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Indicadores Basicos Epidemiologia, Notas de estudo de Epidemiologia

Epidemiologia e indicadores de saúde

Tipologia: Notas de estudo

Antes de 2010

Compartilhado em 05/10/2009

vinicius-correa-6
vinicius-correa-6 🇧🇷

4.8

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Baixe Indicadores Basicos Epidemiologia e outras Notas de estudo em PDF para Epidemiologia, somente na Docsity! A palavra “epidemiologia” deriva do grego (epi = sobre; demos = população, povo; logos = estudo). Portanto, em sua etimologia, significa “estudo do que ocorre em uma população”. Para a Associação Internacional de Epidemiologia, criada em 1954, a Epidemiologia tem como objeto o “estudo de fatores que determinam a freqüência e a distribuição das doenças nas coletividades humanas” (ALMEIDA FILHO e ROUQUAYROL, 1992). O Dicionário de Epidemiologia de John Last a define como “o estudo da distribuição e dos determinantes de estados ou eventos relacionados à saúde, em populações específicas, e a aplicação desse estudo para o controle de problemas de saúde”* (LAST, 1995). Com a ampliação de sua abrangência e complexidade, a Epidemiologia, segundo Almeida Filho e Rouquayrol (1992), não é fácil de ser definida. Ainda assim, esses autores ampliam as definições já colocadas, na medida em que a conceituam como a ciência que estuda o processo saúde-doença na sociedade, analisando a distribuição populacional e os fatores determinantes das enfermidades, Capítulo 10 Epidemiologia e Indicadores de Saúde Darli Antônio Soares Selma Maffei de Andrade João José Batista de Campos 183 * Tradução dos autores danos à saúde e eventos associados à saúde coletiva, propondo medidas específicas de prevenção, controle ou erradicação de doenças e fornecendo indicadores que sirvam de suporte ao planejamento, administração e avaliação das ações de saúde. Ou seja, diferentemente da Clínica, que estuda o processo saúde- doença em indivíduos, com o objetivo de tratar e curar casos isolados, a Epidemiologia se preocupa com o processo de ocorrência de doenças, mortes, quaisquer outros agravos ou situações de risco à saúde na comunidade, ou em grupos dessa comunidade, com o objetivo de propor estratégias que melhorem o nível de saúde das pessoas que compõem essa comunidade. Um dos meios para se conhecer como se dá o processo saúde- doença na comunidade é elaborando um diagnóstico comunitário de saúde. O diagnóstico comunitário, evidentemente, difere do diagnóstico clínico em termos de objetivos, informação necessária, plano de ação e estratégia de avaliação (Figura 1). 184 EPIDEMIOLOGIA E INDICADORES DE SAÚDE FIGURA 1 – Diferenças entre o diagnóstico clínico e diagnóstico da comunidade* Fonte: * Adaptado de Vaughan & Morrow(1992). Objetivo Informação necessária Tipo de diagnóstico Plano de ação Avaliação Melhorar o nível de saúde da comunidade Dados sobre a população Doenças existentes Causas de morte Serviços de saúde, etc. DIAGNÓSTICO COMUNITÁRIO Programas de saúde prioritários Mudanças no estado de saúde da população Curar a doença da pessoa Histórica clínica Exame físico Exames complementares DIAGNÓSTICO INDIVIDUAL Tratamento Reabilitação Acompanhamento clínico (melhora/ cura) ↕ Diagnóstico Clínico Diagnóstico Comunitário ↕ 1)na busca de explicações (causas ou fatores de risco) para a ocorrência de doenças, com utilização predominante dos métodos da epidemiologia analítica; 2) nos estudos da situação de saúde (que doenças ocorrem mais na comunidade? Há grupos mais suscetíveis? Há relação com o nível social dessas pessoas? A doença ou agravo ocorre mais em determinado período do dia, ano?); 3) na avaliação de tecnologias, programas ou serviços (houve redução dos casos de doença ou agravo após introdução de um programa? A estratégia de determinado serviço é mais eficaz do que a de outro? A tecnologia “A” fornece mais benefícios do que a tecnologia “B”?); 4) na vigilância epidemiológica (que informação devemos coletar, observar? Que atitudes tomar para prevenir, controlar ou erradicar a doença?). Evidentemente, esses quatro campos não se desenvolveram de forma uniforme na América