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Guias e Dicas
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hfc a08 discutindo a natureza da ciencia atraves da historia da ciencia, Notas de estudo de Atualidades

Material utilizado no curso de licenciatura em física a distância da UFRN.

Tipologia: Notas de estudo

2015
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Compartilhado em 25/09/2015

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edmundo-rodrigues-junior-5 🇧🇷

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Baixe hfc a08 discutindo a natureza da ciencia atraves da historia da ciencia e outras Notas de estudo em PDF para Atualidades, somente na Docsity! Juliana Mesquita Hidalgo Ferreira André Ferrer P. Martins História e Filosofi a da Ciência Discutindo a Natureza da Ciência através da História da Ciência Autores aula 08 D I S C I P L I N A Todos os direitos reservados. Nenhuma parte deste material pode ser utilizada ou reproduzida sem a autorização expressa da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) Divisão de Serviços Técnicos Catalogação da publicação na Fonte. Biblioteca Central Zila Mamede – UFRN Coordenadora da Produção dos Materiais Vera Lucia do Amaral Coordenadora de Revisão Giovana Paiva de Oliveira Coordenador de Edição Ary Sergio Braga Olinisky Projeto Gráfi co Ivana Lima Revisores de Estrutura e Linguagem Eugenio Tavares Borges Janio Gustavo Barbosa Jeremias Alves de Araújo José Correia Torres Neto Luciane Almeida Mascarenhas de Andrade Thalyta Mabel Nobre Barbosa Revisora das Normas da ABNT Verônica Pinheiro da Silva Revisores de Língua Portuguesa Cristinara Ferreira dos Santos Emanuelle Pereira de Lima Diniz Janaina Tomaz Capistrano Kaline Sampaio de Araújo Revisoras Tipográfi cas Adriana Rodrigues Gomes Margareth Pereira Dias Nouraide Queiroz Arte e Ilustração Adauto Harley Carolina Costa Heinkel Hugenin Leonardo Feitoza Roberto Luiz Batista de Lima Diagramadores Elizabeth da Silva Ferreira Ivana Lima José Antonio Bezerra Junior Mariana Araújo de Brito Priscilla Xavier Adaptação para Módulo Matemático Joacy Guilherme de A. F. Filho Governo Federal Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva Ministro da Educação Fernando Haddad Secretário de Educação a Distância Carlos Eduardo Bielschowsky Reitor José Ivonildo do Rêgo Vice-Reitora Ângela Maria Paiva Cruz Secretária de Educação a Distância Vera Lucia do Amaral Secretaria de Educação a Distância (SEDIS) Aula 08 História e Filosofi a da Ciência 9 10 11 3 Há uma diferença entre lei e teoria? Dê um exemplo para ilustrar a sua resposta. Cientistas realizaram um experimento cujos resultados estavam em desacordo com a Teoria da Relatividade de Einstein. Esses cientistas propuseram descartar a Teoria da Relatividade. Discuta essa atitude. O que não é ciência, para você? Por quê? O que é Natureza da Ciência? Por que incluí-la nessa disciplina? As questões propostas na Atividade 1 dizem respeito à “Natureza da Ciência”. É bem possível que você nunca tenha ouvido a expressão “Natureza da Ciência” antes dessa aula. Como você pode notar, essa expressão se refere a questões relacionadas a: o que a ciência é, como funciona, como os cientistas atuam como grupo social, como a sociedade infl uencia e reage aos empreendimentos científi cos etc. É possível que, por conta própria, você nunca tenha refl etido acerca dessas questões (e pode ter se deparado com difi culdades na Atividade 1). No entanto, mesmo que nunca tenha assistido a uma aula sobre Natureza da Ciência ou lido um texto especifi camente sobre esse tema, certamente você recebeu alguma informação sobre esses assuntos como aluno, mesmo antes de chegar à universidade. Isso porque alguma visão sobre NdC é comunicada mesmo que a intenção do professor de ciências em sala de aula não seja falar sobre esse tema. Desse modo, mensagens