-se, então, uma nova fase, em que conta so- mente com os recursos da Pró-reitoria de Pesquisa e Extensão da UEMG para continuar suas atividades. O objetivo dessa nova etapa é desenvolver a análise dos documentos do SOSP, visando a interação com o projeto de extensão desenvolvido pelo Núcleo de Estudos e Pesquisa de Psicologia e Psicopedagogia da FaE-UEMG. O segundo projeto, “A psicopedagogia vai à es- cola e envolve as famílias, desenvolve uma experiên- cia de indissociabilidade entre o ensino a pesquisa e a extensão”. Coordenado pela profa. Regina Rosa dos Santos Leal, foi aprovado em 2005, pela Secretaria de Ensino Superior do Ministério de Educação SESu/ MEC, a partir do Programa de Extensão voltado a Políticas Públicas – PROEXT-2004. A meta principal do projeto foi a implantação do Laboratório de Psicopedagogia da Pós-Graduação da Universidade do Estado de Minas Gerais, visando um duplo atendimento: por um lado, para as alunas do curso de Pós-graduação em Psicopedagogia Clínica e Institucional da FaE-UEMG, no momento de realiza- ção de seu estágio curricular; e, por outro lado, para os alunos das séries iniciais da Educação Básica do Instituto de Educação de Minas Gerais – IEMG que apresentam dificuldades de aprendizagem. O projeto de extensão cumpriu seu principal objetivo de implantar e implementar o Laboratório de Psicopedagogia da FaE-UEMG, e promover a indisso- ciabilidade entre o ensino, a pesquisa e a extensão. A prática desenvolvida, através dos atendimentos psicopedagógicos realizados pelas alunas estagiárias do curso de Pós-graduação de Psicopedagogia, visa sistematizar um relato de experiência sobre a práti- ca do Laboratório de Piscopedagogia da FaE-UEMG nos dias de hoje. Considerando os registros das atividades da Se- ção Infantil do SOSP sobre as dificuldades de apren- dizagem de alunos da educação básica, e, levando-se em conta os atendimentos realizados no Laboratório de Psicopedagogia pelas alunas da Pós-graduação do curso de psicopedagogia clínica e institucional a FaE- UEMG, pode-se levantar duas vertentes de questões que podem nos abrir novos campos de investigação. A primeira vertente levanta um questionamento sobre as práticas de atendimento às crianças realiza- das no SOSP: Em que consistiam as queixas de dificul- dades de aprendizagem no período do atendimento da seção infantil do SOSP? Quais os instrumentos e procedimentos da avaliação das dificuldades de aprendizagem utilizados? Qual a concepção de difi-  com uma equipe de professores supervisores de está- gio do Curso de pós-graduação em psicopedagogia e as estagiárias do projeto “A Psicopedagogia vai à escola e envolve as famílias”, com bolsa de iniciação científica. Os alunos encaminhados ao Laboratório de Psicopedagogia chegam, em sua maioria, com as seguintes queixas: “dificuldades na leitura e escri- ta,” “raciocínio lento,” “preguiçoso”, “dificuldade em matemática”, “dificuldade comportamental,” “agressividade.” Trazem algumas vezes, diagnósticos prontos de “hiperatividade,” “autismo” e apresen- tam, também, em alguns casos, síndromes, como a de “Down,” “Asperg” ou “dificuldades orgânicas e sociais, tais como a visual, a social e as familiares.” Além disso, existem casos manifestando problemas comportamentais que se encontram relacionados a “problemas étnicos raciais”, vivenciados em situações de preconceitos por parte de colegas e até mesmo de professores, dentro da escola. As práticas e os instrumentos de diagnóstico de- senvolvidas no Laboratório de Psicopedagogia estão baseadas na entrevista com os pais (anamnese), na observação das atividades espontâneas, a partir do instrumento psicopedagógico da hora do jogo e do par educativo, as brincadeiras, jogos, leituras, dese- nhos, bem como provas operatórias, testes psico- motores, verificação do material escolar e entrevista com a professora, com fins de verificação da intera- ção com os colegas e com a dinâmica escolar. Ao final do atendimento, é feita uma devolução oral aos pais sobre todo trabalho desenvolvido. Os dados que configuram o relatório de devolução do atendimento.psicopedagógico podem ser definidos da seguinte forma: Dados de Identificação da criança: idade, sexo, cor, escola que freqüenta, série; queixa ou motivo da consulta; atitudes frente a queixa; resultados das entrevistas e atividades realizadas na avaliação psico- pedagógica; área da linguagem, leitura e escrita; as- pectos cognitivos: aspectos socio-afetivo: hipótese diagnóstica; modalidade de aprendizagem, o prog- nóstico, o encaminhamento ou orientações. De acordo com Visca (1987), a abordagem psi- copedagógica para o atendimento das dificuldades de aprendizagem está de acordo com a perspectiva da “Epistemologia convergente” que consiste, predomi- nantemente, em uma atitude que tenta integrar os aportes das Escolas de Genebra, Psicanalítica e da Psicologia Social fundamentada em Pichón Rivière. Pain (1996) reflete que oferecer à criança a inter- venção psicopedagógica é possibilitar a ela um pro- cesso de regate da aprendizagem: “Permitir à criança apropriar-se de um conhecimento é permitir-lhe forti- ficar o seu Ego, na medida em que ela pode se cons- tituir em uma personalidade mais segura, mais domi- nante e mais responsável...” (PAIN, 1996. p. 16). Fazendo uma reflexão sobre as práticas escola- res, Pain (1996) acrescenta: Constatamos, entretanto, que a escola nem sem- pre desempenha um trabalho competente, em decorrência de posturas dominadoras. Domina oferecendo menos elementos às crianças para pensar, pois seu domínio depende da manuten- ção da ignorância. É o colonialismos no nível da aula. A diferença em relação ao colonizador é que o professor quer construir sujeitos semelhantes a ele. (PAIN, 1996, p. 16-17). A autora reflete o que temos presenciado na prá- tica do Laboratório de Psicopedagogia do Curso de Pós-Graduação da Faculdade de Educação da UEMG e que já estava presente na realidade do setor infantil do SOSP desde meados do século XX. Continuan- do, afirma que nem sempre a escola está preparada para oferecer aos alunos uma flexibilidade que possa garantir um processo democrático e o respeito às di- ferenças. Considerações finais. O fortalecimento da prática da pesquisa e da ex- tensão dentro da Universidade confirma-se com o registro das atividades realizadas pelos Núcleos de Estudos e Pesquisa. No caso do Núcleo de Estudos e Pesquisas de Psicologia e Psicopedagogia da FAE- UEMG, as