Latina e mesmo os campos mais usados pelos serviços de saúde (estudos da situação de saúde e vigilância epidemiológica) ainda têm recebido pouca atenção, com pouca possibilidade de interferência nas decisões a respeito da organização dos serviços (GOLDBAUM, 1992; CASTELLANOS, 1994). Não obstante sua importância, este capítulo não tem a finalidade de discutir as causas das dificuldades de utilização da epidemiologia no planejamento e organização de ações e serviços de saúde, mas sim destacar alguns instrumentos que podem ser utilizados no cotidiano dos trabalhadores de saúde, principalmente no que se refere à elaboração de diagnósticos de saúde, um dos campos com maior potencial de ser utilizado nesses serviços. Tanto para estudos da situação de saúde, como para o estabelecimento de ações de vigilância epidemiológica é importante considerar a necessidade de dados (que vão gerar as informações) fidedignos e completos. Esses dados podem ser registrados de forma contínua (como no caso de óbitos, nascimentos, doenças de notificação obrigatória), de forma periódica (recenseamento da população e levantamento do índice CPO – dentes cariados, perdidos 187 BASES DA SAÚDE COLETIVA e obturados – da área de Odontologia – são alguns exemplos) ou podem, ainda, ser levantados de forma ocasional (pesquisas realizadas com fins específicos, como, por exemplo, para conhecer a prevalência da hipertensão arterial ou diabetes em uma comunidade, em determinado momento) (LAURENTI et al., 1987). Os dados de importância para a análise de situação de saúde são inúmeros e de fontes diversas. Poderíamos destacar, por exemplo, os dados sobre a população (número de habitantes, idade, sexo, raça, etc.), os dados sócio-econômicos (renda, ocupação, classe social, tipo de trabalho, condições de moradia e alimentação), os dados ambientais (poluição, abastecimento de água, tratamento de esgoto, coleta e disposição do lixo), os dados sobre serviços de saúde (hospitais, ambulatórios, unidades de saúde, acesso aos serviços), os dados de morbidade (doenças que ocorrem na comunidade) e os eventos vitais (óbitos, nascimentos vivos e mortos, principalmente). Alguns desses dados (morbidade e eventos vitais) são gerados a partir do próprio setor saúde, de forma contínua, constituindo sistemas de informação nacionais, administrados pelo Ministério da Saúde. No Brasil, há, atualmente, cinco grandes bancos de dados nacionais (CARVALHO, 1997), continuamente alimentados: o Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM); o Sistema de Infor- mação sobre Nascidos Vivos (SINASC); o Sistema de Informação sobre Agravos de Notificação (SINAN); o Sistema de Informações Ambulatoriais do Sistema Único de Saúde (SIA/SUS) e o Sistema de Informações Hospitalares do Sistema Único de Saúde(SIH/SUS). É importante considerar que tanto a informação derivada de dados de doenças (morbidade), como de mortalidade, apresentam vantagens e limitações. Como limitação mais importante, de ambas as fontes de dados, poderíamos pensar sobre como esses dados refletem a saúde (ou ausência de saúde) da população que se deseja estudar. É muito conhecido, no meio da saúde, o termo “ponta de iceberg” para referir- se a uma característica desses dados, ou seja, ambos (especialmente a mortalidade) representam apenas uma parcela da população (a “ponta de iceberg”): a que morre ou a que chega ao serviço de saúde e tem o 188 EPIDEMIOLOGIA E INDICADORES DE SAÚDE seu diagnóstico feito e registrado corretamente, como demonstra a Figura 2. 189 Casos conhecidos Ponta do Iceberg Casos assintomáticos Casos sintomáticos que não procuram o serviço de saúde Casos que procuram o serviço de saúde, mas não são diagnosticados Casos diagnosticados, mas não registrados e/ou informados FIGURA 2 – Característica de ponta de "iceberg" dos casos conhecidos de doenças. 