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Guias e Dicas
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A Família Bloch e a revista Manchete, Manuais, Projetos, Pesquisas de História

Artigo sobre a Família Bloch e a revista Manchete

Tipologia: Manuais, Projetos, Pesquisas

2017

Compartilhado em 21/09/2017

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Baixe A Família Bloch e a revista Manchete e outras Manuais, Projetos, Pesquisas em PDF para História, somente na Docsity! A Família Bloch e a revista Manchete: Faces da História da imprensa brasileira Greyce Falcão do Nascimento - Doutoranda em História – UFPE - 2017 greycefalcao@hotmail.com RESUMO A escolha de uma revista como objeto de estudo, justifica-se por entender a imprensa fundamentalmente como instrumento de manipulação de interesses e de intervenção na vida social, não a considerando como um simples veículo de informações, transmissor parcial e neutro dos acontecimentos, isolado, portanto, da realidade político-social na qual se insere. Além de trabalhar intensamente na produção de consensos, a imprensa busca fabricar socialmente a amnésia, mediante a imposição da velocidade informativa. Pode, em algumas circunstâncias, ocultar, total ou parcialmente, certos aspectos da realidade, inverter a relevância das informações ou promover a descontextualização dos acontecimentos. Diante disso, buscamos analisar a trajetória da família Bloch e da revista Manchete. Veículo que por quase cinquenta anos esteve presente no diadia de milhões de brasileiros. Nesse sentido, ao tomar o jornalismo impresso como fonte/objeto, percebemos que os conteúdos trazidos por esses veículos não podem ser dissociados do lugar ocupado pela publicidade em tais empresas. É preciso atentar para fatores como a objetividade, a imparcialidade, a análise do discurso e quais as motivações para a publicação de certas notícias. Palavras-chave: análise do discurso, revista, jornalismo, história, imprensa. ABSTRACT The choice of a journal as an object of study is justified by understanding the press primarily as an instrument for manipulating interests and intervention in social life, not considering it as a mere vehicle for information, a partial and neutral transmitter of events, isolated, Therefore, of the political-social reality in which it is inserted. In addition to working intensely in the production of consensus, the press seeks to socially fabricate amnesia by imposing informational speed. It may, in some circumstances, conceal certain aspects of reality in whole or in part, reverse the relevance of information or promote decontextualization of events. In view of this, we seek to analyze the trajectory of the Bloch family and Manchete magazine. Vehicle that for nearly fifty years was present in the diadia of millions of Brazilians. In this sense, when taking print journalism as a source / object, we realize that the content brought by these vehicles can not be dissociated from the place occupied by advertising in such companies. Attention must be paid to factors such as objectivity, impartiality, discourse analysis and the motivations for the publication of certain news items. keywords: Discourse analysis, journalism, journalism, history, press. Nascido em Jitomir, na Ucrânia, Adolpho Bloch chegou com a família ao Brasil em 1922, fugindo da perseguição à Comunidade Judaica após a Revolução Russa. Dedicou-se desde muito cedo ao ramo das gráficas e, após trinta anos trabalhando nessa área, sempre prestando serviços a terceiros, decidiu em 1952 lançar sua própria revista de variedades. Conseguindo ser um empresário de sucesso, já na década de 50, Bloch acreditava que havia lugar no mercado para mais uma revista de circulação nacional, com condições de concorrer com a forte O Cruzeiro. Adolpho veio de uma grande família de imigrantes ucranianos que viviam numa (shteith) aldeia pobre de judeus. Para eles, Jitomir era como uma ilha em meio à zona de exclusão estabelecida