explícitas e implícitas sobre o que é uma lei ou teoria, sobre como o cientista trabalha e o status do conhecimento científi co foram transmitidas a você, quer seus professores tivessem ou não a intenção de fazê-lo. Mesmo fora do ambiente escolar, em nossa experiência diária recebemos informações que dizem respeito à Natureza da Ciência. Uma simples embalagem de xampu que apresente uma mensagem do tipo “cientifi camente comprovado” está transmitindo informações a respeito desse assunto. O problema é que muitas vezes (como no caso do xampu) o tipo de conhecimento sobre a Natureza da Ciência transmitido, seja no ambiente escolar ou fora dele, é inadequado. Se você ainda não discutiu esses assuntos em seu curso de licenciatura em Física é porque, de fato, refl exões sobre a NdC ainda não costumam fazer parte da formação dos NdC Em vez de “Natureza da Ciência”, costuma-se usar em português a sigla NdC em referência a esses conhecimentos. Por isso, ocasionalmente também usaremos essa sigla ao longo da presente aula. Em trabalhos em inglês, você encontrará a expressão “Nature of Science” ou a sigla NOS. Aula 08 História e Filosofi a da Ciência4 professores de ciências. Em decorrência disso, pesquisas têm indicado que os professores costumam ter pouco ou nenhum conhecimento acerca de como a ciência funciona, não têm consciência da construção social e cultural do pensamento científi co, consideram que os cientistas têm características peculiares, empregam rigidamente o método científi co para alcançar seus objetivos etc. (MCCOMAS; ALMAZROA; CLOUGH, 1998; HARRES, 1999; LEDERMAN, 2007). Mesmo nos livros didáticos, ainda hoje a principal ferramenta usada pelo professor e que poderia lhes servir de apoio nesse caso, as concepções sobre NdC costumam ser incorretas, simplistas e incompletas (PAGLIARINI, 2007). Devido a esses e outros fatores, as escolas têm sido responsáveis pela transmissão de conteúdos inadequados a respeito da Natureza da Ciência. Permanece a rígida tradição de comunicar fatos ou produtos da ciência. O conteúdo do conhecimento é enfatizado, ao passo que a sua construção é negligenciada ou, involuntariamente, distorcida. Por isso, já há algum tempo, a presença dessa temática na formação dos professores tem sido defendida (ver, por exemplo, MATTHEWS, 1994). Assim, justamente por considerarmos que a discussão aprofundada de tais conhecimentos faz parte da necessidade formativa do professor de Física, decidimos incluí-la nessa disciplina. Acreditamos que colaborar para que a formação dos futuros profi ssionais da área contemple conteúdos de NdC seja signifi cativo para que esses cheguem às escolas. Por que tratar sobre Natureza da Ciência no ambiente escolar? Em 2008, uma edição especial de uma importante revista internacional da área de ensino, a Science & Education, foi inteiramente dedicada à Natureza da Ciência, o que demonstra a relevância atual do assunto. A importância de incluí-lo no ensino de ciências é reconhecida em documentos ofi ciais para a área de ensino no mundo todo, sendo a compreensão das características da ciência um item reconhecido já há algum tempo como um dos objetivos primordiais da educação (CLOUGH; OLSON, 2008; MCCOMAS; ALMAZROA; CLOUGH, 1998). A literatura a favor da pertinência desse tema para o ensino sugere que os conhecimentos sobre Natureza da Ciência seriam relevantes para a tomada de decisões conscientes pela sociedade. Outros argumentos costumam ser citados: manipulação e entendimento da tecnologia; compreensão da ciência como elemento cultural; compreensão das normas da comunidade científi ca; sucesso no aprendizado de conteúdos da ciência; satisfação dos estudantes ao aprender sobre NdC. Defende-se que sua presença humaniza o ensino de ciências, e que seria fundamental para compreender o signifi cado, produção, correlações, possibilidades e limitações do conhecimento (PRAIA; GIL-PÉREZ; VILCHES, 2007; LEDERMAN, 2007, p. 831-832; MCCOMAS; ALMAZROA; CLOUGH, 1998, p. 511-517). Professores de ciências Você certamente conhece as “Leis de Newton”, a “Lei de Ohm”, a “Lei de Hooke”, mas saberia explicar o que, de fato, o que vem a ser uma “lei”, ou qual a diferença entre “lei” e “teoria”? Aula 08 História e Filosofi a da Ciência 5 O que ensinar sobre a Natureza da Ciência? Já há algum tempo tem-se apontado certa convergência em torno de aspectos da Natureza da Ciência a serem contemplados na educação. A partir da literatura acadêmica e documentos da área de ensino de vários países, uma listagem de tópicos geralmente considerados relevantes foi organizada (MCCOMAS; ALMAZROA; CLOUGH, 1998, p. 513):  O conhecimento científi co, enquanto durável, tem caráter provisório;  O conhecimento científi co se apoia fortemente, mas não inteiramente, em observações, evidências experimentais, argumentos racionais e no ceticismo;  Não há uma forma única de fazer ciência (então, não há um método científi co universal passo a passo);  A ciência é uma tentativa de explicar fenômenos naturais;  Leis e teorias exercem diferentes papéis na ciência. Teorias não se tornam leis mesmo com evidências adicionais;  Pessoas de todas as culturas contribuem para a ciência;  Novos conhecimentos devem ser relatados clara e abertamente;  Os cientistas exigem precisa preservação de dados, revisão por pares e replicabilidade dos resultados;  Observações são dependentes da teoria;  Os cientistas são criativos;  A História da Ciência revela tanto um caráter evolucionário quanto revolucionário;  A ciência é parte das tradições culturais e sociais;  A ciência e a tecnologia têm impacto uma na outra;  As idéias científi cas são afetadas pelo contexto social e histórico. Passada uma década da organização dessa listagem, revisões recentes reafi rmam a existência de aceitável nível de convergência a esse respeito (LEDERMAN, 2007, p. 832-835; MCCOMAS, 2008, p. 250-251). No Brasil, autores têm realizado abrangentes levantamentos de tópicos sobre os quais há consenso na literatura, e mostram a existência de certa convergência em torno de elementos centrais como os citados na listagem anterior (ver, por exemplo, MOURA, 2008). Aula 08 História e Filosofi a da Ciência8 A necessidade de uma discussão explícita Acreditamos que você possa ter tido difi culdade para realizar a Atividade 3. Consideramos isso razoável tendo em vista a complexidade dos conceitos envolvidos na temática Natureza da Ciência. Na Atividade 3 o colocamos deliberadamente diante de uma situação a qual tem sido descrita como pouco efi ciente para o aprendizado de aspectos da Natureza da Ciência. Tem-se notado que quando o que ocorre é apenas a apresentação de exemplos históricos dos quais implicitamente se pode abstrair aspectos da NdC, as difi culdades costumam ser grandes. Bons resultados não costumam ser obtidos quando se espera que o aluno ou o futuro professor diante de um episódio histórico, por conta própria, consiga abstrair aspectos implícitos relativos à NdC (LEDERMAN, 2007, p. 847-861). Nesse caso, os indivíduos têm contato com os relatos sobre a história da ciência, geralmente os acham interessantes, mas não conseguem tomá-los como exemplos esclarecedores de aspectos da Natureza da Ciência (MCCOMAS, 2008, p. 261). Recomenda-se, por isso, que a abordagem desses elementos via episódios históricos deva ser preferencialmente explícita. Assim, as pessoas precisariam de oportunidades explícitas de relacionar o exemplo histórico ao princípio de Natureza da Ciência. É o que faremos a seguir. Abordando aspectos da Natureza da Ciência através da História da Ciência Apresentamos a seguir uma listagem de aspectos da NdC organizada a partir da revisão sobre o tema realizada por Breno Moura (2008). 