práticas desenvolvidas pelos dois projetos em andamento contribuem para o resgate de uma história com tradição na investigação das dificulda- des de aprendizagem. Como coordenadora deste 6 Núcleo considero que, apesar de serem grandes os entraves institucionais que vão desde as instalações físicas até a fragilidade do vínculo com a instituição, próprios do atual contexto da FAE-UEMG, os profes- sores ainda se empenham, pois sabem que há muito a ser feito. O projeto de pesquisa do Serviço de Seleção e Orientação Profissional (SOSP- 1949-1992) impediu que todo um material científico de grande relevância para as áreas de educação, psicologia e história fosse incinerado. Com essa conquista, o Núcleo de Pes- quisa de Psicologia e Psicopedagogia da FAE-UEMG abre espaço para novas pesquisas sobre a Psicologia da Educação e suas interfaces com a História da Edu- cação em Minas Gerais. Por outro lado, ao realizar o projeto de extensão “A psicopedagogia vai à escola e envolve as família: uma experiência de indissociabilidade entre pesquisa, ensino e extensão”, o Núcleo de Pesquisa de Psico- logia e Psicopedagogia da FAE-UEMG propõe uma articulação entre o curso de graduação em Pedago- gia da Faculdade de Educação da UEMG, o curso de pós-graduação em Psicopedagogia da FaE/UEMG e o Instituto de Educação do Estado de Minas Gerais. Para a graduação, no momento em que realiza es- tágio integrado entre alunos do 6º e 7º núcleo, para as alunas do curso de pós-graduação Lato -Sensu em Psicopedagogia clínica e institucional no momento do estágio no Laboratório de Psicopedagogia. Essa expe- riência apresenta-se rica e original para os estudantes da FAE e para os alunos, pais e professores do IEMG. A busca pela unidade da pesquisa, ensino e ex- tensão concretiza-se no conjunto arquitetônico do Instituto de Educação de MG. A Faculdade de Edu- cação tem buscado desenvolver práticas e construir conhecimentos relevantes, tanto sobre o resgate da história da educação, como sobre as práticas atuais desenvolvidas no Laboratório de Psicopedagogia. Além disso, muitas famílias atendidas não têm como encaminhar seus filhos a um atendimento psicope- dagógico particular, por essa razão a contribuição dada pelo Laboratório é de grande relevância. Além do mais, oportuniza o diálogo entre a Faculdade de Educação e o Ensino Infantil, Fundamental, Médio e o Magistério do IEMG, permitindo novos cami- nhos e novos projetos como o projeto “Espaço do Jogo”, que pretende pesquisar e refletir sobre o uso dos jogos no processo de ensino aprendizagem. Certamente, tais estudos possibilitarão ressaltar a importância de se garantir uma política efetiva para que os professores desenvolvam ensino, pesquisa e extensão de qualidade e com significado para a FAE/ UEMG e para o IEMG. Referências BOSSA, N. A. BARROS, V. A avaliação psicope- dagógica da criança de sete a onze anos. Pe- trópolis: Vozes, 1997. COELHO. M. I. M. Escola Normal – Instituto de Educação: reconstrução da história da educa- ção elementar (MG 1906-1960) Belo Horizonte, Curso de Pedagogia. CAMPOS, R. P. C. O projeto de pesquisa do Serviço de Orientação e Seleção Profissional, UEMG, 2004. FERNÁNDEZ, A. A inteligência aprisionada. Porto Alegre: Artes Médicas,1991. MAFRA. E. S., CASTILHO, S. F. R. História do Curso de Pedagogia. (pesquisa - 1970-1992). Belo Horizonte, 1999. PORTO, O. Bases da psicopedagogia; diagnós- tico e intervenção nos problemas de aprendizagem. Rio de Janeiro: Wak, 2005. SMICTH, C. Dificuldades de aprendizagem de A a Z; um guia completo para pais e educadores. Porto Alegre, 2001. SCHWARTZMAN, S.; BOUSQUET, H. M.; BOMENY, V. Tempos de Capanema. São Paulo: Paz e Terra/ FGV, 2000. PAIN, S. A função da ignorância. Porto Alegre: Artes Médicas, 1988. VISCA, J. Clínica psicopedagógica; epistemologia convergente. Porto Alegre: Artes Médicas, 1987. 7 RESUMO O presente trabalho tem como objetivo relatar o estudo de fontes documentais que revelam as in- terfaces existentes entre a História da Educação e a História da Psicologia em Minas Gerais. Através de análise de documentos e depoimentos orais, observa-se que o SOSP tornou-se presença marcan- te na origem e constituição da Psicologia de Minas Gerais e do Brasil. A importância desta instituição revela-se nas análises realizadas e merece estudos aprofundados e novos olhares podem encontrar outras facetas para revelar toda contribuição ofertada para o debate acadêmico referente à interface entre a psicologia e a educação em Minas Gerais e no Brasil. Introdução A Universidade do Estado de Minas Gerais - UEMG registra em sua herança contribuições irrefu- táveis para a História da Educação e da Psicologia e pretende, cada vez mais, continuar sua atuação para o progresso das ciências humanas. O cenário histó- rico mostra que Minas Gerais esteve na vanguarda de muitos acontecimentos nacionais e preservar os registros destas atuações é responsabilidade de cada instituição e de pesquisadores, cientes em seu papel social de não permitir que caia no esquecimento dados importantes para a compreensão das práticas sociais e políticas de cada época, fazendo justiça aos atores de fatos ocorridos e suas produções de hoje e do passado. O presente trabalho tem como objetivo relatar o estudo de fontes documentais que revelam as in- terfaces existentes entre a História da Educação e a História da Psicologia em Minas Gerais[3]. O estudo baseou-se na investigação sobre as práticas sociais e de diagnóstico, da Psicologia aplicada do Serviço de Orientação e Seleção Profissional – SOSP. Consistiu em uma busca para identificar seus atores, seus se- tores, suas atuações e as implicações na produção da História da Educação e principalmente suas con- tribuições para a Psicologia no Estado de Minas Ge- rais. Associado ao resgate do material documental, a pesquisa sobre o SOSP coletou dados através do registro da memória oral sobre a instituição, ou seja, registrou e analisou lembranças e reminiscências de antigos diretores, chefes de setores e funcionários do SOSP. O envolvimento de toda a equipe do SOSP é enfatizado por vários ex-funcionários entrevistados. Iniciamos as entrevistas em 2005, quando tivemos a oportunidade de ouvir o depoimento da Profa Su- zana Ezequiel. Continuamos entrevistando diversos psicólogos e/ou professores, funcionários e/ou dire- tores do SOSP: Elza Lima em 07 de março de 2006; Ana Maria Sarmento e Sônia Pains Lemos, em 16 de março de 2006; Antônio