1 Causa básica de morte, segundo a Organização Mundial de Saúde (CID-10) é: “(a) a doença ou lesão que iniciou a cadeia de acontecimentos patológicos que conduziram diretamente à morte ou (b) as circunstâncias do acidente ou violência que produziu a lesão fatal “ [grifo nosso]. Entre as vantagens dos dados de mortalidade, sobre os de morbidade, destaca-se a sua maior disponibilidade, a partir do registro obrigatório (por lei) de todos óbitos, para a maioria das países, proporcionando análise de séries históricas (tendência de determinada causa de óbito, por exemplo), além de sua característica de evento que ocorre uma só vez, ao contrário dos episódios de doenças (LAURENTI e MELLO JORGE, 1996; LEBRÃO, 1997). Entre suas limitações, é importante destacar que a informação sobre mortalidade cobre, como já mencionado, apenas uma porção da população doente e uma parcela menor ainda da população total. Além disso, há, geralmente, um longo período de tempo entre o início da doença e a morte, com exceção de algumas doenças infecciosas agudas e de acidentes ou violências. Outro fator limitante é que as estatísticas de mortalidade trabalham, geralmente, como uma única causa de morte (causa básica1), quando, na realidade, a morte é um fenômeno causado por múltiplos fatores. Finalmente, é importante salientar que os diagnósticos de causa de morte dependem de diversos BASES DA SAÚDE COLETIVA Os indicadores de saúde, tradicionalmente, tem sido construídos por meio de números. Em geral, números absolutos de casos de doenças ou mortes não são utilizados para avaliar o nível de saúde, pois não levam em conta o tamanho da população. Dessa forma, os indicadores de saúde são construídos por meio de razões (freqüências relativas), em forma de proporções ou coeficientes. As proporções representam a “fatia da pizza” do total de casos ou mortes, indicando a importância desses casos ou mortes no conjunto total. Os coeficientes (ou taxas) representam o “risco” de determinado evento ocorrer na população (que pode ser a população do país, estado, município, população de nascidos vivos, de mulheres, etc.). Dessa forma, geralmente, o denominador do coeficiente representa a população exposta ao risco de sofrer o evento que está no numerador. Exceções são o coeficiente de mortalidade infantil – CMI – e de mortalidade materna – CMM – para os quais o denominador utilizado (nascidos vivos) é uma estimativa tanto do número de menores de 1 ano, como de gestantes, parturientes e puérperas expostos ao risco do evento óbito. No caso do Coeficiente de Mortalidade Infantil, alguns nascidos vivos do ano anterior não fazem parte do denominador, apesar de ainda terem menos de um ano de vida no ano em estudo dos óbitos. Por exemplo, se uma criança nasceu em 31/12/1998 e morreu em 02/01/1999 (com dois dias) entrará no numerador do CMI de 1999, mas não no denominador. Pressupõe-se que haja uma “compensação” de nascidos vivos e óbitos de um para outro ano, de forma que o CMI é uma boa estimativa do risco de óbito infantil. É preciso destacar, ainda, a diferença entre coeficientes (ou taxas) e índices. Índices não expressam uma probalidade (ou risco) como os coeficientes, pois o que está contido no denominador não está sujeito ao risco de sofrer o evento descrito no numerador (LAURENTI et al., 1987). Assim, a relação telefones/habitantes é um índice, da mesma forma que médicos/habitantes, leitos/habitantes, etc. (os numeradores “telefones”, “médicos” e “leitos” não fazem parte do denominador população). A rigor, portanto, tanto o Coeficiente de 192 EPIDEMIOLOGIA E INDICADORES DE SAÚDE Mortalidade Infantil como Materna não são coeficientes, mas índices. No entanto, o termo “coeficiente” já está consolidado para ambos os indicadores. COEFICIENTES mais utilizados na área da Saúde Os coeficientes mais utilizados na área da saúde baseiam-se em dados sobre doenças (morbidade) e sobre eventos vitais (nascimentos e mortes). • Coeficientes de MORBIDADE (doenças): a) Coeficiente de incidência da doença: representa o risco de ocorrência (casos novos) de uma doença na população. Pode ser calculado por regra de três ou através da seguinte fórmula: 193 casos NOVOS da doença em determinada comunidade e tempo x 10n população da área no mesmo tempo casos PRESENTES da doença em determinada comunidade e tempo x 10n população da área no mesmo tempo Coeficiente de Prevalência = coeficiente de incidência x duração média da doença b) Coeficiente de