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Guias e Dicas
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crescimento desenvolvimento, Notas de estudo de Fisioterapia

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Tipologia: Notas de estudo

Antes de 2010

Compartilhado em 08/10/2007

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caroline-e-rodrigues-jordao-6 🇧🇷

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Baixe crescimento desenvolvimento e outras Notas de estudo em PDF para Fisioterapia, somente na Docsity! Ministério da Saúde Secretaria de Políticas de Saúde Saúde da Criança Acompanhamento do crescimento e desenvolvimento infantil Série Cadernos de Atenção Básica; n. LI Série A. Normas e Manuais Técnicos, n.173 Brasilia = DF 2002 2 PARTE 1 – Crescimento © 2002. Ministério da Saúde É permitida a reprodução parcial ou total desta obra, desde que citada a fonte. Série Cadernos de Atenção Básica; n. 11 – DAB Série A. Normas e Manuais Técnicos – MS Tiragem: 50.000 exemplares Barjas Negri Ministro de Estado da Saúde Otavio Mercadante Secretário Executivo Cláudio Duarte da Fonseca Secretário de Políticas de Saúde Heloiza Machado de Souza Departamento de Atenção Básica Ana Goretti Kalume Maranhão Área Técnica de Saúde da Criança Denise Costa Coitinho Área Técnica de Alimentação e Nutrição Elaboração, distribuição e informações: MINISTÉRIO DA SAÚDE Secretaria de Políticas de Saúde Departamento de Atenção Básica Área Técnica de Saúde da Criança Área Técnica de Alimentação e Nutrição Esplanada dos Ministérios, edifício sede, bloco G, sala 636 CEP 70058-900, Brasília – DF Tel.: (61) 315 2866 / 224 4561 Fax: (61) 315 2038 Elaboração: Denise Costa Coitinho, Josenilda de Araújo Caldeira Brant, Zuleica Portela Albuquerque Colaboradores: Alfredo Nestor Jerusalinsky, Cláudio Leone, Cora Luiza Araújo Post, Esther Lemos Zaborowski, Flávia Gomes Dutra, Graciene Silveira, Maria Cristina Machado Kupfer, Maria Eugênia Pesaro, Maria Helena D´Aquino Benício, Paulina Schmidtbauer Barbosa Rocha Projeto gráfico, editoração e ilustrações: Eduardo Trindade, Carlos Neri, Rodrigo Mafra Apoio técnico: OPAS/OMS Editorado com recursos do Projeto PNUD BRA 98/006 – Promoção da Saúde Impresso no Brasil / Printed in Brazil Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Políticas de Saúde. Departamento de Atenção Básica. Saúde da criança: acompanhamento do crescimento e desenvolvimento infantil / Ministério da Saúde. Secretaria de Políticas de Saúde. – Brasília: Ministério da Saúde, 2002. 100 p.: il. – (Série Cadernos de Atenção Básica; n. 11) – (Série A. Normas e Manuais Técnicos) ISBN 85-334-0509-X 1. Saúde infantil. 2. Desenvolvimento infan til 1. Brasil. Ministério da Saúde. II. Brasil. Secretaria de Políticas de Saúde. Departamento de Atenção Básica. III. Título. IV. Série. NLM WA 320 Catalogação na fonte – Editora MS FICHA CATALOGRÁFICA Fi] PARTE | — Crescimento HOMENAGEM À JÔ 6 PARTE 1 – Crescimento 7PARTE 1 – Crescimento PARTE 1 – Crescimento O processo biológico do crescimento – fundamentos de importância para a prática clínica, 11 Fatores que influenciam o crescimento, 11 O crescimento intra-uterino e o peso ao nascer, 17 O crescimento pós-natal, 20 A Proposta de Acompanhamento do crescimento: o caminho da saúde, 27 O acompanhamento do crescimento: estruturando a atenção à saúde da criança, 27 Ações no nível da atenção básica, 28 Ações no nível da média complexidade, 34 Referências bibliográficas, 37 Anexos, 39 Metodologia de avaliação do crescimento, 39 Padronização e controle de qualidade de medidas antropométricas, 48 Instrumentos e técnicas de medição antropométrica, 54 Quadro do perímetro cefálico de meninos e meninas de 0 a 2 anos em centímetros, 59 Curva de crescimento Peso/Idade de meninos e meninas de 0 a 6 anos, 60 Curvas de crescimento Estatura/Idade de meninos e meninas de 0 a 6 anos, 62 Curvas de crescimento Peso/Estatura de meninos e meninas de 0 a 6 anos, 64 Dietas hipercalóricas e hiperprotéicas propostas pelo AIDPI, 66 Sinais clínicos dos casos graves de desnutrição, 69 Sumário 10 PARTE 1 – Crescimento 11PARTE 1 – Crescimento O processo biológico do crescimento: fundamentos de importância para a prática clínica De um modo geral, considera-se o crescimento como aumento do tamanho corporal e, portanto, ele cessa com o término do aumento em altura (crescimento linear). De um modo mais amplo, pode-se dizer que o crescimento do ser humano é um processo dinâmico e contínuo que ocorre desde a concepção até o final da vida, conside- rando-se os fenômenos de substituição e regeneração de tecidos e órgãos. É considerado como um dos melhores indicadores de saúde da criança, em razão de sua estreita dependência de fatores ambien- tais, tais como alimentação, ocorrência de doenças, cuidados gerais e de higiene, condições de habitação e saneamento básico, acesso aos serviços de saúde, refletindo assim, as condições de vida da crian- ça, no passado e no presente. O planejamento familiar, a realização de uma adequada assistência pré-natal, ao parto e ao puerpério, as medidas de promoção, proteção e recuperação da saúde nos primeiros anos de vida são condições cruciais para que o crescimento infantil se processe de forma adequada. Fatores que influenciam o crescimento O crescimento é um processo biológico, de multiplicação e aumen- to do tamanho celular, expresso pelo aumento do tamanho corporal. Todo indivíduo nasce com um potencial genético de crescimento, que poderá ou não ser atingido, dependendo das condições de vida a que esteja submetido desde a concepção até a idade adulta. Portanto, pode- se dizer que o crescimento sofre influências de fatores intrínsecos (ge- néticos, metabólicos e malformações, muitas vezes correlacionados, ou seja, podem ser geneticamente determinadas) e de fatores extrínsecos, dentre os quais destacam-se a alimentação, a saúde, a higiene, a habitação e os cuidados gerais com a criança (Ref. 31). Como conseqüência, as condições em que ocorre o cresci- mento, em cada momento da vida da criança, incluindo o perío- do intra-uterino, determinam as suas possibilidades de atingir ou não seu potencial máximo de crescimento, dotado por sua carga genética. 12 PARTE 1 – Crescimento Com relação ao crescimento linear (estatura), pode-se dizer que a altura final do indíviduo é o resultado da interação entre sua carga genética e os fatores do meio ambiente que permitirão a maior ou menor expressão do seu potencial genético. Nas crianças menores de cinco anos, a influência dos fatores ambi- entais é muito mais importante do que a dos fatores genéticos para expressão de seu potencial de crescimento. Os fatores genéticos apre- sentam a sua influência marcada na criança maior, no adolescente e no jovem (Ref. 17). A herança genética A herança genética é a propriedade dos seres vivos de transmitirem suas características aos descendentes. Do ponto de vista do crescimento, a herança genética recebi- da do pai e da mãe estabelece um potencial ou alvo que pode ser atingido. Poucas funções biológicas dependem tanto do potencial genético como o crescimento. No entanto, a qualquer momento, desde a con- cepção e especialmente nas crianças pequenas, fatores ambientais podem perturbar o ritmo e a qualidade deste processo. O alcance dessa meta biológica depende, na verdade, das condições do ambiente onde se dá o crescimento da criança sendo sua influ- ência marcante. Existem grandes variações individuais no potencial de crescimento dado pela herança genética. Observa-se, por exemplo, que a variação de altura da população adulta, saudável, do sexo masculino é cerca de 20 cm, enquanto que esta mesma variação entre irmãos é de 16 cm e entre gêmeos homozigóticos é de 1,6 cm (Ref. 28). A análise do banco de dados da Pesquisa Nacional sobre Saúde e Nutrição (PNSN, 1989), referente à uma amostra de jovens de 20 anos, saudáveis e de classe média alta, todos com uma grande proba- bilidade de terem atingido seu alvo genético de crescimento, mostra uma taxa de variação nas suas alturas, com os mais baixinhos, poden- do apresentar médias em torno de 1,64 cm, enquanto os mais altos poderão ter 1,90 cm ou mais. 15PARTE 1 – Crescimento A influência do meio ambiente A influência do meio ambiente ocorre desde a vida intra-uterina, quando o crescimento é limitado a partir de um certo momento pelo espaço da cavidade intra-uterina, até a idade adulta. Habicht, em 1974 (Ref. 17), demonstrou que crianças menores de 5 anos de diversas nacionalidades, crescem num ritmo semelhante (a exce- ção dos orientais e algumas tribos africanas), desde que submetidas a boas condições de vida. O mesmo não acontece com crianças de mesma nacio- nalidade, porém sob condições socioeconômicas diferentes (as de nível alto crescem de modo similar às crianças de países desenvolvidos, enquanto as de baixo nível socioeconômico crescem em ritmo mais lento). Cada vez mais, existem evidências sobre a uniformidade genética da espécie humana e o peso crescente de outros condicionantes, favo- recendo ou impedindo a expressão do potencial genético. Também se comprovou que filhos de imigrantes japoneses que nas- ciam e viviam nos Estados Unidos eram mais altos que os seus patrícios que permaneciam vivendo no Japão. Atualmente, com o desenvolvi- mento alcançado pelo Japão, essa diferença desapareceu, evidencian- 16 PARTE 1 – Crescimento do assim a grande influência que os fatores ambientais exercem sobre a tendência secular de crescimento de grupos populacionais. É importante salientar que quanto mais jovem a criança, mais de- pendente e vulnerável é em relação ao ambiente. Isso faz com que condições favoráveis ao crescimento sejam função, não apenas dos recursos materiais e institucionais com que a criança pode contar (ali- mentação, moradia, saneamento, serviços de saúde, creches e pré- escolas), mas também dos cuidados gerais, como o tempo, a atenção, o afeto que a mãe, a família e a sociedade como um todo lhe dedicam. Tempo, atenção e afeto definem a qualidade do cuidado infantil e, quan- do maximizados, permitem a otimização dos recursos materiais e institucionais de que a criança dispõe. Num estudo com 300 pares de gêmeos homozigotos criados sepa- rados, e em condições socioeconômicas bem diferentes, observou-se uma variação média de 6 cm de altura quando adultos, sendo que os indivíduos criados em ambientes carentes e com acesso limitado às ações de saúde foram sempre mais baixos que seus irmãos (Ref. 28). A figura 2 abaixo ilustra a diferença na altura média de meninos com 5 anos de idade de países desenvolvidos e em desenvolvimento e de estratos socioeconômicos altos e baixos, onde se pode ver a influência das condições de vida (expressas aqui pelo estrato socioeconômico) sobre o crescimento dessas crianças. Figura 2 (Ref. 18). Um bom exemplo da influência do meio ambiente sobre o crescimento é o de gêmeos homozigóticos (portanto com a mesma herança e potencial genético de crescimento): quando criados separadamente em meios diferentes, o que cresceu em meio favóravel tende a atingir sua meta de crescimento determinada pelo seu potencial genético enquanto o que foi criado em meio desfavorável, cresce aquém do seu potencial genético. 