Luis Rodrigues, em 04 REGISTROS HISTÓRICOS DE UMA INSTITUIÇÃO: SERVIÇO DE ORIENTAÇÃO E SELEÇÃO PROFISSIONAL (99-99) Lucy Esther dos Santos Paixão1; Regina Célia Pereira Campos2 1Mestre em Gestão da informática na Educação pela UFSC, Professora Aposentada da Faculdade de Educação Fae/CBH/UEMG, Professora da UNIPAC/Sabará. Participação voluntária na pesquisa “SOSP. 2Doutora em Educação pela UFMG, professora da Faculdade de Educação FaE/CBH/UEMG, professora do Curso de Mestrado em Educa- ção – Universidade Presidente Antônio Carlos - UNIPAC/Barbacena. Coordenadora do Projeto “SOSP: uma investigação sobre a história da Educação e História da Psicologia em Minas Gerais”. Endereço: Rua Pernambuco, 47 Bairro Funcionários BH – MG Telefones: (031) 3274 2254email: reginacampos2000@yahoo.com.br 3 Projeto “Serviço de Orientação e Seleção Profissional – SOSP: uma investigação sobre a História da Educação e a História da Psicologia em Minas Gerais (1949-1994). Financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais – FAPEMIG (SHA 501-04). 0 Vieira Ayer, que coordenava o Serviço de Orientação Educacional do IEMG. A equipe foi, inicialmente, formada com profis- sionais da educação. Muitos profissionais foram re- crutados entre os alunos do curso de Pedagogia da UFMG, onde o prof. Pedro Parafita Bessa, diretor do SOSP, atuava como professor. Posteriormente, ficou registrado o valor de sua contribuição, tendo sido agraciado com o título de Professor Emérito da UFMG. Em Belo Horizonte, as pesquisas e estudos fo- ram aparecendo e a proximidade com a Universi- dade Federal de Minas Gerais - UFMG garantiram a reprodução conjunta do Teste MM (Minhas Mãos) de Helena Antipoff. Esse trabalho teve como coor- denadoras a profa. Neide de Oliveira Magalhães e as profas da UFMG e funcionárias do SOSP, profa. Suzana Ezequiel da Cunha e profa. Elza Lima. Esta obra é várias vezes reeditada pelo Centro Editor de Psicologia Aplicada – CEPA, no Rio de Janeiro. No manual do Teste MM, encontramos a seguinte afir- mativa: A partir de 1943, época de sua primeira apresen- tação, numerosos artigos foram publicados sobre o teste, quer de autoria de Helena Antipoff, quer de seus colaboradores. As mais recentes publica- ções são a tese de doutoramento do professor Pedro P. de Bessa e o Manual MM, publicado pelo CEPA, em 1960. (ANTIPOFF, 1975. p 10-11). Apesar dessas produções, verificou-se que as publi- cações eram escassas, como afirma um dos entre- vistados: Não havia tanto seminário, tanto evento científico assim para participar, como hoje, porque quando o SOSP começou... foi muito antes dos cursos de psicologia, muito antes. Então, muita coisa se perdeu. São memória oral, só. Pouca coisa, só relatórios que eram publicados, no... chamava-se Arquivos Brasileiros de Psicotécnica. Depois, vi- rou Arquivo Brasileiro de Psicologia Aplicável, mas era pouca coisa. O SOSP contava mesmo era com esse inter- câmbio de pesquisadores que vinham do ISOP do Rio e com as reuniões de estudo de caso e aper- feiçoamento que aconteciam em Belo Horizonte. A atuação da equipe do SOSP era respeitada em toda a sociedade mineira, pelo empenho e competência. Outra entrevistada confirma que o aprofunda- mento de seus estudos acontecia nessas reuniões de estudo de caso. Tendo se especializado no Thematic Apperception Test - TAT, com o Professor Rui Flores Lopes, observa que adquiriu grande capacidade de trabalho quando atuou no SOSP, devido aos estudos e conhecimentos sobre as técnicas de manuseio e interpretação deste instrumento de diagnóstico. Por não haver sido criado, até aquele momento, um curso de Psicologia para a formação dos profis- sionais (a criação da legislação sobre a formação do Psicólogo data de 1962), o SOSP tornou-se fonte original de formação de Recursos Humanos em Psicologia e Pedagogia e de projetos de pesquisa na área. Dele, resultou a criação dos primeiros cursos de Psicologia de Minas Gerais, o da então Universi- dade Católica de Minas Gerais – UCMG, hoje, Pon- tifícia Universidade Católica de Minas Gerais – PUC - Minas e o Curso de Psicologia da Faculdade de Filosofia da Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG, pois os funcionários do SOSP foram os primeiros professores desses cursos. Escusado dizer que o primeiro curso de Psicolo- gia em Minas (alem de ser um dos primeiros no Brasil), o da PUC-Minas, só foi possível graças ao conhecimento produzido e acumulado em insti- tuições como os cursos de medicina, pedagogia e filosofia da UFMG, os serviços de Orientação Educacional do Senai, Senac e o Departamento de Orientação e Treinamento - DOT do antigo Banco da Lavoura de Minas Gerais e, sobretudo o SOSP. Nomes como Helena Antipoff, Mira y Lopez e Pedro P. Bessa estão intimamente ligados ao SOSP. (SALOMON, 2004, p. 9). O SOSP, fundamentado pela abordagem psico- métrica e, posteriormente, pautado em ações de linha humanista, foi também produtor de conheci-  mentos e pesquisas sobre novas metodologias em orientação educacional, vocacional e técnicas de exa- me psicológico e psicopedagógico. A princípio, o SOSP importou modelos de aten- dimento, técnicas de exame e de avaliação do com- portamento de outros países. Trazidos dos Estados Unidos e Europa, os testes eram utilizados para diag- nóstico da inteligência, para sondagem de aptidões e avaliação de interesses. Depois, foi-se construindo os próprios métodos e técnicas de orientação voca- cional e educacional. Esses métodos eram constan- temente adaptados ao perfil da população brasileira através do levantamento de escalas e tabelas elabo- radas com amostragem brasileira, além de procedi- mentos ligados à seleção profissional de vários cargos do funcionalismo do estado de Minas Gerais e outras instituições particulares. No início dos anos 60, é sentida uma crise no sistema de ensino brasileiro. A educação ganhou des- taque e foi amplamente debatida. O projeto de re- forma educacional dos “Pioneiros” aciona, em 1961, a promulgação da LDB, mas os problemas funda- mentais continuam sem resposta: qual a destinação social da educação? Como precisar o conteúdo do ensino? Qual a relação entre trabalho e educação? Pasqualli (2001) situa o final da década de 60 como o período do advento dos estudos sobre as doutrinas científicas do humanismo e da dialética. Uma reação crítica à quantificação e ao positivismo, que ainda gera um crescente desinteresse pelas medidas psicológicas e instrumentos baseados