Docsity
Docsity

Prepare-se para as provas
Prepare-se para as provas

Estude fácil! Tem muito documento disponível na Docsity


Ganhe pontos para baixar
Ganhe pontos para baixar

Ganhe pontos ajudando outros esrudantes ou compre um plano Premium


Guias e Dicas
Guias e Dicas

Os teoremas de Pappus e de Pascal, Notas de estudo de Matemática

Pappus e Pascal

Tipologia: Notas de estudo

2010

Compartilhado em 10/12/2010

pedro-miranda-9
pedro-miranda-9 🇧🇷

4.6

(22)

148 documentos

Pré-visualização parcial do texto

Baixe Os teoremas de Pappus e de Pascal e outras Notas de estudo em PDF para Matemática, somente na Docsity! Os teoremas de Pappus e de Pascal Gabriel de Oliveira Martins 1 Conteúdo 1 Introdução: O espaço afim e as afinidades 3 2 O espaço projetivo 5 2.1 A construção do espaço projetivo . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5 2.2 Dualidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 8 2.3 Transformações projetivas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 10 2.4 Homografias e a reta projetiva . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11 2.5 A razão dupla e o teorema de Pappus . . . . . . . . . . . . . . . 13 3 Curvas algébricas planas projetivas 17 3.1 Cônicas afins e as cônicas projetivas . . . . . . . . . . . . . . . . 17 3.2 Cônicas duais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19 3.3 A razão dupla em cônicas e o teorema de Pascal . . . . . . . . . 20 4 A álgebra na geometria 25 4.1 A resultante de dois polinômios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25 4.2 Polinômios homogêneos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 27 4.3 Sistemas de curvas algébricas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 28 4.4 O Teorema de Bézout e novas demonstrações para os mesmos teoremas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29 5 Apêndice: Recortes afins 34 6 Bibliografia 35 2 2 O espaço projetivo 2.1 A construção do espaço projetivo Nessa parte do texto veremos algumas definições e construções geométricas do espaço que estudaremos. Essa introdução é essencial no estudo da geometria tanto projetiva quanto algébrica, pois nos dará noções intuitivas dos espaços sobre os quais trabalhamos. Sem ela a teoria seguinte poderia se tornar bastante artificial. O espaço projetivo de dimensão n sobre um corpo k, denotado Pn(k), é construido da seguinte maneira. Definimos sobre kn+1 \ {0} a seguinte relação de equivalência: Para qualquer λ ∈ k∗ (x0, x1, ..., xn) ∼ (λx0, λx1, ..., λxn) O conjunto cujo os elementos são as classes de equivalência dadas por essa relação é o espaço projetivo de dimensão n, i.e. Pn(k) = (kn+1 \ {0})/ ∼. Um espaço projetivo de dimensão 1 é chamado de reta projetiva e um de dimensão 2 de plano projetivo. Além disso em geral omitimos sobre qual corpo esta- mos trabalhando, a não ser que isso seja especialmente relevante na situação, e escrevemos apenas Pn. Veja também que dada uma base em kn+1, conseguimos induzir um sistema de coordenadas em Pn (x0, x1, ..., xn) 7→ [x0 : x1 : ... : xn] Chamamos esse sistema de coordenadas de coordenadas homogêneas e é fácil notar que escrevendo os elementos dessa forma, para qualquer λ ∈ k∗ [x0 : x1 : ... : xn] = [λx0 : λx1 : ... : λxn] Outra propriedade importante desse sistema de coordenadas é que não ex- istem pontos em Pn com todas as coordenadas nulas. Há várias formas de “enxergar” o espaço Pn, vejamos o caso P2(R) por ex- emplo (que é o caso mais interessante que conseguimos desenhar). Podemos enxergar cada elemento desse espaço como uma reta que passa pela origem em R3 (dois pontos em R3 \ {0} estão numa mesma reta desse tipo se e somente pertencem à mesma classe de equivalência). Continuando nessa linha de pen- samento podemos observar também que uma reta desse tipo intercepta S2, a esfera unitária, em exatamente dois pontos. Portanto podemos olhar apenas para o hemisfério superior de S2. 