17PARTE 1 – Crescimento A figura 3 por sua vez compara algumas medidas antropométricas de crianças “ricas” (famílias com renda de 10 ou mais salários mínimos) e crianças “pobres” (residentes no bairro de mais baixo nível socioeconômico de Pelotas, na época da coleta de dados), com crianças norte-americanas do National Health and Nutrition Examination Survey II (Ref. 26). O crescimento intra-uterino e o peso ao nascer O período de crescimento intra-uterino é de vital importância para o ser humano. É quando se observa maior velocidade de crescimento. Uma idéia dessa velocidade pode ser ilustrada pelos seguintes fatos: no curto período que vai da concepção até o momento da implantação no útero, o ovo apresenta várias divisões celulares, de modo que, ao implantar-se, já possui 150 células. Ao final da 8ª semana após a fer- tilização (cerca da 12ª semana de gestação), termina o período embri- onário e o concepto já apresenta a forma humana com braços e per- nas, um coração que bate e um sistema nervoso que mostra sinais de início de respostas reflexas ao estímulo táctil (Ref. 29). É neste período, de maior velocidade de crescimento, que os riscos externos (agentes ifnecciosos, malnutrição materna, uso pela mãe de tabaco e outras drogas, insuficiente irrigação placentária, enfermida- des maternas, entre outros) de agressão para o feto são maiores, mais graves e com repercussões mais generalizadas. O controle pré-natal periódico desde o primeiro trimestre e durante toda a gestação, é fundamental para identificar os fatores de risco do retardo de crescimento intra- uterino. 20 PARTE 1 – Crescimento Toda criança com história de baixo peso ao nascer deve ser considerada como criança de risco nutricional e acompanhada com maior assiduidade pelos serviços de saúde, principalmente no primeiro ano de vida. O crescimento pós-natal Evolução A velocidade de crescimento pós-natal é particularmente elevada até os dois primeiros anos de vida com declínio gradativo e pronunci- ado até os cinco anos de idade. A partir do quinto ano, a velocidade de crescimento é praticamente constante, de 5 a 6 cm/ano até o início do estirão da adolescência (o que ocorre em torno dos 11 anos de idade nas meninas e dos 13 anos nos meninos). A velocidade de crescimen- to geral não é uniforme ao longo dos anos e os diferentes orgãos, teci- dos e partes do corpo não crescem com a mesma velocidade. O gráfico 1 (ver página 15) ilustra essas diferenças. Representações gráficas do crescimento O crescimento pode ser representado por meio de dois tipos de curvas: a curva de distância ou de crescimento longitudinal e a curva de velocidade de crescimento. No gráfico 2, estão expressas as curvas de distância do crescimento linear (as estaturas médias em cm, atingidas nas sucessivas idades para a população de referência do National Center of Health Statistics – NCHS) e no gráfico 3, estão os incrementos em estatura de uma idade para a outra, apresentados na forma de uma taxa de crescimento anual em cm/ano (curva de velo- cidade). Da mesma maneira são desenhadas as curvas de peso. o 1º ano de vida (Ref. 1). Esse crescimento compensatório é um fenô- meno que ocorre em resposta a uma desaceleração no ritmo de cresci- mento normal. Corrigida a causa, e se as condições ambientais forem adequadas, o organismo passa a crescer em uma velocidade superior ao esperado para a idade. Esse é um fenômeno muito encontrado em crianças desnutridas em fase de recuperação. Bebês pequenos para a idade gestacional (PIG), pré-termos ou nas- cidos à termo, tendem a permanecer pequenos para a idade ou mes- mo desnutridos, requerendo atenção especial dos serviços de atenção à criança. Em termos de Saúde Pública, recomenda-se a intervenção com o objetivo de se trabalhar na prevenção do baixo peso ao nascer, inves- tindo numa boa cobertura e atenção pré-natal (Ref. 1). Fi] PARTE | — Crescimento Centimetros Centimetros 21 GRÁFICO 2 Alturas médias por idade da população de referência do NCHS - Meninos e meninas de O a 18 anos vao MASC. vão FEM 140 130 too so so 4 CL 734 5 6 7/8 9 EH ILIZA AS 6 IT Idade em anos Fonte: NOHS GRÁFICO 3 Velocidade média de crescimento pós-natal da população de referência do NCHS - meninos e meninas de O a 18 anos 30 20 “ll za as A TERÃO LIZIA IA Ss TIS Idade em anos Fonte: NOHS 22 PARTE 1 – Crescimento Embora não existam es- tudos longitudinais sobre crescimento de crianças e adolescentes brasileiros, os resultados da Pesquisa Na- cional sobre Saúde e Nutri- ção (PNSN/1989) permi- tem uma análise preliminar de seu crescimento. Os gráficos 4 e 5 apresentam curvas de distância de cres- cimento em estatura, femi- ninas e masculinas, respec- tivamente, construídas a partir dos incrementos anuais médios, em centí- metros, para cada ano de vida, para a população bra- sileira e para a população de referência (NCHS). Verifica-se que tanto para meninos como meninas as duas curvas tem aspecto bem similar, contudo, a partir do segundo ano de vida já se percebe que as curvas de crescimento das crianças e adolescentes brasileiros começam a apresentar valores inferiores em relação às curvas de referência. 25PARTE 1 – Crescimento 17 anos (Ref. 27). Acredita-se que esse fenômeno ocorra devido às melhores condições de vida a que estão submetidas as novas gera- ções, como nutrição, controle de enfermidades, habitação, sanea- mento e lazer, o que tem permitido melhores condições para o de- senvolvimento do potencial genético. No que diz respeito às crianças brasileiras, para ambos os sexos e todos os estratos socioeconômicos, a altura média aos sete anos das crianças nascidas no início dos anos 80 é siginificativamente maior (ganho médio igual a 3,6 cm) do que aquelas nascidas em meados da década de 60. No caso de adultos, a altura média de homens e mulhe- res, aos 20 anos, nascidos na segunda metade da década de 60 é supe- rior (1,2 cm, em média) a dos nascidos no começo da década de 50, em todos os estratos socioeconômicos. No entanto, esses ganhos não são ainda suficientes para cobrir a distância que nos separa das popu- lações com condições satisfatórias de vida (Ref. 6). Fatores extrínsecos que influenciam o crescimento Alimentação – A criança até cinco anos requer cuidados específi- cos com a sua alimentação. Crescer consome energia: 32% das neces- sidades calóricas de um recém-nascido são destinadas ao crescimen- to. A dieta da criança deve ter qualidade, quantidade, freqüência e consistência adequadas para cada idade. Para crianças com até 6 me- ses de idade, o leite materno exclusivo é o melhor alimento (Ref. 16). Infecções – É também muito importante para o crescimento ade- quado da criança. É essencial que as crianças sejam imunizadas, se- gundo o calendário de vacinação preconizado pelo Ministério da Saú- de, para que se evite a ocorrência das doenças imunopreveníveis. Quan- to à outros processos infecciosos, é necessário que sejam diagnostica- dos e debelados precocemente para que não evoluam para um quadro adverso, com o aumento das necessidades nutricionais, associado à diminuição do apetite e, nos casos das diarréias e doenças parasitári- as, ao menor aproveitamento biológico dos alimentos. Nos processos febris, observa-se que para cada grau de temperatura acima de 38ºC, estima-se um aumento de 20% nas necessidades calóricas e protéicas da criança, além de causar perda acentuada de apetite. Dessa forma, as infecções repetidas podem levar ao retardo do crescimento e à des- nutrição que, por sua vez é responsável pela maior vulnerabilidade das crianças aos episódios infecciosos mais graves e de maior duração, caracterizando, assim, uma ação sinérgica. 26 PARTE 1 – Crescimento Higiene – A higiene adequada da criança, dos alimentos, do ambi- ente e de todos aqueles que lidam com ela são fatores essenciais para seu bom crescimento. Isso implica na disponibilidade de água potável, de meios adequados para o esgotamento sanitário, e destinação de lixo e em conhecimentos, atitudes e práticas corretas sobre o manu- seio, armazenamento, preparo e conservação dos alimentos, de higie- ne corporal e do ambiente. Cuidados gerais com a criança – Assim como os demais aspec- tos citados acima, também é fundamental para o bom crescimento e desenvolvimento a qualidade dos cuidados dispendidos à criança. Em outras palavras, a criança pequena necessita estabelecer relações afetivas, precisa de outra pessoa para ir se estruturando como um sujeito e para ter uma identidade própria. Estabelecer, desde o nasci- mento, relações com pessoas que a escutem e entendam suas neces- sidades, que lhe dêem carinho e afeto, que lhe proporcionem oportu- nidades seguras de explorar e conhecer o mundo que a rodeia, são condições essenciais ao adequado crescimento e desenvolvimento da criança. Esse tema será abordado de forma mais aprofundada na parte referente ao acompanhamento do desenvolvimento. 27PARTE 1 – Crescimento A proposta de acompanhamento do crescimento: o caminho da saúde O acompanhamento do crescimento: estruturando a atenção à saúde da criança Cada contato entre a criança e os serviços de saúde, independente do fato, queixa ou doença que o motivou, deve ser tratado como uma oportunidade para a análise integrada e preditiva de sua saúde, e para uma ação resolutiva, de promoção da saúde, com forte caráter educativo. O acompanhamento sistemático do crescimento da crian- ça constitui o eixo central desse atendimento. A avaliação periódica do ganho de peso permite o acompanhamen- to do progresso individual de cada criança, identificando aquelas de maior risco de morbi/mortalidade, sinalizando o alarme precoce para a desnutrição, causa básica da instalação ou do agravamento da maior parte dos problemas de saúde infantil. A identificação de um ou mais fatores de risco, tais como: baixo peso ao nascer, baixa escolaridade materna, idades maternas extre- mas (<19 anos e >35 anos), gemelaridade, intervalo intergestacional curto (inferior a dois anos), criança indesejada, desmame precoce, mortalidade em crianças menores de 5 anos na família, condições ina- dequadas de moradia, baixa renda e desestruturação familiar exigem um acompanhamento especial, pois aumentam a probabilidade da exis- tência de doença perinatal e infantil. Se a caracterização do risco e o diagnóstico precoce forem subesti- mados, a condição de saúde da criança pode deteriorar-se e até levar à morte, se não forem tomadas medidas adequadas. A partir da consulta de acompanhamento do crescimento e desen- volvimento é também possível o estabelecimento de condutas curati- vas dirigidas aos processos patológicos presentes e o estabelecimento de condutas preventivas, adequadas à cada idade, sobre vacinação, alimentação, estimulação e cuidados gerais com a criança, em um pro- cesso contínuo de educação para a saúde. Além disso, as informações sobre peso e desenvolvimento in- fantil coletadas durante a avaliação do crescimento e desenvolvi- mento da criança facilitam o diálogo e o aconselhamento com a 30 PARTE 1 – Crescimento Como foram definidos os percentis do Cartão da Criança As curvas de peso/idade adotadas no Cartão da Criança correspondem ao padrão do National Center of Health Statistics (NCHS) de 1977/78, adotado pela Organização Mun- dial da Saúde (OMS) como padrão internacional. No primeiro Cartão da Criança, elabo- rado em 1984, a curva superior correspondia ao percentil 90 e a inferior ao percentil 10. A criança cujo peso/idade estava entre essas duas curvas era considerada como de cres- cimento normal e, portanto seguindo o caminho da saúde. Aquela com peso/idade abai- xo do percentil 10 era considerada como apresentando déficit de crescimento e diagnós- tico presumível de desnutrição energético-proteica. O critério adotado para usar o percentil 10 como ponto de corte inferior foi baseado na proposta do