em dados quantitativos, de acordo com os parâmetros da psicometria. A crítica à quantificação aplicada à Educação pode ser percebida nessa afirmativa de Goulart (1989): Deve-se, contudo, descortinar o caráter ideoló- gico da apropriação da psicometria pela escola. Ela veio justificar a divisão de classes, evidencian- do que os mais bem dotados eram realmente os que pertenciam aos grupos sócio-econômicos mais elevados e que, obviamente, constituíam a classe dominante. Assim, mediante argumentos científicos, a psicometria contribuiu não só para reproduzir na escola a estrutura social mais am- pla, mas sobretudo para perpetuar esta estrutura. (GOULART,1989, p.30) Críticas como essas e outras, ligadas à avaliação psicológica baseada nos instrumentos de medida, alimentaram a crise da abordagem Psicométrica na Psicologia e, conseqüentemente, na Educação. Uma das entrevistadas, ex-funcionária do SOSP, refuta a crítica de que os testes psicológicos brasilei- ros eram apurados tendo como base as tabelas ame- ricanas. Ela afirma: Eu acho que a gente tem é que valorizar nesse ponto. Eu não tenho receio digamos, da crítica dos “atuais”, porque o SOSP primava pelo rigor metodológico. Então, por exemplo, eu traduzi o MPI, mas a gente tinha a D. Suzana Ezequiel que era a estatística e a psicometrista. Então, as normas, as tabelas todas eram construídas. E como nós tínhamos amostras imensas... de 800 pessoas, 1.000 pessoas!, era muito fácil construir as nossas tabelas que observou-se por aí que tem e uma das críticas que se faz muito: “Tá usando tabela americana e tal”. Nós não usávamos tabela americana, não! A gente fazia as nossas tabelas! De fato, diversas tabelas e baremes foram en- contrados entre os documentos do SOSP, em sua maioria, escritos de próprio punho desta psicóloga e professora. Outra crítica comum observada era a de que havia uma desvinculação entre ensino e pesquisa psi- cológica, fato que provocou reações por parte da so- ciedade sobre o uso abusivo dos testes psicológicos. Instalada a crise, que perdura até os dias de hoje, as Comissões de avaliação e revisão dos testes psicoló- gicos do Conselho Federal e Conselhos Regionais de Psicologia vêm discutindo a utilização dos instrumen- tos diagnósticos e a revisão dos testes encontra-se em andamento. Como revelam as declarações de vários entrevis- tados, os diagnósticos realizados no SOSP não con- sistiam apenas em testes psicológicos. O atendimento dos sujeitos se dava na direção de uma abordagem  humanista. Um dos psicólogos e professores entre- vistado reafirma, em sua entrevista, essa tendência: O SOSP tinha uma postura humanista, também, vinda do prof. Bessa, que foi aluno da D. Hele- na, D. Helena Antipoff. Todo o grupo tinha curso superior. O SOSP não tinha ligação assim de tra- balho com a D. Helena, não, mas ela foi profes- sora de quase todos os profissionais de lá. Ela foi professora do prof. Bessa, tanto que quando ela foi para o Rio de Janeiro, trabalhar no Rio, o prof. Bessa que ficou no lugar dela, como assistente, ele era assistente dela e depois ficou como titular. De fato, merece ser destacada essa tendência herdada “hereditariamente” da mestra Helena Anti- poff, que mesmo não tendo diretamente trabalhado no SOSP, recebeu na Fazenda do Rosário inúmeras crianças que eram encaminhadas pelo órgão, confor- me os documentos encontrados. O SOSP estava lá e funcionava plenamente, quando a década de 80 trouxe o debate e a nova Carta Constitucional que estabeleceu a gestão de- mocrática da educação pautada pela universalização do ensino básico, reforma administrativa no Estado e mudanças nas formas de organização e controle do sistema de ensino. A destinação de recursos e o discurso humanitário passaram a ser uma atuação política vinculada a políticas globais. As Conferências de Jomtien (1990), Nova Delhi (1993), Salamanca (1995), Hamburgo (1997), Dakar (2002), e outras seguiram provocando discussões sobre novas pers- pectivas voltadas para a sustentabilidade, a educação e a saúde mundial, especialmente, dos países periféri- cos. Propondo modelos de universalização da oferta da educação, essas discussões internacionais fizeram eclodir novos paradigmas no campo educacional, como a defesa da inclusão social e das pessoas com necessidades especiais. O SOSP ainda fazia atendimentos de orientação infantil e vocacional quando, a partir dos anos 90 e no início do século XXI, sob o advento do neolibe- ralismo e do discurso da globalização, é concretizada a estratégia estatal de descentralização da saúde e da educação pela via da municipalização. Todas essas transformações também trouxeram novos rumos ao Serviço de Orientação e Seleção Profissional. Em 22 de setembro de 1994, através do Decre- to-Lei nº 11539, art.24 inciso IV, o Serviço de Orien- tação e Seleção Profissional - SOSP, juntamente com a Escola Guignard, Fundação Mineira de Arte - FUMA e o Curso de Pedagogia do IEMG (CPIEMG), foram incorporados à Universidade do Estado de Minas Gerais. Nessa ocasião, o Serviço de Orientação e Seleção Profissional foi transformado em Centro de Psicologia Aplicada (CENPA). A psicóloga e professora Marlene Baptista Fran- ca, diretora do SOSP por ocasião de sua transição para CENPA afirma que: Apesar de todas as dificuldades próprias do Ser- viço Público, temos procurado trabalhar dentro dos parâmetros de qualidade, modernidade, procurando sempre novos conhecimentos, no- vas metodologias de trabalho e sempre atentos à pessoa humana como peça mais importante do nosso trabalho. (FRANCA, 1996, p. 39). Revestido da integração na Universidade, como Centro de Psicologia Aplicada, o SOSP buscou man- ter sua vocação original, apresentou uma proposta de estudos avançados e práticas inovadoras no cam- po da Psicologia e da Educação. Buscou constituir-se num laboratório para ensino, pesquisa e extensão, onde os conhecimentos elaborados na academia pudessem retornar à comunidade e a prestação de serviço não fosse apenas um fim em si mesmo. (FRANCA, 1994). A transformação do órgão SOSP em CENPA, conforme o registro da Lei, não descaracterizou sua natureza, nem a finalidade de suas atividades. Bus- cando acompanhar a evolução da psicologia e sua atuação, o SOSP/CENPA busca atender as necessi- dades das transformações históricas, sociais e políti- cas do novo século. O resgate da memória oral de ex-funcionários do SOSP O resgate da memória oral de ex-funcionários do SOSP deixa