pelo czar, já que nessa cidade existiam algumas pequenas empresas que eram permitidas. Dentre as empresas, já existiam algumas gráficas na cidade. Eles imprimiam de tudo, embalagens, etiquetas, brochuras, convites, cartões, programas de teatro, papéis de embrulho, bíblias, formulários, e o “Tanya”, livro sagrado dos “hassidim”, seita carismática de judeus ortodoxos poloneses. Quando Joseph e a família chegaram a cidade, já havia cinco casas de impressão e quarenta sinagogas. Uma importante família da cidade, os Shapiro, já estava rica quando migrou para a América. Deixaram em Jitomir equipamentos, tecnologia e operários formados que Em 1951, o presidente Getúlio Vargas baixou um decreto permitindo que as gráficas e as editoras importassem máquinas com subsídios e sem direitos alfandegários. Adolpho aproveitou a oportunidade e importou várias máquinas rotativas Webendorf, vindas da Alemanha, ampliando e modernizando o parque industrial da gráfica. Os Bloch imprimiam revistas, alguns títulos infantis e gibis encomendados pelo empresário Roberto Marinho. A primeira gráfica dos Bloch no Brasil foi ficava localizada na Rua Frei Caneca, na capital do Rio de Janeiro. Nessa sede funcionava ao mesmo tempo redação, gráfica, depósito, diretoria, todos os departamentos administrativos. Anos depois implantaram o parque gráfico de Parada de Lucas, o maior da América Latina, onde eram impressas revistas e milhares de trabalhos para clientes externos, de rótulos de cerveja e bilhetes de loteria a cartazes de campanha eleitoral. Adolpho, sua primeira esposa Lucy, o jornalista Henrique Pongeti e o primo Pedro Bloch, que teve a ideia do título, foram os fundadores da revista Manchete. O primeiro prédio foi construído na Rua do Russel, no bairro da Glória, projetado por Oscar Niemeyer. Em 26 de abril de 1952, foi lançada a primeira edição da revista Manchete. A revista anunciava um olimpo de repórteres e colaboradores, em que reinavam semideuses das letras como Rubem Braga, Otto Maria Carpeaux, Antônio Callado, Joel Silveira, Orígenes Lessa, Marques Rabelo, Manuel Bandeira, Cyro dos Anjos, Lygia Fagundes e toda a mineirada de primeira linha (Drummond, Sabino, Paulo Mendes Campos e Otto Lara) 4. Assim, baseado na experiência adquirida nas tipografias da família, Adolpho Bloch investiu nas inovações editoriais e em aprimoramento técnico do seu equipamento gráfico, a fim de conquistar o mercado editorial. Embora o investimento inicial tenha sido relativamente baixo, uma vez que ele se aproveitou a princípio de três dias da semana, período em que as máquinas da tipografia da família ficavam ociosas, a revista foi lançada com 200 mil exemplares, custando cinco cruzeiros, o mesmo preço da principal concorrente. Aos 25 anos da revista, Bloch relembra como foi esse momento inicial: 4 Ibidem, p. 168. Em 1952, meus amigos diziam que seria uma loucura lançar uma revista nova. O Cruzeiro estava no auge. A sua tiragem chegava aos 750 mil exemplares e se esgotava nas bancas. Conhecia a tenacidade de seu chefe, Assis Chateaubriand. Também acompanhei Roberto Marinho, no prédio do Liceu de Artes e Oficios, no Largo da Carioca, onde ele comia de marmita na mesa de trabalho, sempre lutando para dar ao Brasil um grande jornal. O esquema estava todo no meu computador pessoal. Comprei uma rotativa off- set de 2 cores e com ela imprimi revistas infantis para a Editora Brasil- América e para O Globo Juvenil. Com os recursos ganhos e aproveitando os dois dias por semana que me sobravam (sábado e domingo), realizei o meu sonho em concreto. No dia 26 de abril de 1952, quando vi sair da máquina os primeiros exemplares de Manchete, naquele mesmo instante comecei a pensar em comprar a rotativa de fotogravura que imprimia as grandes revistas do mundo5. O nome da revista surgiu de uma conversa informal com seu primo Pedro Bloch, que sugeriu o nome Manchete pela semelhança da palavra com o renomado título francês Paris Match6. O complexo onde funcionava toda