professor Carlos Augusto Monteiro do Departamento de Nutrição da Faculdade de Saúde Pública da USP (Ref. 21). A seleção do ponto de corte depende de vários fatores como o grau de sensibilidade e especificidade que se quer dar ao diagnóstico, que por sua vez é função da prevalência da desnutrição na população considerada e de cada situação específica (programas existen- tes, diagnóstico de crianças acompanhadas nos serviços de saúde, etc.). A elaboração do segundo Cartão da Criança em 1997 foi resultado da mudança do perfil epidemiológico das crianças brasileiras, apontada nos resultados da Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde, 1996 (Ref. 5) que mostraram uma redução de quase 20% na prevalência de déficit de crescimento/desnutrição em crianças menores de 5 anos, comparando com 1989. Demonstrava-se que a prevalência de desnutrição em termos gerais no País tinha baixado muito e não se justificava mais utilizar o percentil 10 como ponto de corte inferior da curva de crescimento do Cartão da Criança. Por isso, o Ministério da Saúde adota então o percentil 3 como ponto de corte inferior. Foi então impresso o novo Cartão com 3 curvas: percentil 97, percentil 10 e percentil 3. As crianças cujo peso/idade correspondiam aos valores situados entre os percentis 10 e 3 eram consideradas como de risco, critério que lhes permite continuar como clien- tela dos programas de suplementação alimentar juntamente com aquelas que apre- sentavam valores iguais ou inferiores ao percentil 3, consideradas como apresentando déficit de crescimento/desnutrição. Em 2001, com a atualização das Normas Técnicas para o Acompanhamento do Cresci- mento e Desenvolvimento, foi acrescentada mais uma curva ao Cartão da Criança que é o percentil 0,1 para compatibilização com o instrumento de capacitação da Atenção Inte- grada às Doenças Prevalentes na Infância (AIDPI), permitindo uma gradação nos déficits de peso/idade: Peso Baixo (valores entre os percentis 3 e 0,1) e Peso Muito Baixo (valores igual ou inferior ao percentil 0,1) para melhor orientação alimentar. 31PARTE 1 – Crescimento Interpretação da curva de crescimento Para a avaliação do crescimento individual de uma criança devem ser considerado dois aspectos: a) Na primeira medição, observar a posição do peso em relação aos pontos de corte superior e inferior: • acima do percentil 97: classificar como sobrepeso; • entre os percentis 97 e 3: faixa de normalidade nutricional; • entre os percentis 10 e 3: classificar como risco nutricional; • entre os percentis 3 e 0,1: classificar como peso baixo; • abaixo do percentil 0,1: classificar como peso muito baixo. b) Nas medições seguintes, observar a posição e também o sen- tido do traçado da curva de crescimento da criança: • posição da linha que representa o traçado de crescimento da crian- ça: entre os percentis 97 e 3, corresponde ao caminho da saúde; • sentido do traçado da curva da criança (ascendente, horizontal ou descendente), desenhada em linha contínua a partir da ligação de dois ou mais pontos com intervalos não superiores a dois meses. Intervalos maiores devem ser desenhados com linha pontilhada para chamar a atenção. As consultas para o acompanhamento da criança devem ser tratadas como um momento importante para a coleta de medidas antropométricas e à orientação da mãe sobre os cuidados básicos indispensáveis à saúde de seu filho. A seguir são enumeradas algumas atividades básicas que devem ser realizadas em todas as consultas de rotina: • pesar a criança e registrar o peso no Cartão da Criança que fica em posse da mãe ou responsável e também no Prontuário. Sempre que possível medir também a estatura; • verificar e orientar quanto ao calendário de vacinação, cuidados gerais e higiene; • acompanhar o desenvolvimento psicomotor, social e psíquico da criança; • se houver intercorrências patológicas ou eventos de saúde impor- tantes ocorridos com a criança, anotar no Cartão da Criança (no espaço destinado para tal finalidade); • estimular o aleitamento materno exclusivo até os 6 meses de vida. Orientar a alimentação complementar apropriada após os 6 meses; • verificar e estimular a atividade física regular, principalmente para crianças acima de 4 anos. Se a criança está crescendo e se desenvolvendo bem, o profissional de saúde deve parabenizar os pais. Caso contrário, deve-se explicar aos pais os riscos de saúde que a criança corre, e orientá-los para a promoção do crescimento e desenvolvimento. 32 PARTE 1 – Crescimento Cada uma das condições de crescimento observadas requer uma conduta específica, conforme o quadro a seguir: Posição do peso Inclinação da curva Condição do crescimento Conduta • Verificar a existência de erros alimentares, orientar a mãe para uma alimentação mais adequada de acordo com as normas para alimentação da criança sadia, excetuando- se bebês em aleitamento materno exclusivo. Dietas com restrição calórica só são recomendadas para crianças a partir dos 4 anos com peso/altura > P 97. • Orientar a mãe sobre vacinação, cuidados gerais, higiene e estimulação de acordo com a idade da criança. • Verificar e estimular a atividade física regular, principalmente crianças acima de 4 anos. • Marcar retorno para 30 dias. > P 97 Ascendente Alerta: risco de sobrepeso e obesidade • Parabenizar a mãe sobre o crescimento satisfatório da criança. • Marcar retorno de acordo com o calendário mínimo de consultas. • Investigar possíveis intercorrêcias que possam justificar a diminução da velocidade do crescimento e registrá- las no Cartão. • Tratar as intercorrências presentes. • Marcar retorno para 30 dias. • Investigar possíveis causas com atenção especial para o desmame, dentição, intercorrências infecciosas, formas de cuidado com a criança e afeto, informar a mãe. • Tratar intercorrências clínicas, registrando-as no Cartão. • Marcar retorno para 30 dias. • Investigar possíveis causas com atenção especial para o desmame, alimentação, intercorrências infecciosas, cuidados com a criança, afeto, higiene e informar a mãe. • Tratar intercorrências clínicas, registrando-as no Cartão. • Orientar a mãe sobre alimentação especial visando ao ganho de peso. • Encaminhar para o serviço social, se disponível. • Realizar nova consulta em intervalo máximo de 15 dias. Entre P 97 e P 10 Entre P 97 e P 10 Entre P 10 e P 3 Entre P 10 e P 3 Ascendente Horizontal ou descendente Ascendente Horizontal ou descendente Satisfatório Alerta Alerta Insatisfatório: classificar como risco nutricional Condutas recomendadas para algumas situações de crescimento da criança com até 6 anos de idade 35PARTE 1 – Crescimento • Peso/estatura A relação entre peso e estatura é importante para detectar deficiên- cias recentes de peso (desnutrição aguda) e é também o índice reco- mendado pela OMS para avaliar sobrepeso. Portanto, é um índice de desnutrição aguda e também de sobrepeso. Seus pontos de corte são os percentis 97 (sobrepeso) e 3 (desnutrição). Crianças com peso/estatura abaixo do percentil 3, sobretudo aquelas menores de dois anos de ida- de, devem ser encaminhadas para programas específicos de recupera- ção nutricional. Os serviços de saúde que possuem condições satisfatórias para medir altura ou comprimento das crianças devem fazê-lo, ver anexo 2) principalmente nas crianças menores de 2 anos que apresentarem baixo peso/idade no Cartão da Criança, para diferenciar se o peso bai- xo é decorrente apenas da baixa estatura ou se está associado tam- bém a baixo peso para a idade. A prevalência de déficit de peso para estatura em nosso meio é baixa, em geral, cerca de 5%. Entretanto, é importante verificar tam- bém a magnitude da prevalência do déficit de estatura para idade. Pode ser que a relação peso/estatura seja satisfatória devido a baixa estatu- ra para idade. Assim sendo, o que ocorre é uma adequação do peso para uma estatura que é deficiente. Portanto, a ausência de déficit de peso/estatura isoladamente não deve ser interpretada, imediatamen- te, como ausência de déficit nutricional. Nos anexos 6 e 7, encontram-se as curvas de estatura/idade e peso/ estatura para crianças menores de 7 anos. A seguir, a tabela 3 apresenta uma classificação para prevalência de baixa estatura em populações de crianças menores de 5 anos de idade, proposta pela OMS (ref. 29), que pode ser usada pelos serviços que efetuam análise de sua população em complementação a análise e di- agnóstico de cada criança atendida: 36 PARTE 1 – Crescimento • Perímetro cefálico Importante variável para avaliar crescimento da cabeça/cérebro de crianças nos dois primeiros anos de vida. Além desta idade, o períme- tro da cabeça cresce tão lentamente que sua medida não reflete alte- rações no estado nutricional (Ref. 15). No entanto, é importante con- siderar que a avaliação do desenvolvimento é mais sensível e detecta mais precocemente essas alterações. O perímetro adequado é expresso na forma de uma faixa de nor- malidade que situa-se entre os percentis 10 e 90. O quadro de perí- metro cefálico encontra-se no anexo deste manual e corresponde ao referencial do NCHS. No caso desse índice estar fora da faixa considerada de normalida- de, a criança deve ser encaminhada para um especialista ou equipe multiprofissional, para afastar diagnóstico de microcefalia ou de macrocefalia. • Perímetro braquial O perímetro braquial não se presta para o acompanhamento do crescimento infantil, uma vez que alterações neste parâmetro são len- tas, variando muito pouco com o aumento da idade, sendo útil apenas para a triagem de prováveis casos de desnutrição (entre os seis meses e cinco anos de idade o perímetro braquial varia pouco (Ref. 10). É necessário um treinamento cuidadoso para que a medida tenha a con- fiabilidade desejada. Orientações para as deficiências identificadas No caso desses índices estarem fora da faixa considerada de nor- malidade, as crianças devem ser encaminhadas a um profissional ca- pacitado em distúrbios do crescimento, para avaliação detalhada e orientação mais específica. No caso específico de déficits de estatura, é provável que a causa seja dieta deficiente em quantidade e/ou qualidade e história de infecções de repetição no passado ou ainda persistente no presente. Nesses casos, a história clínica e social da criança é muito importante e os casos devem ser acompanhados com orientação alimentar e cuidados gerais, objetivando a recuperação total ou parcial deste déficit. No entanto, déficits muito acentuados, sobretudo em crianças de famílias de boa condição socioeconômica devem ser encaminhadas aos especialistas para afastar diagnósticos de doenças metabólicas ge- néticas ou infecções crônicas que interferem no crescimento. 37PARTE 1 – Crescimento 1. BARROS, F.C.; VAUGAHAN, J.P.; VICTORA, C.G. Crescimento e desnutrição. In: Epidemiologia da desigualdade. São Paulo: HUCITEC, 1988, p. 95-116. 2. BARROS, F.C.; TOMASI, E.; VICTORA, C.G. As mães e suas gestações: comparação de duas coortes de base populacional no Sul do Brasil. Cadernos de Saúde Pública, vol 12, Supl. 1, p. 21-25, 1996. 3. BEATON, G.H.; BENGOA, J.M. (Eds). Nutrition in preventive medicine. Geneva: World Health Organization, 1976. 4. BEATON, G. et al Apropriate uses of Anthropometric Indices in Children: a report based on ACC/SCN Workshop. Written and edited by G. Beaton, A Kelly, J. Kevan, R. Martorell and J. Mason. [S.I.: s.n.], dec. 1990. 5. BEMFAM, IBGE, MS. Pesquisa Nacional sobre Demografia e Saúde, 1996. Rio de Janeiro: [s.n.], 1997. 