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Túneis no espaço-tempo, Notas de estudo de Matemática

Túneis no espaço-tempo

Tipologia: Notas de estudo

Antes de 2010

Compartilhado em 13/08/2009

pedro-miranda-9
pedro-miranda-9 🇧🇷

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Baixe Túneis no espaço-tempo e outras Notas de estudo em PDF para Matemática, somente na Docsity! 4 Gazeta de Física ar ti go s “Wormholes”: Túneis no Espaço-Tempo Francisco Lobo * Paulo Crawford * Existem soluções das equações de Einstein que descrevem túneis ou wormholes transitáveis no espaço- -tempo. Poder-se-á utilizar uma geometria destas para efectuar viagens interstelares rápidas? Esta questão tem sido avançada nos últimos tempos. No entanto, a matéria que constitui um tal wormhole (transitável) tem densidade de energia negativa, o que viola algumas condições de energia fundamentais. Por isso, ela se designa por matéria exótica. Apesar desta e doutras dificuldades, não existe uma prova irrefutável da inexistência de wormholes, pelo que nada nos impede de os considerar possíveis. Mostramos aqui como construir wormholes transitáveis e analisamos as condições necessárias para uma viagem confortável de seres humanos através deles. Trata-se do desenvolvimento da ideia de Carl Sagan no seu livro Contacto, que deu origem ao filme com o mesmo nome. 5Gazeta de Física wormholes: túneis no espaço-tempo Introdução É frequente os escritores de ficção científica considerarem buracos negros para viagens interestelares rápidas. Imaginam viajantes intrépidos lançando-se num buraco negro e encontrando-se subitamente numa região distante do universo. Para ilustrar tais buracos recorre-se normalmente a soluções esfericamente simétricas das equações de Einstein, por serem as mais fáceis de tratar. No entanto, podem levantar-se objecções muito sérias às viagens interestelares através de buracos negros esfericamente simétricos. Em primeiro lugar, no caso mais simples, conhecido por buraco negro de Schwarzschild, as forças de maré na vizinhança do buraco podem produzir acelerações tão grandes que esmagariam qualquer viajante, comprimindo-o transversalmente e esticando-o na direcção longitudinal. Em segundo lugar, a fronteira do buraco, conhecida por horizonte de acontecimentos, pode ser considerada uma “membrana” com um só sentido, através da qual os objectos entram mas não podem sair. Logo, uma viagem nos dois sentidos é estritamente proibida a não ser que o buraco negro tenha carga eléctrica, sendo então a sua geometria dada pela solução de Reissner-Nordstrom, e o objecto de saída seja um buraco branco. Os buracos brancos possuem anti-horizontes, que são superfícies instáveis face a pequenas perturbações e das quais só podem emergir objectos ou luz mas nada pode entrar. Como resultado dessa instabilidade, o anti-horizonte pode converter-se em horizonte, num intervalo de tempo extremamente pequeno. Esta conversão, que ocorre pouco depois da criação do anti-horizonte, impede na prática uma travessia nos dois sentidos. Uma outra solução das equações de Einstein, sem simetria esférica mas com simetria em torno de um eixo, é a solução de Kerr, que descreve buracos negros em rotação. Esta geometria possui no seu interior túneis que ligam regiões assimptoticamente planas do espaço-tempo. Se aceitarmos a formação dos túneis de Kerr, estes não existiriam por muito tempo devido à presença de horizontes de Cauchy: superfícies nulas (i.e., luminosas) para além das quais se quebra a previsibilidade. Estes horizontes de Cauchy também são instáveis relativamente a pequenas perturbações. Um pacote de ondas luminosas incidente sofreria um blue-shift, com um aumento exponencial da energia ao aproximar-se do horizonte de Cauchy, dando origem a campos gravitacionais intensos que fechariam os túneis, convertendo-os possivelmente em singularidades físicas. Logo, o interior de um buraco negro de Kerr não deve possuir túneis a ligar regiões diferentes do espaço-tempo, mas singularidades que também esmagariam qualquer viajante. Se fosse possível a formação e a estabilização dos túneis de Kerr, estes possuiriam singularidades em forma de anel. Se a física fosse puramente clássica e o buraco negro suficientemente grande e com rotação elevada, um viajante facilmente atravessaria a singularidade. No entanto, a teoria quântica de campos prevê que as singularidades quebram o estado de vácuo (quântico), irradiando um fluxo intenso de partículas de altas energias que certamente mataria qualquer viajante. Os wormholes (tradução à letra: buracos