1) A ciência é uma atividade de cooperação; 2) A ciência tem como principal objetivo adquirir conhecimento do mundo natural; 3) A ciência é dinâmica, mutável e experimental; Aula 08 História e Filosofi a da Ciência 9 4) O conhecimento científi co não é estático e convergente, mas mutável e provisório; 5) A ciência é criativa na invenção de conceitos e explicações; 6) Não existe um método científi co único universal; 7) Não existe uma maneira única de fazer ciência; 8) Não há um conjunto de regras perfeitamente defi nidas a aplicar de forma mecânica e independentemente do domínio investigado; 9) Uma observação significativa não é possível sem uma expectativa preexistente; 10) As observações são dependentes da teoria; 11) A natureza não produz evidências simples o bastante para permitir uma interpretação não ambígua; 12) As teorias científi cas não são induções, mas hipóteses que vão imaginativa e necessariamente além das observações; 13) Recusa-se o empirismo que concebe os conhecimentos como resultado da inferência a partir de “dados puros”; 14) As teorias científi cas não podem ser provadas; 15) Leis e teorias desempenham diferentes papéis na ciência. Teorias não se tornam leis mesmo com evidências adicionais; 16) O desacordo entre os cientistas sempre é possível; 17) Treinamento compartilhado é um componente essencial do acordo entre os cientistas; 18) Os cientistas não desenvolvem deduções incontestáveis, mas fazem complexos julgamentos de especialistas; 19) O conhecimento científi co baseia-se fortemente, mas não totalmente, na observação, em evidências experimentais, em argumentos racionais e no ceticismo; 20) O raciocínio científi co não se estabelece sem apelar para fontes sociais, espirituais, morais e culturais. Aula 08 História e Filosofi a da Ciência10 Como se pode observar, alguns desses itens se repetem, de modo que apenas enunciam de maneiras diferentes uma mesma concepção sobre a Natureza da Ciência expressa em outro (ver, por exemplo, os itens 6, 7 e 8). Sentimos necessidade de expressar um mesmo enunciado de variadas formas a fi m de facilitar a compreensão, tendo em vista a complexidade do tema. Levando em conta o potencial didático dos episódios da História da Ciência discutidos nas Aulas 3 a 7, tomaremo-los como pano de fundo para contextualização de alguns enunciados contidos no quadro anterior. Procuramos refl etir sobre determinadas questões particulares de NdC, realizando, portanto, uma abordagem explícita, refl exiva e contextualizada desses elementos. Outros aspectos da NdC contidos nesse quadro serão retomados nas aulas seguintes (por exemplo, na discussão sobre o indutivismo e o método científi co).  “a ciência é uma atividade de cooperação”  “a ciência é dinâmica, mutável e experimental”  “o conhecimento científi co não é estático e convergente, mas mutável e provisório” Nas Aulas 6 (Tópicos de História do vácuo – Parte 1) e 7 dessa disciplina discutimos alguns episódios históricos relacionados ao tema “vácuo”. Procuramos explorar a contraposição de ideias entre Aristóteles e os atomistas sobre o tema na Antiguidade. Passamos pela Idade Média, onde a infl uência aristotélica e o “horror ao vácuo” se faziam marcantes. E chegamos às discussões e experimentos de Galileu, Descartes, Baliani, Berti, Torricelli, Pascal e outros autores, no século XVII. Nesse percurso histórico, procuramos mostrar que da Antiguidade até Descartes era quase unânime a posição contrária à possibilidade de vácuo, enquanto que, a partir de mudanças ocorridas no século XVII, com os estudos experimentais de Torricelli e Pascal, passa-se a aceitar a possibilidade e existência efetiva do vácuo. Os fenômenos explicados anteriormente pela concepção de que a natureza tinha horror ao vácuo passam a ser explicados pela atuação da pressão atmosférica. Como se pode notar, portanto, a ciência não é estática, mas sim dinâmica. O conhecimento científi co é provisório, mutável. Assim