prevalência da doença: representa o número de casos presentes (novos + antigos) em uma determinada comunidade num período de tempo especificado. É representado por: Para compararmos o risco de ocorrência de doenças entre populações usamos, dessa forma, o coeficiente de incidência, pois este estima o risco de novos casos da doença em uma população. O coeficiente de prevalência é igual ao resultado do coeficiente de incidência multiplicado pela duração média da doença (LILIENFELD e LILIENFELD, 1980). Portanto: BASES DA SAÚDE COLETIVA Da fórmula acima fica evidente que a prevalência, além dos casos novos que acontecem (incidência), é afetada também pela duração da doença, a qual pode diferir entre comunidades, devido a causas ligadas à qualidade da assistência à saúde, acesso aos serviços de saúde, condições nutricionais da população, etc. Assim, quanto maior a duração média da doença, maior será a diferença entre a prevalência e a incidência. A prevalência é ainda afetada por casos que imigram (entram) na comunidade e por casos que saem (emigram), por curas e por óbitos. Dessa maneira, temos como “entrada” na prevalência os casos novos (incidentes) e os imigrados e como “saída” os casos que curam, que morrem e os que emigram (Figura 3). 194 Assim, a prevalência não é uma medida de risco de ocorrência da doença na população, mas pode ser útil para os administradores da área de saúde para o planejamento de recursos necessários (leitos hospitalares, medicamentos, etc.) para o adequado tratamento da doença. Dois tipos de coeficientes de prevalência podem ser utilizados: o coeficiente de prevalência instantânea ou pontual ou momentânea (em um tempo especificado) e o coeficiente de prevalência por período ou EPIDEMIOLOGIA E INDICADORES DE SAÚDE Casos novos Imigração CuraÓbito Emigração Prevalência FIGURA 3 – Representação gráfica das entradas e saídas que compõem a prevalência em determinado período de tempo. Cuidado especial deve ser tomado quando se vai calcular o coeficiente de mortalidade infantil de uma localidade, pois tanto o seu numerador (óbitos de menores de 1 ano), como seu denominador (nascidos vivos) podem apresentar problemas de classificação. Para evitar esses problemas, o primeiro passo é verificar se as definições, citadas pela Organização Mundial de Saúde (1994), estão sendo corretamente seguidas por quem preencheu a declaração de óbito da criança. Estas definições são as seguintes: Nascido vivo: é a expulsão ou extração completa do corpo da mãe, independentemente da duração da gravidez, de um produto de concepção que, depois da separação, respire ou apresente qualquer outro sinal de vida, tal como batimentos do coração, pulsações do cordão umbilical ou movimentos efetivos dos músculos de contração voluntária, estando ou não cortado o cordão umbilical e estando ou não desprendida a placenta. Óbito fetal: é a morte do produto de concepção, antes da expulsão ou da extração completa do corpo da mãe, independentemente da duração da gravidez. Indica o óbito se o feto, depois da separação, não respirar nem apresentar nenhum outro sinal de vida, como batimentos do coração, pulsações do cordão umbilical ou movimentos efetivos dos músculos de contração voluntária. 197 padronizar os coeficientes, tendo como referência uma população padrão (geralmente a mundial, quando se comparam diferentes países, ou nacional, quando se comparam diferentes locais do mesmo país), mas isto não será abordado aqui (a respeito de padronização ver LAURENTI et al., 1987). b) coeficiente de mortalidade infantil (CMI): é uma estimativa do risco que as crianças nascidas vivas tem de morrer antes de completar um ano de idade. É considerado um indicador sensível das condições de vida e saúde de uma comunidade. Pode ser calculado por regra de três ou através da seguinte razão: óbitos de menores de 1 ano em determinada comunidade e ano x 1.000 nascidos vivos na mesma comunidade e ano BASES DA SAÚDE COLETIVA Óbito infantil: é a criança que, nascida viva, morreu em qualquer momento antes de completar um ano de idade. Dessas definições, fica claro que uma criança que nasceu viva, nem que tenha apresentado