a confecção da revista situava- se à beira mar da Praia do Flamengo, num prédio de dez andares, com fachada de vidro e de alumínio, projetado pelo arquiteto Oscar Niemeyer. O primeiro número, que chegou às bancas em 26 de Abril de 1952, estampava na capa a bailarina do Teatro Municipal do Rio de Janeiro, Inês Litowski, e alardeava como exclusividade “Uma grande reportagem de Jean Manzon” e ainda, “A verdadeira vida amorosa de Ingrid Bergman”. O fundo escuro, contrastando com o dourado de uma carruagem que servia de cenário e com as chamadas emolduradas em vermelho desagradou ao próprio Bloch. Na década de 50, a Revista O Cruzeiro, editada pelos Diários Associados, de Assis Chateaubriand, ocupava praticamente sozinha, a liderança nas vendas. A publicação trazia em média 130 páginas, 70 anúncios, em edições de 400 mil exemplares semanais. A dinâmica de trabalho da Bloch Editores surgiu bem diferente da praticada na antiga líder. A composição manual foi substituída pela composição eletrônica, investiu-se na qualidade gráfica onde as cores fortes exerciam uma grande 5 BLOCH, Adolpho. O Pilão. Rio de Janeiro: Bloch Editores, 1978, p.19. 6 Lançada em 19 de março de 1949, a Paris Match era uma revista francesa de caráter jornalístico- informativo, que competia com as norte-americanas Life e Time, tendo como principal característica a qualidade fotojornalística de suas matérias. atração sobre o público, e com isso, a partir de 1952, a Manchete tornou-se a principal concorrente de O Cruzeiro. Depois de dezessete edições semanais, Manchete estava praticamente falida. Eram poucos anúncios e poucos leitores. Além disso, havia o sucesso estrondoso da revista O Cruzeiro, do grupo empresarial Diários Associados, de Assis Chateaubriand, que chegava a vender mais de 750 mil exemplares por semana. Bloch procurou Roberto Marinho, das empresas Globo e Samuel Wainer, do jornal “A Ultima Hora”, mas não conseguiu vender a revista para nenhum empresário. Diante da falta de compradores, Adolpho resolveu convidar Hélio Fernandes, ex- diretor de “O Cruzeiro”, para tentar salvar o veículo e ele assumiu a direção da revista a partir da vigésima quinta edição. Mãos à obra, Hélio tratou de esquentar, e muito, as páginas. Inovou, ignorando a regra de ouro do Cruzeiro (na capa, só mulheres), e passou a alternar, com as damas da primeira, figuras viris como Eisenhower ou Stálin (um vivo, outro morto). As longas reportagens de até 24 páginas foram substituídas por matérias de duas ou três folhas vibrantes, grandes fotos e textos de alta qualidade discursiva e cunho muitas vezes sensacionalista, muitas assinadas pelo próprio Hélio. Na primeira página, chamadas carregadas de malícia ou de conteúdo explosivo7. A passagem de Hélio Fernandes foi muito importante para a revista, tanto no contexto comercial quanto editorial. A partir dele, Manchete ganhou impulso e atingiu a primeira centena de milhares. Novos colaboradores e anunciantes começaram a chegar. A condição primordial para que Hélio Fernandes aceitasse o cargo na revista fora a premissa da “total independência na linha editorial”, fato que no futuro gerou discordâncias entre ele e Adolpho. A revista também passou a manter negócios com agências de fotografia internacionais e sucursais em Paris e Nova York. Mesmo com o crescimento da revista, as reportagens de Hélio Fernandes começaram a incomodar Adolpho Bloch. A atividade bancária estava intensa, a revista vendia bem e Hélio, com carta branca, continuava a provocar a alta sociedade, o poder constituído, a indústria e a publicidade. Partiu com chumbo grosso para a área de educação 7 BLOCH, Arnaldo. Os irmãos Karamabloch. Ascensão e queda de um império familiar. 