como nesse caso, novas interpretações para fenômenos já conhecidos surgem ao longo da História da Ciência (e novos fenômenos são observados). E nada pode nos garantir que a explicação que atualmente consideramos correta não seja descartada no futuro. Como vimos, ao longo daquelas aulas, muitos pesquisadores se dedicaram ao estudo daqueles fenômenos, propuseram hipóteses, realizaram experimentos e sugeriram diferentes explicações para os resultados observados. Mais especifi camente, vimos, por exemplo, que o experimento de Berti antecipava em muitos aspectos o experimento realizado por Torricelli. Este teria realizado suas investigações com base nesses experimentos anteriores e sugestões de variação nas condições experimentais possivelmente apontadas por Galileu. Pascal, por sua vez, teria se apoiado nas conclusões de Torricelli e conduzido uma série de investigações também a partir do diálogo com Descartes, e possivelmente com base em sugestões desse fi lósofo. Aula 08 História e Filosofi a da Ciência 13 de evitar o vácuo. Ou seja, quer o experimento fosse imaginado ou realizado, a possibilidade de interpretá-lo variava. Dizer, portanto, que a observação depende da teoria, não implica em dizer que uma pessoa vê exclusivamente o que ela quer ver. Além disso, não se deve pensar que, no passado, o comportamento dos pesquisadores/ pensadores era diferente e pior do notado atualmente. Ou seja, não é correto dizer que eles se comportavam de maneira inadequada e não aceitavam evidências que pareciam apontar o contrário do que pensavam; e atualmente os pesquisadores se comportam de outro modo. As evidências fornecidas pela natureza é que não são simples, e podem ser interpretadas de maneiras diferentes. A partir dos experimentos e observações não se extrai indutivamente uma teoria. Os resultados são interpretados pelos cientistas, que não realizam observações e experimentos sem uma opinião ou conhecimento prévio sobre o assunto investigado. Podem chegar, portanto, a diferentes interpretações. A existência de múltiplas explicações para um mesmo fenômeno pode ser ilustrada por várias situações da História da Ciência abordadas em nossas aulas:  Einstein propôs a rejeição ao éter, embora Lorentz e Poincaré não considerassem necessário rejeitá-lo.  Num mesmo período da História da Ciência, a natureza da luz foi entendida de várias maneiras (vibracional, corpuscular etc.).  Os fenômenos eletromagnéticos foram explicados por alguns cientistas importantes através de forças agindo a distância entre cargas elétricas. Outros cientistas igualmente importantes consideravam que um meio atuava como intermediário nas interações eletromagnéticas.  Alguns pesquisadores interpretaram o que se observou com os primeiros telescópios como imagens genuínas do que existia no mundo celeste; outros consideraram que o que se observava eram apenas alterações provocadas pelas lentes daqueles instrumentos. As situações apontadas ao longo da presente seção ilustram também dois outros aspectos da Natureza da Ciência: “o desacordo entre os cientistas sempre é possível” e o “treinamento compartilhado é um componente essencial do acordo entre os cientistas”. Assim, “os atomistas”, por compartilharem ideias semelhantes sobre a matéria, tendiam a explicar determinado fenômeno de uma maneira, isto é, tal visão de mundo era essencial para o acordo entre eles. Já os que seguiam as ideias de Aristóteles compartilhavam de outra concepção de mundo, as quais os levavam a outras interpretações específi cas sobre os fenômenos. Na Idade Média, a aceitação da pressão atmosférica fazia com que os cientistas interpretassem determinados fenômenos de uma maneira. Os mesmos fenômenos eram interpretados de outra maneira por aqueles que compartilhavam de outra formação, segundo a qual a natureza tinha horror ao vácuo. Aula 08 História e Filosofi a da