5 Todos as retas que não pertencem ao plano z = 0 estão representadas unicamente nesse hemisfério, as outras são representadas por dois pontos que chamamos de antipodais, no “equador” de S2. Para tentar compreender o formato do plano projetivo podemos imaginar a “colagem” desses pontos an- tipodais, essa é uma imagem que não pode ser realizada em três dimensões. Isso nos deixa numa situação muito boa para introduzir as retas projetivas imersas no plano projetivo. Uma reta em P2 é um conjunto do tipo ` = {[x0 : x1 : x2] ∈ P2 | a0x0 + a1x1 + a2x2 = 0, a0, a1, a2 ∈ k} Com ao menos um ai 6= 0. Ou seja, olhando P2(R) da forma que estamos fazendo, uma reta em P2(R) será a interseção de um plano que passa pela origem com S2 (na verdade a classe de equivalência determinada por esse ćırculo). Observe pelo desenho que duas retas em P2 sempre se interceptam, vamos provar esse teorema mais à frente quando falarmos sobre dualidade. Mudando um pouco de perspectiva, consideremos agora o plano z = 1. 6 Cada elemento de P2(R) está unicamente representado nesse plano, menos, de novo, os elementos equivalentes às retas em z = 0. Essa representação é extremamente interessante pois nos permite observar que podemos “recortar” do nosso plano projetivo um plano afim e os pontos que sobram, nesse caso o conjunto {[x : y : z] ∈ P2(R) | [x : y : 0], x, y ∈ R} É na verdade uma reta projetiva (a reta z = 0), a qual chamamos de reta no infinito. Isso é, podemos enxergar nosso plano projetivo como a união de um plano afim e um reta projetiva! P2(R) = A2(R) ∪ P1(R) Além disso, podemos olhar agora nosso plano projetivo como um plano afim adjuntado de certos pontos, os quais formarão uma reta projetiva e que, como veremos adiante, serão correspondentes às direções assintóticas das retas desse plano afim. Vamos elaborar esse racioćınio. Voltando a escrever as coordenadas em P2 como [x0 : x1 : x2], seja `∞ a reta x0 = 0, podemos definir uma bijeção de P2(k) \ `∞ em A2(k) da seguinte forma φ : P2 \ `∞ → A2 [x0 : x1 : x2] 7→ ( x1 x0 , x2x0 ) Perceba que essa função está bem definida em P2 \ `∞, pois nesse domı́nio x0 6= 0, e dois representantes da mesma classe de equivalência no plano projetivo têm a mesma imagem, além disso é bijetiva e é fácil saber sua inversa (você consegue ver?). O próximo teorema nos da uma outra boa razão para chamar a reta `∞ de reta no infinito. Teorema 2.1.1. Duas retas em A2 são paralelas se e somente se interceptam a reta no infinito no mesmo ponto. Demonstração: Vamos considerar a função φ e duas retas paralelas em A2: `1 = {x ∈ A2 | a1x1 + a2x2 + b = 0} `2 = {x ∈ A2 | a1x1 + a2x2 + c = 0} Com ao menos um ai 6= 0. Perceba que se y0 6= 0 é um número qualquer, chamando xiy0 = yi (pode parecer que foi “tirado da cartola”, mas a ideia é que φ(y0 : y1 : y2) = (x1, x2)) a1y1 + a2y2 + by0 = 0⇔ a1x1 + a2x2 + b = 0 Isso nos mostra que na verdade a pré imagem das retas afins `1, `2 por φ são as retas projetivas 7 2.3 Transformações projetivas As transformações projetivas são os isomorfismos entre os espaços projetivos, assim como as transformações lineares inverśıveis para os espaços vetoriais. Ba- sicamente uma transformação projetiva é uma função linear nas coordenadas, i.e. T : Pn → Pn [x0 : ... : xn] 