2ª reimpressão. São Paulo: Companhia das Letras, 2008, p. 176. dinheiro para fazer propaganda. Bloch tenta fugir de Brizola, pois sabe que ele quer tudo de graça, mas acaba recebendo-o em seu escritório. (...) A Manchete acaba financiando boa parte da publicidade, ou melhor, dos reclames do candidato do PDT. Brizola vence a eleição 10. Além da boa relação com os políticos, o sucesso da Manchete vinha do quadro de jornalistas, redatores e colaboradores. O time era selecionado entre pessoas de destaque do meio intelectual. O semanário contava com Carlos Drummond de Andrade, Rubem Braga, Joel Silveira, Manuel Bandeira, Fernando Sabino, Nelson Rodrigues, Otto Maria Carpeaux, Lígia Fagundes Telles, entre outros. Jean Manzon, fotógrafo que trabalhou para a Paris Match e O Cruzeiro, foi o principal fotógrafo da revista, trabalhando ao lado de profissionais como Darwin Brandão, Gil Pinheiro, Gervásio Baptista, Fúlvio Roiter, Jader Neves, entre outros. Em meados dos anos 1960, Adolpho Bloch resolveu investir no setor de livros, fundando a Editora Bloch. Os primeiros lançamentos traziam premiados autores nacionais e estrangeiros. A dinâmica da comercialização e as baixas tiragens levaram ao fechamento da editora, cuja sede, na Rua do Russel, cedeu lugar ao Museu Manchete que abrigava uma ampla coleção de arte moderna, com valiosos quadros e esculturas. Nos anos 1970 a Editora Bloch já possuía as seguintes revistas: Manchete Esportiva, Jóia, Sétimo Céu, Fatos e Fotos, Enciclopédia Bloch, Domingo Ilustrado, Amiga, Desfile, Pais e Filhos, Ele e Ela, Geográfica Universal, Fatos, Carinho, Mulher de Hoje, Tendência, Incrível, Agricultura de Hoje e Medicina de Hoje. As fotografias ocupavam em média 70% das páginas. A linguagem dos textos era quase poética e se inspirava na fotografia principal da matéria. Folheando um exemplar da Manchete, mesmo os mais leigos eram capazes de apreender informações sobre temas diversos, como o Sputnik, a criação da Petrobrás, a bomba atômica, a morte de Getúlio Vargas, etc. Um dos trunfos da revista eram suas grandes coberturas em cores, numa época em que a televisão ainda era em preto e branco, pelo menos até 1974. Manchete recebia muitas críticas quanto ao seu produto jornalístico. Em 1977, Justino Martins, que havia sido diretor da revista, redigiu um diagnóstico dos problemas da principal publicação da Bloch. Em cinco laudas, o relatório questionava o excesso de matérias internacionais, onde, do total de matérias, 50% a 70% eram assuntos 10 PENA, Felipe. Seu Adolpho: Uma biografia em fractais de Adolpho Bloch, fundador da TV e Revista Manchete. Rio de Janeiro: Usina de Letras, 2010.p.125. estrangeiros. Os textos de caráter nacional eram, na maioria das vezes, de interesse exclusivo da publicidade. O relatório ainda colocava a falta do humorismo na revista, as poucas matérias dirigidas ao público feminino e textos desnecessariamente longos. Justino Martins acreditava que o público deveria ter uma relação mais estreita com os jornalistas que faziam a revista, e os redatores, por seu lado, deveriam escrever com mais graça, objetividade, e simplicidade. Para isso tinham que dispor de mais tempo para escrever. Ele enfatizava a cobertura de reportagens com pessoas comuns. Já Carlos Heitor Cony dizia que a revista tinha uma postura otimista e positiva ao extremo. Manchete passou anos consolidada como a revista da família brasileira, dando abertura para que outros títulos também fossem lançados. Como as revistas Ele e Ela, Desfile, Sétimo Céu e Amiga, que fizeram sucesso nos anos 70 e 80. Além das revistas, a Editora Bloch adquiriu duas emissoras de rádio. Oscar Bloch utilizou-se do prestígio e amizade entre os militares para concorrer a uma concessão de um canal de televisão. Oscar e Pedro (Jaquito), sobrinhos de Adolpho, convenceram-no a entrar nesse ramo. Em 1981, Adolpho Bloch e Silvio Santos foram os vencedores das concessões. Inicialmente foi feito um investimento de cinquenta milhões de dólares no canal. Pena ressalta a figura extremamente contraditória de Adolpho. Um empresário que buscava sempre estar ao lado de quem representava o poder, que deu total apoio aos governos militares, mas que ao mesmo tempo foi capaz de financiar boa parte da publicidade na campanha de Leonel