6. BENÍCIO, M.H.D.A.; GOUVEIA, N.C.; MONTEIRO, C.A. Secular growth trends in Brazil over three decades. Annals of Human Biology, V. 21, n. 4, p.381-390, 1994. 7. BRASIL. Ministério da Saúde, Fundação Nacional de Saúde, PACS. Ações Básicas de Saúde e Desenvolvimento da Criança. [S.I.: s.n;], 1994. 8. BRASIL. Ministério da Saúde. Assistência Pré-natal: Manual Técnico, 3ª edição, Brasília: Ministério da Saúde, Secretaria de Políticas de Saúde, 2000. 9. BRASIL. Ministério da Saúde. Módulo 1: Cartão da Criança: Instrutivo. Brasília: Ministério da Saúde, 1994. 10. BURGESS, H.J.L.; BURGESS, A.P. A modified standard for mid-upper- arm circumference in young children. Journal of Tropical Pediatrics, n. 15, p.189-192, 1969. 11. CHAVEZ, R. et al. Mortality in second and third degree malnutrition. J TropPed, n. 2, p.77-83, 1956. 12. CLAP; OPAS; OMS. Material de apoio a promoção, proteção e vigilância da saúde da criança. Publicação Científica CLAP, Montivideu, Uruguai, n. 1304.01, 1995. 13. DOUEK, P.C.; LEONE,C. Estado nutricional de lactentes: comparação de três classificações antropométricas. J Pediat (Rio), v. 71, n. 3, p.139- 144, 1995. 14. FIOCRUZ; MS. Pesando e medindo em uma unidade de Saúde. Centro Colaborador em Alimentação e Nutrição, região sudeste, Rio de Janeiro: ENSP, 1997. 15. GIBSON, R.S. Anthropometric assessment of growth. In: Principles of nutritional assessment. Oxford University Press, p. 163-186, 1990. Referências bibliográficas 40 PARTE 1 – Crescimento Peso/Idade A variação do peso, com relação à idade da criança, é muito mais rápi- da do que da estatura e reflete, quase que imediatamente, qualquer dete- rioração ou melhora do estado de saúde, mesmo em processos agudos. Num prazo de poucos dias, podem ser observadas alterações importan- tes no peso, cuja medição é mais fácil e mais precisa que à estatura. Trata-se de um índice de fácil aferição por profissional de saúde bem treinado, constituindo-se numa técnica não invasiva e cultural- mente bem aceita pelas mães. Tais características tornam esse índice muito adequado para o acompanhamento do crescimento e do estado de saúde e nutrição da criança. Por essas vantagens, o índice peso/ idade é priorizado para o acompanhamento do crescimento no nível da atenção básica de saúde. Estatura/Idade O ganho de estatura é um bom parâmetro para a avaliação do cresci- mento da criança por ser cumulativo, progressivo e não sofrer regressões. Apesar de medir cumulativamente o crescimento, o ganho de esta- tura é relativamente lento o que faz com que custe a refletir proble- mas agudos de saúde e nutrição da criança. Ademais, a medição pode ser difícil e requer muito cuidado, sobretudo em lactentes e crianças pequenas. Imprecisões de poucos milímetros para mais, por exemplo, podem mascarar problemas no crescimento entre duas medições pró- ximas. Por isso o índice estatura/idade é recomendado para ser usado em adição ao peso/idade, sempre que os serviços tenham condições para coletar a medida de estatura com pessoal treinado para tal. Peso/Estatura Este índice reflete o peso corporal em relação à estatura e, portan- to, não requer a informação da idade. Muito valorizado no passado tem ainda aplicação na clínica pediátrica, na avaliação e seguimento individual de casos de desnutrição aguda e de peso excessivo. Perímetro cefálico/Idade A medição do perímetro da cabeça é importante para avaliar o ta- manho da cabeça e do cérebro. Sua importância na infância está rela- cionada ao volume intracraniano, permitindo uma avaliação do cresci- mento do cérebro. O acompanhamento do perímetro craniano deve ser feito, prioritariamente, nas crianças de 0 a 24 meses, período de maior crescimento pós-natal da cabeça e cérebro. É uma medida que A N EX O 41PARTE 1 – Crescimento apresenta pequena faixa de variação para qualquer grupo etário, com um desvio padrão que permanece pequeno e aproximadamente cons- tante para todo o período de crescimento. Não há quase variação raci- al, populacional ou de fatores geográficos. Embora haja uma pequena diferença entre os sexos (maior no sexo masculino) a diferença não excede 1 cm para a média em qualquer idade. (Ver tabela no Anexo 4). Perímetro braquial Em situações excepcionais, quando a coleta de peso e estatura é dificultada como em situações de emergência, em atividades de tria- gem, em inquéritos populacionais, em campanhas de vacinação, entre outras, a medição do perímetro braquial pode ser utilizada como um índice alternativo do estado nutricional da criança de até 24 meses. Baixos valores de circunferência braquial, nesta faixa etária, são bons preditores de desnutrição. A principal vantagem operacional da medi- da é a portabilidade da fita braquial. Esta medida só é útil para triagem de prováveis casos de desnutrição, uma vez que sua variabilidade é pequena. Não se presta para o acompanhamento do crescimento infantil uma vez que alterações neste parâmetro são lentas, variando muito pouco com o aumento da idade, prestando-se apenas para a triagem de prováveis casos de desnutrição. É necessário um treina- mento cuidadoso para que as medidas tenham a acurácia desejada. Curva de Crescimento de Referência Tendo em vista a grande influência do ambiente no crescimento, o padrão ideal para comparação seria aquele obtido de populações que tivessem a maior probabilidade de estar crescendo plenamente de acordo com o seu potencial. Este é o caso das populações das áreas mais desenvolvidas do mundo ou dos grupos de maior renda dos vários países. Acreditava-se, primeiramente, que populações asiáticas e de raça negra fossem mais baixas que populações de raça branca devido a ca- racterísticas genéticas. Contudo, estudos com filhos de imigrantes ja- poneses nos Estados Unidos, imigrantes indianos na Inglaterra e afri- canos para a Europa e Estados Unidos, mostraram que em condições ambientais semelhantes, e melhores do que aquelas de seus antepas- sados, esses indivíduos cresciam dentro da faixa de normalidade espe- rada para a raça branca. Considera-se como Padrão de Crescimento de uma população aquele construido, segundo a metodologia definida pela Organização Mundial da Saúde (OMS), com amostragem representativa de indiví- A N EX O 42 PARTE 1 – Crescimento duos saudáveis da referida população. Quando se utiliza um conjunto de dados construído com indivíduos de outra população se diz que é um Referencial. A OMS adotou como referência internacional, o padrão construído pelo National Center of Health Statistics – NCHS (1977/1978). Considerando que a recomendação atual para a alimentação de crian- ças nos seis primeiros meses de vida é o aleitamento materno exclusivo, a Organização Mundial da Saúde (OMS) vem desenvolvendo estudos em seis regiões do mundo para a construção de uma nova referência internacional de crescimento. As crianças incluídas nesses estudos devem seguir as recomendações da OMS quanto ao aleitamento ma- terno e introdução adequada de alimentos, entre outras exigências. Até que essas novas curvas de crescimento da OMS estejam disponíveis para uso nos serviços de saúde, as referências para peso/idade, estatura/idade e peso/estatura recomendadas até o presente pelo Ministério da Saúde para o acompanhamento do cres- cimento das crianças brasileiras são aquelas do NCHS (1977/1978), atualmente apresentadas no Cartão da Criança (anexos 5 e 6). Pontos de corte da referência Existem diferentes maneiras de se representar os pontos de corte dos índices antropométricos: por meio de percentis, de escores Z e de outras formas de classificação. Percentis A variabilidade do crescimento entre indivíduos saudáveis pode ser expressa através da seguinte lógica. Alinhamos por ordem crescente de estatura, 100 meninas sadias de mesma idade e de condições socioeconômicas adequadas ao cres- cimento pleno, escolhidas ao acaso. A medida da estatura de cada menina representa 1% do total (ou um centil). Tomando-se o valor da estatura da terceira menina da fila, teremos 3% das meninas estudadas com estatura igual ou inferior àquela me- dida. Denominamos a estatura da menina número 3 como percentil 3 de estatura para aquela idade específica. A mesma lógica é utilizada para a definição de outros percentis (10, 50, 97, etc.) de estatura para idade, bem como dos percentis de outras medidas antropométricas, como o peso para a idade, o perí- metro cefálico para a idade, etc. A N EX O 45PARTE 1 – Crescimento Outras classificações Entre as outras possibilidades de classificação da variabilidade do normal, a mais utilizada é a da proporcionalidade em relação à media- na, expressa sob a forma de porcentagem da mesma. • Desvio percentual em relação à mediana É a relação entre o valor de uma medida (peso ou estatura) indivi- dual e o valor da mediana na população de referência expressa em percentagem. Chama-se também adequação percentual (ou AD%). AD% = valor individual (peso/altura) X 100 valor da mediana na referência As primeiras classificações de estado nutricional da criança baseadas em parâmetros antropométricos utilizavam como critério de corte, para definir o limite de normalidade, uma porcentagem do valor esperado, definida arbitrariamente. Nessas classificações o valor esperado para aquele parâmetro era sempre definido como o valor médio ou, conforme o referencial, mediano para uma criança de mesmo sexo e idade. A classificação de Gómez (para crianças menores de 5 anos) é a mais antiga e, a partir da década de 50, disseminou-se pela América Latina e definia os seguintes pontos de corte para a relação de peso para a idade: • não desnutrido: peso para idade superior a 90% do esperado4; • desnutrido de primeiro grau: 76 a 90% de adequação de peso para a idade; • desnutrido de segundo grau: 61 a 75% de adequação de peso para a idade; 4. O peso esperado era o peso médio da referência para uma criança de mesmo sexo e idade. A N EX O 46 PARTE 1 – Crescimento • desnutrido de terceiro grau: 60% ou menos de adequação de peso para idade. Embora muito utilizada, originalmente, Gómez havia proposto como forma de avaliação de risco de morbimortalidade de lactentes e não como uma ferramenta para diagnóstico nutricional a ser aplicada de forma indiscriminada (Ref. 11). Na década de 70, Waterlow propôs uma classificação de estado nutricional que utilizava dois parâmetros antropométricos: como primeiro ponto considerava a porcentagem de adequação de esta- tura para a idade da criança, definindo como limite inferior de ade- quação (ponto de corte) 96% do valor esperado para mesmo sexo e idade, e em seguida o peso para a estatura fixando como ponto de corte 90% do esperado. Dessa maneira, sua classificação original- mente era: • não desnutrido: criança com estatura para idade superior a 95% e peso para estatura acima de 90% dos valores esperados; • wasted (emaciado, emagrecido, desnutrição aguda ou recen- te): criança com estatura para idade acima de 95% e peso para estatura abaixo de 90% dos valores esperados; • stunted (retardo de crescimento, estatura baixa, desnutrição pregressa, nanismo nutricional): criança com estatura para ida- de inferior a 95% e peso para estatura acima de 90% do valor espe- rado; • stunted and wasted (estatura baixa e emagrecimento, desnu- trição crônica ainda ativa): criança com estatura para idade infe- rior a 95% e peso para estatura abaixo de 90% do valor esperado (Ref. 31). Apesar de ter sido bastante utilizada, a classificação original, discri- minando o tipo de desnutrição que a criança apresentava, e não sua intensidade, buscava definir prioridades de intervenção. Anos depois, o autor