evidentes as práticas sociais e políticas  registrar o esforço de uma equipe de profissionais, o desafio de constituição de uma prática científica e, principalmente, a persistência e a teimosia daqueles que acreditam no caminho a ser trilhado. O sentimento que nos domina, ao final deste trabalho, é o de desejo de que possam falar de nós o que Drummond (1985) diz sobre essa grande figura da psicologia mineira: Volto à casa de Helena A casa de Helena é a casa de daqui a 20 anos, De daqui a 50, ao incontável. É uma casa pousada em nós, em nosso sangue. Podemos torná-la real: O risco arquitetônico de Helena Fica estampado na consciência. E quando Helena se cala Na aparência mortal, Seu riso viçoso e alegre perdura, Lição de Helena Antipoff mineira universal. Carlos Drummond de Andrade Helena é a psicóloga Helena Antipoff, psicólo- ga que criou o primeiro Laboratório de Psicologia Aplicada à Educação em Belo Horizonte e uma das professoras da antiga Escola Normal Modelo, hoje, Instituto de Educação de Minas Gerais. Para que não fiquemos presos ao passado, este lugar, o aqui e agora, é simplesmente a casa de “Helena”, é sim- plesmente o “SOSP”, ou simplesmente tudo que nos inspira a entregar o que produzimos e estimular a continuidade de outras produções. Referências ANTIPOFF, H. Teste MM. Belo Horizonte: Funda- ção Estadual de Educação Rural - FEER, 1975. BESSA, M. C. C., Homenagem a Mira y Lopes. Ca- derno de Educação, vol.1, n.4, Belo Horizonte, 1996. BRASIL, Ministério da Educação. 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Palavras-chave: orientação profissional, seleção profissional, mercado de trabalho, profissão. I - Introdução O Serviço de Orientação e Seleção Profissional – SOSP realizou, no período de seu funcionamen- to, entre as décadas de 50 a 80, diversas seleções profissionais e desenvolveu inúmeros processos de orientação profissional para a escolha e definição da profissão visando a adequação de adolescentes, jo- vens e adultos ao mercado de trabalho. Este artigo vem introduzir, através de de um breve relato histó- rico e algumas reflexões, a importância da orientação profissional no cenário das práticas de gestão das or- ganizações no contexto do capitalismo. No debate acadêmico, a questão relativa à se- leção e à orientação profissional é objeto de estudo tanto da Psicologia e da Pedagogia, quanto da Socio- logia, da Administração e da Economia. Conforme afirma Melo-Silva (2005), no entanto, estudos sobre os processos de orientação profissional são escassos no contexto brasileiro: Decisões relativas à carreira, com maiores ou me- nores graus de liberdade de “escolha” constituem objeto de estudo desde meados do século pas- sado. Mais recentemente observa-se o aumento da preocupação de investigadores das ciências humanas, no contexto brasileiro, pela sistema- tização de dados sobre tópicos específicos em Orientação Profissional. No Brasil a quantidade de publicações neste domínio ainda é reduzida se comparada a outras áreas do conhecimento como a Psicologia e a Educação. Dessa forma, torna-se necessário avaliar as possíveis contribui- ções prestadas pela Orientação Profissional frente às dificuldades relativas à escolha da profissão. A avaliação sistemática de procedimentos de in- tervenção será útil no sentido de desencadear melhorias nos serviços e programas, assim como, fornecer diretrizes para a definição de políticas pú- blicas. (MELO-SILVA, 2005, p. 01). Nosso interesse, portanto, gira em torno des- sa sistematização de dados sobre os processos de escolha das profissões e da escolha de profissionais ao longo da história, principalmente, da história bra- sileira, a partir do Século XX, de forma a registrar algumas das possíveis contribuições prestadas pelo Serviço de Orientação e Seleção Profissional frente PROCESSOS DE ORIENTAÇÃO E SELEÇÃO PROFISSIONAL: HISTÓRIA E REFLEXÕES Sidnei Huebert dos Santos1 Regina Célia Pereira Campos2 1Mestrando em Educação Tecnológica do CEFET/MG, Professor da Faculdade de Educação da UEMG. email: siduemg@yahoo.com.br 2Doutora em Educação, professora da Faculdade de Educação FaE/CBH/UEMG, professora do Curso de Mestrado em Educação – UNI- PAC/Barbacena. Coordenadora do Projeto “SOSP: uma investigação sobre a história da Educação e História da Psicologia em Minas Gerais” E-mail: reginacampos2000@yahoo.com.br 7 às dificuldades relativas à escolha da profissão. A escolha de uma ocupação ou profissão, bem como a utilização sistemática de procedimentos voltados para a orientação e seleção profissional so- mente ganham relevância significativa com a efetiva implantação do sistema capitalista e seus desdobra- mentos nas relações sociais de produção e de tra- balho. Pimenta (1981) registra, na década de 80, a existência da possibilidade de escolha da profissão pelo trabalhador: O trabalho, enquanto dimensão da existência, sempre existiu nas sociedades dos homens. Po- rém, não se pode dizer que o homem sempre pôde escolher de trabalhar naquilo que gostaria. No decorrer da história, os homens foram mais ou menos livres para escolher aquilo que gosta- riam de fazer. Houve períodos em que sequer a preocupação com escolha pôde surgir: nas socie- dades de castas, nas de estamentos e nas classes sociais rígidas. Nos dias atuais, pode-se (se não escolher), preocupar-se com a possibilidade de vir a escolher. Se existe a possibilidade de escolha, existe também a possibilidade de alguém ajudar alguém a escolher, isto é, de orientação. (PIMEN- TA,1981, p. 19-20). A presença e a possibilidade de escolha indica, segundo a autora, a flexibilização das classes e do mercado de trabalho que, com o desaparecimen- to das classes sociais rígidas, hoje, vai possibilitando maior ou menor liberdade ao trabalhador. Ao lon- go do tempo, entretanto, nem sempre foi assim. O significado de trabalho é historicamente construído e assume representações diferentes na medida em que novas concepções são adotadas, de acordo com interesses diversos de cada sociedade. II - Dos primórdios do trabalho até as Corporações de Ofício Nas sociedades tribais, o trabalho é uma atividade importante, visa a manutenção da vida e a garantia da sobrevivência. Geralmente, as atividades se diferen- ciam em função do sexo, da capacidade e habilidade individual de cada um. Conforme relata Bock (2001): A vida tribal, como pode ser verificada até hoje [...] não prevê e nem pressupõe atividades e ocupações distintas entre seus membros, haven- do apenas uma hierarquia no que se refere aos assuntos de guerra e aos cuidados com a saúde, funções que são exercidas por questão de bravu- ra e/ou idade avançada e que alcançam grande respeitabilidade entre os indivíduos da comunida- de. De fato, a caça é atribuição dos homens, pelo vigor físico e possibilidade de descolamentos ágeis que possuem, uma vez que as mulheres estão encarregadas dos cuidados dos filhos. Logicamen- te, deve existir entre eles os mais hábeis, mas que construíram tal habilidade pelo exercício e pela prática e que acabam tendo a função de ensinar aos outros a melhor forma do desempenho da- quele trabalho. [...]