Brizola para o governo do Rio de Janeiro, em 1982, pelo PDT (Partido Democrático Trabalhista) quando voltara do exílio. O mesmo conseguiu vencer as eleições nesta ocasião. O autor enfatiza que Adolpho sempre se preocupou em cortejar quem estivesse no comando político. Não importava o partido ou grupo de posição política, embora fosse um declarado anticomunista. Quando lançou Manchete, em 1952, Adolpho buscava uma aproximação imediata com o então presidente Getúlio Vargas, e assim ele faz com todos os líderes seguintes, além de manter relações com outros políticos como prefeitos, governadores, senadores e deputados, comparecendo a cerimônias de posse, encontros políticos, viagens, inaugurações, e almoços que ele mesmo promovia no prédio da Manchete, onde recebia parlamentares de todo o país, principalmente do eixo Rio-São Paulo. O autor relata um episódio onde em uma viagem a Washington, nos Estados Unidos, Adolpho foi convidado a integrar a comitiva oficial do então presidente João Goulart. Quando desceram do avião, todos foram recebidos pelo presidente americano John F. Kennedy. Além disso, João Goulart frequentava a casa de campo de Adolpho em Teresópolis e almoçava frequentemente no restaurante da Manchete. A relação não só de Adolpho, como de toda a família Bloch, resulta num benefício de concessão para a extinta rede de televisão Tupi, ao lado do comunicador Sílvio Santos. É essa relação amistosa e quase pessoal com os presidentes, onde ele tem acesso direto aos gabinetes em Brasília, além de constantes empréstimos, financiamentos, propagandas de estatais na revista e perdão de dívidas por impostos, que vão manter o sucesso da revista e do grupo empresarial durante muito tempo. Segundo Pena, foi a mudança na dinâmica governamental do país, um dos principais motivos da falência. Em seus primeiros encontros com o então presidente Fernando Collor de Melo, em busca de apoio financeiro, Adolpho é praticamente ignorado. Em outra ocasião, também em Brasília, num encontro com o presidente do período José Sarney, ele foi acompanhado de Fernando Barbosa Lima, então diretor geral da revista Manchete, em busca de obter o perdão de todas as dívidas da empresa, e o que ele consegue, é apenas uma promessa de renegociação. Nos anos 1990, o grupo Bloch já acumulava dívidas com o INSS (Instituto Nacional de Seguridade Social), Fundo de Garantia, Embratel, Correios, além de débitos com outros serviços públicos. Em 05 de Junho de 1983, entrava no ar a TV Manchete, como um desafio para a Bloch Editores, já que seu fundador admitia não entender e nem gostar de televisão, mas que, devido à receita publicitária, que com certeza traria, a empresa entraria neste novo ramo. Assim, todas as atenções e investimentos da empresa passaram a se concentrar na emissora. Em 1984 a TV Manchete foi a primeira rede de televisão a transmitir o desfile das escolas de samba do Rio de Janeiro. A partir da cobertura do carnaval, a emissora começou a vencer as acirradas disputas pelo Ibope. Após o período carnavalesco, com a baixa audiência das séries inglesas, Adolpho decidiu fazer novelas e fez investimentos a juros altos. O maior sucesso alcançado veio em 1990 com a novela Pantanal, de Benedito Ruy Barbosa. Com uma audiência regular, os dois primeiros anos foram de prejuízo financeiro, apesar do aparente sucesso de público. O plano Cruzado e o Plano Cruzado II trouxeram a inflação e o aumento dos juros. A dívida da Manchete já chegava a 30 milhões de dólares. Há um grande consenso entre biógrafos e ex-funcionários de que a rede de televisão, a crise financeira do país, a inflação, os altos juros e a mudança na dinâmica da economia nacional com a modernização, além da desvalorização da moeda, foram os fatores da falência desse grande grupo de comunicação. Nos anos 1990, com os crescentes investimentos na rede de televisão, sempre. Hoje, no Edifício Manchete, está o seu último escritório, tal como JK o deixou. Tudo ali pertence à História do Brasil. Durante