proporia modificações visando a incorporar a intensidade do agra- vo nutricional na mesma, mas isso tornou a classificação mais comple- xa e de difícil utilização na rotina dos serviços básicos de saúde. Outros autores, como Jelliffe, Seoane e Latham, Mc Laren, Ariza Ma- cias, etc., propuseram classificações baseadas em diferentes porcenta- gens de adequação, associadas ou não a sinais clínicos e/ou laboratoriais, porém sem maiores repercussões na prática pediátrica (Ref. 3). A N EX O 47PARTE 1 – Crescimento Entretanto, apesar de ser utilizada por diversos autores para definir classificações de estado nutricional, a principal desvantagem desse tipo de ponto de corte – porcentagem da mediana – decorre do fato de que a mesma não tem, para as diferentes idades e sexos, uma correspon- dência constante com a distribuição de escore Z ou de percentis. Por exemplo, dependendo da idade da criança, 80% da média do peso/ idade pode estar acima ou abaixo de -2 escores Z. De maneira oposta, conforme o sexo e a idade considerados, um ponto de corte corres- pondente a aproximadamente -2 escores Z, resultaria numa ponte de corte para baixa estatura de 90% da mediana, enquanto para baixo peso seria de 80% da mediana, o que certamente dificultaria, na práti- ca do dia a dia, a interpretação dos valores observados. Além disso, a proposta de pontos de corte como um percentual da média ou da mediana diferentes para as diversas classificações e índi- ces antropométricos, tornam-se difíceis as comparações quando mé- todos de classificação diferentes são utilizados, além de não se presta- rem para efetuar o acompanhamento do processo de crescimento ao longo do tempo (Ref. 13). A N EX O 50 PARTE 1 – Crescimento Procedimentos de padronização 1. O supervisor entrega 2 vias do formulário de padronização para cada antropometrista, con- forme o modelo ao lado. 2. Cada antropometrista mede a criança que está partici- pando do treinamento e anota o valor da medida na 1ª via do for- mulário. Todas as dez crianças devem ser medidas uma vez. 3. O supervisor recolhe a 1ª via do formulário. O antropome- trista não deve memorizar o re- sultado da primeira medição. 4. Cada antropometrista deve repetir a medição das crianças e ano- tar os valores observados na 2ª via do formulário. 5. Para calcular a precisão e a exatidão, cada antropometrista de- verá preencher o Quadro 2. Observe que no exemplo, apresentam-se os resultados das medições do antropometrista y, realizadas em um grupo de dez crianças. QUADRO 2 Exercício para Cálculo de Precisão e Exatidão da medida de altura (mm) Antropometrista: Y do quadro 1 A N EX O (1) (2) (3) (4) (5) (6) (7) (8) (9) (10) 1 842 837 +5 25 1.679 828 822 1.650 +29 841 2 861 854 +7 49 1.715 838 846 1.684 +31 961 3 862 858 +4 16 1.720 860 856 1.716 +4 16 4 875 865 +10 100 1.740 862 860 1.722 +18 324 5 826 827 - 1 1 1.653 820 820 1.640 +13 169 6 864 860 +4 16 1.724 856 854 1.710 +14 196 7 820 835 - 15 225 1.655 823 824 1.647 +8 64 8 884 882 +2 4 1.766 876 876 1.752 +14 196 9 820 815 +5 5 1.635 801 806 1.607 +28 784 10 866 870 - 4 16 1.736 853 865 1.718 +18 324 TOTAL + 7/10 477 + 10/10 3.875 Criança Antropometrista Precisão SupervisorAntropometrista Exatidão Nº Medição (mm) 1ª 2ª (1-2) (1-2) 2 (1+2) Medição (mm) 1ª 2ª (6+7) (5-8) (5-8)2 51PARTE 1 – Crescimento Para o preenchimento do Quadro 2, deve-se adotar os se- guintes procedimentos: a) Copiar as duas medições de estatura do antropometrista Y nas co- lunas 1 e 2 e as duas medições do supervisor, realizados previa- mente por ele, nas colunas 6 e 7. b) Calcular a diferença entre as duas medições do antropometrista e anotar o resultado com seu sinal apropriado (+ ou -), na coluna 3. Esse valor deverá ser elevado ao quadrado e anotado na coluna 4. O somatório dos valores obtidos na coluna 4, será a PRECISÃO do antropometrista Y. c) Somar as duas medições realizadas pelo antropometrista e anotar na coluna 5. d) Somar as duas medições realizadas pelo supervisor e anotar na co- luna 8. e) Calcular a diferença entre o resultado da coluna 5 e da coluna 8 e anotar o valor na coluna 9 com o sinal apropriado (+ ou -). Esse valor deverá ser elevado ao quadrado e anotado na coluna 10. O somatório dos valores obtidos na coluna 10, será a EXATIDÃO do antropometrista. f) É importante que o supervisor faça o cálculo de sua PRECISÃO, assim como foi feito pelos antropometristas. 6. Para resumir e melhor comparar os resultados encontrados para cada antropometrista, deverá ser construído o Quadro 3. Como o exemplo abaixo: a) Registrar o total da PRECISÃO do supervisor na 1ª linha. No local reservado para exatidão do supervisor, não será registrado nenhum valor; sua medição é considerada a exata, o valor verdadeiro. b) Do quadro – CÁLCULO DA PRECISÃO E EXATIDÃO, que deverá já estar preenchido para cada antropometrista, transferir os totais da coluna 4 – PRECISÃO e da coluna 10 – EXATIDÃO, para suas respectivas colunas. c) Para preencher as colunas SINAL, consultar no mesmo quadro citado no item anterior, a coluna 3 para a precisão e a coluna 9 para a exatidão. Deve-se construir uma fração cujo denominador é igual ao número de sinais positivos (+) e negativos (-) encontrados. Ignorar os valores iguais a zero. O numerador é o número de sinais mais freqüentes. A N EX O 52 PARTE 1 – Crescimento 7. Regras gerais para avaliação dos resultados: a) A precisão do supervisor normalmente será melhor, pois se supõe sua melhor habilidade técnica e, portanto, o valor anotado será o menor. Idealmente esse deve ser igual a zero tanto para o supervisor, como para o antropometrista. Na prática, se considera que uma precisão é adequada quando o valor encontrado pelo antropome- trista é menor do que o dobro do valor do supervisor (tomado arbi- trariamente). Exemplo: o valor da precisão do supervisor é igual a 294, assim a precisão do antropometrista será satisfatória se for inferior a 294 x 2 = 588. No caso, teriam resultados satisfatórios os antropometristas U, V e Y. b) Como o supervisor é considerado exato, para avaliar a exatidão dos antropometristas, compara-se o valor obtido para cada um com o valor da precisão do supervisor. Na prática, se considera que uma exatidão é adequada se o valor encontrado for igual ou menor que o triplo do valor da precisão do supervisor (tomado Antropometristas Total Sinal Total Sinal Observações (pelo supervisor) (col.4) (col.3) (col.10) (col.9) Supervisor Antropometrista: U Antropometrista: V Antropometrista:W Antropometrista: X Antropometrista: Y Antropometrista: Z 294 324 431 774 893 457 1278 4/8 6/9 6/10 5/10 5/9 7/10 7/10 NA 524 1195 1024 3655 3875 1040 NA 7/10 8/9 7/10 9/10 10/10 6/10 A melhor precisão como se esperava. A precisão e a exatidão são satisfatórias. Valores demasiado altos de 3,8mm. Voltar a medir as mesmas crianças sob supervisão, com instrução. Precisão deficiente devido a repetição de uma má medição. Exatidão quase adequada. Com maior precisão, se espera que a exatidão seja adequada. Precisão deficiente em todo o procedimento, resultado demasiado elevado de 7,4 mm, se observou uma atitude e atenção deficiente. É necessário falar com o antropometrista e voltar a padronizá-lo. Precisão satisfatória. Está fazendo algo errado sistematicamente; 8,9mm mais alto. Ao repetir as medições, se observou que o antropometrista tentava colocar a criança na posição correta, fazendo a medição errada. Precisão e exatidão deficientes devido a erro nas primeiras quatro medições. Depois teve rendimento satisfatório. Voltar a medir. Precisão Exatidão QUADRO 3 Resumo dos resultados encontrados na padronização A N EX O 55PARTE 1 – Crescimento Altura (crianças de 24 a 72 meses - em pé) Instrumentos de medição: A medição da altura da criança maior de 2 anos deve ser feita em pé, em balança plataforma com antropômetro ou em antropômetro de parede. Procedimento para a medição: 1. A criança deve estar descalça, com roupas muito leves ou despida, sem touca, protetores ou enfeites de cabeça. O cabelo deve estar solto. 2. Colocar a criança de pé, sem curvar os joelhos, braços ao longo do corpo com os calcanhares e ombros eretos e olhando para a frente. 3. Deslizar o antropômetro ou haste metálica da balança até encostar na cabeça da criança, com pressão suficiente apenas para compri- mir os cabelos, mantendo-a firme. 4. Proceder a leitura da medida. A medida correta exige a precisão até o milímetro, contudo, para evitar erros de medição aconselha-se aproximar, quando necessário, para o meio centímetro mais próxi- mo (exemplo: 110,2 cm aproximar para 110,0 cm, 131,8 cm, apro- ximar para 132,0 cm). Registrar imediatamente. 5. Avaliar a adequação da altura na tabela de percentis e informar a mãe sobre essa adequação. A N EX O 56 PARTE 1 – Crescimento Peso Crianças de 0 a 23 meses Instrumentos de medição: As balanças mais apropriadas para esta faixa etária são as que possuem divisões em, no mínimo, 100g, capacidade total de, no mí- nimo, 25 kg, facilidade de leitura dos pesos e mecanismo de tara. As balanças portáteis são aconselháveis por permitirem a deslocação para visitas domiciliares, inquéritos, pesagens durante campanhas de vacinas, etc. Os equipamentos que melhor atendem essas características são: 1. balança pediátrica, que possuem grande precisão com divisões em 10g mas menor capacidade (16kg) e portabilidade; 2. balança suspensa de braço com suporte para a criança; 3. balança suspensa tipo relógio com suporte para a criança. Técnicas de medição: 1. Colocar a balança pediátrica em superfície plana em altura que per- mita uma boa visualização da escala, destravar e tarar a balança antes de toda e qualquer pesagem. 2. As balanças suspensas devem ser penduradas em local seguro e em altura que permita uma boa visualização da escala, normalmente na altura dos olhos do profissional de saúde, tarar a balança antes de toda e qualquer pesagem. 3. A criança deve estar descalça, despida ou, no caso de frio, com roupas muito leves, sem touca, protetores ou enfeites de cabeça. O cabelo deve estar solto. 4. Para a balança pediátrica: • Com o auxílio da mãe ou acompanhante, colocar a criança no cen- tro da balança pediátrica, deitada ou sentada. A N EX O 57PARTE 1 – Crescimento Crianças de 24 a 72 meses Instrumentos de medição Para o caso de crianças de 24 a 60 meses, as balanças mais apropriadas são as que possuem divisões em, no mí- nimo, 100g, facilidade de leitura dos pesos e mecanismo de tara. A balança que melhor atende a essas características é a balança plataforma, utilizada para a pesagem de adultos. Contudo, a portabilidade é também uma característica de- sejável, o que faz com que as seguintes balanças sejam recomendadas: • balança suspensa de braço com suporte para a criança; • balança suspensa tipo relógio com suporte para a criança. • Movimentar o cursor maior (quilogramas) sobre o suporte apro- ximando-a do número de quilos esperados para a idade. Movi- mentar o cursor menor (gramas) fazendo o ajuste até o pontei- ro atingir o equilíbrio. • Ler o peso da criança e anotá-lo, imediatamente, na ficha de registro. 5. Para as balanças suspensas • Com o auxílio da mãe, colocar a criança no suporte. • Movimentar a peça ao longo do suporte até atingir o equilíbrio (balanças de braço) ou ler o peso diretamente no relógio (balanças tipo relógio). • Ler o peso e anotá-lo, imediatamente, na ficha de registro. 6. Com o auxílio da mãe ou acompanhante, retirar a criança da balança. 7. Anotar o peso na curva de crescimento no Cartão da Criança e interpretar a evolução 8. Informar o peso da criança e a evolução do crescimento para a mãe ou acompanhante. 