7→ [ ∑ a0ixi : ... : ∑ anixi] Tal que det  a00 a01 . . . a0n a10 a11 . . . a1n ... ... ... an0 an1 . . . ann  6= 0 Como você já percebeu podemos representar uma transformação desse tipo por uma matriz mas note que essa representação não é única, por exemplo, se T pode ser representada por uma matriz A ela também é representada pela matriz λA com λ ∈ k∗. Na verdade as transformações projetivas formam um grupo (é fácil ver que elas têm inversa pela condição que colocamos no determinante) e o grupo das transformações projetivas de Pn(k) denotado PGLn(k) é na ver- dade isomorfo ao grupo das matrizes inverśıveis de ordem n + 1, GLn+1(k), quocientado pelo seu centro Z = {λI | λ ∈ k∗} sendo I a identidade. PGLn ∼= GLn+1 Z O próximo teorema é extremamente importante. Antes do enunciado pre- cisamos de uma definição. Dizemos que n + 2 pontos, pi i ∈ {0, ..., n + 1}, em Pn estão em posição geral se existe uma base β = {b1, ..., bn+1} em kn+1 tal que a seguinte condição é satisfeita. P (b1) = p1 P (b2) = p2 ... P (bn+1) = pn+1 P (b1 + b2 + · · ·+ bn+1) = p0 Denotando por P (v) a classe de equivalência de um vetor v ∈ kn+1. Teorema 2.3.1. Sejam pi ∈ Pn com i ∈ {1, ..., n+ 2} em posição geral e p′i da mesma forma, existe uma única transformação projetiva T tal que T (pi) = p ′ i Demonstração: Provarei o caso para n = 2 e é fácil ver como a prova se generaliza. Vale notar que como essas transformações formam um grupo posso assumir p′1 = e1 = [1 : 0 : 0], 10 p′2 = e2 = [0 : 1 : 0], p ′ 3 = e3 = [0 : 0 : 1] e p ′ 4 = e4 = [1 : 1 : 1] (pois se existe f tal que f(pi) = ei e g tal que g(p ′ i) = ei então g −1 ◦ f(pi) = p′i como queriamos, a unicidade também é imediata, segue pelas propriedades de um grupo). Vamos escrever pi = [pi1 : pi2 : pi3]. Estamos procurando aij ’s que sat- isfaçam as quatro condições a11 a12 a13a21 a22 a23 a31 a32 a33  p11p12 p13  =  µ0 0   a11 a12 a13a21 a22 a23 a31 a32 a33  p21p22 p23  =  0λ 0   a11 a12 a13a21 a22 a23 a31 a32 a33  p31p32 p33  =  00 ν   a11 a12 a13a21 a22 a23 a31 a32 a33  p41p42 p43  =  ζζ ζ  Isso nos da 12 equações e 13 incógnitas, mas não há problema, esse grau de liberdade (de uma dimensão) se justifica pois se uma matriz A satisfaz essas condições, então λA com λ ∈ k∗ também as satisfaz, como eu havia dito antes (esse grau de liberdade some quando quocientamos GL3 pelo seu centro). A solução então é um único elemento de PGL2.  Obs: Estamos fazendo essas contas em k3 e considerando os elementos de P2 como as classes de equivalência das retas que passam pela origem. Essa observação é importante para evidenciar que P2 não possui nenhuma estrutura algébrica expĺıcita, não podemos somar dois pontos nem multiplicá-los por es- calares como costumamos fazer no vaso vetorial. 2.4 Homografias e a reta projetiva Vamos nos voltar para o caso particular da reta projetiva e suas transformações projetivas as quais chamamos de homografias. Esse caso é particularmente interessante pois em geometria nos interessamos, por exemplo, nas interseções entre retas e construções geométricas que podemos fazer com elas. Procurar transformações projetivas entre elas é uma boa ajuda para provar teoremas como veremos à frente. Pensemos um pouco sobre os recortes afins da reta. Repare que um hiper- plano em P1 é apenas um ponto e que A1 = k, é comum chamar o ponto no infinito da reta projetiva de ∞ e escrever P1 = A1 ∪∞ = k ∪∞ 11 Isso vai nos ajudar, pois se quisermos observar o comportamento de uma homografia h : P1 → P1 restrita a um aberto afim (isso é, desconsiderando apenas um ponto) essa homografia é simplesmente