. Depreende-se daí que, nesta situação, não há possibilidade e nem a necessida- de de grandes escolhas no que se refere ao de- sempenho de funções tanto para a sobrevivência material ou não. (BOCK, 2001, p. 3). Nem sempre, entretanto, o trabalho está liga- do à sobrevivência. Se para as sociedades tribais, o trabalho tornava-se a garantia da sobrevivência, para os gregos antigos era considerado algo de menor im- portância, destinado aos escravos. A condição de ser trabalhador, na Grécia Antiga, era compulsória e he- reditária. Dependendo da origem familiar, cada um exercia determinado tipo de trabalho, geralmente, não cabendo escolhas. Não se pode deixar de mencionar, também, as implicações da visão religiosa acerca do trabalho. O Cristianismo em sua vertente católica, por exemplo, atribui ao trabalho um caráter penoso, através do qual pode-se atingir a expiação de pecados. Por outro lado, em sua vertente protestante e calvinista, como afirma Max Weber (1996) enfatiza as habilidades hu- manas (música, artes, comércio, desenvolvimento in- dustrial e outros) como dádivas divinas que, por essa razão devem ser incentivadas e aprimoradas. Ten- dência que favoreceu o comportamento econômico dos Estados Unidos e países da Europa incentivando o desenvolvimento do sistema capitalista. 60 modo de produção capitalista. Complementando os estudos sobre a gerência científica, Henry Ford lança mão de um novo concei- to de produção – a linha de montagem. Baseada na expectativa do consumo e da produção em massa, é introduzida, no chão da fábrica de automóveis, uma esteira rolante com o intuito de aumentar a produti- vidade e de reduzir o esforço humano no processo de montagem, diminuindo também os custos. Surge então o Fordismo, que segundo afirma Lisboa (2002) “apresenta uma separação radical entre concepção e execução, com base em um trabalho simplificado e fragmentado, de ciclos operatórios curtos, requeren- do pouca formação e pouco tempo de treinamento dos trabalhadores”. (LISBOA, 2002, p. 35), Braverman (1987) registra que, nesse contexto, são criadas as organizações e seus departamentos, responsáveis pelo controle dos trabalhadores, cuja ocupação está centrada na “seleção, adestramento, manipulação, pacificação e ajustamento da ‘mão-de- obra’ para adaptá-la aos processos de trabalho assim organizado”. (BRAVERMAN, 1987, p. 84). O aspecto da formação do trabalhador passa a se restringir somente aos saberes exclusivamente necessários para a execução de suas tarefas, intensa- mente fragmentadas pela linha de montagem, dentro de um tempo e num ritmo duramente controlados. De certa forma, podemos refletir que, tendo a ênfa- se voltada para o produto final do trabalho - o consu- mo em massa - continuam cerceadas as opções de escolha profissional do trabalhador. Constantes transformações mundiais influencia- ram as mudanças da economia baseada na agricultu- ra para a economia industrial do final do século XVIII. A migração de milhares de pessoas das zonas rurais para os centros urbanos em busca de emprego na indústria, tornou necessário o desenvolvimento das práticas e estratégias de evolução organizacional, bem como, criou novas formas de administrar os trabalhadores. Historicamente, podemos dizer que a escola substitui as corporações de ofício. Com o fim das corporações, coube ao Estado assumir a formação profissional da população e esta formação ocorrerá no ambiente escolar. No Brasil, por exemplo, con- forme nos apresenta Brandão (1999), o ano de 1906 representa um importante marco para a educação profissional brasileira, devido à posse do Presidente Afonso Pena, cuja plataforma de governo pretendia a criação de escolas de ensino técnico em todo o Brasil. Ao longo do tempo, as escolas técnicas tam- bém sofreram inúmeras transformações, em função de sua própria evolução, bem como das mudanças do capitalismo e da ciência. Hoje, estudos realizados na área da sociologia do trabalho4 apontam a escola como um espaço propí- cio para a efetivação de uma educação voltada para a formação do trabalhador. Esses estudos afirmam que, de alguma forma, a escola sempre está voltada à formação do trabalhador, conforme o desejo do mercado de trabalho, contribuindo assim, inexora- velmente, para a perpetuação do sistema. Ao abordar a questão da educação como formação humana, entretanto, Silva (2007) fundamentando-se no conceito de capitalismo tardio de Adorno que discute as novas formas de dominação econômica, política e cultural, reflete que: A formação humana, no contexto do capitalismo tardio passa a ser, cada vez mais, fruto dessa ins- trumentalização da razão que produz e busca dar legitimidade ao controle impetrado às diferentes práticas educativas. A educação adquire o status de formação administrada quando se demarcam finalidades predeterminadas com vistas a adequá- la a requisitos postos pela sociedade, e, no con- texto em questão, tais requisitos estão sempre associados à adaptação da formação e da escola a generalizáveis, e portanto, pretensas demandas de formação para o trabalho. O caráter prescri- tivo de antecipação dos desígnios da formação obedece ao critério de adequação da educação a imperativos postos pelas relações de troca, e im- puta uma forma coisificada às finalidades e práticas educativas ao impetrar-lhes a lógica da mercado- ria. (SILVA, 2007, p.3). 4Dentre tais teóricos destacam-se os reprodutivistas, como Bourdiue & Passeron, Althusser, Mariano Enguita e outros. 