9. Nos casos de crescimento deficiente ou de desnutrição, proceder de acordo com as orientações deste manual. A N EX O 60 PA RTE 1 – Crescim ento ANEXO 5 Curvas de crescimento Peso/Idade meninos de 0 a 6 anos – NCHS ANEXO 61 PA RTE 1 – Crescim ento ANEXO 5 Curvas de crescimento Peso/Idade meninas de 0 a 6 anos – NCHS ANEXO 62 PA RTE 1 – Crescim ento ANEXO 6 Curvas de crescimento Estatura/Idade meninos de 0 a 6 anos – NCHS ANEXO 65 PA RTE 1 – Crescim ento ANEXO ANEXO 7 Curvas de crescimento Peso/Estatura meninas de 0 a 6 anos – NCHS 66 PARTE 1 – Crescimento ANEXO 8 Dietas hipercalóricas e hiperprotéicas propostas pelo AIDPI Recomendações para a alimentação da criança Até 6 meses • Oriente a mãe a dar o peito sempre que a criança quiser, de dia e de noite. Explique porque não é necessário dar outra comida ou líqui- do, nem chá ou água. • O leite materno já contém tudo que o bebê precisa nessa idade, na quantidade, temperatura e condições de higiene ideais. • Se a criança já estiver recebendo outros alimentos, oriente a mãe a dar o peito antes de cada comida até substitui-la totalmente. 6 a 7 meses* • Oriente a mãe para que continue dando o peito. • Já é tempo de começar a dar outros alimentos. Oriente a mãe para começar a dar, aos poucos, purês e papas de frutas e legumes. • Oriente a mãe a ir amamentando até dar 3 vezes ao dia. • Observação: - Sopas e mingaus ralos não sustentam a criança. 8 a 11 meses* • A mãe deve continuar dando papas e purês acrescentando carne, frango, peixe ou miúdos desfiados ou bem picadinhos. • A comida servida aos outros membros da família pode ser dada ao bebê, desde que passada na peneira ou amassada com o garfo. Junte uma colher de chá de óleo ou, na falta dele, manteiga ou margarina. - Dê 3 vezes ao dia, se estiver mamando; - Dê 5 vezes se já não estiver mais no peito. • Observação: - Oriente a mãe a separar um prato só para a criança. - Oriente a mãe a ajudar a criança a comer. * Só colocar óleo extra na alimentação para as crianças que estiverem com peso baixo ou ganho insuficiente de peso. A N EX O 67PARTE 1 – Crescimento A N EX O12 a 23 meses • Oriente a mãe para dar da mesma comida servida à família, distri- buída em 5 porções diárias. Juntar uma colher de chá de óleo, mar- garina ou manteiga para a comida ficar mais forte. • Observação: - Oriente a mãe para que continue dando o peito sempre que a criança quiser. - Oriente a mãe a separar um prato só para a criança. - Oriente a mãe a ajudar a criança a comer. 2 anos ou mais • Oriente a mãe para seguir com a alinentação da família 3 vezes ao dia reforçada com o óleo, margarina ou manteiga, e ofereça 2 lan- ches como frutas, biscoitos, pães, aipim cozido, etc. • Mesmo que faça sujeira, ela deve comer sozinha e mexer nos alimentos de seu prato para aprender. Oriente para que a mãe fique junto, ajudan- do a criança para que coma o suficiente e para que deixe a criança ajudar a preparar os alimentos em tarefas que não sejam perigosas. • Oriente a mãe para variar a alimentação da criança ao máximo para formar bons hábitos. No caso de doença • Oriente a mãe para que ofereça mais o peito se estiver mamando. Faça as comidas preferidas e dê mais vezes ao dia. aumente pelo menos uma refeição até o final da doença. Limpe o nariz, se estiver entupido ou escorrendo, dificultando a alimentação. Orientando a mãe a tratar o peso muito baixo Se a criança está com o peso muito baixo, ela vai se fortalecer com dietas especiais. Dieta 1 • 2 colheres de sopa de leite em pó integral ou 200 ml de leite líquido; • 1 colher de sopa de abóbora cozida; • 1 colher de sopa de óleo; • 1 colher de sopa de açúcar; • Acrescente água fervida até completar 1 copo (200 ml). 70 PARTE 1 – Crescimento 71PARTE 1 – Crescimento Parte 2 Desenvolvimento 72 PARTE 1 – Crescimento 75PARTE 1 – Crescimento Desenvolvimento humano: fundamentos e princípios para a prática clínica Quando perguntamos a uma pessoa o que ela entende por desen- volvimento, ou quando discutimos com profissionais de saúde ou áreas afins o significado do termo desenvolvimento da criança, fica- mos surpresos com as mais variadas respostas, uma vez que, de fato, o desenvolvimento humano é perpassado por conceitos heterogêne- os das mais diversas origens. Acreditamos que isso se deva ao fato de o desenvolvimento humano poder ser definido ou entendido de várias formas, dependendo do referencial teórico que se queira ado- tar e de quais aspectos se queira abordar. Para o pediatra, surge a definição do livro de texto que diz: “desen- volvimento é o aumento da capacidade do indivíduo na realização de funções cada vez mais complexas” (Ref. 7). O neuropediatra certamen- te pensará mais na maturação do sistema nervoso central e conseqüen- te integridade dos reflexos. O psicólogo, dependendo da formação e experiência, estará pensando nos aspectos cognitivos, na inteligência, adaptação, inter-relação com o meio ambiente, etc. O psicanalista dará mais ênfase às relações com os outros e à constituição do psiquismo. Entretanto, todos esses profissionais estão corretos em suas análi- ses. Cada um deles pensa nos aspectos que vivencia na prática profis- sional e que para o outro, com experiência diferente, pode ser incom- pleta ou reducionista. O que nos confirma que o desenvolvimento vai além de uma determinação biológica e necessita uma abordagem multiconceitual e, conseqüentemente, multidisciplinar. Para serem válidas, as generalizações sobre o desenvolvimento in- fantil não podem estar baseadas apenas na avaliação das habilidades pertencentes a um determinado sistema: motor, perceptivo, linguagem, etc. Esses sistemas traduzem determinadas funções que se apóiam em um processo de maturação neurológica, aperfeiçoam-se, desenvolvem- se, sofrem influências ambientais e se organizam em um núcleo consti- tuído pelo psiquismo. O atraso de uma dessas habilidades por si só não significa necessariamente um problema patológico já que entendemos que cada ser humano se desenvolve a partir de suas possibilidades e do meio em que está inserido. A criança deverá ser sempre vista como um todo e em relação com seu ambiente, pais e família. A diversidade conceitual não deve desviar nossa atenção do que é essencial: conhecer o desenvolvimento normal e suas variações para que se possa oferecer orientações à família, e em caso de necessidade, fazer o encaminhamento para diagnóstico e intervenção, o mais precocemente possível. PARTE 2 - Desenvolvimento 76 PARTE 1 – Crescimento Conceitos e definições E nós, o que entendemos por desenvolvimento? Primeiramente, para respondermos a essa pergunta, faz-se necessário diferenciar alguns termos muitas vezes utilizados como sinônimos, embora tenham sig- nificados diferentes. Assim, vamos começar definindo alguns concei- tos que nos situem em determinada perspectiva, a começar pelos pró- prios termos crescimento e desenvolvimento. • Crescimento significa aumento físico do corpo, como um todo ou em suas partes, e pode ser medido em termos de centímetros ou de gramas. Traduz aumento do tamanho das células – hipertrofia – ou de seu número – hiperplasia (Ref. 7). • Maturação é a organização progressiva das estruturas morfológi- cas, já que, como o crescimento, seu potencial está geneticamente determinado. A maturação neurológica engloba os processos de crescimento, diferenciação celular, mielinização e o aperfeiçoamen- to dos sistemas que conduzem a coordenações mais complexas (Ref. 2). • Desenvolvimento é um conceito amplo que se refere a uma trans- formação complexa, contínua, dinâmica e progressiva, que inclui, além do crescimento, a maturação, a aprendizagem e os aspectos psíquicos e sociais (Ref. 2). • Desenvolvimento psicossocial é o processo de humanização que inter-relaciona aspectos biológicos, psíquicos, cognitivos, ambien- tais, socioeconômicos e culturais, mediante o qual a criança vai adquirindo maior capacidade para mover-se, coordenar, sentir, pen- sar e interagir com os outros e o meio que a rodeia; em síntese, é o que lhe permitirá incorporar-se, de forma ativa e transformadora, à sociedade em que vive (Ref. 2). Condições básicas do desenvolvimento na infância A palavra infante vem do latim infans, que significa incapaz de falar. Geralmente, define o período que vai do nascimento até aproximada- mente dos 2 aos 3 anos de idade, quando a fala já se transformou em instrumento de comunicação. Nessa fase, muitos eventos ocorrem pela primeira vez: o primeiro sorriso, a primeira palavra, os primeiros passos, o primeiro alcançar de um objeto. A criança é um ser dinâmi- co, complexo, em constante transformação, que apresenta uma se- Crescimento e Desenvolvimento (C.D.) fazem parte do mesmo processo, porém exigem abordagens diferentes e específicas para sua percepção, descrição e avaliação. PARTE 2 - Desenvolvimento 77PARTE 1 – Crescimento qüência previsível e regular de crescimento físico e de desenvolvimen- to neuropsicomotor. Esse desenvolvimento sofre a influência contínua de fatores intrín- secos e extrínsecos que provocam variações de um indivíduo para ou- tro e que tornam único o curso do desenvolvimento de cada criança. Os fatores intrínsecos determinam as características físicas da criança, a cor dos seus olhos e outros atributos geneticamente determinados. Os fatores extrínsecos começam a atuar desde a concepção, estan- do diretamente relacionados com o ambiente da vida intra-uterina, proporcionado pela mãe por meio das suas condições de saúde e nu- trição. Além disso, mãe e feto sofrem os efeitos do ambiente que os circunda. O bem-estar emocional da mãe também influencia de forma significativa o bem-estar do feto, embora esse tipo de influência não funcione, necessariamente, como causa direta de problemas de de- senvolvimento ulteriores. Após o nascimento, o ambiente em que a criança vive, os cuidados que lhe são dispensados pelos pais, o carinho, estímulos e alimenta- ção passam a fazer parte significativa no processo de maturação que a leva da dependência à independência. Características biológicas O ser humano apresenta algumas características que o diferenciam dos outros animais. Algumas delas fazem paralelos com alguns aspec- tos que podemos observar na maioria das escalas ou roteiros para avaliação do desenvolvimento, por exemplo (Ref. 9): • posição ereta – esta é a posição que facilita a locomoção e per- mite manter uma série de atividades efetivas, deixando as mãos livres para a construção dos objetos da cultura, que não são outra coisa senão um prolongamento do equipamento biológico com o qual a criança nasce. Da posição supina em que se encontra o recém-nascido até quando ele é capaz de se colocar na posição ereta, inúmeros eventos ocorrem, passando por várias etapas preditivas e pré-determinadas que se traduzem como desenvol- vimento motor; • aparelho visual e flexibilidade manual – permitem a coordena- ção e habilidade para construir e usar equipamentos – o que PARTE 2 - Desenvolvimento 80 PARTE 1 – Crescimento Antes mesmo de nascer, o psiquismo de um bebê já está em cons- tituição. Seus pais desejam, imaginam, pensam e falam sobre ele, an- tecipando-lhe um lugar determinado no romance familiar. Ao nascer, é acolhido nesse lugar, tecido com as palavras e com as imagens cria- das por seus pais. A essa aposta dos pais a respeito desse psiquismo pressuposto, o bebê poderá responder de modo inesperado, não coin- cidente com a imagem prévia, mas que não deixará de alimentar o desejo