uma função de uma variável h̃ : k → k que já é um tipo bem mais simples de função para se trabalhar. Vamos agora saber que tipos de funções essas restrições são. Sabemos que uma homografia é uma função do tipo h : P1 → P1 [x0 : x1] 7→ [dx0 + cx1 : bx0 + ax1] Com ad−bc 6= 0 (a ordem dos coeficientes parece estranha mas no final você vai entender por que eu escrevi assim). Se nomearmos [0 : 1] = ∞, z = x1/x0 temos em P1 \∞ [x0 : x1] = [1 : z] 7→ h(1 : z) = [1 : az+bcz+d ] Isso pode gerar divisões por zero, mas vamos fazer uma convenção de que 1 0 = ∞ (isso é [1 : 1 0 ] = [0 : 1]) e que λ∞ = ∞ ∀λ ∈ k ∗ (isso vem de que [0 : λ] = [0 : 1]). Além disso se identificarmos k = P1 \ ∞ e notarmos também que h(0 : 1) = [c : a] = [1 : a/c], podemos escrever h : k ∪∞ → k ∪∞ z 7→ az+bcz+d ∞ 7→ ac Note (ou verifique se estiver com paciência) que essa função está bem definida. Esse é o resultado que queriamos, as homografias quando restritas a k são funções do tipo az+bcz+d . Vamos usar esse resultado agora para provar um teo- rema. Teorema 2.4.1. Sejam `1 e `2 duas retas em P2, seja s o ponto onde elas se interceptam e o um ponto qualquer em nenhuma das retas. A transformação que leva um ponto p ∈ `1 em um ponto q ∈ `2 dado por q = op ∩ `2 é uma homografia. 12 h : k ∪∞ → k ∪∞ y 7→ y ∞ 7→ ∞ Que é uma homografia. (Nossa transformação toma uma reta y = µ e a leva na altura µ onde ela intercepta o eixo y).  Corolário 2.5.2. Sejam a1,a2,a3 e a4 quatro pontos em uma reta ` em P2. Se- jam m e n dois pontos que não estão nessa reta. Então [ma1,ma2,ma3,ma4] = [na1, na2, na3, na4]. E finalmente vamos utilizar nossa teoria para provar um dos teoremas prin- cipais. Teorema 2.5.3 (de Pappus). Sejam `1 e `2 duas retas em P2 e s = `1 ∩ `2. Sejam p1, p2, p3 ∈ `1 três pontos distintos e diferentes de s e q1, q2, q3 ∈ `2 três pontos satisfazendo a mesma condição. Então os pontos a1 = p1q2 ∩ p2q1, a2 = p1q3 ∩ p3q1 e a3 = p2q3 ∩ p3q2 são colineares. Demonstração: Seja a′2 = a1a3∩q1p3. Vamos mostrar que a′2 = a2, logo teremos a2 ∈ a1a3 e isso será suficiente para provar o teorema. Vamos nomear os pontos b1 = p2q3∩q1p3 e b2 = q1p2 ∩ q2p3, pois vamos usá-los na prova. Nosso esquema fica como na figura abaixo. 15 Basta notar agora que [q1, b1, p3, a2] q3 =̂[s, p2, p3, p1] q2 =̂[q1, p2, b2, a1] a3 =̂[q1, b1, p3, a ′ 2] E isso implica a2 = a ′ 2 como queŕıamos.  16 3 Curvas algébricas planas projetivas A partir de agora vamos nos focar em P2, vamos também fixar nosso corpo base k como R ou C. Podemos definir sobre esse plano objetos um pouco mais complexos que retas, que chamamos de curvas algébricas projetivas. Uma curva é um conjunto dado da seguinte maneira. C = {x ∈ P2 | F (x0, x1, x2) = 0} Onde F é um polinômio homogêneo em k[x0, x1, x2] (se você não sabe o que é um polinômio homogêneo veja a seção 4.2.). Se n é o grau de F dizemos também que a curva C é de grau n. Note que precisamos que F seja homogêneo para que esse conjunto esteja bem definido, pois dessa forma F (λx0, λx1, λx2) = λnF (x0, x1, x2) = 0, para todo λ ∈ k, onde n é o grau de F . As curvas que realmente estudaremos são as cônicas, as curvas de grau dois. Para enxergar uma cônica irredut́ıvel (i.e. dada por um polinômio irredut́ıvel) basta notar que ela define um cone em k3 e tomando a relação de equivalência do plano projetivo ela se parecerá, ao menos topologicamente, com um ćırculo, que é o que estamos acostumados a entender por cônicas. (Fato “curioso”: esse cone na verdade é o cone de isotropia da forma quadrática que define a cônica.) As redut́ıveis serão produtos de dois polinômios homogêneos de grau um, ou seja serão dois planos que passam pela origem em k3 i.e. duas retas em P2. 