de verme) oferecem um mecanismo para viagens interstelares rápidas. A Fig. 1 apresenta um diagrama de um wormhole que liga dois universos diferentes; a Fig. 2 apresenta duas regiões distantes do mesmo universo. Ambos os wormholes são descritos pela mesma solução das equações de Einstein, a solução de Schwarzschild, diferindo apenas nas suas topologias. Saliente-se que estas equações não impõem restrições à topologia das soluções. Mas também existe uma série de objecções às viagens interestelares utilizando os wormholes de Schwarzschild. As forças de maré de origem gravitacional na garganta destes wormholes têm a mesma ordem de grandeza que as do horizonte do buraco negro de Schwarzschild. Fig. 1 Diagrama de um wormhole que liga dois universos diferentes. Fig. 2 Diagrama de um wormhole que liga duas regiões distintas de um espaço-tempo. Forças de maré e tempo de travessia no wormhole Imaginemos uma viagem através do wormhole, numa direcção radial, em que o viajante parte do repouso de uma estação espacial no universo inferior, em l=-l1, e termina numa estação espacial no universo superior, em l=+l2. Designemos por v(r) a velocidade radial do viajante, medida por um observador estático em r e seja , com )=v/c. O valor de v(r) é dado pela derivada da distância própria percorrida pelo viajante, dl, em ordem ao tempo próprio medido pelo observador estático, d(s=e!dt. Temos então as equações: em que d( é o tempo próprio medido pelo viajante, que se relaciona com d(s por uma transformação de Lorentz d(=d(s/*. O sinal - refere-se à primeira parte da viagem (no universo inferior); o sinal + refere-se à segunda parte da viagem (no universo superior). Para que seres humanos possam realizar comodamente uma viagem através de um wormhole impomos três condições: (i) A viagem deve demorar pouco tempo, digamos menos de um ano, quer para o viajante quer para os observadores nas estações -l1 e +l2. (9) (ii) A aceleração sentida pelo viajante não deve exceder a aceleração gravítica terrestre g+ . Localmente, podemos introduzir uma outra base ortonormada no referencial próprio do viajante, , definida em função da base ortonormada dos observadores estáticos, , pela transformação de Lorentz : é o quadrivector velocidade do viajante. O quadri- vector aceleração do viajante é . Logo, os dois quadrivectores são ortogonais entre si e, portanto, . Como o viajante se move radialmente, a sua aceleração tridimensional tem apenas a componente radial, i.e., e , onde a é a intensidade da aceleração. 8 Gazeta de Física Para que o viajante sinta uma aceleração menor ou igual à aceleração gravítica terrestre exige-se que (10) (iii) As acelerações de maré, , entre as várias partes do corpo do viajante também não deverão exceder a aceleração gravítica terrestre g+ . Designemos por a separação vectorial entre duas partes do corpo do viajante (por exemplo, a separação entre a cabeça e os pés). é puramente espacial no referencial próprio do viajante, i.e., . A aceleração de maré entre duas partes do corpo do viajante é dada pela equação do desvio geodésico: , onde são as componentes do tensor curvatura de Riemann. Com base nesta equação é ainda possível impôr condições na velocidade, v, do viajante ao atravessar o wormhole e na função de redshift !, mas evitámos apresentá-las aqui. Restrições impostas à tensão e à densidade de energia na garganta do wormhole As restrições impostas à função de forma, b(r), do wormhole implicam que, através das equações de Einstein (4)-(6), surjam restrições na densidade de massa-energia, ', na tensão radial, (, e na pressão lateral, p, que geram a curvatura do espaço-tempo. As restrições mais severas ocorrem na garganta do wormhole. A tensão radial na garganta é: Para analisar as tensões na garganta e na sua vizinhança, definimos a seguinte função sem dimensões, utilizando as equações de campo (4) e (5) e substituindo as funções ( e ' pelas funções b e ! : (11) Na garganta ou nas suas vizinhanças: . A condição (0 > '0c2, estipulando uma tensão radial na garganta superior à densidade de massa-energia, introduz uma dificuldade na construção de um wormhole. Como a matéria usual não goza dessa propriedade, essa matéria designa-se por matéria exótica. A natureza exótica dessa matéria, está associada às medições efectuadas por observadores que se movam através da garganta com uma velocidade radial próxima da velocidade da luz, i.e., * >>1. Qualquer desses observadores medirá uma densidade de massa-energia negativa: 'c2<0 , pois wormholes: túneis no espaço-tempo 9Gazeta de Física wormholes: túneis