apenas batimentos do cordão umbilical, e morrido em seguida, deve ser considerada como óbito de menor de 1 ano (óbito infantil) e entrar no cálculo do coeficiente de mortalidade infantil (CMI). Nesse caso, deve ser emitida uma Declaração de Nascido Vivo (DN) e uma Declaração de óbito (DO), indicando que se trata de óbito não fetal, e providenciados os respectivos registros de nascimento e óbito em cartório de registro civil. Caso essa criança tivesse, erroneamente, sido classificada como óbito fetal (natimorto), além de possíveis problemas com relação a transmissão de bens e propriedades (direito civil), ainda teríamos um viés no cálculo do coeficiente de mortalidade infantil e neonatal: o numerador perderia um caso de óbito infantil e o denominador perderia 1 nascido vivo. Isso faria com que o CMI calculado fosse menor do que realmente é (redução artificial, ou enganosa). O exemplo a seguir (Quadro 1) demonstra como o CMI se reduz (artificialmente) à medida que óbitos infantis são classificados de forma errônea como óbitos fetais (natimortos). 198 EPIDEMIOLOGIA E INDICADORES DE SAÚDE Situação Óbitos de menores Nascidos vivos CMI de 1 ano Verdadeira 30 2000 15,0 Situação com classificação 29 1999 14,5 errônea de 1 óbito Situação com classificação 28 1998 14,0 errônea de 2 óbitos QUADRO 1 – Coeficiente de mortalidade infantil segundo diferentes situações O coeficiente de mortalidade infantil pode ainda ser dividido em: - coeficiente de mortalidade neonatal (óbitos de 0 a 27 dias inclusive) em relação ao total de nascidos vivos (por 1000); - coeficiente de mortalidade pós-neonatal ou infantil tardia (óbitos de 28 dias a 364 dias inclusive) em relação ao total de nascidos vivos (por 1000). O coeficiente de mortalidade neonatal pode ainda ser subdividido em coeficiente de mortalidade neonatal precoce (0 a 6 dias inclusive) e coeficiente de mortalidade neonatal tardia (7 a 27 dias). Essa divisão, relacionada à idade da criança quando morreu, deve-se à observação de que no período neonatal predominam as causas ligadas a problemas da gestação e do parto (causas perinatais e anomalias congênitas), e de que, no período pós-neonatal, prevalecem as causas de morte relacionadas ao meio ambiente e às condições de vida e de acesso aos serviços de saúde (doenças infecciosas, pneumonias, diarréia, por exemplo) (LAURENTI et al., 1987). Dessa forma, nos países desenvolvidos, onde a mortalidade infantil é baixa e problemas relacionados ao meio ambiente já se encontram quase totalmente resolvidos, o componente neonatal predomina, enquanto em muitos países pobres ainda prevalece o componente pós-neonatal. A Figura 5 demonstra as divisões referentes aos períodos neonatal e pós-neonatal (infantil tardio). Observamos, ainda, que há o período perinatal, que vai da 22ª semana de gestação até a primeira semana de vida da criança, o qual será abordado adiante. 199 Período Perinatal óbito Infantil Tardio Período Neonatal 2 2 s em an as Fe to c o m + o u - 5 0 0 g ra m as N as ci m en to 7 d ia s 2 8 d ia s 1 an o Gestação Após nascimento FIGURA 5 – Períodos que vão desde a gestação até o primeiro ano de vida de uma criança. BASES DA SAÚDE COLETIVA e) coeficiente de mortalidade por doenças transmissíveis: é uma estimativa do risco da população morrer por doenças infecciosas e parasitárias (tuberculose, tétano, diarréia infecciosa, aids, etc.), classificadas atualmente no Capítulo I da CID-10. Quanto mais elevado o resultado deste coeficiente, piores as condições de vida. É dado pela equação: 202 EPIDEMIOLOGIA E INDICADORES DE SAÚDE óbitos devidos a doenças infecciosas e parasitárias (DIP) x 100.000 população estimada para o meio do ano na mesma área Observamos que o denominar agora passa a ser a população estimada para o meio do ano (01 de julho), que é considerada a melhor estimativa do número de habitantes expostos em todo o ano. Em razão de alterações de doenças nos Capítulos das várias revisões da CID, é necessário tomar cuidado em análises de séries temporais. Por exemplo, na CID-9 a Aids era enquadrada no Capítulo III - “Doenças das glândulas endócrinas, da nutrição e do metabolismo e transtornos