Ciência Atividade 5 14  “o conhecimento científi co baseia-se fortemente, mas não totalmente, na observação, em evidências experimentais, em argumentos racionais e no ceticismo”  “o raciocínio científi co não se estabelece sem apelar para fontes sociais, espirituais, morais e culturais” Esses aspectos da Natureza da Ciência podem ser ilustrados por vários elementos apresentados nos episódios históricos discutidos em nossas aulas. Uma postura empirista-indutivista (discutiremos o indutivismo em detalhe nas aulas seguintes) poderia conceber que o conceito de conservação de “quantidade de movimento” foi elaborado através de algum experimento marcante. Como vimos, no entanto, René Descartes defi niu que certa quantidade de movimento havia sido dada por Deus ao universo. Por considerar a imutabilidade uma das características de Deus, Descartes concebeu que essa quantidade de movimento inicial se conservava. Vimos também nas aulas de História da Mecânica que as concepções teológicas e alquímicas de Isaac Newton estiveram presentes de modo marcante em seus trabalhos sobre gravidade e gravitação. Por exemplo, uma das motivações para que ele negasse as concepções materialistas de Descartes era o receio de que essas pudessem levar ao ateísmo. Esses episódios da História da Ciência ilustram bem, portanto, dois aspectos importantes da Natureza da Ciência: “O conhecimento científi co se apoia fortemente, mas não inteiramente, em observações, evidências experimentais, argumentos racionais e no ceticismo” e “As ideias científi cas são afetadas pelo contexto social e histórico”.  “As teorias científi cas não podem ser provadas” Coloque-se um [canudo de] junco, com uma extremidade no vinho e outra na boca. Sugando o ar do canudo, atrai-se o vinho para cima, embora ele seja pesado. Isso acontece porque é necessário que algum corpo sempre venha logo depois do ar que é sugado para cima, para evitar a formação de um vácuo (BURIDAN apud MARTINS, 1989, p. 12). Use a afi rmação de Jean Buridan (séc. XIV) para ilustrar o papel das concepções dos cientistas ao elaborar, realizar experimentos e interpretar resultados. Relacione-a também ao caráter complexo das evidências fornecidas pela natureza sobre seu comportamento. Aula 08 História e Filosofi a da Ciência 15  “Leis e teorias desempenham diferentes papéis na ciência”  “Teorias não se tornam leis mesmo com evidências adicionais” Discutimos anteriormente que o conhecimento científi co é mutável e provisório. Não podemos ter certeza de que as concepções que atualmente consideramos corretas serão aceitas futuramente. Isso porque essas concepções são interpretações de fenômenos naturais. Não podem ser “provadas”, mesmo por experimentos (ao contrário do que geralmente as pessoas costumam dizer). Um ponto interessante a esse respeito é que, popularmente, muitas pessoas podem aceitar a concepção de que o conhecimento não é defi nitivo. Mas, quando se pede que expliquem a diferença entre lei e teoria, afi rmam que lei difere de teoria porque lei é “aquilo que está provado”. Não percebem, portanto, que tal explicação está em contradição com a afi rmação de que o conhecimento é provisório. Afi nal, se algo de fato pudesse ser provado, então seria defi nitivo, certo? Nas aulas de História da Mecânica, vimos diferentes leis de movimento: a proposta por Aristóteles, a lei de Philoponos, a lei de Hiparcos etc. Se “lei”, então, fosse “aquilo que está provado”, como explicaríamos a existência de tantas leis sobre movimento ao longo da História da Ciência? Se você analisar com atenção essas diferentes leis, notará que seus autores tentavam descrever o que consideravam ser uma regularidade observada na natureza. Essa, então, é a defi nição de lei. Mas o que será, então, uma teoria? Estudamos nas aulas de História da Mecânica, por exemplo, a teoria aristotélica para o movimento, através da qual