3.1 Cônicas afins e as cônicas projetivas Como observamos todas as cônicas projetivas irredut́ıveis se parecem com ćırculos, enquanto, como sabemos, as cônicas afins irredut́ıveis eram classificadas em três 17 F−1(0) ⊂ R3. Isso é, utilizando, por exemplo, a expansão na fórmula de Taylor do nosso polinômio, teremos que a equação de Tp, a reta tangente no ponto p = [p0 : p1 : p2], será. Tp : ∂F∂x0 (p)x0 + ∂F ∂x1 (p)x1 + ∂F ∂x2 (p)x2 Não se esqueça que F (p) = 0. Note que essa reta está bem definida, pois se dois ponto x, y ∈ R3 são tais que x = µy para algum µ ∈ R, então Tx = Ty. Essa conta nos diz algo muito bom. A função φ que toma um p ∈ P2 e o leva em Tp ∈ (P2)∗ é dada por φ : P2 → (P2)∗ x = [x0 : x1 : x2] 7→ [ ∂F ∂x0 (x) : ∂F∂x1 (x) : ∂F ∂x2 (x) ] E é portanto uma transformação projetiva (pois a derivada parcial de um polinômio homogêneo de grau dois em relação a uma de suas variáveis é um polinômio, também homogêneo, de grau um). Além disso perceba (você não precisará fazer contas para ver isso) que a cônica dual de uma cônica irredut́ıvel também é irredut́ıvel. (Dica: para isso note que a equação da cônica dual será dada por F (φ−1(x0, x1, x2)) = 0.) Muitas das coisas que eu disse nesse texto se generalizam para curvas planas de grau maior mas nesse texto realmente estamos mais interessados nas pro- priedades das cônicas, que são mais fortes. Por exemplo, não é verdade que dada uma curva sua curva dual tem o mesmo grau que a curva inicial. Além disso as cônicas também possuem um invariante projetivo muito importante que é a razão dupla (o mesmo invariante que mostramos existir para as retas). 3.3 A razão dupla em cônicas e o teorema de Pascal Seja C uma cônica em P2 e m ∈ C um ponto da cônica. Considere o conjunto das retas que passam por m, lembre-se que isso é uma reta que chamaremos de m∗ no espaço (P2)∗. Cada ponto m ∈ C define um mapa πm : C → m∗, definido da seguinte maneira, πm(m) é a reta tangente à conica em m e para n ∈ C , n 6= m, πm(n) = mn. 20 Proposição 3.3.1. Para qualquer ponto m ∈ C o mapa πm é uma bijeção. Mais que isso se m e n são dois pontos em C o mapa πn ◦ π−1m : m∗ → n∗ É uma homografia. Demonstração: Que πm é uma bijeção ficará claro durante a demonstração. Sem = n, πn◦π−1m = id que é uma homografia, caso contrário escolhamos a reta mn como a reta no infinito. Retirando a reta no infinito obtemos uma hipérbole C̃ em A2, sejam `1 e `2 suas duas retas assintóticas, suponha também sem perda de generalidade que `1 ∈ m∗ e `2 ∈ n∗. Criamos um sistema de coordenadas da seguinte maneira. (0, 0) = `1 ∩ `2, (1, 0) ∈ `1 \ {(0, 0)} e (0, 1) ∈ `2 \ {(0, 0)}. As retas r ∈ m∗ são da forma r : y = µ para algum µ ∈ k∗ (todas essas retas incerptam a reta no infinito em m logo são paralelas ao eixo x). Pelo mesmo motivo as retas s ∈ n∗ são da forma s : x = µ. Nossa hipérbole nessa base se escreve como C̃ : λxy = 1, para algum λ ∈ k∗. 21 Nossa transformação então é dada pela fórmula πn ◦ π−1m : k ∪∞ → k ∪∞ z 7→ 1λz Que é de fato uma homografia.  Podemos então definir a razão dupla entre quatro pontos de uma cônica da seguinte maneira. Se m1,m2,m3,m4 ∈ C são 4 pontos distintos, dado um ponto n ∈ C qualquer definimos. [m1,m2,m3,m4] = [nm1, nm2, nm3, nm4] De acordo com a proposição que acabamos de provar essa razão dupla está bem definida, i.e. não depende da escolha do ponto n. E agora ao teorema principal. Teorema 3.3.1 (de Pascal). Seja C uma cônica irredut́ıvel e sejam a,b,c,d,e e f , seis pontos distintos nessa cônica. Então os pontos ab ∩ de, bc ∩ ef e cd ∩ fa são colineares. (Se organizarmos os pontos de forma consecutiva esses pontos são os pontos de interseção dos lados opostos do hexágono determinado por a,b,c,d,e e f , mas o teorema não exige nada a respeito da disposição dos pontos). 