imunitários” (código 279.1). Na CID-10, em vigor no Brasil desde 1996, essa doença mudou para o Capítulo I – “Doenças Infecciosas e Parasitárias” (GRASSI e LAURENTI, 1998). Dessa forma, se formos analisar o coeficiente de mortalidade por doenças transmissíveis no Paraná desde 1980, por exemplo, devemos ter em mente que a partir de 1996 poderá ocorrer um aumento artificial deste coeficiente, simplesmente porque mais uma doença (a aids) passou a fazer parte do agrupamento de causas infecciosas/parasitárias (Capítulo I da CID-10). Cálculos de coeficientes por outras causas específicas ou por capítulos da CID (por exemplo, causas externas, infarto do miocárdio, doenças cerebrovasculares, acidentes de trânsito, etc.) também são possíveis, usando o mesmo raciocínio e padrão de equação utilizado para o cálculo do coeficiente de mortalidade por doenças transmissíveis. Observar a qualidade da informação específica, na análise do ano, ou, principalmente, em séries temporais, é indispensável, pois muitas vezes essas causas específicas não vêm sendo adequadamente descritas nas declarações de óbito, o que leva a coeficientes subestimados. • Coeficientes de NATALIDADE Os principais coeficientes que medem a natalidade (nascimentos) de uma população são o coeficiente de natalidade e o de fecundidade. Enquanto o coeficiente de natalidade está relacionado com o tamanho da população, o de fecundidade está relacionado com o número de mulheres em idade fértil. Por isso, é comum a fecundidade ser expressa também em média de filhos por mulher (por exemplo: 2,5 filhos por mulher). O coeficiente de natalidade, portanto, pode ser calculado pela seguinte equação (ou também por regra de três): 203 Nascidos vivos em determinada área e período x 1.000 população da mesma área, no meio período Nascidos vivos em determinada área e período x 1.000 mulheres de 15 a 49 anos da mesma área, no meio do período O coeficiente de fecundidade, como está relacionado à população feminina em idade fértil, é dado pela fórmula (ou calculado por regra de três): PROPORÇÕES mais utilizadas na área de saúde Como já referido, as proporções não estimam o risco do evento em uma dada população, porém são mais fáceis de serem calculadas, pois não necessitam de denominadores, como o número de habitantes, para o seu cálculo. Além disso são mais fáceis de se compreender, pois seus resultados são sempre em percentuais (a cada cem pessoas, tantas morrem por doenças do aparelho circulatório, por exemplo). • Mortalidade proporcional por idade: é um indicador muito útil e fácil de se calcular. Com base no total de óbitos, fazemos uma regra de três, calculando qual a proporção de óbitos na faixa etária de 20 a 29 anos ou de menores de 1 ano, por exemplo. Duas proporções, em relação à mortalidade por idade, são mais freqüentemente utilizadas: a mortalidade infantil proporcional (proporção de óbitos de menores de 1 ano em relação ao total de óbitos) e a mortalidade proporcional de 50 anos ou mais, também BASES DA SAÚDE COLETIVA conhecida como Indicador de Swaroop e Uemura ou Razão de Mortalidade Proporcional (proporção de óbitos de pessoas que morreram com 50 anos ou mais de idade em relação ao total de óbitos) (LAURENTI et al., 1987). Evidentemente, quanto piores as condições de vida e de saúde, maior a mortalidade infantil proporcional e menor o valor do Indicador de Swaroop e Uemura, pois grande parte das pessoas poderá morrer antes de chegar aos 50 anos de vida. Nos países ricos, ao contrário, a maioria da população morre com mais de 50 anos; assim, o Indicador de Swaroop e Uemura será mais alto (em torno de 85%). A mortalidade proporcional por idade também pode ser representada em gráfico, sendo conhecida como Curva de Mortalidade Proporcional (ou Curva de Nelson de Moraes, que foi quem a propôs). Para isso, primeiro devemos calcular todos os percentuais correspondentes às seguintes faixas etárias: menor de 1 ano, de 1 a 4 anos, de 5 a 19 anos, de 20 a 49 anos e de 50 anos e mais (a soma de todos os percentuais dessas faixas etárias deve dar 100%). A seguir, colocamos esses valores (percentuais) no gráfico, como mostra a Figura 