no espaço-tempo Um wormhole é um atalho hipotético que liga duas regiões de um espaço-tempo. Contém duas entradas que designamos por bocas, ligadas por um túnel, cuja circunferência mínima chamamos a garganta. Pode-se visualizar um wormhole através de um diagrama de imersão, que idealiza um espaço-tempo com apenas duas dimensões espaciais. Neste diagrama, a garganta do wormhole é representada por uma circunferência, mas no espaço-tempo tetradimensional seria uma esfera. Os wormholes foram descobertos matematicamente como soluções das equações de campo por Flamm em 1916, poucos meses depois de estas serem formuladas por Einstein. Em 1935, Einstein e Rosen, numa tentativa de construir um modelo geométrico de uma partícula elementar, encontraram soluções que representavam o espaço físico por dois planos idênticos, em que a partícula era representada por uma ponte que ligava os dois planos. Esta solução posteriormente ficou conhecida por “ponte de Einstein-Rosen”. Os wormholes foram alvo de estudo exaustivo na década de 50 pelo físico norte-americano John Wheeler e seus colaboradores. No entanto, nenhuma das soluções a que chegaram representa um wormhole transitável no espaço- -tempo. As soluções encontradas eram as de um wormhole dinâmico, que, uma vez criado, se expandia até um valor máximo da gargan-ta, contraindo-se novamente até a garganta desaparecer. A expansão e a contracção do wormhole é tão rápida que impede a travessia de qualquer viajante ou mesmo de um raio luminoso. Os físicos têm sido bastante cépticos em relação aos wormholes. Em finais da década de 80 deu-se um renas- cimento, em parte devido a um desafio, lançado por Carl Sagan a Kip Thorne, sobre a possibilidade real de viagens interstelares rápidas, ideia utilizada no livro Contacto (saído na Gradiva). Foram encontradas soluções das equa- ções de campo de Einstein que apresentavam algumas caracte- rísticas peculiares [1]. Nomeadamente, a matéria que constitui o wormhole tem uma densidade de energia negativa, quando observada por um via- jante que atravessa o wormhole a uma velocidade elevada. Diz-se, por vezes, que esta matéria é exótica, porque viola algumas condições de energia que são fundamentais para os teoremas clássicos sobre singularidades do espaço-tempo. Aparentemente, as leis da física clássica proíbem as densi- dades de energia negativas, mas a teoria quântica de campo prevê a sua existência, violando por isso algumas destas condições de energia. Este assunto continua a ser alvo de intensa investigação. Espera-se que uma eventual teoria da gravitação quântica venha a resolver o problema. Se é certo que os buracos negros parecem ser uma conse- quência inevitável da evolução estelar, já não se pode afirmar que exista um mecanismo natural para a criação de wormholes. Pergunta-se: será que uma civilização infinitamente avançada poderia construir um wormhole para realizar viagens interstelares? Será que as leis da física permitem a construção de wormholes e a mudança topológica associada? Atendendo às flutuações gravitacio- nais do vácuo, predomina uma espuma quântica com uma topologia multiplamente conexa à escala de Planck. Podemos imaginar uma civilização avançadíssima a extrair um wormhole da espuma quântica e a expandi-lo até dimensões clássicas. Thomas Roman oferece outra perspectiva interessante [5]. Considera a formação de um wormhole no big-bang através de uma flutuação quântica que se expandiu exponencialmente durante a inflação do universo, atingindo dimensões clássicas. Mesmo os wormhole não-estáticos e sem simetria esférica são constituídos por matéria cuja densidade de energia é negativa para alguns observadores. Uma análise qualitativa é a seguinte: um feixe luminoso (formado por geodésicas nulas) que entra numa boca e emerge na outra tem uma secção eficaz que inicialmente diminui e depois de atravessar a garganta aumenta. A conversão do decréscimo para o acréscimo da secção recta eficaz apenas pode ser produzida pela repulsão gravitacional da matéria do wormhole, o que corresponde à existência de densidades de massa-energia (ou pressões) negativas. Por outro lado, a restrição ( >'c2 viola algumas condições de energia, nomeadamente as condições de energia fraca, forte e dominante que são fundamentais para demonstrar alguns dos teoremas sobre a existência de singularidades. Construção e estabilidade de um wormhole transitável Seria extremamente desconfortável para um viajante interagir com matéria sujeita a tensões da ordem de (o,5×1040 N/m2(10 m/b0)2. Existem várias maneiras de proteger o viajante. Morris e Thorne sugerem que poderíamos colocar um tubo de vácuo através do wormhole, com um diâmetro muito menor do que o raio da garganta, e utilizar tensões nas paredes do tubo para evitar o acoplamento da matéria exótica com o viajante. 