22 4 A álgebra na geometria A partir de agora vamos tentar provar os dois teoremas que já provamos (de Pappus e de Pascal) utilizando argumentos mais algébricos. Faremos isso ex- plorando propriedades dos polinômios que definem as nossas curvas. 4.1 A resultante de dois polinômios Vamos estudar agora o conceito da resultante de dois polinômios. Essa técnica nos ajudará a tratar problemas de interseções entre curvas de forma mais algébrica. Daqui em diante k representará um corpo qualquer, apesar de que muitos resultados valem também em anéis não vamos nos preocupar com isso, além disso ∂f representará o grau do polinômio f . Lema 4.1.1. Sejam f, g dois polinômios em k[x]: f = a0 + a1x+ a2x 2 + · · ·+ anxn an 6= 0 g = b0 + b1x+ b2x 2 + · · ·+ bmxm bm 6= 0 f e g tem um fator não constante comum se e só se existem polinômios ϕ,ψ ∈ k[x] com ∂ϕ < n e ∂ψ < m tal que ψf = ϕg Demonstração: (⇒) Se f e g possuem um fator não constante h. Então f = hϕ, g = hψ e ψf = ϕg. (⇐) Temos que ψf = ϕg. Fatore g em um produto de polinômios irredut́ıveis. Eles precisam aparecer na fatoração de ψf , como ∂ψ < ∂g, eles não podem ser todos fatores de ψ, logo f e g possuem um fator não constante comum.  Teorema 4.1.1. Dois polinômios f e g possuem um fator não constante co- mum se e só se: R(f, g) = ∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣ a0 a1 ......... an a0 ......... an−1 an ......... ......... ...... a0 ..... ......... ...... an b0 b1 ......... bm ... ......... .......... ...... b0 ..... .......... ...... bm ∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣ = 0 Sendo as m primeiras linhas de a’s, as n últimas de b’s com as linhas preenchi- das de zeros. R(f, g) é chamada a resultante dos polinômios f e g. Demonstração: (⇒) Suponha que f e g tenham um fator não constante comum. Então e- 25 xistem: ϕ = α1 + α2x+ · · ·+ αnxn−1 ψ = β1 + β2x+ · · ·+ βmxm−1 Onde pelo menos um αi 6= 0 e um βi 6= 0. Logo como ψf = ϕg: a0β1 = b0α1 a1β1 + a0β2 = b1α1 + b0α2 ...... ... ...... anβm = bmαn Que é um sistema homogêneo de equações lineares nas m+n variáveis β1, ..., βm, α1, ..., αn, o qual sabemos que possui uma solução não trivial (dada por ψ e ϕ). Logo o determinante da matriz de coeficientes (que é a R(f, g) que t́ınhamos) é igual a zero. (⇐) Para a rećıproca, basta notar que se R(f, g) = 0, nosso sistema possui uma solução não trivial, i.e. com ao menos um αi ou βi diferente de zero. Porém a igualdade ψf = ϕg força tanto um αi quanto um βi a serem diferentes de zero.  A utilização da resultante pode ser estendida para polinômios em mais de uma indeterminada de forma natural. Basta olhar um polinômio f ∈ k[x1, x2, ..., xr] como um polinômio em k[x1, ..., xr−1][xr] e fazermos a resultante em relação à última variável. Ou seja dados dois polinômios f, g ∈ k[x1, x2, ..., xr]: f = A0 +A1xr +A2x 2 r + · · ·+Anxnr An 6= 0 g = B0 +B1xr +B2x 2 r + · · ·+Bmxmr Bm 6= 0 Com Ai, Bi ∈ k[x1, ..., xr−1], R(f, g) ∈ k[x1, ..., xr−1] será dada então pela ex- pressão: R(f, g) = ∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣ A0 A1 ........... An A0 ........... An−1 An ........... ......... ...... A0 ..... ......... ...... An B0 B1 ........... Bm ..... ........... .......... ...... B0 ..... .......... ...... Bm ∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣ O lema 4.1.1, pode ser estendido para polinômios f, g ∈ D[x] onde D é um domı́nio, precisamos generalizar esse resultado para domı́nios pois queremos utilizá-lo para polinômios em várias indeterminadas, que são polinômios desse tipo (um polinômio em k[x1, x2, ..., xr] é um polinômio em D[xr] onde D = k[x1, ..., xr−1]). A generalização pode ser provada exatamente da forma que 26 fizemos, só que desta vez resolvemos o sistema de equações no corpo de frações D̃ do nosso domı́nio e após achar uma solução não trivial do sistema, multiplicamos cada coordenada por fatores adequados para achar uma solução não trivial em D. Corolário 4.1.2. Sejam f, g ∈ k[x1, x2, ..., xr] e Rf,g sua resultante, sejam a0, a1 ∈ k, então Rf,g(a0, a1) = 0 se e somente se existe a2 ∈ k tal que f(a0, a1, a2) = g(a0, a1, a2) = 0. 4.2 Polinômios homogêneos Um polinômio F ∈ k[x1, x2, ..., xr] é dito homogêneo de grau n se cada um dos seus monômios tem o mesmo grau. O grau de um monômio de um polinômio com mais de uma variável é a soma dos graus de cada variável que aparece no mesmo. Em geral denotamos por letras minúculas polinômios quaisquer e por le- tras maiúsculas polinômios homogêneos. Uma propriedade fundamental dos polinômios homogêneos é tratada na próxima proposição. Proposição 4.2.1. Um polinômio f ∈ k[x1, x2, ..., xr] é homogêneo de grau n se e somente se: f(tx1, ..., txr) = t nf(x1, ..., xr) Essa equação acontecendo em k[x1, x2, ..., xr, t] Demonstração: (⇒) É imediato. (⇐) Escreva f como soma de polinômios homogêneos, f = Fn1 + Fn2 + · · ·+ Fns , n1 < · · · < ns Com ∂Fni = ni 6= 0. A equação do enunciado toma a forma: tn1Fn1 + t n2Fn2 + · · ·+ tnsFns = tnFn1 + tnFn2 + · · ·+ tnFns Mas isso implica que tni = tn ∀i, logo s = 1 e n1 = n.  Podemos provar com isso um lema que utilizaremos mais à frente. Teorema 4.2.1. A resultante R(F,G) de dois polinômios homogêneos F,G ∈ k[x1, x2, ..., xr], com ∂F = n e ∂G = m em relação à variável xr ou é nula ou é um polinômio homogêneo de grau nm. Demonstração: Escrevendo: 27 mn+ 1 desses pontos e os una, dois a dois, por uma reta. Como existe somente uma quantidade finita dessas retas então existe um ponto p, que não pertence a nenhuma dessas retas, nem a F ou G. Escolha um sistema de coordenadas onde esse ponto é igual a [0 : 0 : 1]. Então temos: F (x) = Anx n 2 +An−1x n−1 2 + · · ·+A0 G(x) = Bmx m 2 +Bm−1x m−1 2 + · · ·+B0 ComAn, Bm constantes não nulas eAi, Bi ∈ k[x0, x1] polinômios homogêneos de grau i. Pelo corolário 4.1.2, RF,G(c0, c1) = 0 se e somente se existe um c2 ∈ k tal que F (c0, c1, c2) = G(c0, c1, c2) = 0. Isso é as duas primeiras coordenadas de qualquer ponto em comum de F e G satisfazem R(c0, c1) = 0. Mas cada um dos mn+ 1 pontos possui um valor [c0 : c1] diferente, pois caso contrário existiriam y e z em F ∩ G com a mesma razão [y0 : y1] = [z0 : z1], mas dessa forma x, y e p estariam na mesma reta, o que contraria nossa escolha de p. Mas pelo teorema 4.2.1, RF,G(x0, x1) ou é nula ou é um polinômio homogêneo de grau mn, como ela se anula em nm+ 1 pontos distintos ela é nula e F e G possuem uma componente em comum.  