6 Esse caráter prescritivo, segundo a autora, limi- tador e alienante, do ponto de vista da autodetermi- nação do trabalhador, por outro lado, possibilita que essa formação seja administrada. Ao discutir as no- ções de competência, realiza a critica sobre a fluidez da formação profissional, apontando a necessidade de re-significação da noção de competência. IV - O surgimento das novas formas de orientação e formação para o trabalho A partir das grandes organizações industriais que surgiram ao final do século XIX, são criadas novas formas de organização do trabalho e, principalmente, novas formas de gerenciá-lo. Para manter a produção, diante de um mundo do trabalho complexo, tornou- se necessário repensar a formação do trabalhador e os processos de escolha e de orientação profissional. Diversos estudos surgiram e teorias administrativas foram criadas para fundamentar os procedimentos de seleção profissional adotados pelos departamen- tos de seleção de pessoas e, também, as políticas de educação e de orientação para o trabalho. O surgimento da orientação profissional, de modo sistematizado, ocorreu no início do século XX, por meio das idéias e do trabalho de Frank Parsons, que criou, nos Estados Unidos, o primeiro centro de orientação profissional. Conforme indica Pimenta (1981), “foi a partir de Parsons que os esforços de psicólogos de todos os países se voltaram para essa dupla tarefa: conhecer o indivíduo e conhecer o que as profissões exigiam dele”. (PIMENTA, 1981, p. 20) Parsons, através do seu “Guidance Movement”, criou um método que buscava conhecer o jovem estudante e o mundo do trabalho de forma a rea- lizar um ajuste do primeiro em relação ao emprego (Beck, 1977; Santos, 1985). Além de Parsons, outros pesquisadores da Psicologia do início do século XX, segundo Pimenta (1981), também criaram Centros de Aconselhamento e Orientação profissional como Binet, Claparède, Carl Rogers, Myra Y Lopes, dentre outros. Losch e Correia (2004), ao discutirem a flexibi- lização do trabalho e da gestão de pessoas limitadas pela racionalidade instrumental, explicam a evolução da gestão de pessoas a partir dos estudos de Marras. Estes autores, a partir de Marras, indicam como cinco as fases de desenvolvimento: Contábil, Legal, Tecni- cista, Administrativa e Estratégica. A fase contábil e pioneira surge antes de 1930 devido à preocupação com os custos da organização, nesta fase as pessoas eram vistas somente sob enfoque contábil, como se fossem máquinas. Na fase legal, no período entre 1930 e 1950, surge a figura de um profissional denominado “chefe de pessoal” que se ocupa das relações de trabalho segundo as leis trabalhistas. A terceira fase, a tecni- cista, surge após 1950, alavancanda pela utilização do conceito de Recursos Humanos (RH) no nível gerencial. A organização dos setores de Recursos Humanos nas indústrias passa a representar para as organizações e para os trabalhadores grande melho- ria nas relações. Tornam-se funções dos setores de Recursos Humanos: o treinamento, o recrutamento e a seleção; adoção de cargos e salários, promoção da higiene e segurança, garantia de benefícios aos tra- balhadores, entre outros. A fase administrativa, entre 1965 a 1985, tam- bém conhecida como sindicalista, devido à revolu- ção movida pelas bases trabalhadoras, é considerada um marco na história das organizações. Nessa fase, ocorre uma significativa mudança na responsabilidade do denominado gerente de RH, visando transformar os procedimentos burocráticos e operacionais em responsabilidades voltadas para os indivíduos e suas relações. A última fase, a estratégica, surge após 1985, jun- tamente com os primeiros “Programas de Planeja- mento Estratégico”. Está relacionada à elaboração do planejamento estratégico central das organizações. Nessa fase, percebe-se uma preocupação a longo prazo por parte das empresas com seus trabalhado- res, o profissional de RH passa a agir para além do ní- vel tático, atingindo outros níveis, como as diretorias, estratégicos dentro da organização. Machado (1994) reflete que a crescente infor- matização das atividades industriais e de serviços, o desenvolvimento da microeletrônica, da informática e da robótica, transformaram os ritmos e a intensidade 6 da produção, das relações sociais de produção, dos padrões organizacionais e das formas de gerencia- mento. Os discursos relativos às “qualidades totais” vêm mascarar a cultura do controle dentro das orga- nizações através da cooptação dos trabalhadores. Estudos realizados por Noronha & Ambiel (2006) analisam a produção acadêmica brasileira sobre a Orientação Profissional, a partir da década de 1950, na tentativa de compreender como eram prestados seus serviços e quais os instrumentos e procedimen- tos mais utilizados. Os autores percebem, a partir dos anos 90, um considerável aumento da produção de conhecimento na área. Registram, ainda, que no cenário nacional, na “década de 50, Barioni e Jorge (1952) já relatavam o uso de diversos instrumentos no Departamento Regional de São Paulo do SE- NAC, visando uma melhor adaptação dos menores que se formavam em seus cursos nos cargos ofe- recidos pelas empresas”. (NORONHA & AMBIEL, 2006, p. 76). V - Considerações Finais O surgimento das novas formas de orientação e formação para o trabalho, ao longo dos tempos, cumpriu as finalidades de responder às demandas da produção e assegurar a adaptação e adequação dos trabalhadores aos devidos cargos, de forma a cumprir os requisitos do mercado de trabalho. Con- ceitos como recursos humanos, gestão de pessoas, qualidade total, habilidades, interesses, qualificação e competências forjam, ao longo do tempo, discursos e práticas que revelam limitações e contradições no campo das relações sociais no trabalho. A discussão sobre as formas de seleção, treina- mento, orientação profissional, de ontem, abre es- paço para que novas práticas de formação humana no trabalho se estabeleçam, hoje, sem desconsiderar que as relações sociais no trabalho continuam a refle- tir tensões e embates próprios das organizações do contexto do sistema capitalista. 6 DOCUMENTAÇÃO PARA MATRÍCULA • Formulário de inscrição preenchido; • Diploma do Curso de Graduação (Cópia auten- ticada) ou Declaração de Conclusão de Curso; • Histórico Escolar do Curso de Graduação (cópia); • Documento de identidade (cópia); • CPF (cópia); • Título de Eleitor e comprovante da última vota- ção (cópia); • Certificado de Reservista (cópia); • Certidão de nascimento e/ou casamento (cópia); • Curriculum Vitae (resumido); • Uma foto 3x4; • Carta de intenção. SELEÇÃO DOS CANDIDATOS - Análise: 1.1 - do Curriculum Vitae; 1.2 - do histórico escolar do Curso de Graduação; 1.3 - da carta de intenção do candidato.  - Entrevista (quando necessário). 