de seus pais em relação a ele. Tudo isso colocará em jogo um circuito de trocas, cujo resultado será um ser humano singular, único, dotado de um “eu” capaz de dirigir-se aos “outros”. Esse “eu” terá a função fundamental de articular todas as funções envolvidas no pro- cesso de desenvolvimento. Assim sendo, devemos sempre considerar que uma família é composta de crianças individuais cujas diferenças não são apenas genéticas, mas também determinadas pela maneira como cada uma delas se relaciona com seus pais e com aqueles que a cuidam e como é inserida no contexto das fantasias e crenças de sua famí- lia e dos acontecimentos inesperados. Esse contexto nunca é duas vezes o mesmo, e orienta o desenvolvimento emocional único de cada criança (Ref. 12). PARTE 2 - Desenvolvimento 81PARTE 1 – Crescimento Desenvolvimento normal e patológico Desenvolvimento normal Sabemos que um bebê depende inteiramente de outra pessoa para se desenvolver, que na maioria das vezes é sua mãe. Sem ela (ou sem seu substituto), o “filhote humano”, ao contrário de outros animais, não é capaz de ir à busca do seu alimento. Ou seja, se um bebê não tem quem dele cuide (alimente, agasalhe, etc.), converse e o deseje, ele morre. Portanto, precisamos atentar para as peculiaríssimas relações que se estabelecem entre a mãe e o bebê e o quanto isso é importante para o desenvolvimento psíquico da criança. Mesmo após o nascimento, com o corte do cordão umbilical, o binômio mãe-bebê continua existindo. Se antes, a mãe experimentava o bebê como parte dela, agora é o bebê que a experimenta como parte de si. Assim como durante a gestação consi- deramos o feto como parte da mãe, após o parto precisamos continuar pensando que a mãe é experimentada pelo bebê, como parte dele. Anteriormente, falamos sobre a dotação genética do ser, a importân- cia e integridade do SNC, da maturação, etc. – elementos necessários e importantes, mas que perdem todo o seu valor se a criança em interação com o outro não tem a possibilidade de se tornar um ser humano capaz de desejar e querer viver. É importante ter em mente que o desenvolvi- mento não se faz “no ar”, por pura maturação. É bem mais abrangente: o bebê se desenvolve por causa da mãe e para ela, da mesma forma que ela se desenvolve como mãe por causa dele e para ele. Por exemplo, se um bebê colocado de bruços levanta a cabeça e alça o seu olhar, isso não ocorre apenas por estar neurologicamente maduro, mas também para reencontrar o olhar da mãe, reconhecer-se na alegria que encontra nos olhos dela. Se o bebê mama, não é só porque está com fome ou por instinto de sobrevivência, mas sobretudo porque a mãe assim o deseja e a ele se oferece. Quando ensaia os primeiros passos, não é só para fazer um treino psicomotor, mas é para alcançar a outra pessoa que se põe a uma certa distância e o chama. Assim, a dupla mãe-bebê vai construir de olhar em olhar, de sorriso em sorriso, de passo a passo, nessa via dupla, uma parceria. Caberá à mãe a tarefa de instalar e manter a conexão de seu bebê com o mundo, através da transmissão da linguagem e de jogos que PARTE 2 - Desenvolvimento 82 PARTE 1 – Crescimento são fundamentais na constituição do psiquismo. Assim, ela se torna importante não apenas pelo fato de prover a subsistência do seu filho, mas também porque participa da construção do seu psiquismo, reconhecendo-o como um ser, ao mesmo tempo em que ela própria se vê, com surpresa, moldada e modificada por essa relação. Ela per- mite que o bebê se constitua em um ser humano dotado de um psiquismo que, juntamente com a carga genética, o SNC e o apare- lho cognitivo, compõe os aspectos estruturais do indivíduo. Períodos ou etapas do desenvolvimento Do ponto de vista didático, observa-se que o desenvolvimento vai transcorrendo por etapas ou fases, que correspondem a deter- minados períodos do crescimento e da vida, em geral. Cada um des- ses períodos tem suas próprias características e ritmos – ainda que não se deva perder de vista que cada criança tem seu próprio padrão de desenvolvimento (Ref. 7). Período pré-natal (da concepção ao nascimento) No momento da concepção, a herança dos pais é transmitida atra- vés dos seus genes – o que determinará a cor dos olhos, cabelos, pele, ou seja, as futuras características físicas da criança. Durante a gesta- ção, a interação mãe-feto é a mais íntima possível, podendo inclusive influenciar o crescimento e desenvolvimento do bebê: doenças mater- nas, nutrição, hábitos, situações emocionais, por exemplo. Antes mesmo do nascimento o bebê é antecipado pela mãe, tanto de forma consciente como inconsciente. Apesar do advento de no- vas tecnologias, como a ecografia e a punção amniótica, a gravidez continua sendo vivida como um grande mistério. Por mais que a tecnologia avance e traga novas informações, essa antecipação con- tinuará sendo feita. Por exemplo, mesmo sabendo que seu bebê será um menino, a mãe prosseguirá imaginando seus traços físicos e de personalidade. Hoje, sabe-se que o feto reage ao movimento e sono maternos, e que ainda dentro do útero difere de sua mãe por sua própria dinâmica de maturação: já tem certo grau de autonomia, na medida em que seu funcionamento sensorial não está em total conexão com a vida senso- rial da mãe. Pode reagir a sons, seu ciclo de sono-vigília não coincide necessariamente com o da mãe, já possui um certo grau de olfato, visão e tato. O que o bebê constrói na parceria com a mãe ou seu substituto será o seu legado para lidar, no futuro, com as circunstâncias da vida. A criança existe para a mãe mesmo antes de nascer, ou até mesmo antes de ser concebida, e esse desejo materno pelo filho pode influenciar vários aspectos do seu desenvolvimento. PARTE 2 - Desenvolvimento 85PARTE 1 – Crescimento O pai, ou seu substituto, deve lembrar à mãe, desde o começo, para que ela não se feche na relação com o seu bebê e, conseqüentemente, se esqueça do mundo. Isso acontece com algumas mães; nessas oca- siões, o pai chama a mãe de volta e a ajuda a não fazer do bebê a sua única razão de viver. Primeira infância: lactente (29 dias a 2 anos exclusive) No lactente, ou no período denominado de primeira infância, ocor- rem as maiores e mais rápidas modificações no desenvolvimento da criança, principalmente no tocante ao domínio neuropsicomotor. Em linhas gerais, poderia ser descrito da seguinte forma: o desenvolvi- mento cefálico antecede o caudal, e o proximal antecede o distal (figu- ra 1). Portanto, os braços passam a obedecer ao controle cortical e à orientação visual antes que as pernas. Dessa forma, a criança evolui de brincadeiras com as mãos e a boca para brincadeiras com os pés e a boca – o que lhe permite usar parte de seu próprio corpo como uma experiência de prazer desligada da necessidade. A criança suga o dedo e as mãos não necessariamente porque está com fome, mas sim por- que isso é gostoso e às vezes lhe acalma. Gradativamente, os ritmos de sono, alimentação e excreção vão se estabelecendo a partir da presença e ausência da mãe (alternância): a mãe que ora está presente ora não está; ora fala com o bebê, ora se cala; ora lhe oferece o seio, ora lhe tira, imprime certa coordenação às funções orgânicas do bebê. Ele começa a aprender a diferenciar o dia da noite e a tolerar melhor a distância entre uma mamada e ou- tra. Os intervalos passam a fazer parte de sua vida. Os membros superiores tornam-se gradativamente cada vez mais ágeis para alcançar, segurar e manipular objetos. Primeiro, agarra o objeto com a mão; depois, usa os dedos e finalmente o movimento de pinça fina (polegar e indicador). A partir daí, começa a brincar e utili- zar os objetos para mordê-los e jogá-los fora e assim vai construindo a sua vida psíquica e relações com o mundo. A fala materna dirigida ao bebê tem uma função muito importante. O “mamanhês”, uma forma particular de fala da mãe, apresenta uma série de características específicas, entre elas uma prosódia, uma con- versação cheia de picos e entonações especiais. Esse tipo de lingua- gem produz no bebê uma apetência oral, uma avidez, que o leva mui- O bebê começa a formar a imagem do seu corpo, a partir das atividades exploratórias de seu próprio corpo, através do olhar da mãe. Assim, nesse mundo a dois, vai constituir a noção de si mesmo. Ao brincar, a criança transforma, de forma criativa, aquilo que lhe é estranho e inesperado em experiências que podem ser utilizadas por ela para construir de modo singular o seu mundo e suas relações. PARTE 2 - Desenvolvimento 86 PARTE 1 – Crescimento Época dos jogos simbólicos, ou seja, das brincadeiras do “faz-de- conta”, onde a criança é capaz de fazer-se passar por um outro, encenando um personagem. tas vezes a sugar vigorosamente o peito ou mesmo a chupeta, e que o faz ficar extremamente atento à mãe. Nessa fase, aparece com destaque o lugar do pai, ou de um terceiro, interpondo-se no par mãe-criança, uma vez que tudo aquilo que inte- ressa à mãe também torna-se objeto de interesse da criança. Esse momento da entrada de um terceiro na relação permite que a criança entenda que a mãe não é só dela, nem vive só para ela, existem tam- bém os irmãos, o pai, o trabalho, ou seja, a mãe deseja outras coisas além dela. A partir daí o par mãe-filho começa a se separar, abrindo um espaço que permite à criança construir laços com os outros. Des- cobrir que a mãe não é só dela, possibilita que ela possa buscar não mais o desejo da mãe, mas o seu próprio desejo. A progressão do desenvolvimento vai desde o período em que o bebê está totalmente dependente até o final de seu primeiro ano de vida, quando, o lactente, dá os seus primeiros passos, adquirindo mobilidade e habilidades de manipulação que lhe permitem explorar a maior parte do meio ambiente. Essa capacidade neuromotora está a serviço do “eu” no seu desejo de conhecer e dominar o ambiente que o rodeia. O mesmo acontece com a aquisição da linguagem, que se inicia pelas trocas sonoras, ritmadas e prazerosas com sua mãe e vai evoluindo até a criança poder falar de si mesma e se afirmar dizendo não, fazendo suas escolhas, conhecendo e agindo no seu pequeno universo. Assim, aprendem a caminhar, alcançam objetos desejados, se separam de suas mães, abrem portas e começam a descobrir o mundo. Infância (segunda infância ou pré-escolar – 2 a 6 anos exclusive) Período caracterizado pelo aprimoramento das habilidades até en- tão adquiridas, em especial a capacidade de comunicação, locomoção (andar e correr com segurança, subir escadas, etc.), manuseio de obje- tos e jogos simbólicos. É a idade do explorar e do brincar. Embora essas funções tenham certa autonomia neuromotora, elas não se or- ganizam, dependendo da atividade centralizadora do psiquismo que possibilita suas articulações numa direção determinada por cada su- jeito. Nessa perspectiva, se essa organização psíquica falhar, uma cri- ança pode adquirir, por exemplo, a função da marcha – ou seja, come- çar a andar – mas não saberá para onde se dirigir, pode começar a falar, mas não saberá fazer escolhas, falar de si, fazer planos. A capacidade de elaboração simbólica (falar de si, ser criativo na linguagem, pensar sobre si mesmo) vai gradativamente aumentando O “mamanhês” desempenha papel fundamental no desenvolvimento do bebê, pois propicia a primeira vinculação psíquica do bebê com um outro, nesse caso a mãe. PARTE 2 - Desenvolvimento 87PARTE 1 – Crescimento ao longo desse período. Inicia-se pelo choro, que a mãe entende como demanda; passa pelas fases do balbucio, dos gestos, das pequenas