E agora vamos utilizar esse teorema, para provar o teorema de Pascal (na verdade um teorema mais geral do que o de Pascal). Teorema 4.4.2. Se duas curvas de grau n se interceptam em n2 pontos e exatamente nm desses pontos pertencem a uma curva irredut́ıvel de grau m, então os outros n(n−m) pontos pertencem a uma curva de grau n−m. Demonstração: Sejam F1 e F2 as duas curvas de grau n e G a curva de grau m como no enunciado. Um curva da reta λF1 +µF2, sempre pode ser encontrada passando por um ponto qualquer de P2, (um hiperplano e uma reta no espaço projetivo das curvas sempre se interceptam). Escolha esse ponto em G, dessa forma G e λ0F1+µ0F2 (a curva escolhida), possuem pelo menos mn+1 pontos em comum, logo possuem uma componente em comum, que necessariamente é G, pois G é irredut́ıvel. Logo λ0F1+µ0F2 = GH e a cruva H de grau n−m possui os outros n(n−m) pontos que não pertencem a G. Corolário 4.4.3 (Teorema de Pascal). Demonstração: Observe a imagem abaixo. 30 As cúbicas r1∪ r2∪ r3 e s1∪ s2∪ s3 se interceptam em nove pontos, a cônica C passa por exatamente seis deles, logo pelo teorema anterior existe uma reta que passa pelos outros três pontos, o que prova o teorema.  Para provar o teorema de Pappus vamos provar um teorema um pouco menos geral e que dará um pouco mais de trabalho do que o anterior, note que o que precisamos é relaxar as hipóteses, pois no teorema de Pappus nossa cônica que passa por seis dos nove pontos é redut́ıvel, logo esse teorema não nos ajuda. Teorema 4.4.4. Se duas cúbicas se interceptam em exatamente nove pontos, toda cúbica que passa por oito desses pontos, também passa pelo nono. Demonstração: Sejam F1 e F2 as duas cúbicas e p1, ..., p9 seus pontos de interseção. Seja G a cúbica que possui oito dos nove pontos. Se G pertence à reta λF1 + µF2 não há nada o que provar, caso contrário λF1 + µF2 + νG é um plano no espaço das cúbicas e sempre podemos achar uma cúbica nesse plano passando por dois pontos arbitrários em P2, vamos mostrar que isso gerará uma contradição. Vamos separar a demonstração em três casos: (i) Existem três pontos dentre {p1, ..., p9} que são colineares. (ii) Existem seis pontos dentre {p1, ..., p9} que estão em uma cônica. (iii) Não existem três pontos colineares nem seis pontos em uma mesma cônica entre {p1, ..., p9}. Dos nove pontos não podem existir quatro colineares, pois caso existissem a reta que possui esses quatro pontos seria uma componente das cúbicas, similar- mente não podem existir sete pontos em uma mesma cônica, logo esses são de fato todos os casos. (i) Suponha que p1, p2, p3 estão em uma única reta `, então p4, ..., p8 estão em uma única cônica C , pois suponha que duas cônicas C1, C2 possuam cinco pontos 31 em comum, elas, portanto, possuem uma componente em comum r, além disso só um dos cinco pontos em comum pode pertencer à outra componente da cônica (como a outra componente é uma reta se dois dos cinco pontos pertencessem à outra componente esses dois pontos determinariam essa componente). Mas se somente um ponto pertence à outra componente, os outros quatro pontos pertencem a r e são portanto colineares, absurdo. Seja a um ponto em ` diferente de p1, p2, p3 e b um ponto que não pertencem nem a ` nem a C . Podemos escolher λ0, µ0, ν0 tal que a, b ∈ λ0F1 + µ0F2 + ν0G, mas isso força ` a ser uma componente de λ0F1 + µ0F2 + ν0G, logo a outra componente necessariamente tem que ser C , o que é absurdo pois b /∈ ` ∪ C . (ii) Suponha que p1, ..., p6 pertencem a uma cônica mathscrC, então p7, p8 pertencem a uma reta `. Escolhendo a ∈ C e b /∈ C ∪` obtemos uma contradição análoga à que obtemos em (i). (iii) Se não há três pontos em uma reta nem seis pontos em uma cônica seja ` = p1p2 e C a cônica que passa por p3, ..., p7. Escolhendo a e b em ` obtemos uma contradição, pois p8 não estará nem em ` nem em C .  Corolário 4.4.5 (Teorema de Pappus). Demonstração: Observe a imagem abaixo. 32
Docsity logo



Copyright © 2024 Ladybird Srl - Via Leonardo da Vinci 16, 10126, Torino, Italy - VAT 10816460017 - All rights reserved