66 ARTE EDUCAÇÃO Objetivos: • Capacitar profissionais para atuar, inovar e orientar o Ensino das Artes nas Instituições de Ensino Superior. • Identificar a Arte como um instrumento de trans missão de valores históricos e culturais, na forma ção individual e social do cidadão. • Analisar criticamente o ensino das Artes, a partir de conceitos e fundamentos aplicados à Educação, face à realidade social, política e cultural brasileira. • Oferecer subsídios para a reflexão e interpretação do papel do Arte Educador na Educação Básica. Público Alvo: Profissionais graduados em nível superior com interesse na área. Horário: Sábados: de 08h às 16h 30 min Duração: 20 meses Carga Horária: 400h/a PSICOPEDAGOGIA CLÍNICA E INSTITUCIONAL Objetivos: • Possibilitar a fundamentação teórico-prática de diferentes concepções de Psicopedagogia. • Desenvolver prática psicopedagógica, mediante estágio supervisionado em clínica e instituições educacionais. • Estimular o intercâmbio com pesquisas nas áreas da Psicopedagogia. • Capacitar o profissional de Psicopedagogia para dar o suporte necessário aos processos de apren dizagem e ao desenvolvimento do aluno. Público Alvo: Profissionais graduados em nível superior com interesse na área. Horário: Segundas e quartas, terças e quintas: 18h 30 min às 22h 40 min. Sextas e sábados: quinzenalmente. Sextas: 18h 30 min às 22h40 min Sábados: 8h às 17h Duração: 19 meses Carga Horária: 540 h/a incluindo estágio supervisionado. EDUCAÇÃO AMBIENTAL Objetivos: • Capacitar para implementação da Educação Ambiental em empresas, escolas, indústrias e ongs. • Desenvolver competências com trabalhos inter disciplinares em projetos de Educação Ambiental. • Capacitar professores para o Ensino Superior na área pertinente. Público Alvo: Profissionais graduados em nível superior com interesse na área. Horário: Segundas e quartas: de 18h 30 min às 22h 10 min, com enriquecimento curricular em sábados previamente agendados. Duração: 13 meses Carga Horária: 390 h/a EDUCAÇÃO, COMUNICAÇÃO E TECNOLOGIA Objetivos: •Promover a formação de educadores para atuar no campo da educação, comunicação e tec nologia. Possibilitar a discussão da relação entre processos educativos, processos comunicacionais e mediação tecnológica. Público Alvo: Profissionais graduados em nível superior com interesse na área. Horário: Terças e quintas: de 19h às 22h 40 min Duração: 14 meses Carga Horária: 390 h/a. ESPECIALIZAÇÃO EM PRÁTICAS EDUCATIVAS; INCLUSÃO PARA A DIVERSIDADE Objetivos: • Possibilitar reflexão face a diversidade cultural em espaços como a sala de aula, consultórios clínicos e programas sociais públicos e privados diversos. • Contribuir para a formação de profissionais para atuar com as várias dimensões dos sujeitos inseri dos na cultura. • Promover o acesso aos novos conhecimentos e CURSOS DE PÓS-GRADUAÇÃO 67 produções sobre os temas da contemporaneidade que lhes colocam desafios à sua prática profissional. Público Alvo: Profissionais graduados em nível superior e interessados na área. Horário: Sábados: de 08h às 17h. Duração: 15 meses Carga Horária: 406 h/a. EDUCAÇÃO INFANTIL Objetivos: • Contribuir, num enfoque interdisciplinar e transdis- ciplinar, para a qualificação e formação continuada de profissionais para a Educação Infantil. • Promover o aprofundamento, a ampliação e a atualização de conhecimentos teórico-conceituais específicos relativos à Educação Infantil, com incorporação e apropriação crítica dos mesmos. • Incentivar a reflexão e a crítica na busca da cons- trução de práticas pedagógicas eficientes e de qualidade na Educação Infantil, tendo-se como referência as bases teóricas que as fundamentam, os contextos específicos, bem como as possibilida- des cognitivas, biológicas, neurológicas, emocio nais e psicológicas das crianças pequenas. • Promover a criação de espaços estimuladores de debates e reflexões consistentes sobre a atitude do “aprender a conhecer”, “aprender a fazer”, “aprender a viver em comum” e “aprender a ser” (UNESCO/1996-ASA) no cotidiano dos processos educativos desenvolvidos nas institui ções de Educação Infantil. Público Alvo: Profissionais graduados em nível superior com Interesse na área. Horário: Segundas e quartas-feiras: de 19h às 22h 40 min Duração: 14 meses Carga Horária: 440 h/a. EDUCAÇÃO MATEMÁTICA Objetivos: • Subsidiar aquisição de conhecimentos pedagó- gicos e matemáticos possibilitando condições para reflexão sobre a ação educativa que exercem. • Promover a qualificação de docentes para o exer- cício do magistério superior na área de Educação Matemática. • Possibilitar a elaboração e a execução de projetos de ensino e pesquisa em Educação Matemática que impliquem na renovação da prática docente. • Identificar os principais métodos matemáticos, estatísticos e computacionais utilizados em Educação Matemática, com ênfase na utilização dos recursos multimídia para o ensino. • Valorizar o Magistério, resgatando a melhoria da qualidade do ensino utilizando os recursos da Educação a Distância, aliados à mobilização do saber tácito do professor e à reflexão crítica de sua prática pedagógica. Público Alvo: Profissionais graduados em nível superior, professores de Matemática da escola Básica e interessados na área. Horário: Sextas-feiras: de 18h 30 min às 22h 10min e sábados: de 08h 30 min às 16h 40 min Duração: 14 meses Carga Horária: 424 h/a. ANÁLISE BIOENERGÉTICA Objetivos: • Possibilitar aos profissionais agregarem o conhe- cimento da Análise Bioenergética como forma de enriquecimento aos respectivos campos de atuação. • Promover a prática de aspectos e conceitos da Análise Bioenergética nas várias situações da clínica médica, social e psicológica na instituição escolar, empresarial, familiar, religiosa e outros. • Oportunizar o desenvolvimento de “grupos de movimento” com exercícios de bioenergética para adultos e crianças, que possibilite compreen- der os aspectos da expressividade humana, atra- vés da linguagem corporal e gestual. • Capacitar docentes para o Ensino Superior com a apreensão e apropriação de paradigmas metodo- lógicos. • Ampliar o conhecimento do comportamento humano, através do estudo e da interdependência biopsicosocial. • Propiciar oportunidades para apreensão e apro- priação de instrumental necessário às descobertas na leitura corporal de si mesmo e do outro, corre- lacionando-as com as patologias do caráter.
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