anos, lutei com o presidente para convencê-lo a ser o cronista de sua própria vida. Hoje, tenho a felicidade de ter editado seus quatro livros de memórias12. Em 1969 ele chegou a ser “advertido” pelo ministro Delfim Neto sobre os frequentes elogios a J.K. (cassado) e a Brasília. Na ocasião da morte do ex-presidente, Adolpho ficou muito abalado e precisou de atendimento médico. Durante os 12 anos de seu ostracismo político, em que é perseguido pela ditadura militar, JK conta com o apoio e a amizade de Adolpho Bloch. Não só no exílio, mas também no retorno ao Brasil. O empresário se encarrega de dar-lhe suporte moral e financeiro. Monta um apartamento para ele no último andar do prédio da Manchete, é o responsável pela publicação dos três volumes de sua autobiografia e ainda o contrata como articulista da Manchete. Adolpho não cede às pressões dos militares para que abandone o amigo e quase perde suas empresas. As ameaças de devassa fiscal na Manchete são ignoradas, assim como os manifestos de políticos e empresários ligados à ditadura13. Desde o início, Adolpho fez de Manchete uma espécie de órgão oficial das obras. (...) JK tinha um escritório no prédio da Manchete onde despachava seus papéis, preparava sua biografia e colaborava eventualmente com pequenos artigos para a revista14. É importante verificarmos a relação da imprensa, observando que não forma um grupo homogêneo, mas que engloba diversos grupos empresariais e familiares, com diferentes interesses, em relação à ditadura. Segundo José Esmeraldo Gonçalves, jornalista da Revista Manchete nos anos 1970, muitos jornais divulgavam a lista completa com nomes, números de documentos e endereços de vários cidadãos. Involuntariamente ou não, contribuíram com a formação de fichas de elementos 12 BLOCH, Adolpho. O Pilão. Rio de Janeiro: Bloch Editores, 1978, p. 23. 13 PENA, Felipe. Seu Adolpho: Uma biografia em fractais de Adolpho Bloch, fundador da TV e Revista Manchete. Rio de Janeiro: Usina de Letras, 2010, p. 107. 14 Depoimento de Roberto Muggiati. Apud BARROS, J.A.; GONÇALVES, José Esmeraldo (orgs.) Aconteceu na Manchete: as histórias que ninguém contou. Rio de Janeiro: Desiderata, 2008, p.21. considerados “subversivos”. O clipping com dados pessoais dos detidos alimentava as fichas dos órgãos de segurança. Pelo que percebemos durante a análise da revista no período delimitado, a Manchete não tomou esse tipo de atitude. Embora, assim como outros grupos proprietários de jornais e revistas, a Bloch tivesse interesses econômicos e ideológicos em comum com os governos militares. A história da imprensa no Brasil confunde-se com a história do poder. Os empresários de comunicação estão sempre ao lado dos governos. E mesmo quando vão para a oposição têm o claro objetivo de defender interesses próprios, ligados, na maioria das vezes, ao acesso às verbas públicas de propaganda. (...) Quando lança a revista Manchete, em 1952, a preocupação de Adolpho é aproximar-se de Getúlio Vargas. E assim continua com todos os presidentes seguintes. Mesmo durante o regime militar, quando sofre pressões por causa de seu relacionamento com JK, a Manchete publica matérias elogiando os presidentes15. Muitas vezes a revista esquivou-se de publicar assuntos polêmicos ou que entrassem em confronto com o governo. Um exemplo disso é que às vésperas do AI-5, na edição de 02 de Novembro de 1968, a revista dedicou vinte de suas páginas a uma reportagem sobre o casamento de Jacqueline Kennedy com o bilionário grego Onassis. Essa atitude mostra que, num período de efervescência social, que deu margem a “um golpe dentro do golpe”, a revista fez questão de desviar a atenção do leitor para fora do que estava acontecendo, trazendo temas voltados ao entretenimento e ao esvaziamento político. 15 PENA, Felipe. Seu Adolpho: Uma biografia em fractais de Adolpho Bloch, fundador da TV e Revista Manchete. Rio de Janeiro: Usina de Letras, 2010, p. 123.
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