10 Gazeta de Física Essa possibilidade quebra a simetria esférica do wormhole, e obriga a obter soluções das equações de Einstein para um wormhole não-esférico. De facto, Matt Visser [3] aplicou o formalismo das condições de junção e descobriu soluções de wormholes cúbicos e poliédricos. Essas soluções têm a vantagem de um viajante não encontrar matéria exótica na travessia. Morris e Thorne ainda sugerem que a matéria exótica que constitui o wormhole (apesar das suas tensões e densidade de energia enormes) acopla muito fracamente com a matéria normal, tal como acontece com os neutrinos e as ondas gravitacionais. Na ausência de uma compreensão mais completa da matéria exótica, é impossível estabelecer uma análise da estabilidade do wormhole face a pequenas ou grandes perturbações, tal como na travessia de uma nave espacial. Mas se o wormhole apresenta instabilidades naturais, uma civilização avançada poderia monitorizar a sua estrutura e aplicar forças de feedback de modo a estabilizá-lo (nova sugestão de Morris e Thorne). A construção de um wormhole é muito problemática, pois implica mudanças da topologia do espaço-tempo (Fig. 6). Na relatividade geral as mudanças topológicas são provavelmente acompanhadas de singularidades do espaço-tempo, as quais só poderão ser compreendidas e talvez evitadas no quadro de uma teoria quântica da gravitação. Fig. 6 A mudança da topologia do espaço-tempo na construção de um wormhole. (a) É criada uma deformação na curvatura do espaço-tempo. (b) Efectua-se uma dobra ligeira no hiperespaço. (c) O tecido do espaço-tempo é rompido na deformação e na dobra, e, em seguida, efectua-se uma colagem. O processo de rompimento produz uma singularidade, governada pelas leis da gravitação quântica. Aliás, existem fortes indicações de que os efeitos da gravitação quântica predominam à escala de Planck, , produzindo uma espuma com uma estrutura multiplamente conexa do espaço- -tempo. Poderíamos imaginar uma civilização avançadíssima a extrair um wormhole transitável dessa espuma quântica, expandindo-o até ele atingir dimensões macroscópicas. Thomas Roman oferece uma perspectiva mais realista [5]. Suponhamos que um wormhole transitável se poderia for- mar no universo recém-nascido, através de uma flutuação quântica. Será possível, num cenário inflacionário do universo, converter um wormhole quântico num wormhole com dimensões clássicas? Qualquer esperança de construir um wormhole depende da futura descoberta de um campo exótico, ou seja, de um estado quântico cuja tensão exceda a densidade de energia à escala macroscópica. Mas mesmo que um tal campo exótico existisse, há outras dificuldades, nomeada- mente: a mecânica quântica poderá proibir uma mudança topológica do espaço-tempo, ou os wormholes serem alta- mente instáveis, e a matéria exótica acoplar fortemente com a matéria normal, o que impediria a travessia. Outra consideração assombrosa acerca dos wormholes é a sua possível utilização como máquinas do tempo, embora tal viole aparentemente a causalidade… Em conclusão: apesar das dificuldades apresentadas, não existe uma prova irrefutável da inexistência de wormholes como soluções das equações de Einstein da gravitação. Portanto, não nos resta senão admitir wormholes transitáveis no espaço-tempo como uma possibilidade teórica e continuar a investigar a matéria exótica e todas as outras consequências incómodas associadas aos wormholes. * Departamento de Física e Centro de Física Nuclear da Universidade de Lisboa Av. Prof. Gama Pinto, 2 1699 Lisboa crawford@cosmo.cii.fc.ul.pt Referências: [1] Morris, M. S. e Thorne, K. S., “Wormholes in spacetime and their use for interstellar travel: A tool for teaching general relativity”, American Journal of Physics 56 (1988) 395-411. [2] Crawford, P. e Simões, A. I., “Tempo e Relatividade I e II”, Gazeta de Física, Vol 9 (1986), 36-40 e 49-56. [3] Visser, M., “Lorentzian wormholes: From Einstein to Hawking”, AIP Press, New York, 1995. [4] Thorne, K. S., “Black holes and time warps: Einstein’s outrageous legacy”, Papermac, New York, 1995. [5] Roman, T. A., “Inflating Lorentzian wormholes”, Physical Review D 47 (1993), 1370-1379. Créditos das Figuras: Figs. 1 e 2: Ref. [1]. Figs. 3, 4, 5 e 6: Ref. [4]. wormholes: túneis no espaço-tempo
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