6, que também descreve os 4 tipos de curvas (nível de 204 EPIDEMIOLOGIA E INDICADORES DE SAÚDE Tipo I - Nível de saúde muito baixo Tipo III - Nível de saúde regular % 30 40 10 0 <1 1 a 4 5 a 19 20 a 49 50 e mais % 2 Idade (em anos) <1 1 a 4 5 a 19 20 a 49 50 e mais % 30 20 10 0 Idade (em anos) Tipo II - Nível de saúde baixo Tipo IV - Nível de saúde elevado <1 1 a 4 5 a 19 20 a 49 50 e mais % 30 20 10 0 Idade (em anos) <1 1 a 4 5 a 19 20 a 49 50 e mais % 40 30 20 10 0 Idade (em anos) FIGURA 6 – Curvas de mortalidade proporcional por idades, em diferentes situações de saúde (extraído de LAURENTI et al., 1987). Para finalizar, deve-se considerar que os indicadores de medidas do nível de saúde baseiam-se em números. Números, entretanto, que representam pessoas que vivem em determinada comunidade, que nasceram, adoeceram ou morreram. Além de servirem para avaliar o nível de saúde de uma comunidade, esses indicadores medem, indiretamente, seu nível de vida (condições de moradia, nutrição, etc.). O Quadro 3 ilustra essa afirmação, ao apresentar alguns indicadores de saúde para duas regiões administrativas do Brasil, evidenciando que os valores desses indicadores refletem diferenças nas condições de vida dessas populações. A Região Sul, para os indicadores selecionados, apresentou melhor perfil, condizendo com sua realidade socioeconômica mais favorável do que a da Região Nordeste. 207 Indicadores Região Sul Região Nordeste Coeficiente de mortalidade 24,0 por 1000 58,3 por 1000 infantil nascidos vivos nascidos vivos Coeficiente de natalidade 19,3 por 1000 habitantes 25,0 por 1000 habitantes Taxa de nascidos vivos de 21,2% 25,9% mães adolescentes Mortalidade proporcional 4,5% 7,8% por doenças infecciosas e parasitárias Mortalidade proporcional 58% 53% de 60 anos ou mais QUADRO 3 – Alguns indicadores de saúde para as Regiões Sul e Nordeste do Brasil, em 1997. Fonte: BRASIL, 2000 (IDB-98). É importante ressaltar, ainda, que os indicadores de saúde refletem “médias” do que está acontecendo em uma população. Por exemplo, a taxa de baixo peso ao nascer (< 2500 gramas) dos nascidos vivos residentes em Londrina, em 1997, foi de 7,5% (ou seja, de cada 100 crianças nascidas vivas, em média, 7,5 nasciam com peso baixo). No entanto, ao analisar a taxa de baixo peso nas áreas de abrangência das Unidades Básicas de Saúde da zona urbana, esse valor variou de 1,1% (cerca de 1 criança com baixo peso para cada 100 nascidas) até 12,2% (SPECIAN et al., 1998). BASES DA SAÚDE COLETIVA Dessa forma, é indispensável considerar que um indicador “médio” pode estar, na realidade, camuflando importantes desigualdades no interior dessas populações e outras formas de “medir” saúde (como as entrevistas com lideranças comunitárias, a observação da realidade, a desagregação dos indicadores em níveis geográficos menores) também devem ser buscadas, simultaneamente à análise desses indicadores de saúde tradicionais. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALMEIDA FILHO, N.; ROUQUAYROL, M.Z. Introdução à epidemiologia moderna. 2. ed. 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Informe Epidemiológico do SUS, Brasília, ano VI, n. 4, p. 7-46, out./dez. 1997. 208 EPIDEMIOLOGIA E INDICADORES DE SAÚDE CASTELLANOS, P.L. A epidemiologia e a organização dos sistemas de saúde. In: ROUQUAYROL, M.Z. (Org.). Epidemiologia & Saúde.4.ed. Rio de Janeiro: Medsi, 1994. p.477-84. GOLDBAUM, M. Epidemiologia e serviços de saúde. Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 12, Supl. 2, p.95-9, 1996. GRASSI, P.R.; LAURENTI, R. Implicações da introdução da 10ª revisão da Classificação Internacional de Doenças na análise de tendência da mortalidade por causas. Informe Epidemiológico do SUS, ano VII, n. 3, p. 43-7, jul./set. 1998. HANSLUWKA, H.E. Measuring the health status of a population: current state of the art. Population Bulletin of the United Nations, Genebra, n. 23/24, p. 56-75, 1987. KERR-PONTES, L.R.; ROUQUAYROL, M.Z. A medida da saúde coletiva. In: ROUQUAYROL, M.Z., ALMEIDA FILHO, N. Epidemiologia & Saúde. 5. ed. Rio de Janeiro: Medsi, 1999. LAST, J.M. 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