Aristóteles propôs explicações para os fenômenos como os movimentos dos projéteis, dos corpos leves e graves etc. Já na Idade Média surgiu a teoria do ímpeto, que também se propôs a explicar esses mesmos fenômenos. Temos, então, a defi nição do que é uma teoria. Como se pode notar, portanto, leis e teorias desempenham papéis diferentes na natureza, de modo que uma teoria não se torna lei. Aula 08 História e Filosofi a da Ciência Resumo 1 2 18 Nessa aula defi nimos o que é Natureza da Ciência e apresentamos alguns aspectos dessa temática geralmente considerados relevantes para o ensino. Procuramos, em seguida, mostrar como é possível discuti-los a partir de episódios da História da Ciência apresentados nas aulas anteriores. Autoavaliação À luz do que discutimos nessa aula, examine as suas concepções prévias sobre a Natureza da Ciência expressas nas respostas à Atividade 1. Escolha quatro aspectos da Natureza da Ciência apresentados nessa aula. Explique-os e refl ita sobre a importância de abordar esses aspectos nas escolas. Referências ALONSO, Á. V. et al. Consensos sobre la naturaleza de la Ciencia: la comunidad tecnocientífi ca. Revista Electrónica de Enseñanza de las ciências, v. 6, n. 2, p. 331-363, 2007. CLOUGH, M. P.; OLSON, J. K. Teaching and assessing the nature of science: an introduction. Science & Education, v. 17, p. 143-145, 2008. HARRES, J. B. S. Concepções de professores sobre a natureza da ciência. Tese (Doutorado) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Porto Alegre, 1999. LEDERMAN, N. G. Nature of science: past, present, and future. In: ABELL, S.K.; LEDERMAN, N. G.(Ed.). Handbook of research on Science Education. Mahwah: Lawrence Erlbaum Associates, 2007. p. 831-880. MARTINS, R. de A. O vácuo e a pressão atmosférica, da antiguidade a Pascal. Cadernos de História e Filosofi a da Ciência, v. 1, n. 3, p. 9-48, 1989b. (Série 2). Disponível em:<http:// ghtc.ifi .unicamp.br/pdf/ram-33.pdf>. Acesso em: 24 nov. 2009. ______. Introdução: a história das ciências e seus usos na educação. In: SILVA, C. C. (Ed.). Estudos de história e fi losofi a das ciências: subsídios para aplicação no ensino. São Paulo: Livraria da Física, 2006. p. xxi-xxxiv. Aula 08 História e Filosofi a da Ciência Anotações 19 MASSONI, N. T.; MOREIRA, M. A. O cotidiano da sala de aula de uma disciplina de Histórica e Epistemologia da Física para futuros professores de física. Investigações em Ensino de Ciências, v. 12, n. 2, p. 7-54, 2007. MATTHEWS, M. R. História, fi losofi a e ensino de ciências: a tendência atual de reaproximação. Cadernos Catarinenses de Ensino de Física, v. 12, n. 3, p. 164-214, dez. 1995. MCCOMAS, W. F. Seeking historical examples to illustrate key aspects of the Nature of Science. Science & Education, v. 17, p. 249-263, 2008. MCCOMAS, W. F.; ALMAZROA, H.; CLOUGH, M. The nature of science in science education: an introduction. Science & Education, v. 7, p. 511-532, 1998. MOURA, B. A. O livro II do Opticks de Newton no século XVIII: incorporando a natureza da ciência no ensino por meio de episódios históricos. 2008. Dissertação (Mestrado em Ensino de Ciências) - Universidade de São Paulo, São Paulo, 2008. PAGLIARINI, C. R. Uma análise da história e fi losofi a da ciência presente em livros didáticos de física para o Ensino Médio. 2007. Dissertação (Mestrado em Física) - Universidade de São Paulo, São Paulo, 2007. PEDUZZI, L. O. Q. Sobre a utilização didática da história da ciência. In: PIETROCOLA, M. (Org.). Ensino de física: conteúdo, metodologia e epistemologia numa concepção integradora. Florianópolis: Editora da UFSC, 2001. p. 151-170. PRAIA, J.; GIL-PÉREZ, D.; VILCHES, A. O papel da Natureza da Ciência na educação para a cidadania. Ciência e Educação, v. 13, n. 2, p. 141-156, 2007. Aula 08 História e Filosofi a da Ciência Anotações 20
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