palavras, e vai até a elaboração de frases e criação de suas próprias histórias. Assim, a capacidade de representação é fundamental para a elaboração do pensamento, pois possibilita à criança poder passar a prescindir da presença da mãe e dos objetos, bem como pensar e falar sobre eles na ausência dos mesmos. Na medida em que, mediante a relação estabelecida com a mãe, o psiquismo se constitui, circunscreve-se o campo das diferenças. A criança começa a perceber o que é o “eu” e o que é o “outro”, o que é meu e o que é do outro. Aparecem as interrogações sobre as dife- renças sexuais e sobre a origem dos bebês. Essas são suscitadas pela curiosidade sexual, precursora da curiosidade intelectual, tão im- portante na experiência da aprendizagem. A percepção dos desejos paternos torna-se também motivo de especulação para a criança: “O que meus pais querem que não sou eu?”, “O que eles querem de mim?”, são perguntas norteadoras da organização psíquica (não for- muladas conscientemente). As expectativas que os pais têm a respeito da criança são particu- larmente importantes, uma vez que ela passa a interrogar o desejo de ambos a respeito de si. Deve-se ressaltar que o que prevalece, em grande parte, no funcionamento psíquico das crianças é o desejo incosciente dos pais, muitas vezes contraditório às suas vontades conscientes. Podemos citar como exemplo uma mãe que leva sua filha ao pedia- tra e queixa-se de sua falta de controle esfincteriano: “Ela já tem 4 anos e muitas vezes precisa usar fraldas, porque senão “faz nas cal- ças”. Quando o médico começa a orientá-la sobre que atitude tomar, recomendando inclusive a que não acompanhe a filha ao banheiro, ela exclama: “Ah! Mas ela ainda é tão pequenininha...”. O que vemos, nesse caso, é uma mãe que conscientemente quer que sua filha cresça e se comporte como uma menina de 4 anos, mas seu desejo inconsci- ente é de que ela permaneça “seu bebê”. E é a esse desejo inconscien- te que a menina está respondendo, quando suja a roupa (Ref. 4). Embora o desejo dos pais seja referência para a criança, ele não é um determinante absoluto de sua estrutura psíquica, o que quer dizer que a criança não se assujeita completamente ao desejo de seus pais; podendo se opor ou encontrar outras saídas, fazendo suas próprias escolhas. A criança começa a vivenciar sentimentos bastante ambivalentes em relação aos mais próximos: o pai e a mãe. Ao menor sinal de proibição, faz birras, chora, fica “cheia de vontades”. Tempos difíceis para os pais e para as crianças, porém fundamentais para o seu desenvolvimento, uma vez que a criança está dando grandes passos em direção à independência, experimentando-se como ser único, com PARTE 2 - Desenvolvimento 90 PARTE 1 – Crescimento aparece quase sempre afetada nos casos de crianças com deficiên- cias graves. Esses desencontros abrem a perigosa possibilidade de instalação de transtornos psíquicos graves – ausência de fala, au- sência de contato com os outros, por exemplo –, que se somam ao déficit orgânico. Problemas psíquicos na ausência de lesões orgânicas Quando não existem alterações orgânicas estruturais, podem tam- bém desenvolver-se transtornos psíquicos, efeito das perturbações do diálogo mãe-bebê. Na primeira infância, esses transtornos acabarão por revelar-se em perturbações funcionais, já que o bebê ainda não pode falar e queixar-se de seus incômodos, aflições, ou seja, das alte- rações significativas em sua iniciante vida de relações com seus seme- lhantes. Em primeiro lugar, os problemas se manifestarão em pertur- bações ligadas ao sono e à alimentação, podendo vir a atingir o desen- volvimento motor, diminuir as vocalizações, perturbar o olhar do bebê dirigido à sua mãe. Muitas alergias, febres, aparecimento de cólicas e vômitos podem ter esse caráter psíquico, e é preciso aventar tanto a hipótese orgânica como a psíquica. Nas crianças pequenas, é bom atentar para as diminuições das vocalizações e/ou alterações de investimento que a mãe realiza em relação às mesmas. Pode ocorrer, por exemplo, que a mãe diminua o “mamanhês” e os jogos e brincadeiras com o bebê o qual, por sua vez, pode apresentar dificuldade de sustentação da cabeça na ausência de qualquer problema de ordem neurológica. Se essas diminuições vie- rem acompanhadas da perda do olhar do bebê dirigido à mãe, faz-se necessária uma melhor investigação. Uma intervenção do profissional poderá localizar mais precisamente essas ocorrências e restabelecer o diálogo mãe-bebê. PARTE 2 - Desenvolvimento 91PARTE 1 – Crescimento Roteiro para o acompanhamento do desenvolvimento Uso da Ficha de Acompanhamento do Desenvolvimento O acompanhamento do desenvolvimento deve fazer parte da con- sulta geral da criança. Para isso, não é necessário criar espaços especí- ficos, momentos fora da consulta ou instrumental especializado, em- bora alguns pequenos brinquedos e/ou objetos do consultório pos- sam ser usados para desencadeiar alguma resposta reflexa ou marco do desenvolvimento. Durante a consulta, o profissional deve prestar atenção à forma como a mãe lida com o seu filho, se conversa com ele, se está atenta às suas manifestações. Muitas vezes, principalmente com o primeiro filho, ela fica muito tensa ao procurar o serviço de saúde. Também não é incomum, no período pós-parto, a mulher sentir-se mais angustiada ou mesmo deprimida. Nesses casos, uma conversa amigável e com- preensiva por parte da equipe de saúde fará com que ela se sinta mais confiante e se relacione de forma mais espontânea com o bebê. Entre- tanto, não podemos esquecer que existe a depressão pós-parto, síndrome muitas vezes grave, diante da qual devemos encaminhar a mãe imediatamente para um serviço especializado. Com relação à criança, a seqüência do desenvolvimento pode ser identificada em termos gerais através dos marcos tradicionais. Essas referências constituem uma abordagem sistemática para a observação dos avanços da criança no tempo. A aquisição de de- terminada habilidade baseia-se nas adquiridas previamente e rara- mente pulam-se etapas. Estes marcos constituem a base dos instrumentos de avaliação. Porém, muitos deles carecem de sensibilidade, embora proporcionem um método estruturado para observação do progresso da criança e ajudem na indicação do retardo do desenvolvimento. Entretanto, fo- calizar a atenção apenas em algum “marco” pontual pode resultar na incapacidade de identificar processos estruturais que afetem o grau de desenvolvimento da criança como um todo. PARTE 2 - Desenvolvimento 92 PARTE 1 – Crescimento Do mesmo modo que não se deve valorizar demasiadamente atra- sos isolados de algum(ns) marco(s) de acordo com o instrumento que está sendo utilizado, também não se deve desprezar ou desqualificar a preocupação dos pais quando a mesma não coincide com os achados obtidos pelos instrumentos de avaliação. É fundamental escutar a queixa dos pais e levar em consideração a história clínica e o exame físico da criança, no contexto de um programa contínuo de acompanhamento do crescimento e desenvolvimento. So- mente assim será possível formar-se um quadro completo do crescimen- to e desenvolvimento da criança e da real necessidade de intervenção. Neste manual, propositalmente, não estamos usando a palavra avaliação, uma vez que sugere o uso de escalas ou testes quantitati- vos. Sabemos que um exame neurológico completo e uma avaliação psicológica é muitas vezes necessária, mas, nesses casos, a criança deve ser encaminhada a um especialista ou serviço de referência. O nosso propósito é oferecer uma Ficha de Acompanhamento do Desen- volvimento que sirva como roteiro de observação e identificação de crianças com prováveis problemas de desenvolvimento, incluindo al- guns aspectos psíquicos. Com esse objetivo, a ficha – que vem sendo adotada desde 1984 pelo Ministério da Saúde – foi revista e ampliada. Em sua primeira versão, houve uma escolha por alguns marcos do desenvolvimento das condutas motora (ampla e fina), visual, auditiva e social. Na pre- sente versão, ao lado dos marcos de desenvolvimento maturativo, motor e social, foi acrescentado, em cada faixa correspondente à épo- ca da consulta, um marco ou indicador psíquico. Assim, cada faixa passou a contemplar quatro indicadores: (1) maturativo; (2) psicomotor; (3) social; e (4) psíquico – como pode-se verificar no exem- plo abaixo: A área sombreada corresponde ao período de incidência ou desapa- recimento de determinado marco. Com exceção dos indicadores psí- quicos, os mesmos constam da maioria das escalas correntemente em uso, incluindo Denver (Ref. 1), Sheridan (Ref. 9) e Gesell (Ref. 3). Sua padronização de uso pode ser vista no Anexo 1 do presente manual. PARTE 2 - Desenvolvimento 95PARTE 1 – Crescimento Cartão da Criança Marcos do Desenvolvimento Infantil Ao trazer a criança ao serviço de saúde, a mãe recebe um docu- mento chamado Cartão da Criança. Na maioria das vezes, ela o recebe ao sair da maternidade. Nesse cartão, que sempre deve ficar em poder da mãe, estão anotados dados relativos ao nascimento e primeiros dias de vida do bebê. De um lado, apresenta o gráfico da curva de crescimento; do outro, alguns marcos do desenvolvimento da criança e orientações de cuidados gerais – o que ajuda a família a acompanhar o desenvolvimento do bebê. Adicionalmente, também traz o esquema de vacinação da criança e a mãe deve cuidar em manter esse esquema absolutamente em dia, vacinando seu filho conforme as datas estabelecidas. Após a consulta clínica e avaliação do crescimento e desenvolvi- mento, a equipe de saúde – além de anotar o peso da criança no gráfi- co do crescimento e desenhar sua curva – deve também conversar com a mãe sobre a importância do desenvolvimento e o significado da progressão dos marcos que estão no Cartão da Criança (ver anexo 2). Esses marcos, selecionados a partir da Ficha de Acompanhamento do Desenvolvimento, permitirão ao profissional estabelecer uma conver- sa com a mãe a respeito do desenvolvimento do seu filho e como ela pode, durante os cuidados normais do dia-a-dia com a criança, parti- cipar e estimular o crescimento e desenvolvimento da mesma. PARTE 2 - Desenvolvimento 96 PARTE 1 – Crescimento Referências bibliográficas 1. BONNER, B.; MILLING, L.; WALKER, C.E. Denver Developmental Screening Test. In: JRAYSER, D.; SWEETLAND, R.C. (Editors). Test Critiques. v. 1. Test Corporation of America, 1984. 2. COMISSION INTERSECTORIAL PARA LA PROMOCIÓN DEL DESARROLLO PSICOSOCIAL DE LA INFANCIA. Documento mar- co. Argentina, out. 1996. 3. GESELL, A. A criança de 0 a 5 anos. 4ª edição, São Paulo: Martins Fontes, 1996. 4. INFANTE, D.P. A formação da subjetividade da criança. In: Pedia- tria básica. (no prelo). 5. JORDAN, J. Comunicação pessoal. [S.I.: s.n.], 1985. 6. KNOBLOCK, H.; PASSAMANICK, B. Gesell e Amatruda: psico- logia do desenvolvimento do lactente e criança pequena – bases neuropsicológicas e controversas. São Paulo: Atheneu, 2000. 7. MARCONDES, E. Pediatria básica. 8. ed. São Paulo: Sarvier, 1994. 8. MYERS, R. The twelve Who Survive. Michigan: High/Scope Press, 1995. 9. SHERIDAN, M.D. From birth to five years. England: Nfer-Nel- son, 1985. 10. SIMÕES, C. IBGE. Censos Demográficos e PNADs de 1992 a 1999. 11. SMITH, DW. Growth and its disorders. [S.I.]: WB Saunders Company, 1977. 12. WINNICOTT, D.W. A família e o desenvolvimento individu- al. São Paulo: Martins Fontes, 1997. PARTE 2 - Desenvolvimento 97PARTE 1 – Crescimento ANEXO 1 A N EX O PARTE 2 - Desenvolvimento
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